Charge: Leo Bastos |
O cineasta britânico Sacha Cohen produziu uma série documental no ano passado chamada Lockdown americano e desmontando Borat, que é um desdobramento do filme Fita de cinema seguinte, também dele (ambos em cartaz no Prime Vídeo). O filme é uma sátira ferina ao terraplanismo em solo norte-americano. A série é resultado de uma temporada do diretor na residência dos dois bizarros personagens do filme – típicos tiozões do zap aqui do Brasil. Lá, na convivência diária com os ilustres personagens, Sacha gravou as conversas – um festival de barbaridades nunca visto. Depois o diretor vai confrontar os “brilhantes intelectuais” com cientistas e especialistas sobre as certezas levantadas por eles, e sempre que a verdade é posta, com base em evidências científicas, a dupla repele, por somente acreditar nas ‘teses’ difundidas na cartilha trumpista. Numa das partes mais constrangedoras, Hilary Clinton garante a eles, que nunca bebeu sangue de crianças, mas ambos ignoram solenemente a versão dela, já que foram convencidos na campanha presidencial da veracidade dessa estapafúrdia fake news e outras semelhantes, instrumentos fundamentais na eleição que deu a vitória a Trump.
Alguma semelhança com o bolsonarismo tupiniquim, terra dos “cidadãos de bem”? Sim. Muita semelhança. Tanto lá como cá, essas criaturas que mais parecem de outro planeta, vivem num mundo particular, distantes da realidade, muitas vezes por ignorância, e em outras, por conveniência. Abaixo vamos dissecar as enormes e inúmeras contradições do “cidadão de bem” apenas para municiar um pouco o leitor que tiver paciência de acompanhar essa arenga até o final. É um texto bastante longo.
Uma das principais bandeiras do “cidadão de bem” é o combate à corrupção, e para todos eles, Lula é o maior ladrão do mundo, mesmo sendo isso um disparate completo. Eles estão sempre nas redes sociais pedindo cadeia para os corruptos. Mas não passamos uma semana sem que um desses falsos moralistas seja desmoralizado, eles próprios sendo protagonistas de roubalheira a mais deslavada. Brizola dizia para se desconfiar de quem vomita moralidade o tempo inteiro, e parece ser esse tipo de discurso um escudo por trás do qual os verdadeiros corruptos se escondem.
Não tenhamos dúvidas de que boa parte dessa gente é composta por sonegadores, estelionatários e trapaceiros dos mais diversos tipos, pessoas que no mesmo dia que vão na rede social pedir cadeia pra corruptos, promovem seus ilícitos cotidianos para se locupletar. São os eternos devedores da previdência, caloteiros contumazes de financiamentos de bancos públicos, e vez por outra reprodutores de práticas análogas ao trabalho escravo. É o famoso moralista que tem gato de internet e de TV por assinatura em casa, que suborna guarda de trânsito, que recebe ou oferece propinas no dia a dia. É um típico malandro esperto que bate uma carteira no meio da multidão e sai gritando “pega ladrão”.
Não custa lembrar que esses milhões de “cidadãos de bem” são os mesmos que votaram em Aécio Neves para presidente sem nenhum constrangimento e usaram por muito tempo a camisa com a frase “Não tenho culpa, votei em Aécio. E eram adeptos entusiastas do “Somos todos Cunha”, quando o deputado corrupto era presidente da Câmara. Lembram-se? Eles ficam indignados com o caso do triplex que teria sido adquirido por Lula numa imaginária troca de favores – uma farsa já desmontada -, mas aplaudem a compra de uma mansão de R$6 milhões pelo filho de Bozo (vale mais do que o Triplex e o Sítio de Atibaia somados). Não há nenhuma reflexão crítica, mesmo porque a capacidade cognitiva dessa gente é quase nula para refletir sobre qualquer assunto. Eles ignoram o enriquecimento ilícito da família miliciana com base nas rachadinhas, mas esbravejam contra as supostas riquezas do filho de Lula, outra farsa já desmoralizada. Quando questionados sobre as rachadinhas, o “cidadão de bem” alega que todos os políticos usam o mecanismo, portanto, nada de anormal. E tem corrupção na vacina, nos gabinetes da família, na compra de imóveis. E tem roubalheira no MEC, na saúde, na compra de vacinas. Até as outrora respeitadas Forças Armadas vem envergonhando o país ao gastar fortunas na compra de viagras e próteses penianas para seus generais com disfunção erétil, além das farras com nossos impostos na compra de cervejas e picanhas, devidamente superfaturada, é claro.
