Gabriel Boric |
Em um clima de acirrada polarização, o candidato de extrema-direita à presidência do Chile, José Antonio Kast, líder do Partido Republicano, obteve 27,91% dos votos, acima dos 25,83% de Gabriel Boric, do Aprovo Dignidade, a frente progressista.
Para o segundo turno, marcado para 19 de dezembro, ao que tudo indica nada falará tão forte como o ensinamento político de que “quanto mais amigos, menos inimigos”. De um lado, uma ampla coalizão de forças em defesa de um projeto de desenvolvimento nacional, de fortalecimento do papel do Estado, respeito à natureza e aos direitos humanos, e de ruptura com as estruturas herdadas da sangrenta ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990). De outro, a de Kast, o Bolsonaro chileno que, entre outras ações, faz questão de visitar na prisão membros da ditadura condenados por crimes bárbaros contra presos políticos e defende explicitamente em seu programa o fim do Ministério da Mulher.
Primeiras definições
No dia seguinte à eleição, já vemos algumas importantes definições, como a do Partido Socialista – do histórico presidente Salvador Allende, que teve sua vida ceifada no Palácio da la Moneda em 1973 – que se pronunciou de forma incondicional em apoio a Boric.
Com 7,61% dos votos, o candidato Marco Enríquez-Ominami, do Partido Progressista (PRO), conclamou os chilenos a conformarem uma “grande coalizão para enfrentar a extrema direita”. Para o líder do PRO, Boric “deve nos unir e tem peso para isso, demonstrando que a intransigência não serve”.
Já o candidato Sebastián Sichel, do presidente Sebastián Piñera, declarou que não apoiará a Boric, talvez como uma parte dos 12,7% do seu eleitorado.
Em sentido oposto, a candidata da Democracia Cristã, Yasna Provoste, declarou que “esse espírito totalitário, fascista é o que representa a candidatura de José Antonio Kast. Não poderíamos ter uma atitude neutra”. Entretanto a candidata disse que anseia saber “o que Gabriel Boric tem a oferecer ao país”, indicando disposição de negociar.
O efeito das alianças para o segundo turno, no entanto, ainda é uma incógnita. No primeiro havia coligações formadas por vários partidos. Se poderia pensar que uma coligação excluída do segundo turno passaria seus votos para um dos dois candidatos, mas não é tão simples. No segundo turno cada partido, independente da coligação em que estivesse antes, vai apoiar este ou aquele candidato. Assim, pode haver rachas nas forças que apoiaram cada coligação. O primeiro a declarar posição foi o Partido Socialista que integrava a coalizão de Yasna Provoste junto com vários outros. O mesmo, no entanto, não aconteceu com os demais parceiros de coalizão. Existe uma infinidade de partidos que ainda não se manifestou.
O povo seguirá as alianças?
Um fato a ser considerado é o de que todos os demais candidatos, incluindo Sichel, o indicado de Piñera, atacaram Kast na campanha acusando-o de extremista e até fascista pois essa posição poderia conquistar votos não alinhados nem com esquerda nem com direita. Se algum deles apoiar Kast no segundo turno, não se sabe o que seus eleitores farão, principalmente aqueles que tem consciência do significado de votar num fascista. A tendência é que muitos sigam sua própria consciência votando em Boric como a alternativa possível, ainda que discordando de pontos programáticos do candidato, mas para evitar mal maior. É impossível fazer prognósticos sobre qual o percentual dessa parcela dos eleitores vai votar em Boric, ou eventualmente vai seguir a orientação do candidato em quem votou no primeiro turno, ou ainda vai se eximir de votar já que o voto não é obrigatório.
Outro fator importante é que Kast se identifica com o ditador Pinochet e defende expressamente o regime ditatorial que até hoje horroriza grande parte da população. Como votará essa parcela que não quer de jeito nenhum uma volta aos tempos sombrios, independente do partido em que acredite atualmente?
Aposta na maioria silenciosa
Por fim, devemos ter em conta que metade do eleitorado não saiu de casa para votar no primeiro turno. Manterão a mesma postura inerte no segundo turno conscientes da possibilidade da eleição de um novo Pinochet? Uma coisa é certa e clara: Boric é, nesta disputa, a única possibilidade de evitar a eleição de alguém que prega o retorno das práticas da ditadura e ataca as instituições democráticas.
Gabriel Boric parece ter uma compreensão parecida. Hoje ele afirmou: “Temos que entender quem votou em outras alternativas e convidá-los a ser parte desse projeto e, sobretudo, também a esses 55% de chilenos que não foram votar. Queremos falar a vocês que aqui há uma alternativa de esperança, de mudança, para que tenhamos um país justo e digno para todas e todos”.
* Esta reportagem foi elaborada pelo Coletivo ComunicaSul, com o patrocínio do Barão de Itararé, Agência Carta Maior, jornal Hora do Povo, Diálogos do Sul, Apeoesp Sudoeste Centro, Intersindical, Sintrajufe-RS, Sinjusc, Sindicato dos Bancários do RN, Sicoob, Agência Sindical e 152 contribuições individuais.
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