Atenção, esta coluna abre com "spoiler" de resenha de filme e livro indevidamente copiada do Google: "‘O Medo do Goleiro diante do Pênalti’, de 1972, é o primeiro longa-metragem do alemão Wim Wenders.
Baseado no romance homônimo de Peter Handke, conta a história do goleiro Joseph Bloch, que, depois de perder um pênalti durante um jogo em Viena, é substituído.
Sem cortes, seguem os desdobramentos: vemos o goleiro se afastar do campo, sair vagando pela cidade, entrar num cinema, não conseguir completar uma chamada telefônica e voltar só para um hotel barato onde está hospedado.
No dia seguinte, novas perambulações, marca um encontro com a moça da bilheteria do cinema e, sem motivo aparente, mata-a durante a noite. Segue sua vida, como se nada fosse, à espera de que a polícia se aproxime".
Somos nós, brasileiros, agora, que estamos na marca do pênalti, neste domingo, 2 de outubro, o dia mais importante de nossas vidas, prontos para escolher em que canto chutaremos a bola que mudará os rumos do país na rota da civilização ou o manterá a caminho da barbárie.
Chutar no meio facilitará a defesa que levará ao segundo turno, sempre sujeito às viradas imprevisíveis, estimuladas por tentativas de melar o campeonato.
À direita temos o caos de quem está disposto a contestar o VAR, a tripudiar sobre as 17 regras ou sobre a Constituição, sem respeito aos tribunais.
À esquerda encontramos a rota de quem já ganhou quatro campeonatos de 2002 para cá e acabou expulso de campo por juiz ladrão, sem ter cometido faltas graves que merecessem o cartão vermelho.
Ganhar no primeiro turno, e liquidar o jogo, faz parte da regra se a diferença atende ao desejo da maioria.
Ir para o segundo não significa nenhuma catástrofe, é até o mais comum, e há quem diga que ganhar os dois turnos torne a vitória ainda mais saborosa, além de conferir autoridade indiscutível ao vencedor.
Seria verdade caso a disputa envolvesse dois times limpos, o que não ocorre neste momento no Brasil.
São tantos os golpes baixos da equipe armada que o melhor será derrotá-la imediatamente, sem dar chances ao azar.
Não existe motivo razoável para sentir o medo do goleiro na hora do pênalti, porque os que buscam o pentacampeonato já demonstraram à exaustão saber vencer para fazer o Brasil decolar novamente, como no começo deste século 21, ao distribuir o pão e crescer, despertar o gigante adormecido —hoje apodrecido e amedrontado, vítima da necropolítica que vitimou quase 700 mil vidas, a mata, os rios, e o devolveu ao mapa da fome, além de ameaçar o Estado Democrático de Direito.
Como será estimulante poder voltar a criticar um governo democrático por erros, não por crimes.
No próximo dia 18 de dezembro, um domingo, em Lusail, no Qatar, será decidida a 22ª Copa do Mundo de futebol.
Será difícil, mas não improvável, a presença brasileira na final, embora seja incomparável a importância dos domingos de outubro e dezembro.
Principalmente para quem votou pela primeira vez para presidente só em 1989, quase aos 40 anos — e precisou lutar muito, até expor a vida, para exercer o direito de escolher seu destino.
A hora tão aguardada de virar o jogo, de dar a volta por cima, chegou na primavera brasileira.
Sem o medo do goleiro na hora do pênalti, sem medo dos fascistoides, sem medo de ser feliz.
* Publicado originalmente no jornal Folha de S.Paulo.
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