O “cidadão de bem” repete com frequência que a mamata acabou. O cartão corporativo do presidente, segundo o insuspeito TCU, torrou R$21 milhões dos cofres públicos de 2019 a março de 2021 , gastos de R$96 mil mensais. Vejam, apenas num cartão cuja conta quem paga é o povo, foram gastos R$2,6 milhões só com comida – é uma orgia sem fim essa gastança perdulária de um dissimulado que esbraveja cinicamente contra as mamatas. Em suas viagens a passeio pelo país foram consumidos R$16,5 milhões. Somente naquelas férias em Santa Catarina o falso moralista gastou R$900 mil e outros R$783 mil no carnaval de Guarujá. Nada disso incomoda o “cidadão de bem”. Isso é o que nos acostumamos a caracterizar de viver em realidade paralela.
“O cidadão de bem”, só chama Lula de ex-presidiário – tem o prazer em repetir à exaustão esse ataque sórdido a quem foi preso injustamente por um juiz sem escrúpulos. A prisão foi exatamente para retirá-lo da disputa e abrir caminho para a eleição daquele que tanto nos envergonha. Os “cidadãos de bem” não sabem que Mandela, Mahatma Gandhi e também o próprio Jesus Cristo, a quem eles tanto dizem venerar, também foram ex-presidiários, vítimas de perseguição política. E nem ficam de cara vermelha por estarem ao lado de figuras como Roberto Jefferson (está preso atualmente) e Valdemar Costa Neto (ex-presidiário), dois dos mais famosos corruptos de nossa história, o último deles, presidente do partido do presidente.
O bolsonarista adora exaltar a bandeira do Brasil como símbolo de seu patriotismo, mas não se constrange nem um pouco – na verdade até deliram – quando o “mito” bate continência para a bandeira norte-americana. Em suas manifestações, eles sempre trazem também a bandeira de Israel, talvez para realçar o ódio que sentem pelos adversários, o mesmo ódio que aquele estado terrorista despeja contra os palestinos, vítimas de uma política organizada de genocídio. Esses pseudo-nacionalistas estão agora comemorando a privatização da Eletrobrás e defendendo o mesmo destino para a já esquartejada Petrobrás. Entregar riqueza e patrimônio do país e do povo para eles é ser patriota. É muita loucura. Nenhum outro governo de extrema direita muito afora adota esse tipo de política. Aqui chegamos ao cúmulo do presidente do país propor ao homem mais rico do mundo, Elon Musk, um excêntrico bilionário sulafricano com nacionalidade norte-americana – uma espécie de velho da Havan -, ter o direito de controlar o monitoramento da Amazônia.
Num dos episódios mais vergonhosos na história das relações internacionais, o presidente brasileiro pediu a Biden “ajuda” na disputa contra Lula, o que vem a ser interferência direta nas questões internas de um país por uma potência estrangeira.
Veja o que disse o professor de Comunicação Fábio Palácio sobre o assunto:
“Ora, as eleições brasileiras são assunto interno do Brasil. Porém, um “patriota” que bate continência para outras bandeiras não deve mesmo saber o significado dos termos “soberania” e “não intervenção”. É o fim do mundo – um comprovado gesto de traição à pátria, uma clara violação de nossa independência – o Bolsonaro se portar como uma cadelinha a demonstrar de maneira descarada tamanha subserviência a um país que nunca respeitou a soberania dos povos. E o “cidadão de bem” aplaude com entusiasmo. Haja patriotismo!
