Charge: Nando Motta/247 |
A candidatura de Pablo Marçal a prefeito de São Paulo está em queda, em um ritmo lento e gradual, mas o suficiente para projetar sua derrota em 6 de outubro.
Sua última tacada talvez tenha sido a vitimização depois da cadeirada que recebeu do candidato Datena.
Deu errado. Como era de se esperar, o eleitor em potencial de Marçal quer ver seu candidato agredindo, e não sendo agredido.
Mas a tentativa do candidato disruptivo (expressão edulcorada usada pela imprensa comercial para definir o comportamento de Marçal) de governar a maior cidade do país deixa lições importantes.
A principal delas é que o céu é o limite para a quantidade de esgoto e lama que a extrema-direita é capaz de derramar sobre a política do país.
Como imaginar que o fascismo nativo seria capaz de cavar um poço ainda mais fundo, depois de vermos Bolsonaro defendendo a tortura, a eliminação física de adversários e a ditadura militar?
Seria possível conceber algo mais nefasto do que um presidente imitando a falta de ar das vítimas de covid e se negando a comprar vacinas que poderiam salvar centenas de milhares de vidas?
Depois que Bolsonaro manifestou inúmeras vezes seu desprezo pelas mulheres e pelos negros, indígenas e pessoal LGBTQIA, tentou rasgar a Constituição e dar um golpe de estado, além de ser acusado de falsificar cartões de vacinação e roubar joias, na cabeça de quem podia passar que os extremistas de direita tinham uma carta na manga ainda mais tenebrosa?
Eis que entra em cena Marçal, com uma ficha criminal alentada, que inclui condenação por estelionato contra idosos, e uma visceral falta de educação.
Chega a ser chocante e constrangedor sua incivilidade para debater propostas e ideias.
Por isso, sua tática se limita a ataques dignos de brigas de rua entre arruaceiros e vagabundos, com provocações, xingamentos e acusações sem provas contra adversários, ao mesmo tempo em que é incapaz de apresentar um miserável projeto exequível que seja para o cargo que pleiteia.
Diferenças à parte, o bolsonarismo raiz e a versão delinquência escrachada simbolizada por Marçal são, claro, vinhos da mesma pipa e ameaçam igualmente o regime democrático. Ambas as correntes são negacionistas até a medula, odeiam a ciência e as artes e fazem da mentira mais sórdida seu instrumento fundamental de ação política.
A leniência dos veículos de comunicação em relação ao extremismo de direita, tratando-o como se fosse uma oposição republicana e democrática, chegando a dar inclusive visibilidade para sua pauta das trevas, só contribui para fortalecê-lo.
Mas este enfrentamento está longe de ser coisa simples. Aqui e em boa parte do mundo, o fascismo contemporâneo modulou um discurso que fala diretamente à parte mais sombria da alma de muitos seres humanos, explorando e manipulando da pior maneira suas frustrações, angústias e analfabetismo político.
Nenhum projeto partidário e muito menos aspirações pessoais de qualquer natureza podem se sobrepor à urgência civilizatória de se esmagar politicamente a extrema-direita. Sim, esmagar, porque derrotar é pouco, como prova o resultado da eleição de 2022.
É uma meta de longo prazo, que exige articulação internacional, disposição e determinação política por parte dos lutadores políticos e sociais do campo progressista, além de disputa cultural permanente por corações e mentes
Não custa lembrar que no período da redemocratização do país prevaleciam na sociedade brasileira os valores dos que lutaram contra a ditadura e pela restauração da democracia.
Recuperar essa hegemonia é o desafio do século.
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