Reproduzo artigo de Raquel Junia:
Todos os dias nos jornais, rádios e canais de TV é possível coletar exemplos de desrespeito aos direitos humanos. A primeira versão do 3º Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH 3) , lançada em dezembro de 2009 pelo governo federal, tentou criar ou fortalecer mecanismos já existentes para coibir este tipo de postura. Foi o caso da proposta de criação de um ranking nacional de veículos de comunicação comprometidos com os princípios dos direitos humanos. Da mesma forma, os veículos que cometem violações também estariam elencados. A proposta não era inovadora, já que atualmente a “Campanha pela ética na TV” promove o ranking dos veículos que atentam contra a dignidade humana. Mas o PNDH 3 a reforçava e sugeria a criação pelos estados e municípios de um observatório social destinado a acompanhar a cobertura da mídia em direitos humanos. Entretanto, o decreto 7.177 , de 12 de maio de 2010, retirou do plano a proposta do ranking, além de outras modificações.
O editor da Revista Caros Amigos e professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Hamilton Octávio de Souza, lembra que situações de desrespeito aos direitos humanos, como o direito à moradia digna, por exemplo, ocorrem cotidianamente na mídia comercial. "As pessoas têm o direito de se organizar e lutar por um lugar para morar. Mas todas as vezes que ocupam um prédio abandonado ou vazio, a mídia trata isso como invasão da propriedade privada, mesmo que o prédio não esteja cumprindo função social, e pede imediatamente a emissão de posse destes locais. O que está colocado na declaração universal dos direitos humanos é que se garanta a moradia, mas a mídia não pede ao poder público que garanta isso, e sim que defenda a propriedade privada. Este comportamento é fomentador da violência que se pratica contra aqueles que não têm moradia", pontua.
Convidado para a aula inaugural do ano letivo da EPSJV/Fiocruz em 2010, o ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, comentou a oposição da mídia comercial ao PNDH 3 e afirmou que de fato há programas que fazem campanha contra os direitos humanos. Na terceira reportagem da série sobre as modificações no 3º Plano Nacional de Direitos Humanos, conheça o que pretendia a versão original do programa no campo da comunicação, as reflexões sobre as modificações feitas pelo decreto presidencial e a concentração midiática no Brasil.
A diretriz 22
A diretriz 22 do PNDH 3 - "Garantia do direito à comunicação democrática e ao acesso à informação para a consolidação de uma cultura em Direitos Humanos" - reúne dez ações programáticas. Na proposta original, a primeira ação programática fala sobre a criação de um marco legal para regulamentar o artigo 221 da Constituição, de maneira a estabelecer o respeito aos direitos humanos nos serviços de radiodifusão concedidos, permitidos ou autorizados. A ação sugere ainda sanções de acordo com a gravidade das violações praticadas, variando de multa até a cassação da concessão. Esta ação também foi modificada pelo decreto presidencial 7.177. A parte final do texto, que falava sobre as punições no caso de desrespeito, foi suprimida.
Na opinião do Coletivo Brasil de Comunicação Social (Intervozes), o PNDH 3 deveria ser implementado integralmente, assim como pensam também várias entidades e movimentos reunidos na Campanha pela integralidade do PNDH 3. Oona Castro, membro do Intervozes, avalia que a mídia teve papel importante na pressão para que o governo federal recuasse e fizesse as modificações no programa. "A mídia não só defendeu seus próprios interesses, recusando e desqualificando tudo que pudesse ser de regulamentação de sua atividade, como também ecoou a voz dos setores conservadores, mesmo em questões que não eram diretamente relacionadas a ela, como a questão da terra e do aborto, por exemplo", analisa.
Para a jornalista, os cortes feitos no texto original comprometem em parte uma regulamentação da mídia, como foi proposto também pela Conferência Nacional de Comunicação, realizada em dezembro de 2009. "Ao vetar o ranking, o que eles fazem é não dar legitimidade para o que já é feito. E isso não pode ser entendido como censura porque o ranking é a posteriori, é uma participação social no processo de avaliação do conteúdo veiculado na mídia. Chamar isso de censura ou atentado à liberdade de expressão é um disparate. Toda vez que levantam essa lebre de ameaça a liberdade de expressão, eles estão defendendo que eles tenham liberdade para fazer qualquer coisa e que ninguém possa fazer nenhuma avaliação participativa e crítica daquilo que é feito", critica.
A Campanha pela ética na TV - Quem financia a baixaria é contra a cidadania publicou este ano o 17° ranking da baixaria na TV . De agosto de 2009 a abril de 2010 foram feitas 391 denúncias. O programa campeão foi o Big Brother, da TV Globo, com 227 denúncias. Em seguida estão os programas Pegadinhas Picantes, do SBT, Pânico na TV, da Rede TV, Se liga bocão, da TV Itapoá-Record e Bronca Pesada, da TV Jornal-SBT. Na lista de denúncias com relação a estes programas estão o desrespeito à dignidade humana, exposição de pessoas ao ridículo, incitação à violência, apelo sexual, sensacionalismo, entre outros. A realização da Campanha e do ranking é uma iniciativa da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados em parceria com entidades da sociedade civil. O movimento foi um dos resultados da VII Conferência Nacional de Direitos Humanos, realizada em 2002.
Para o jornalista e professor do departamento de Estudos Culturais e Mídia da Universidade Federal Fluminense (UFF), Dênis de Moraes, a diretriz 22 do PNDH 3, como foi redigida originalmente, contribuiria para a democratização dos meios de comunicação. Dênis afirma, entretanto, que o retrocesso na questão da mídia dentro do plano não o surpreendeu.
