Charge: Nani |
O resultado da movimentação da janela eleitoral definiu um bloco de partidos de centro e de direita que são amontoados do que se chama na política de “baixo clero parlamentar”. O que era tolerável e residual no quadro parlamentar formado a partir de 1979 – que trouxe de volta a arrumação ideológica que deu sustentação ao período democrático 1945-1964 – conclui seu caminho rumo à mediocridade. Enquanto os partidos com alguma representação social se isolam, o quadro eleitoral é tomado de assalto – literalmente – por amontoados de políticos sem rosto, envolvidos em uma estranha articulação onde interesses individuais se transformam em maiorias e dão suporte ao conteúdo político e ideológico ao governo de inspiração fascista de Jair Bolsonaro.
O Brasil vive ainda o impacto profundo do processo de desgaste deliberado e constante das instituições democráticas que precedeu o golpe contra a presidenta Dilma Rousseff, em 2016, e a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no ano de 2018, e resultaram na ascensão dos militares ao poder pela via eleitoral.
A articulação entre a Operação Lava Jato e a mídia tradicional teve o poder de destruir todo o sistema político que deu sustentação à democracia brasileira pós-Constituinte. Os artífices da estratégia de destruição do PT e de seu principal líder, Luiz Inácio Lula da Silva, estavam dispostos a pagar qualquer preço para tirá-los do poder. O questionamento diário da política brasileira por meio das ações espetaculares da polícia e do Ministério Público do Paraná, sob a liderança do então juiz de primeira instância Sergio Moro, contudo, não abalou significativamente a popularidade de Lula, nem acabou com o seu partido. Recaiu principalmente sobre o PSDB, o partido de centro que rivalizou com o PT a partir das eleições de 1994 e virou pó nas eleições de 2018. Este ano corre o risco de ser varrido do mapa. Antes disso, a traição do vice de Dilma Rousseff, Michel Temer, cuja participação no golpe que a derrubou, em 2016, o fez presidente por três anos do segundo mandato da presidenta petista, destruiu o PMDB (que tirou o P do nome recentemente).
A moral da história política e da democracia brasileira, depois de golpes sucessivos às instituições democráticas, é a de que todo o trabalho de desestabilização política empreendido pelos partidos supostamente de centro (PSDB e PMDB) para tirar o PT do poder tiveram seu maior efeito devastador sobre estes mesmos partidos. O PT diminuiu, mas nem tanto, e nunca foi majoritário. No período de governos petistas, sempre foi o que conseguiu a maior e a mais fiel bancada nas urnas, mas dentro de um Congresso fragmentado por muitas legendas e por interesses corporativos sólidos. As chamadas esquerdas continuam do mesmo tamanho. Lula, o maior líder político do país, conseguiu dar volta por cima da perseguição judicial e midiática e voltou com a mesma força. O PT foi governo porque Lula entendeu, desde o seu primeiro dia de governo, que apenas sobreviveria na cadeira de presidente se fizesse amplos acordos partidários e claros acordos sociais.
A esquerda – o PT mais os pequenos partidos ideológicos – está onde sempre esteve. Os suprimidos do quadro partidário foram os partidos de centro. Ao embarcarem na canoa furada de participar ativamente da guerra híbrida que se abateu sobre o país – e cujo principal elemento foi a Lava Jato – deram de graça o seu eleitor para a extrema-direita e entregaram o poder para um louco de hospício que de louco não tem nada, mas um claro projeto de destruição da democracia. A ideologia do antipetismo – que substituiu todas as outras no processo de tirar o PT do poder – não contaminou os eleitores históricos de Lula (que tem uma votação sempre maior do que a do seu partido). Contaminou os eleitores que votavam no PSDB contra Lula e deixaram de ver o partido como única alternativa de poder possível. O anticomunismo fora de hora – ridiculamente expressado com todas as letras pelo candidato tucano Aécio Neves em 2014 – encontrou um abrigo mais confortável na extrema-direita de Bolsonaro.
O ex-presidente Michel Temer, usado no projeto feito sob medida para tirar o PT do poder, suprimiu do PMDB a capacidade histórica de sobreviver e tornar-se governo sempre, sem o trabalho de disputar a Presidência. O PMDB herdou do PSD do varguismo, anterior ao golpe de 1964, o papel de definir maiorias legislativas – e consequentemente a governabilidade de presidentes da República. Atuou assim no governo Itamar Franco e nos governos de Fernando Henrique Cardoso. Lula resistiu à aliança com o partido no primeiro mandato, mas no segundo o teve como parceiro. Temer foi o vice de Dilma nos seus dois mandatos. Embora a vida do PMDB tenha sido entrecortada por traições a aliados políticos, o golpe contra uma companheira de chapa tira do partido qualquer confiabilidade para fazer novos acordos. Contra o PMDB também pesou a desarticulação infringida por Eduardo Cunha ao partido, no mandato 2014-2018 – se a atuação do parlamentar foi decisiva para o impeachment de Dilma, seu modus operandi, de agir acima dos partidos para formar um grande aglomerado sob sua orientação pessoal, acabou por quebrar a já frágil organicidade de uma legenda que atuava no centro ideológico.