O “cidadão de bem” costuma estufar o peito e dizer: sou defensor da família. Pura demagogia. Grande parte dessa turma, principalmente os homens – a maior base do bolsonarismo – tem filhos fora do casamento, se casou mais de uma vez, tem amantes, frequenta casas de prostituição, mantém contatos com garotas e garotos de programa etc. Quantos deles não são organizadores contumazes de orgias sexuais, promíscuos que contratam prostitutas para a prática do sexo desregrado?
O “cidadão de bem” costuma estufar o peito e dizer: sou defensor da família. Pura demagogia. Grande parte dessa turma, principalmente os homens – a maior base do bolsonarismo – tem filhos fora do casamento, se casou mais de uma vez, tem amantes, frequenta casas de prostituição, mantém contatos com garotas e garotos de programa etc. Quantos deles não são organizadores contumazes de orgias sexuais, promíscuos que contratam prostitutas para a prática do sexo desregrado?
Eles adoram divulgar pornografia das mais pesadas em grupos de zap, mas não se envergonham um pouquinho sequer de repetir o mantra “a familia acima de tudo”. Não há um caso de denúncia de pedofilia em que o infrator não tenha uma foto ao lado do “mito” em suas redes sociais bradando em defesa da família. É o cinismo no nível mais deslavado que se possa imaginar vindo de depravados se passando por santos.
O “cidadão de bem” tem orgulho de se apresentar contra o aborto. A “cidadã de bem”, também. Mas boa parte dessas “cidadãs de bem” fizeram aborto a mando do “cidadão de bem” ou por vontade própria. É rara uma mãe de um “cidadão de bem” que não tenha feito aborto ou abortos. Os “cidadaos de bem” são aqueles que vão numa clínica particular, pagam mais de R$15 mil reais pelo aborto da filha ou da esposa e ao sair da cirurgia vão pras redes sociais dizer que quem defende aborto é criminoso irrecuperável. Como é hipócrita o “cidadão de bem”! Aborto bom, seguro, bem feito, só pra eles. As mulheres pobres que fazem abortos com os açougueiros da vida – todas deveriam ser atendidas pelo estado – devem ser presas, na visão tacanha dessas abomináveis criaturas.
Ao tempo em que são contra o aborto por “defenderem a vida”, são estridentes defensores da pena de morte e das operações da polícia que visam ao extermínio dos pobres e negros de nossas periferias. Eles chegam a comemorar cada chacina nas periferias contabilizando os números de mortos como menos votos para Lula. Como bons “cristãos” que julgam ser, tem como referência política um coronel da ditadura que torturou mulheres enfiando ratos vivos em suas vaginas, que ainda trazia os filhos delas para presenciarem cenas devastadoras de sessões de tortura. É assim que o “cidadão de bem” defende a vida. Eles comemoraram até a morte do neto de Lula, uma inocente criança, como fizeram também com as mortes da ex-esposa e do irmão do presidente.
O “cidadão de bem” odeia a população LGBTQIA+ – a considera uma aberração humana, um desvirtuamento das leis divinas. Mas parte desse público se encaixa no que se chama de “bicha enrustida”. Como não consegue encarar sua homossexualidade, acaba despejando seu ódio àqueles que tiveram a coragem de assumir sua condição sexual. E parte dessa gente, volta e meia, é flagrada em relações sexuais com parceiros do mesmo sexo, uma desmoralização completa para um machão de extrema-direita. Não é anormal também a presença desses machões nas madrugadas em busca de sexo pago com travestis pelas ruas das grandes cidades. Assim que saem dos motéis vão pras redes sociais bradar contra os gays. E toma mais cinismo.
Quase todos os dias temos casos e casos divulgados na imprensa de estupradores, pedófilos, agressores de crianças, gays e mulheres, e a regra nunca falha: todos eles se definem nas redes sociais como “cristãos”, “defensores da família”, sempre com fotos ao lado de Bolsonaro. Trago aqui três exemplos entre os mais conhecidos, todos do Rio de Janeiro: o vereador cassado e preso, Dr. Jairinho, acusado do assassinato do enteado, um crime que chocou o país; a deputada e pastora cristã Flordelis, cassada e presa, que mandou matar o marido; e o mais recente, outro vereador, Gabriel Monteiro, em processo de cassação, que filmava relações sexuais com adolescentes – uma denunciou ter sido estuprada.
