Charge: Emanuele Del Rosso |
Desde que foi comprado por Elon Musk, o Twitter passa por uma enorme crise. Mesmo que se recupere da crise, há dúvidas sobre se a plataforma conseguirá manter sua lógica de funcionamento ou mesmo seu ecossistema de usuários.
Mesmo sendo vendida por cerca de 44 bilhões de dólares, a percepção global é de que a relevância econômica do Twitter é inexistente. A compra da rede por Elon Musk nunca fez sentido, não passando de uma tentativa de golpe do bilionário sul-africano que deu errado, inclusive para ele mesmo.
O Twitter não dá lucro relevante e, nos resultados atuais, Elon Musk demoraria cerca de 120 à 250 anos para recuperar o dinheiro que foi investido.
Seu plano era apenas dar mais um golpe no mercado financeiro, algo que se tornou comum para ele nos últimos anos. Ele iniciou a tentativa de golpe comprando 9% das ações do Twitter e, pouco depois, anunciou a compra da plataforma, fazendo com que as ações inflacionassem. Seu plano era cancelar a compra e vender suas ações ainda com preço inflacionado, lucrando em cima disso.
É um tipo de golpe que o sulafricano já aplicou algumas vezes. Com suas empresas mais famosas (Tesla e SpaceX), com outras empresas (como a GameStop que rendeu até um documentário na Netflix) e com diversas criptomoedas, como fez com o Bitcoin e com a Dogecoin.
Porém dessa vez seus planos deram errado graças à uma intensa batalha jurídica de acionistas que viram a oportunidade de se livrarem da rede social e de lucrarem em cima disso, em conjunto com reguladores do mercado financeiro irritados com os constantes golpes do bilionário. Elon foi obrigado judicialmente a comprar a rede social, assumindo-a sem nenhum plano concreto e sem potencial real de lucro no novo negócio.
Sua primeira medida tem sido enxugar os gastos do Twitter por meio da demissão de trabalhadores e do encerramento de departamentos essenciais, como o de moderação, além de diversos planos econômicos sem base estratégica, como o Twitter Blue, que já gerou outras crises no mercado financeiro, como o caso da farmeceutica Eli Lilly, que viu suas ações serem derrubadas após uma confusão no Twitter que apenas foi possível por causa da falta de planejamento do novo dono da plataforma.
Sua falta de planejamento e, principalmente, o fechamento do departamento de moderação da plataforma fez com que anunciantes paralisassem ações no Twitter e reduzissem ainda mais sua captação de recursos, como foi o caso da HBO. Um grupo formado pelas maiores agências de publicidade dos Estados Unidos lançou um alerta para seus clientes de que anunciar no Twitter se tornou um investimento de alto risco.
Ontem ainda ocorreu um novo erro estratégico do bilionário sul-africano, que deu um ultimato para que os funcionários descontentes deixassem a empresa. Até o momento, as informações são de que cerca de 80% dos funcionários do Twitter se demitiram e Musk ordenou o fechamento de todos os escritórios da empresa por temer retaliações desses funcionários.
Desde ontem, os alertas de problemas com a rede social aumentaram cerca de 7.000% com usuários relatando problemas no funcionamento de ferramentas básicas, queda total na rede ou problemas em acessar suas contas. Um dos principais problemas em acessar a conta vem sendo a de pessoas que utilizam autenticação por SMS, já que tal serviço foi descontinuado por Musk desde a terça-feira.
A rede passa por uma crise sem precedentes e o próprio CEO já fez conversas internas anunciando a possibilidade de que a empresa acabe falindo dentro dos próximos meses.
Alguns falam sobre outra pessoa comprar a rede social de Musk, mas, devido as questões econômicas comentadas, isso só deve ocorrer se Elon aceitar perder uma quantidade grande de dinheiro no processo, pois o preço que ele pagou na rede é muito acima do que ela vale.
Mas o que é o Twitter e quais os problemas com seu fim?
O Twitter atualmente é uma rede irrelevante no ponto de vista econômico e de volume de pessoas que o utilizam. Quando analisamos outras redes sociais sob essa ótica, diversas estão acima do Twitter que, no momento, não está nem mesmo presente no top 10 de maiores redes sociais do planeta.
Whatsapp, Facebook, Youtube, Instagram, Telegram, Tiktok, Weibo, Snapchat, Kuaishou, Pinterest e Reddit são redes que, por exemplo, apresentam volume de usuários maior do que a plataforma do pássaro azul.