O eleitor brasileiro de centro, portanto, foi um dos mais afetados pela grande confusão institucional, intencional, movida por uma máquina de propaganda bem articulada, financiada e azeitada contra os governos de esquerda eleitos legitimamente. E levou junto os partidos que tinham algum funcionamento orgânico e poder de mediação na vida institucional. O eleitor de centro que se deixou levar pela histeria antipetista em 2018, está arrependido mas não reconhece o PSDB e o PMDB como seus representantes. Esses votos estão à solta. O partido de centro que conseguir oferecer alguma racionalidade ideológica a este eleitor tem grandes chances de começar 2023 como a nova grande força do quadro partidário.
O Brasil vive ainda o impacto profundo do processo de desgaste deliberado e constante das instituições democráticas que precedeu o golpe contra a presidenta Dilma Rousseff, em 2016, e a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no ano de 2018, e resultaram na ascensão dos militares ao poder pela via eleitoral.
A articulação entre a Operação Lava Jato e a mídia tradicional teve o poder de destruir todo o sistema político que deu sustentação à democracia brasileira pós-Constituinte. Os artífices da estratégia de destruição do PT e de seu principal líder, Luiz Inácio Lula da Silva, estavam dispostos a pagar qualquer preço para tirá-los do poder. O questionamento diário da política brasileira por meio das ações espetaculares da polícia e do Ministério Público do Paraná, sob a liderança do então juiz de primeira instância Sergio Moro, contudo, não abalou significativamente a popularidade de Lula, nem acabou com o seu partido. Recaiu principalmente sobre o PSDB, o partido de centro que rivalizou com o PT a partir das eleições de 1994 e virou pó nas eleições de 2018. Este ano corre o risco de ser varrido do mapa. Antes disso, a traição do vice de Dilma Rousseff, Michel Temer, cuja participação no golpe que a derrubou, em 2016, o fez presidente por três anos do segundo mandato da presidenta petista, destruiu o PMDB (que tirou o P do nome recentemente).
A moral da história política e da democracia brasileira, depois de golpes sucessivos às instituições democráticas, é a de que todo o trabalho de desestabilização política empreendido pelos partidos supostamente de centro (PSDB e PMDB) para tirar o PT do poder tiveram seu maior efeito devastador sobre estes mesmos partidos. O PT diminuiu, mas nem tanto, e nunca foi majoritário. No período de governos petistas, sempre foi o que conseguiu a maior e a mais fiel bancada nas urnas, mas dentro de um Congresso fragmentado por muitas legendas e por interesses corporativos sólidos. As chamadas esquerdas continuam do mesmo tamanho. Lula, o maior líder político do país, conseguiu dar volta por cima da perseguição judicial e midiática e voltou com a mesma força. O PT foi governo porque Lula entendeu, desde o seu primeiro dia de governo, que apenas sobreviveria na cadeira de presidente se fizesse amplos acordos partidários e claros acordos sociais.
A esquerda – o PT mais os pequenos partidos ideológicos – está onde sempre esteve. Os suprimidos do quadro partidário foram os partidos de centro. Ao embarcarem na canoa furada de participar ativamente da guerra híbrida que se abateu sobre o país – e cujo principal elemento foi a Lava Jato – deram de graça o seu eleitor para a extrema-direita e entregaram o poder para um louco de hospício que de louco não tem nada, mas um claro projeto de destruição da democracia. A ideologia do antipetismo – que substituiu todas as outras no processo de tirar o PT do poder – não contaminou os eleitores históricos de Lula (que tem uma votação sempre maior do que a do seu partido). Contaminou os eleitores que votavam no PSDB contra Lula e deixaram de ver o partido como única alternativa de poder possível. O anticomunismo fora de hora – ridiculamente expressado com todas as letras pelo candidato tucano Aécio Neves em 2014 – encontrou um abrigo mais confortável na extrema-direita de Bolsonaro.
O ex-presidente Michel Temer, usado no projeto feito sob medida para tirar o PT do poder, suprimiu do PMDB a capacidade histórica de sobreviver e tornar-se governo sempre, sem o trabalho de disputar a Presidência. O PMDB herdou do PSD do varguismo, anterior ao golpe de 1964, o papel de definir maiorias legislativas – e consequentemente a governabilidade de presidentes da República. Atuou assim no governo Itamar Franco e nos governos de Fernando Henrique Cardoso. Lula resistiu à aliança com o partido no primeiro mandato, mas no segundo o teve como parceiro. Temer foi o vice de Dilma nos seus dois mandatos. Embora a vida do PMDB tenha sido entrecortada por traições a aliados políticos, o golpe contra uma companheira de chapa tira do partido qualquer confiabilidade para fazer novos acordos. Contra o PMDB também pesou a desarticulação infringida por Eduardo Cunha ao partido, no mandato 2014-2018 – se a atuação do parlamentar foi decisiva para o impeachment de Dilma, seu modus operandi, de agir acima dos partidos para formar um grande aglomerado sob sua orientação pessoal, acabou por quebrar a já frágil organicidade de uma legenda que atuava no centro ideológico.
O eleitor brasileiro de centro, portanto, foi um dos mais afetados pela grande confusão institucional, intencional, movida por uma máquina de propaganda bem articulada, financiada e azeitada contra os governos de esquerda eleitos legitimamente. E levou junto os partidos que tinham algum funcionamento orgânico e poder de mediação na vida institucional. O eleitor de centro que se deixou levar pela histeria antipetista em 2018, está arrependido mas não reconhece o PSDB e o PMDB como seus representantes. Esses votos estão à solta. O partido de centro que conseguir oferecer alguma racionalidade ideológica a este eleitor tem grandes chances de começar 2023 como a nova grande força do quadro partidário.
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