O professor elogia a postura do ministro Vannuchi, que considera coerente. Para Dênis, o ministro perdeu "a queda de braço" dentro do governo. O jornalista lembra ainda que nenhuma das resoluções da Conferência Nacional de Comunicação foram implementadas até o momento. "O retrocesso no Plano integra uma cadeia de inércia e de temores em relação à grande mídia por parte do governo federal. Durante as duas gestões, o governo não quis medir forças com os meios de comunicação, que nestes oito anos tiveram poucos dos seus interesses afetados", afirma. Para ele, o PNDH 3, nos pontos que se referem aos veículos de comunicação resultou numa "carta de intenções extremamente moderada e inofensiva".
Hamilton de Souza observa que foi impressionante a reação dos setores da mídia empresarial ao plano. "Foi uma reação totalmente arbitrária, conservadora e reacionária. Numa sociedade verdadeiramente democrática isso tem que estar não só num programa que serve de referência, mas contemplado na lei e, mais do que isso, tem que ser algo exigido por toda a sociedade e fiscalizado pelo Estado. Ora, nós temos programas de rádio e TV que incentivam o linchamento das pessoas, estimulam a violência, discriminam setores da sociedade, transformam os movimentos sociais e as populações pobres das favelas em criminosos e inimigos do povo brasileiro", denuncia.
Histórico de recuos
Dênis de Moraes lembra outras propostas do governo federal durante os dois mandatos do presidente Lula que foram abandonadas devido ao receio em relação a tensões com a mídia comercial. São exemplos disso, a proposta de criação da Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual (Ancinav) e de um Conselho Federal de Jornalismo. "A alegação é de que estes dois projetos eram inconsistentes e que havia problemas. Mas se havia problema por que não discutir, modificar e aprimorar?", questiona.
Para o professor, a existência de um conselho para regular a atividade jornalística é necessária, uma vez que a profissão não pode estar isenta de fiscalização, já que é uma atividade que tem uma interferência muito profunda na esfera pública. Na visão de Dênis, a única "queda de braço que o governo travou" durante os dois mandatos foi a criação da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), que no entanto tem apresentado problemas de gestão e, de acordo com ele, ainda mantém uma programação tímida, no caso da TV Brasil.
O jornalista ressalta que, assim como na proposta de criação da Ancinav, o PNDH 3 também visa garantir maior diversidade nos meios de comunicação, como já está garantido pela Constituição brasileira. "As questões da diversidade e dos direitos humanos estão previstos na Constituição de 1988. O governo não fez nenhuma mudança nisso, não houve nenhuma inovação, nenhum abuso. Parece que houve excessos e abusos, mas foram os meios de comunicação que se encarregaram de mostrar as duas questões de maneira maniqueísta", diz.
Hamilton de Souza também recorda que os meios de comunicação comerciais combateram a proposta de uma distribuição mais equitativa das verbas públicas de publicidade. "Mais de 60% destas verbas são destinadas para a Rede Globo e não existe uma distribuição equitativa em relação às TV's comunitárias, educativas e universitárias", comenta.
Formas de controle público
Oona Castro lembra que hoje são poucos os mecanismos que a população tem para realizar o controle público do que é veiculado nos meios de comunicação. "Os processos de conferência, se continuados, precisam ampliar a participação e os conselhos municipais, estaduais e nacional devem ser implementados. Os canais de participação realmente não existem, apenas pequenas e poucas iniciativas isoladas", afirma.
Em 2005, um episódio mostrou que a sociedade civil organizada pode conseguir resultados importantes na luta pelo respeito aos direitos humanos nos meios de comunicação. Por pressão de movimentos sociais, o Ministério Público Federal tirou do ar por dois meses o programa Tarde Quente, da Rede TV, apresentado por João Kleber, por entender que atentava contra os direitos humanos. No mesmo horário foram exibidos programas de direitos de resposta das minorias ofendidas durante o Tarde Quente. Como recorda Hamilton de Souza, a programação substitutiva tinha um conteúdo muito melhor e comprometido com os direitos humanos."O Ministério Público tem condições em todo o Brasil de fiscalizar, exigir que as televisões caminhem na direção do respeito aos direitos humanos e possam contribuir para elevar o nível de
compreensão da própria realidade da sociedade brasileira", opina Hamilton.
O jornalista conta outro episódio que revela a postura da mídia commercial quando o assunto é controle público. Em 2007, o Ministério Público de São Paulo tentou realizar um encontro entre lideranças de movimentos e entidades de defesa dos direitos das mulheres e dirigentes de empresas de comunicação para discutir o papel da mulher na televisão brasileira. "Esse encontro era para trocar ideias, para promover esclarecimento do que pensam e que críticas os movimentos de mulheres têm com relação à programação da televisão. Os representantes das várias emissoras se negaram a participar do encontro, dizendo que a TV deles não aceita nenhum tipo de intromissão e interferência do que colocam no ar. Isso mostra que eles consideram as
concessões não como serviço público que tem que dar satisfação para a sociedade, mas como se fosse uma propriedade privada", lamenta.
Brasil atrasado
"O Brasil está na vanguarda do atraso em termos de comunicação, apresenta um dos piores resultados em termos de medidas que possam modificar o cenário de forte concentração dos meios de comunicação", alerta Dênis de Moraes. O jornalista lançou em 2009 o livro A Batalha da Mídia, sobre iniciativas de comunicação dos governos considerados progressistas na América Latina. Para ele, o Brasil está atrasado em relação a políticas públicas de comunicação tanto de regulação do setor, quanto de criação de mecanismos de democratização, como o apoio e criação de mídias públicas e comunitárias e produção audiovisual.
Dênis assegura que a Venezuela, a Bolívia e o Equador, consideradas por ele como o "eixo da esperança", estão dando um exemplo mundial de como o poder público eleito pelo povo pode interferir nos meios de comunicação. "Apesar de enfrentarem uma das mais sórdidas campanhas midiáticas e das elites conservadoras, estes países têm mantido o compromisso essencial com a busca de sistemas de comunicação menos concentrados e em defesa da diversidade informativa e cultural", analisa.