Porém, mesmo sem essa relevância, o Twitter se tornou o centro de batalhas políticas, de marketing e de costumes do ocidente durante os últimos 6 anos, a partir de duas características centrais: O Ecossistema de usuários que o utilizam e a facilidade de análises externas que a plataforma oferece.
O primeiro ponto diz respeito ao perfil e vínculos entre usuários que foi criado pelo Twitter nos últimos dez anos. A rede se tornou primariamente um ponto de partida para tendências e uma rede de jornalismo de notícias urgentes. Estudando as tendências que de tempos em tempos orbitam a internet, ou mesmo as pautas e conteúdos que viralizam na rede, facilmente encontramos, ao estudar sua trajetória de proliferação, um ponto de partida no Twitter.
Se tornou até mesmo uma piada comum a história de que quando algo viraliza no Facebook, no Twitter tal conteúdo já é considerado velho. Essa história tem seus pontos de amparo na realidade, tendo o Twitter se tornado um grande epicentro de influenciadores de diversos outros espaços, inclusive pautando e influenciando a mídia tradicional por diversas vezes.
Já o segundo ponto diz respeito à lógica de funcionamento do Twitter. Ele é uma das poucas redes sociais que é largamente aberta. Em uma simples busca você pode encontrar o pensamento e o histórico de publicação de qualquer pessoa que utiliza a plataforma, checar opiniões diversas sobre basicamente qualquer assunto que possa ser imaginado, além de poder observar os temas mais discutidos em um território a partir de seus “trending topics”.
Essas duas características fizeram com que, nos últimos anos, o Twitter se tornasse uma ferramenta bastante importante para analistas, cientistas de dados, comunicadores e outras pessoas interessadas em medir os impactos sociais de diversos temas, tendo exemplos como os estudos sobre a proliferação de Covid-19, do crescimento da Extrema direita ou do embate social sobre temas como o feminismo, questões ambientais, luta antiracista e diversas pautas e lutas.
A importância do Twitter para a Ciência de dados
Na ciência de dados, o Twitter se tornou, com o tempo algo primordial. Mesmo não estando entre as 10 maiores redes sociais do mundo, a plataforma domina a requisição para uso de sua API de análise e pedidos de acesso aos seus dados. Pesquisadores ao redor do mundo inteiro utilizam essa rede social como fonte para diversas pesquisas sobre opiniões, comportamentos e gostos.
Isso ocorre por conta da lógica de funcionamento aberta do Twitter, que permite que sejam coletadas informações que se configuram como amostras genéricas que se diferenciam das amostras aleatórias coletadas em outras redes por não prender pessoas a bolhas específicas.
Um exemplo é que se você analisar vários grupos de whatsapp a tendência é que você seja colocado em uma amostra aleatória e específica (uma bolha) o que exigirá diversas técnicas complexas de estatística para que uma análise leve esse fato em consideração e consiga se aproximar da realidade.
Já amostras genéricas, como a do Twitter, exigem uma complexidade menor de técnicas estatísticas para se alcançar resultados que se aproximem do real.
Não existe outro espaço na internet, a não ser o Twitter que contemple esse modelo de amostragem, já que a configuração de outras redes sociais (algumas inclusive sem sistemas de buscas aceitáveis) impossibilita que, mesmo um pesquisador autorizado, consiga escapar completamente de bolhas comportamentais.
Efeitos do Fim
Mesmo com uma relevância econômica mínima, o fim da rede social pode apresentar uma mudança de aspectos sociais imprevisível nos países ocidentais como um todo.
A dependência da internet ocidental pelo Twitter é muito maior do que seu valor de mercado ou seu lucro anual e as mudanças sociais causadas pelo fechamento dessa rede social irão impactar todo o fluxo de informação, pautas, tendências e modismos da internet.
Além disso, o seu fim significaria um golpe imenso nas tentativas públicas e populares de compreenderem o mundo a partir das análises de dados possibilitadas pela plataforma. Nesse ponto, é previsível um mundo informacional cada vez mais fechado em empresas como Facebook e Google que controlam e fecham para si (ou para quem pode pagar ou requisitar judicialmente) as informações sociais que passam por suas plataformas.
Ainda é impossível calcular os efeitos sociais de um fechamento dessa rede social, porém é possível afirmar que eles serão sentidos com bastante força caso realmente isso ocorra.
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