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| Charge: Gilmar |
Aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro têm usado as redes sociais e toda a influência da mídia para pressionar por anistia ou prisão domiciliar. O mantra da absolvição é a injustiça da prisão de um “homem doente e idoso”.
Um doente, no entanto, que é pura potência quando ataca adversários, a democracia e diz ter saúde de atleta para disputar mais uma eleição. Mas logo vira um doente crônico quando precisa responder à justiça e cumprir pena de 27 anos.
Bolsonaro, 70 anos, enquadra-se como idoso, de fato, mas não há nada na lei que impeça a condenação de pessoa com qualquer idade. É verdade que a lei permite, em certas condições, a prisão domiciliar para pessoas com 80 anos ou mais.
Mas o que salta aos olhos é a dupla face da justiça no Brasil, um país acentuadamente marcado por divisão de classes. E pelo tratamento diferenciado da mídia, da justiça, das forças militares e da sociedade quando a pessoa é de direita ou esquerda, como agora é possível evidenciar no caso Bolsonaro. Não houve, na prisão de Lula, em abril de 2018, então com 72 anos, nenhum movimento apelativo na sociedade por conta da sua idade. Ele lá permaneceu por 580 dias, injustamente, como reconheceram, posteriormente, os órgãos de justiça.
A hipocrisia torna-se ainda mais evidente nos apelos emocionais à idade, quando parlamentares e boa parte dos brasileiros parecem alheios ao fato de que há 2.806 presos no país com mais de 70 anos (até dezembro de 2024). Para esses, o silêncio de classe.
Aliados e seguidores de Bolsonaro dizem que ele pode morrer na prisão. Ora, se a lei é igual para todos, é fato que quem está preso corre o risco de morrer na prisão. Em 2023 houve 3.091 mortes no sistema penitenciário brasileiro. Em 10 anos estima-se que 17 mil morreram em presídios, a maioria por causas evitáveis como doenças ou negligências. O que não será o caso de Bolsonaro, que terá assistência médica permanente.
A prisão, no Brasil, parece, às classes média e alta algo incompatível com “pessoas de bem”, não importando os eventuais crimes que a pessoa tenha cometido: corrupção, assassinato, feminicídio, atropelamento, omissão que levou milhares à morte na pandemia, tentativa de golpe de estado... há sempre um jeitinho brasileiro para uma nova sentença: dois presos, duas medidas!
É a mesma população e seus principais representantes no Parlamento e Judiciário, sobretudo, que fecham os olhos para o fato de 70% dos presos no Brasil terem a cor negra. Uma realidade que evidencia o racismo estrutural no sistema prisional brasileiro. E há uma aceleração do encarceramento, conforme dados de relatório do Anuário de Segurança Pública. O crescimento entre 2005 e 2022 foi de 381,3% entre os negros e 215% entre os brancos.
A desigualdade social também se reflete, portanto, na desigualdade judicial, conforme a renda, cor, ideologia, gênero e profissão – entre outras. Isto sem falar na dificuldade de acesso à justiça, para as pessoas de extrema vulnerabilidade. O Brasil que se apieda de Bolsonaro, não é o mesmo que olha para grupos minoritários e/ou vulneráveis. Há uma justiça para o andar de cima e o de baixo, para as mulheres e os homens, para os brancos e os negros, para os ateus e religiosos, para a esquerda e a direita.
Uma verdade que se desnuda, em plena luz do dia, sem chocar as “pessoas de bem”.
* Publicado originalmente no jornal virtual Grifo.

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