Para Hamilton de Souza, a reação da mídia ao 3º Plano Nacional de Direitos Humanos também é uma lição para as pessoas que querem democratizar a comunicação no Brasil. "Mostra que nós temos uma luta muito grande neste país até que consigamos ter um sistema de comunicação que realmente seja respeitador dos direitos humanos, democrático, que contemple a liberdade de expressão para todos os setores da sociedade e não apenas os empresariais", destaca.
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domingo, 20 de junho de 2010
Boas e más notícias
Reproduzo da letra da música de Xico Esvael, um talentoso cantor e compositor popular:
Se o jornal publicou
Se a rádio comentou
Quem perdeu?
Quem ganhou?
Se a TV noticiou
Se a revista ilustrou
Quem perdeu?
Quem ganhou?
Se o livro argumentou
Se a internet espalhou
Quem perdeu?
Quem ganhou?
Se você acreditou
Ignorou quem editou
Quem perdeu?
Quem ganhou?
Descortine o que está escondido
Por detrás deste palco fingido
Mensure o que foi urdido
Tudo deve ser bem aferido.
Quem perdeu?
Quem ganhou?
Celebrizou, enricou, se danou.
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Se o jornal publicou
Se a rádio comentou
Quem perdeu?
Quem ganhou?
Se a TV noticiou
Se a revista ilustrou
Quem perdeu?
Quem ganhou?
Se o livro argumentou
Se a internet espalhou
Quem perdeu?
Quem ganhou?
Se você acreditou
Ignorou quem editou
Quem perdeu?
Quem ganhou?
Descortine o que está escondido
Por detrás deste palco fingido
Mensure o que foi urdido
Tudo deve ser bem aferido.
Quem perdeu?
Quem ganhou?
Celebrizou, enricou, se danou.
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Elio Gaspari e a farsa contra Dilma
Reproduzo artigo de Dulce Maia, publicado no Observatório da Imprensa:
Houve um tempo em que mentira tinha pernas curtas. Agora, a internet faz exercícios diários de alongamento da mendacidade. Nos últimos meses, uma torrencial campanha caluniosa circula pela rede mundial de computadores tomando por base artigo do jornalista Elio Gaspari, publicado originalmente nos jornais Folha de S.Paulo e O Globo em suas edições de 12 de março de 2008.
Quem tiver curiosidade de buscar na internet o número de vezes em que aparecem variantes da infame sentença "Agora a surpresa: adivinhem quem é Dulce Maia? Sim, ela mesma: Dilminha paz e amor! Esse é só mais um codinome da terrorista Estela/Dilma" – colada ao final do artigo de Gaspari – verá que estão hospedadas em mais de 500 páginas da rede (marca muito próxima à moda nazista de cunhar a verdade repetindo-se mil vezes uma mentira para torná-la veraz).
Ao contrário do que afirmam, Dulce Maia existe e resiste. Quem é Dulce Maia? Sou eu. Antes de mais nada, quero deixar claro que não me arrependo de nenhuma das opções políticas que fiz na vida, inclusive de ter participado da luta armada e da resistência à ditadura militar implantada em 1964. Eu me orgulho de ter sido companheira de luta de brasileiros dignos como Carlos Lamarca, Onofre Pinto, Diógenes de Oliveira e Aloysio Nunes Ferreira.
Sinal de descaso
Não pretendo polemizar com meus detratores, que ousaram decretar minha morte civil. Estes irão responder em juízo por seus atos. Não admito que queiram impor novos sofrimentos a quem já foi presa, torturada e banida do Brasil durante a ditadura. Lutarei com todas as minhas forças para garantir respeito à minha honra e à minha dignidade.
Gostaria apenas de fazer algumas reflexões sobre essa insidiosa campanha, alicerçada nos erros cometidos pelo jornalista Elio Gaspari ao tratar da ação contra o consulado norte-americano de São Paulo, em 1968. O articulista teve 40 anos para apurar a história. Falsamente me colocou como participante do episódio, sem nunca ter me procurado para checar a veracidade das informações de que dispunha. Tomou pelo valor de face peças do inquérito policial relativo ao atentado, como declaração extraída sob tortura do arquiteto e artista plástico Sérgio Ferro.
Se o articulista tivesse compulsado os arquivos do próprio jornal Folha de S.Paulo, facilmente encontraria entrevista de Sérgio Ferro (de quem também me orgulho de ser amiga há quase meio século). Conforme se lê no texto do repórter Mario Cesar Carvalho, publicado a 18 de maio de 1992, "Ferro assumiu pela primeira vez, em entrevista à Folha que ele, o arquiteto Rodrigo Lefrèvre (1938-1984) e uma terceira pessoa que ele prefere não identificar colocaram a bomba que explodiu à 1h15 do dia 19 de março de 1968 no consulado de São Paulo. Um estudante ficou ferido".
A matéria de 1992 trazia ilustração com um imenso dedo indicador em riste (o famoso "dedo-duro" apontado sobre a cabeça de um homem e acompanhado do texto "terror e cultura").
Gaspari tinha o dever ético de me procurar para verificar se seria eu essa terceira pessoa. Além de não fazê-lo, publicou que o atentado fora cometido por cinco pessoas (entre as quais fui falsamente incluída). O mesmo cuidado deveriam ter tido os responsáveis pela matéria da Folha de S.Paulo de 14 de março de 2008, que repercutiu o artigo de Gaspari reafirmando as falsas acusações.
A esses erros elementares de apuração, deve se somar a relutância da Folha de S.Paulo em restabelecer a verdade. Em nenhum momento, o ombudsman do jornal veio a público para tratar do assunto. O pedido de desculpas de Gaspari foi mera formalidade, sem delicadeza alguma. Sinal mais evidente do descaso do jornal foi a demora na publicação de carta de Sérgio Ferro, onde refutava categoricamente que eu tivesse participado daquela ação armada. A carta só foi publicada dois dias depois de ser divulgada no blog do jornalista Luis Nassif.