A jornalista Cynara Menezes, num post no twitter escreveu: “Bolsonaro enche a boca para falar de família, mas quantas famílias foram destruídas pelo bolsonarismo? Destruídas pela homofobia e transfobia, pela intolerância, pelo ódio político, pela bala, pela fome. Até onde eu sei, a única família que se deu bem na era Bolsonaro foi a dele”. Bem, é esse tipo de gente que inunda as redes sociais em defesa da família enquanto promove essas coisas abomináveis.
O “cidadão de bem” gosta de postar fotos com prateleiras vazias em supermercados na Venezuela e filas em Cuba – diz ficar indignado com a suposta miséria nestes países. Mas eles não ficam nem um pouco sensíveis com a fila do osso, com as milhares de pessoas no frio e na fome nas ruas das grandes cidades. O governo da esquerda, que para eles quebrou o país, tinha erradicado a fome, mas depois do golpe de 2014 a miséria se alastrou chegando agora a 33 milhões de brasileiros passando fome. Mas eles acham essas pessoas fracassadas, inúteis para a sociedade. Não à toa o “cidadão de bem” tem como um dos alvos prediletos de seus ataques o padre Julio Lancellotti, que num trabalho digno de Prêmio Nobel, promove ações de apoio aos miseráveis das ruas de São Paulo.
A propósito, o “cidadão de bem” ataca com frequência o comunismo o associando à fome e à miséria, mas ele ignora – por ser estúpido – o fato de ser justamente o capitalismo que promove as dificuldades e sofrimento diários de bilhões de pessoas pelo mundo. Eles provavelmente nunca ouviram falar no Haiti e no Burundi, dois dos países mais miseráveis do mundo, ambos capitalistas.
O “cidadão de bem” considera Cuba e Venezuela como ditaduras sanguinárias, mas bate palmas para a família do “mito” que viaja com frequência para a Arábia Saudita, esta sim, uma autêntica ditadura sanguinária. Neste país não existem eleições, não existem parlamento, associações da sociedade civil, sindicatos, etc. A mulher vive na mais completa opressão, e religião, só a oficial, todas as outras são proibidas. Como vimos, nada que o “cidadão de bem” defende tem o mínimo de coerência.
O “cidadão de bem”, na sua paranóia anticomunista diz o tempo inteiro que o comunismo toma a casa das pessoas, mas o governo comandado por seus líderes fez aprovar na Câmara dos Deputados uma lei que permite aos bancos tomar as casas das pessoas endividadas (77% da população brasileira). Quem toma a casa das pessoas não é o comunismo, como é ensinado no curso básico de Olavo de Carvalho, mas os banqueiros capitalistas e especuladores, que lucram bilhões às custas da fome e da miséria do povo.
Parte dos “cidadãos de bem ” passou a usar também a bandeirinha da Ucrânia em seus perfis, e alguns de seus militantes foram para o distante país europeu lutar ao lado dos batalhões nazifascistas e outros em busca de sexo com refugiadas. Eles não movem uma palha para ajudar nosso sofrido povo vítima constante das enchentes que assolam o país, mas fazem uma concorrida mobilização para financiar mercenários, aventureiros e oportunistas.
O “cidadão de bem” odeia a luta dos sem-teto por moradia, a luta dos sem-terra para ter uma área para plantar e a luta dos trabalhadores por melhores salários. Para eles são todos vagabundos, preguiçosos, e merecem porrada. Por outro lado, eles cultivam adoração a policiais, milicianos, grileiros, esquadrões da morte, madeireiros, pescadores e caçadores ilegais, latifundiários, garimpeiros, atiradores e pastores picaretas. Para estes, a proteção do estado, para os outros, repressão. Estão sempre ao lado dos opressores e de grupos criminosos, sempre estimulando a violência como arma política.
