Presidente Lula durante o Fórum das Grandes Economias sobre Energia e Clima (20/4/23) |
1- Bastou o presidente Lula questionar o uso exclusivo do dólar em transações comerciais e pedir para os EUA se empenharem pela paz para que o mundo viesse abaixo.
2– Lula e o Brasil estão afrontando os EUA, disseram. Logo os EUA, que apoiaram a transição democrática brasileira.
3– Bom, em primeiro lugar, não foram apenas os EUA quer apoiaram as eleições brasileiras. Quase todos os países do mundo assim o fizeram.
Em segundo lugar, apoiar eleições limpas é o normal para um país democrático. Devemos ser assim tão gratos aos EUA por que fizeram o que era correto? Afinal, apoiar um golpe de Estado é apoiar um crime.
Claro está que, nesse apoio, pesou também o fato de que Bolsonaro é um aliado de Trump, grande adversário de Biden e dos democratas.
4– Em terceiro, Lula e o Brasil, mesmo assim, agradeceram imensamente esse apoio. Lula visitou os EUA antes de viajar para a China e receber Lavrov.
Em linguagem diplomática, essa é uma sinalização muito importante. Foi buscar cooperação e colocar as relações bilaterais com os EUA em um novo patamar. Teve um diálogo muito franco com Biden.
Objetivamente, não conseguiu muita coisa, mas tentou. O que conta mais em diplomacia são os gestos e as medidas concretas.
Mas é importante frisar que o Brasil e a América Latina não são grandes prioridades para a atual política externa dos EUA, centrada, infelizmente, em um confronto com China, Rússia etc.
5– Em quarto, e mais importante, o muito bem-vindo apoio dos EUA à democracia brasileira não implica que o Brasil tenha de ter uma política externa alinhada com Washington.
6– O Brasil não tem de se alinhar nem com os EUA, nem com China, nem com Rússia, nem com ninguém. O Brasil tem de se alinhar consigo mesmo.
7- A política externa que convêm aos interesses do Brasil é uma política de não-alinhamento. Uma política pragmática e universalista que procure estabelecer fortes laços de cooperação com todas as nações do globo, sem preconceitos político-ideológicos.
Ao mesmo tempo, uma política que coloque ênfase na geração de uma ordem mundial, simétrica, pacífica, multilateralista e multipolar.
8- Não convém ao Brasil inserir sua política externa na lógica da nova Guerra Fria, como parecem desejar alguns.
Essa é uma lógica que conduz ao confronto e à guerra, e que limita muito, a priori, o espaço geopolítico e geoeconômico do país.
9– Independentemente de eventuais arroubos retóricos, o Brasil, na prática, não afronta ninguém. O Brasil negocia, de forma transparente, com todos.
10– As relações bilaterais do Brasil com os EUA já estão colocadas num patamar de grande relevo. É uma política de Estado. Foi assim nos primeiros governos de Lula, foi assim com Dilma Rousseff (até o escândalo da espionagem) e será assim no terceiro governo de Lula.
O Brasil quer ser um bom parceiro dos EUA, mas quer também ser parceiro de muitos outros países.
Os EUA não precisam ter ciúmes ou receios, o Brasil é um país muito generoso e cordato.
* Marcelo Zero é sociólogo e especialista em Relações Internacionais.
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