Luz do sol
Processado, o jornal foi condenado em primeira instância à reparação por danos morais. Imaginava que a ação judicial fosse um freio eficaz às aleivosias, particularmente depois da exemplar observação do juiz de Direito Fausto José Martins Seabra de que o jornal "não só extrapolou o direito de crítica, como olvidou o compromisso legal e ético com a verdade".
No entanto, o artigo de Gaspari voltou a circular com o espantoso adendo de que Dulce Maia não existe e que este seria apenas um codinome de Dilma Rousseff. A utilização do artigo em plena campanha eleitoral mostra que setores da sociedade não têm qualquer apreço pela verdade como arma política. São pessoas que, muito provavelmente, apoiaram o golpe militar de 1964 e não apreciam o debate franco e aberto de ideias.
Chama atenção, também, o silêncio de Elio Gaspari sobre o uso indevido de seu texto. Nunca li qualquer manifestação do articulista refutando o uso de seu nome em páginas que emporcalham a internet com mentiras sobre minha pessoa.
O desrespeito é de duplo grau. Primeiro, pela reiterada circulação de informações falsas sobre o atentado ao consulado norte-americano (prática já condenada pela Justiça na sentença de primeira instância do juiz Martins Seabra). Em segundo lugar, e não menos importante, com a tentativa de me despersonalizar, como se Dulce Maia fosse apenas um codinome.
Depois dos desaparecimentos forçados praticados pela ditadura, que impôs a aniquilação física de adversários políticos, sequazes do regime militar querem impor a aniquilação moral em plena democracia. E o fazem da forma mais vil, espalhando mentiras pela internet.
Como estratégia política, não é novidade. Documentos do governo norte-americano revelam que a CIA apoiava o uso de boatos para desestabilizar o governo democrático de Salvador Allende. Vivi em Santiago e presenciei a onda de boatos que não atingiu seus objetivos eleitorais (Allende foi deposto pelo sangrento golpe militar de setembro de 1973).
Trazer à luz do sol aqueles que usam a mentira como ferramenta política é uma tarefa urgente. Farei a minha parte, acionando judicialmente todos aqueles que atacam minha honra ao tentar tirar proveito político de grotescas caricaturas para atingir a imagem de seus adversários.
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Houve um tempo em que mentira tinha pernas curtas. Agora, a internet faz exercícios diários de alongamento da mendacidade. Nos últimos meses, uma torrencial campanha caluniosa circula pela rede mundial de computadores tomando por base artigo do jornalista Elio Gaspari, publicado originalmente nos jornais Folha de S.Paulo e O Globo em suas edições de 12 de março de 2008.
Quem tiver curiosidade de buscar na internet o número de vezes em que aparecem variantes da infame sentença "Agora a surpresa: adivinhem quem é Dulce Maia? Sim, ela mesma: Dilminha paz e amor! Esse é só mais um codinome da terrorista Estela/Dilma" – colada ao final do artigo de Gaspari – verá que estão hospedadas em mais de 500 páginas da rede (marca muito próxima à moda nazista de cunhar a verdade repetindo-se mil vezes uma mentira para torná-la veraz).
Ao contrário do que afirmam, Dulce Maia existe e resiste. Quem é Dulce Maia? Sou eu. Antes de mais nada, quero deixar claro que não me arrependo de nenhuma das opções políticas que fiz na vida, inclusive de ter participado da luta armada e da resistência à ditadura militar implantada em 1964. Eu me orgulho de ter sido companheira de luta de brasileiros dignos como Carlos Lamarca, Onofre Pinto, Diógenes de Oliveira e Aloysio Nunes Ferreira.
Sinal de descaso
Não pretendo polemizar com meus detratores, que ousaram decretar minha morte civil. Estes irão responder em juízo por seus atos. Não admito que queiram impor novos sofrimentos a quem já foi presa, torturada e banida do Brasil durante a ditadura. Lutarei com todas as minhas forças para garantir respeito à minha honra e à minha dignidade.
Gostaria apenas de fazer algumas reflexões sobre essa insidiosa campanha, alicerçada nos erros cometidos pelo jornalista Elio Gaspari ao tratar da ação contra o consulado norte-americano de São Paulo, em 1968. O articulista teve 40 anos para apurar a história. Falsamente me colocou como participante do episódio, sem nunca ter me procurado para checar a veracidade das informações de que dispunha. Tomou pelo valor de face peças do inquérito policial relativo ao atentado, como declaração extraída sob tortura do arquiteto e artista plástico Sérgio Ferro.
Se o articulista tivesse compulsado os arquivos do próprio jornal Folha de S.Paulo, facilmente encontraria entrevista de Sérgio Ferro (de quem também me orgulho de ser amiga há quase meio século). Conforme se lê no texto do repórter Mario Cesar Carvalho, publicado a 18 de maio de 1992, "Ferro assumiu pela primeira vez, em entrevista à Folha que ele, o arquiteto Rodrigo Lefrèvre (1938-1984) e uma terceira pessoa que ele prefere não identificar colocaram a bomba que explodiu à 1h15 do dia 19 de março de 1968 no consulado de São Paulo. Um estudante ficou ferido".
A matéria de 1992 trazia ilustração com um imenso dedo indicador em riste (o famoso "dedo-duro" apontado sobre a cabeça de um homem e acompanhado do texto "terror e cultura").
Gaspari tinha o dever ético de me procurar para verificar se seria eu essa terceira pessoa. Além de não fazê-lo, publicou que o atentado fora cometido por cinco pessoas (entre as quais fui falsamente incluída). O mesmo cuidado deveriam ter tido os responsáveis pela matéria da Folha de S.Paulo de 14 de março de 2008, que repercutiu o artigo de Gaspari reafirmando as falsas acusações.