O “cidadão de bem” também adora xingar os sindicalistas e manifestantes de atos pela democracia de desocupados, preguiçosos, que não trabalham, mas se orgulham de ver o “mito” dezenas de vezes participando de motociatas, jegueatas, de passeios de lanchas e jet-ski em plenos dias de semana, quando deveria estar trabalhando. Ele afirma com toda certeza do mundo que a militância de esquerda vai às manifestações em troca de um sanduíche de mortadela, mas faz vista grossa quando são flagrados pagando R$150,00 a “manifestantes” para irem a passeatas pelo do fim dos direitos trabalhistas e pela volta da ditadura.
Quando nós da esquerda perguntamos quem mandou matar Marielle Franco, eles respondem perguntando quem mandou matar Celso Daniel. Questionam também quem mandou dar a facada em Bolsonaro. Todos os envolvidos no assassinato da vereadora são milicianos amigos da família Bolsonaro, alguns dos quais condecorados por eles. Já os outros dois casos citados foram exaustivamente investigados, o primeiro, pela polícia do governo, e o segundo, pela PF do atual governo, e não há absolutamente nada que possa associar os dois crimes a partidos progressistas.
O “cidadão de bem” desconfia da justiça eleitoral brasileira e acha que ela está a serviço da campanha de Lula, e que haverá fraude na eleição que se aproxima. Eles ignoram que os membros da familícia foram eleitos seguidamente em eleições transparentes, as mesmas que eles agora lançam desconfiança por saberem que estão prestes a ser derrotados, e que o próprio “mito” foi eleito presidente com o respaldo da urna eletrônica que eles dizem ser insegura – a verdade é que temos um modelo de votação e apuração dos mais modernos e eficientes do mundo, motivo de orgulho, de causar inveja até mesmo aos países mais desenvolvidos. Ao cobrar “transparência” na apuração da eleição, o “cidadão de bem” se esquece ou finge esquecer que seu “mito” está impondo 100 anos de sigilo a diversas informações do governo que poderiam levá-lo à cadeia, inclusive as dos exorbitantes e imorais gastos do cartão corporativo. Transparência nos olhos dos outros é refresco. Toda essa cantilena serve apenas para que os “cidadãos de bem”, no estilo Trump, preparem terreno para uma tentativa de aventura golpista após a derrota com data marcada.
O “cidadão de bem” fica indignado porque as centrais sindicais teriam pago R$150 mil reais a Daniela Mercury para tocar no 1º de maio, mas vão para as redes defender que um Bolsonarista cantor de música breganeja receba mais de R$1 milhão da prefeitura de uma cidade de menos de 10 mil habitantes. Ele ataca a lei Rouanet que tem critérios rígidos de seleção e sistema rigoroso de prestação de contas, mas se cala diante das contratações milionárias pagas com dinheiro público, desviado da saúde e educação de pequenos municípios, para seus correligionários, suspeitos de montar esquema de caixa 2 para o esquema eleitoral da familícia. Lembra-se que essa turma vivia dizendo que iria abrir a tal “caixa-preta” do BNDES? Abriram e nada encontraram, mas o fundo que administra a carreira do milionário bolsonarista Gusttavo Lima, teve aporte de R$320 milhões do referido banco, uma nebulosa negociata a favorecer os apaniguados da família miliciana. Que tal reabrir a caixa-preta?
O “cidadão de bem” não acredita em pesquisa eleitoral quando o “mito” está atrás nas pesquisas, nem mesmo nas pesquisas que eles próprios encomendam. É o velho negacionismo de sempre, negação da ciência, como negaram as vacinas contra a COVID. Eles alegam que na eleição passada todas as pesquisas diziam que o mito ia perder, o que é uma grande mentira, pois se apegam a períodos distintos dos resultados divulgados. Ele simplesmente esteve atrás por um momento e depois passou à frente, em outro. Simples assim, mas muito complexo para um “cidadão de bem” entender.