A esses erros elementares de apuração, deve se somar a relutância da Folha de S.Paulo em restabelecer a verdade. Em nenhum momento, o ombudsman do jornal veio a público para tratar do assunto. O pedido de desculpas de Gaspari foi mera formalidade, sem delicadeza alguma. Sinal mais evidente do descaso do jornal foi a demora na publicação de carta de Sérgio Ferro, onde refutava categoricamente que eu tivesse participado daquela ação armada. A carta só foi publicada dois dias depois de ser divulgada no blog do jornalista Luis Nassif.
Luz do sol
Processado, o jornal foi condenado em primeira instância à reparação por danos morais. Imaginava que a ação judicial fosse um freio eficaz às aleivosias, particularmente depois da exemplar observação do juiz de Direito Fausto José Martins Seabra de que o jornal "não só extrapolou o direito de crítica, como olvidou o compromisso legal e ético com a verdade".
No entanto, o artigo de Gaspari voltou a circular com o espantoso adendo de que Dulce Maia não existe e que este seria apenas um codinome de Dilma Rousseff. A utilização do artigo em plena campanha eleitoral mostra que setores da sociedade não têm qualquer apreço pela verdade como arma política. São pessoas que, muito provavelmente, apoiaram o golpe militar de 1964 e não apreciam o debate franco e aberto de ideias.
Chama atenção, também, o silêncio de Elio Gaspari sobre o uso indevido de seu texto. Nunca li qualquer manifestação do articulista refutando o uso de seu nome em páginas que emporcalham a internet com mentiras sobre minha pessoa.
O desrespeito é de duplo grau. Primeiro, pela reiterada circulação de informações falsas sobre o atentado ao consulado norte-americano (prática já condenada pela Justiça na sentença de primeira instância do juiz Martins Seabra). Em segundo lugar, e não menos importante, com a tentativa de me despersonalizar, como se Dulce Maia fosse apenas um codinome.
Depois dos desaparecimentos forçados praticados pela ditadura, que impôs a aniquilação física de adversários políticos, sequazes do regime militar querem impor a aniquilação moral em plena democracia. E o fazem da forma mais vil, espalhando mentiras pela internet.
Como estratégia política, não é novidade. Documentos do governo norte-americano revelam que a CIA apoiava o uso de boatos para desestabilizar o governo democrático de Salvador Allende. Vivi em Santiago e presenciei a onda de boatos que não atingiu seus objetivos eleitorais (Allende foi deposto pelo sangrento golpe militar de setembro de 1973).
Trazer à luz do sol aqueles que usam a mentira como ferramenta política é uma tarefa urgente. Farei a minha parte, acionando judicialmente todos aqueles que atacam minha honra ao tentar tirar proveito político de grotescas caricaturas para atingir a imagem de seus adversários.
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Sem saída, José?
Reproduzo artigo enviado pelo amigo Gilson Caroni Filho:
Para enfrentar a batalha por espaço político a partir das eleições de outubro, quando serão escolhidos, além do presidente, novos governadores, senadores e deputados, a direita brasileira, sem projetos ou discursos, ensaia a repetição de arrazoados desmentidos pela história recente. Não sabendo como fazer oposição a um governo que completa seu oitavo ano cercado por popularidade recorde, e sem idéia de como restabelecer o prestígio de seus mais ilustres quadros, ao tucanato restou os factóides na imprensa e a esperança no ativismo judiciário.
Insistindo em ignorar que um novo paradigma econômico reclama um novo paradigma político, com um Estado forte, dotado de poder econômico e capacidade, para fazer cumprir as leis e regulamentações que estimulem o crescimento econômico com justiça social, sobra a José Serra a defesa de um “Estado musculoso que não se pareça com um lutador de sumô”. A direita, convenhamos, já foi bem mais feliz em metáforas.
O que o leitor lerá, até outubro, nas colunas da imprensa corporativa é tão previsível quanto a sucessão de dias e noites. O desequilíbrio do setor público será apresentado como resultante do modelo de intervenção do Estado na economia. O único problema é que, ao contrário da gestão neoliberal, não há qualquer evidência de exaustão macroeconômica. Na linha inversa do que afirma o credo conservador, o Estado não perdeu força como agente de desenvolvimento em uma economia complexa. Quem se mostrou um estorvo ao progresso, em razão de uma interferência caótica na vida das pessoas e das empresas, gerando privilégios para setores improdutivos, foi o mito do mercado como mecanismo capaz de regular-se a si mesmo.
Como repete incansavelmente o presidente Lula, a mudança na orientação da política econômica salvou o capitalismo brasileiro dele mesmo, democratizando seu funcionamento, a fim de sair de uma crise que parecia interminável. Manter as linhas mestras do atual governo corresponde a seguir o desafio a que se propôs Keynes, e ao qual devemos dar continuidade agora devido ao caráter cíclico das crises capitalistas.
Serra sabe que é herdeiro de um legado assustador. O governo ao qual se opõe foi capaz de ultrapassar o modelo supostamente modernizante e concentrador de rendas, herdado do consórcio liderado pelo PSDB, para uma etapa caracterizada pelo trinômio “crescimento-distribuição-participação”. Os critérios de escolha, em outubro, estão dados pelos êxitos obtidos pelo campo democrático-popular: retomada do desenvolvimento econômico e tomada de medidas voltadas para a redistribuição de renda e riqueza entre classes e regiões. Tudo isso realizado por atores políticos capazes de hierarquizar adequadamente as prioridades e de tratá-las dentro de um arcabouço de legalidade. Será de pouca valia argumentações que desconsiderem situações políticas novas e completamente distintas das que existiam em 2002.
A situação piora quando José Serra chama o Mercosul de farsa e ataca a ações diplomáticas levadas a cabo no atual governo. Fica claro que seu projeto de política externa seria guiado pela subalternidade aos desígnios estadunidenses e não pela realização mais plena da convivência internacional soberana. Só mesmo uma miopia conservadora, colonizada, de caráter quase religioso, pode justificar esse posicionamento.
Se a direita acredita ter alguma chance no terreno da moralidade abstrata, incorre em outro um equívoco colossal. Há algum tempo, com a inclusão crescente de amplos setores da população na esfera do consumo, o brasileiro compreendeu que toda a campanha contra o governo petista envolveu apenas um moralismo de fachada.
Sob o espetáculo midiático, a defesa de valores abstratos é feita por pessoas que sempre foram coniventes com a injustiça social. A pedagogia do cotidiano removeu argumentos que não passavam de cortina de fumaça para encobrir outros interesses. A sabedoria do senso comum já aprendeu que a pior imoralidade é condenar o povo, depois de séculos, a continuar a ser explorado, a não ter onde morar, o que comer, a viver em um estado de miséria e ignorância. E agora, José? Qual o próximo dossiê a ser apresentado como substituto a um projeto de país?
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Para enfrentar a batalha por espaço político a partir das eleições de outubro, quando serão escolhidos, além do presidente, novos governadores, senadores e deputados, a direita brasileira, sem projetos ou discursos, ensaia a repetição de arrazoados desmentidos pela história recente. Não sabendo como fazer oposição a um governo que completa seu oitavo ano cercado por popularidade recorde, e sem idéia de como restabelecer o prestígio de seus mais ilustres quadros, ao tucanato restou os factóides na imprensa e a esperança no ativismo judiciário.
Insistindo em ignorar que um novo paradigma econômico reclama um novo paradigma político, com um Estado forte, dotado de poder econômico e capacidade, para fazer cumprir as leis e regulamentações que estimulem o crescimento econômico com justiça social, sobra a José Serra a defesa de um “Estado musculoso que não se pareça com um lutador de sumô”. A direita, convenhamos, já foi bem mais feliz em metáforas.
O que o leitor lerá, até outubro, nas colunas da imprensa corporativa é tão previsível quanto a sucessão de dias e noites. O desequilíbrio do setor público será apresentado como resultante do modelo de intervenção do Estado na economia. O único problema é que, ao contrário da gestão neoliberal, não há qualquer evidência de exaustão macroeconômica. Na linha inversa do que afirma o credo conservador, o Estado não perdeu força como agente de desenvolvimento em uma economia complexa. Quem se mostrou um estorvo ao progresso, em razão de uma interferência caótica na vida das pessoas e das empresas, gerando privilégios para setores improdutivos, foi o mito do mercado como mecanismo capaz de regular-se a si mesmo.
Como repete incansavelmente o presidente Lula, a mudança na orientação da política econômica salvou o capitalismo brasileiro dele mesmo, democratizando seu funcionamento, a fim de sair de uma crise que parecia interminável. Manter as linhas mestras do atual governo corresponde a seguir o desafio a que se propôs Keynes, e ao qual devemos dar continuidade agora devido ao caráter cíclico das crises capitalistas.
Serra sabe que é herdeiro de um legado assustador. O governo ao qual se opõe foi capaz de ultrapassar o modelo supostamente modernizante e concentrador de rendas, herdado do consórcio liderado pelo PSDB, para uma etapa caracterizada pelo trinômio “crescimento-distribuição-participação”. Os critérios de escolha, em outubro, estão dados pelos êxitos obtidos pelo campo democrático-popular: retomada do desenvolvimento econômico e tomada de medidas voltadas para a redistribuição de renda e riqueza entre classes e regiões. Tudo isso realizado por atores políticos capazes de hierarquizar adequadamente as prioridades e de tratá-las dentro de um arcabouço de legalidade. Será de pouca valia argumentações que desconsiderem situações políticas novas e completamente distintas das que existiam em 2002.
A situação piora quando José Serra chama o Mercosul de farsa e ataca a ações diplomáticas levadas a cabo no atual governo. Fica claro que seu projeto de política externa seria guiado pela subalternidade aos desígnios estadunidenses e não pela realização mais plena da convivência internacional soberana. Só mesmo uma miopia conservadora, colonizada, de caráter quase religioso, pode justificar esse posicionamento.
Se a direita acredita ter alguma chance no terreno da moralidade abstrata, incorre em outro um equívoco colossal. Há algum tempo, com a inclusão crescente de amplos setores da população na esfera do consumo, o brasileiro compreendeu que toda a campanha contra o governo petista envolveu apenas um moralismo de fachada.
Sob o espetáculo midiático, a defesa de valores abstratos é feita por pessoas que sempre foram coniventes com a injustiça social. A pedagogia do cotidiano removeu argumentos que não passavam de cortina de fumaça para encobrir outros interesses. A sabedoria do senso comum já aprendeu que a pior imoralidade é condenar o povo, depois de séculos, a continuar a ser explorado, a não ter onde morar, o que comer, a viver em um estado de miséria e ignorância. E agora, José? Qual o próximo dossiê a ser apresentado como substituto a um projeto de país?
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Lula, imprensa e diversidade informativa
Reproduzo artigo de Beto Almeida, publicado no sítio Carta Maior:
O tema da falta de neutralidade da imprensa voltou à baila nesta semana por iniciativa do presidente Lula. Quando ele pede que a imprensa seja neutra ou no mínimo diga que tem candidato, está levantando um problema real e verdadeiro. Mas, a solução para isto, está muito longe da simples decisão dos proprietários de veículos de converterem-se repentinamente a uma neutralidade ou a uma diversidade informativa que nunca praticaram historicamente. A solução caminha para o fortalecimento das mídias públicas e pela construção, no caso brasileiro, de um grande jornal popular e nacionalista. E para esta solução, o próprio presidente Lula poderia sim ser um grande aliado.