A justiça é alvo permanente dos ataques do grupo, mas quando a mesma justiça impede o Ministério Público de investigar as rachadinhas de Flávio Bolsonaro eles comemoram com gosto, assim como quando a justiça permite que a Eletrobrás seja entregue a preço de banana.
Dilma foi derrubada por um golpe de estado em 2014. Hoje tudo piorou no país, inflação recorde, desemprego em massa, queda da renda do trabalhador, preço dos combustíveis nas estrelas, 100 milhões de brasileiros em insegurança alimentar, etc. E o que diz o “cidadão de bem” sete anos depois do golpe? Que tudo é culpa de Lula e do PT. Isso mesmo, repito, sete anos depois, Temer e o “mito” não têm responsabilidade por nada. É sempre culpa do PT. Se você questiona o “cidadão de bem “ sobre a gasolina a R$8,00 e o gás de cozinha a R$110,00, ele responde: E daí, pelo menos a Petrobrás não está sendo roubada.
Por falar em Dilma, é necessário lembrar da história dessa mulher digna e honrada. Ela foi derrubada por um golpe de estado por não ter se submetido às chantagens dos gangsteres do centrão que queriam tomar o governo de assalto – o mesmo centrão que os “cidadãos de bem” detonavam ao cantar a musiquinha “se ficar pega centrão não fica um meu irmão”. O resto sabemos. O que não conseguiu com Dilma, o centrão conquistou depois: tomou conta literalmente do governo com o orçamento secreto e tudo mais. E agora o cabisbaixo “cidadão de bem” fala que é necessário alianças para poder governar.
O “cidadão de bem” é aquele que vai ao Twitter e detona as vacinas contra a COVID. Logo depois vai ao posto, e escondidinho, com o rabinho entre as pernas, toma a sua e diz pra todo mundo que não tomou. É a mesma pessoa que xinga Dilma de anta até hoje por ela ter falado sobre estocagem de vento – um procedimento possível e eventualmente necessário -, mas não se envergonha quando o mito produz a pérola: “podemos até viver sem oxigênio, mas sem liberdade, não. Quanta genialidade! Sem falar que esses “defensores da liberdade” são os mesmos a defender a volta da ditadura, o AI-5, ou seja, a supressão das liberdades, a censura, as torturas e os assassinatos políticos.
Mudar a cabeça de quem acredita em mamadeira de piroca e que a terra é plana, será tarefa hercúlea que vai demorar algum tempo. Não há receita e nem fórmula mágica para enfrentar esse desafio que temos e que teremos pela frente. E não é o objetivo deste artigo enfrentar essa questão – fica pra outro momento.
Trago aqui para realçar o texto uma frase que circula na internet, que é precisa ao caracterizar a extrema direita brasileira: “O bolsonarismo é uma seita extremista que hospeda o pior do ser humano: o fanático religioso, o militar miliciano, o rico racista e violento e o pobre ignorante
esgoto.” É essa a essência do “cidadão de bem”.
Finalizando, reproduzo um post do geógrafo Pedro Ronchi, que me inspirou a escrever esse cansativo artigo a partir de seus tuítes: “quem apoia Bolsonaro, não o faz em razão da economia, da saúde, da educação ou por um suposto combate à corrupção. Apoia por ser racista, sexista, e preconceituoso.”
Então é isso, essa gente que saiu dos esgotos com a tampa aberta durante as passeatas de junho de 2013, se espelha num “mito” igualmente misógino, homofóbico, racista e ignorante. É seu espelho, seu amplificador. Para eles, números, estudos técnicos, comprovações científicas, informações precisas, argumentos embasados, etc, nada vale. O que vale é somente a palavra daquele que dá vazão a tudo de ruim que o “cidadão” de bem carrega contigo.
Pra encerrar é necessário esclarecer que nem todo eleitor bolsonarista é “cidadão de bem”, mas com certeza todo “cidadão de bem” é bolsonarista.
* GalindoLuma é escritor de crônicas eróticas.
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