A reclamação de Lula foi feita em discurso na Convenção do PT que indicou oficialmente Dilma Roussef como candidata presidencial. Ele registrava o desequilíbrio que sente ao assistir pela televisão a cobertura jornalística da campanha eleitoral. Os tempos e o tratamento são obviamente diferenciados. A preferência dos barões da mídia é escandalosa. Há uma unanimidade contra a candidata de Lula. Exceção feita, nas revistas de circulação nacional, à Carta Capital. Exceção que também se verifica na chamada mídia alternativa, porém extremamente pulverizada e de escassa circulação nacional. Com todo o heroísmo que significa a sua sustentação.
No mesmo discurso Lula fala que “ somos todos defensores da imprensa mais livre do mundo” e que não se incomoda com as críticas que recebe. Mas, o que é realmente uma imprensa livre? A que temos no Brasil é prisioneira do poder econômico, controlado pelas classes endinheiradas. Rigorosamente aprisionada dos preconceitos e visões destas classes. Imprensa livre de quem, então? Mais adiante, no mesmo discurso, Lula fala que é preciso ficar atento e “mudar de canal”. Como mudar de canal? Para qual, se não há alternativas!
Neutralidade na imprensa do capital?
Aqui entramos no problema que reiteradamente, não apenas este escriba, mas também outros mais qualificados, vem tratando de enfrentar, propondo a fundação de um programa público de estímulo da edição e leitura de jornais. Certamente, os barões da mídia, advertimos com antecipação, vão gritar escandalizados. Estatização da mídia! Dirão, alguns. Querem o dinheiro público para fazer política! Dirão outros.
Ué, mas isto não vem ocorrendo historicamente?! Como é que se sustenta, esta mesma mídia que ataca editorialmente a participação do estado em ramos essenciais da economia e da sociedade, entre os quais acrescentaria a obrigação de garantir informação diversificada e idônea aos cidadãos? Basta reflefir sobre a informação de que a maior empresa de comunicação do país recebe, apenas ela, mais de 60 por cento das bilionárias verbas públicas federais. Não faz muito tempo, a Revista Veja trazia, numa só edição, 14 páginas de publicidade da Petrobrás, um dos alvos prediletos do cada vez mais precário jornalismo do veículo.
O governo paga para apanhar
Que o governo paga para apanhar, pode ser uma conclusão. Verdadeira, mas não esgota o problema. Aliás, o governo até promoveu um critério novo e mais democrático para a distribuição de sua publicidade. Ainda assim, a grande massa de brasileiros não pode nem mudar de canal, nem pode ler jornal, já que continuamos com a quase unanimidade dos jornais de circulação mais relevantes aprisionados pelos empresários que praticam o desequilíbrio informativo, que estão muito longe da neutralidade sugerida por Lula - aliás, duvido que ela exista.
E também não temos, como em outros países ou como já tivemos no passado, um jornal nacional de ampla circulação que refletisse o ponto de vista das classes populares e nacionalistas, que, afinal, existem na sociedade. Ou não? A tomar pela imprensa do capital hoje, parece que estes outros pontos de vista não existiriam. Paradoxo: estas conseguem eleger o presidente da república, mas não conseguem construir um jornal que tenha a sua cara e os seus sonhos.
A experiência do jornal “Última Hora”
Já tivemos o jornal “Última Hora”, nacionalista e popular. Uma página importantíssima na história da imprensa brasileira, tema já tocado aqui por este escriba e também pelo jornalista Laurindo Leal Filho. Tal como Lula hoje, Vargas também percebia que toda a imprensa se voltava contra o nacionalismo, condenava as leis trabalhistas e previdenciárias, hostilizava o salário mínimo, defendia os interesses das oligarquias e, sobretudo, do capital estrangeiro.
O presidente Vargas comenta então o problema da desinformação crônica do país com o jornalista Samuel Wainer. E sugere: “Por que tu não montas um jornal?” O encorajamento veio de Vargas. Houve um empréstimo do Banco do Brasil e de outras instituições e nasceu o ‘Última Hora”. Hoje, o presidente Lula poderia ir além da reclamação e das críticas corretas que faz à esta imprensa desequilibrada e propor uma solução. Se disserem que é um absurdo que um presidente encoraje á formação de uma iniciativa deste porte, lembraremos as nebulosas condições em que foi criada a maior rede de televisão do Brasil, inclusive afrontando a lei, conforme demonstrou a histórica CPI do Grupo Time-Life. O encorajamento, digamos, veio de longe...
Aliás, a solução já vem sendo proposta reiteradas vezes por segmentos do movimento de democratização da comunicação. Tanto no seminário “A imaginação a serviço do Brasil”, de julho de 2002, que preparou um programa específico entregue ao então candidato Lula, como também nos debates da Confecom e nos Congressos Nacionais de Jornalistas, muito embora nem todos os sindicatos a sustentem de modo militante. Clamam por Diploma! Diploma! Mas onde este exército de jornalistas diplomados, espelidos pela indústria do canudo, irá trabalhar?
Temos fatores soltos que necessitam ser coordenados. Temos um povo praticamente proibido da leitura. Nossos índices de leitura de jornal, segundo a Unesco, perdem para os da Bolívia! Temos um exército de jornalistas e escritores talentosos desempregados, vítimas da propaganda enganosa que foi a explosão de faculdades de comunicação no país, prometendo emprego para todos. E temos uma indústria gráfica com 50 por cento de capacidade ociosa crônica. Gráficas paradas e um povo sem poder ler!
Esta solução trilha por uma Fundação para o Jornalismo Público. Muitos fundos de pensão de empresas públicas, altamente rentáveis, aliás, poderiam associar-se a esta Fundação.
Hipocrisia
Quando os barões da mídia, fingindo-se escandalizados, reclamarem do uso de recursos públicos para um jornalismo de missão pública, que não é o deles, apresentaremos uma tabela com todos os monumentais recursos que durante décadas estas empresas de mídia drenaram do estado. E diremos que estamos apenas reivindicando isonomia. Por que o BNDES pode oferecer empréstimos para a Vale do Rio Doce, para grandes empresários e até poderosas empresas estrangeiras, ou para as empresas de comunicação já instaladas, e esta Fundação para um Jornalismo Público não pode também receber? Que a dívida que grandes empresas de mídia possuem com o INSS seja convertida em favor de um programa que edifique um programa público de leitura e edição de jornais no Brasil é algo ser examinado.
E também denunciaremos a hipocrisia desta mídia que ataca o estado editorialmente, mas ante qualquer dificuldade de caixa bate exatamente às portas deste mesmo estado para o uso, sim, do dinheiro público. Elas não se transformaram nestes poderosos conglomerados por eficiência empresarial, mas, sobretudo, por irrigação privilegiada de recursos do estado para sua contabilidade privada!
Jornal popular, nacionalista, a baixo preço
O papel essencial desta Fundação é a de editar e distribuir nacionalmente um jornal de grande circulação, a preços populares, estabelecendo a diversidade informativa preconizada na Constituição. Não é livre uma imprensa aprisionada por uma única classe social poderosa que edita apenas seus desejos e sua vassalagem ante aos grandes interesses. Não esqueceremos jamais: esta mídia que aí está a atacar o fortalecimento das políticas públicas atuais, foi a mesma que atacou Vargas por criar a Petrobrás, chegando até mesmo a proclamar - pasmem - que no Brasil não havia petróleo!
Nesta onda de recall das grandes empresas, bateu a inspiração para escrever artigo com o título “E o dia em que fizerem o recall da mídia?”. Quanta informação adulterada, defeituosa, falsificada! Será possível corrigir? Afinal, não estamos falando de um tapete, um pedal ou um cabo de freio... Estamos falando de informação, pedra preciosa para a cidadania!
A solução é construir, expandir e qualificar o campo da mídia pública. Mudanças mais audazes nos critérios de distribuição de publicidade oficial já ajudariam muito a reequilibrar o campo de mídia. Com o valor das 14 páginas de publicidade dadas exclusivamente à Veja, uma TV Comunitária se sustenta por vários anos!
Escola de jornalismo
Além de editar um jornal, esta Fundação para o Jornalismo Público bem que poderia ter uma escola de jornalismo, pois a ideologia da notícia emanada pela imprensa comercial hoje já penetrou de tal modo nas escolas de comunicação que, em certos casos, parece uma cooptação informativo-cultural em torno de valores alheios e até mesmo antagônicos aos do povo brasileiro, dos que produzem e constroem este país. E jornalismo não é fábrica de sabão.
Não é pecado sonhar em ter uma escola de jornalismo nesta Fundação sob a orientação de geniais jornalistas, como Mauro Santayanna, por exemplo, que trabalhou naquele valente Última Hora. E tantos outros. É preciso abrir uma página nova no jornalismo brasileiro, pensando nas próximas gerações. E também poderia instalar nesta Fundação uma editora especializada em temas que permitissem ao povo brasileiro ter acesso a livros de qualidade, a baixo custo, e, tematicamente, ajudando na superação das vulnerabilidades ideológicas, padrões de informação e de cultura que querem nos impingir alguns governos intervencionistas, pelos braços de suas ONGs, alardeando ambíguas e ardilosas bandeiras democráticas.
Se nasceu a TV Brasil, a EBC, em sintonia com inúmeras mudanças democráticas da comunicação em vários países da América Latina, por que não avançamos? Por que não ir além da constatação de que estamos padecendo de uma manipulação informativa clamorosa? Denunciar é rigorosamente necessário, tanto quanto apresentar caminhos a seguir.
Na Argentina, existe o jornal Página 12 e o fortalecimento da TV e rádio públicas, além de uma nova lei de comunicação que proíbe o monopólio. Na Bolívia nasceu o jornal Câmbio e em oito meses de vida já vende tanto quanto o mais antigo jornal do país, o La Razón, com 70 anos de vida. Na Venezuela, nasceu o jornal Correio do Orenoco, resgatando o jornal original de Simon Bolívar, no qual foi redator o general pernambucano Abreu e Lima, que lutou ao lado do Libertador. No México há o jornal La Jornada, uma espécie de cooperativa.
Já passou da hora do povo brasileiro dar um passo novo para fazer uma nova história do jornalismo. Se oferecemos ao mundo com engenhosidade e criatividade a mais bela festa popular do planeta, se já oferecemos ao mundo um Alberto Santos Dumont, se já lançamos ao mundo um Paulo Freire, um Josué de Castro, um Oscar Niemeyer e uma música de inventividade admirável, por que não podemos pretender criar um outro caminho para um jornalismo tal como previsto na Constituição: humanista, diversificado, plural, respeitando os mais elevados valores da nação, sua diversidade cultural e coibindo o daninho processo de concentração midiática?
Para os que temem nesta proposta alguma nostalgia guttemberguiana, nada disso: o povo brasileiro pode, finalmente, entrar na Era de Guttemberg e, simultamentemente, fazer este jornalismo espalhar-se pelo digital, sobretudo agora que a Telebrás pública irá cuidar de democratizar a banda larga. Mas, é preciso fazer jornalismo, o velho e bom jornalismo, de Jack London, de John Reed, do Barão de Itararé, de Barbosa Lima Sobrinho
E bem que o presidente Lula, deixando a presidência, pode ser uma espécie de presidente de honra desta Fundação para um Jornalismo Público
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O tema da falta de neutralidade da imprensa voltou à baila nesta semana por iniciativa do presidente Lula. Quando ele pede que a imprensa seja neutra ou no mínimo diga que tem candidato, está levantando um problema real e verdadeiro. Mas, a solução para isto, está muito longe da simples decisão dos proprietários de veículos de converterem-se repentinamente a uma neutralidade ou a uma diversidade informativa que nunca praticaram historicamente. A solução caminha para o fortalecimento das mídias públicas e pela construção, no caso brasileiro, de um grande jornal popular e nacionalista. E para esta solução, o próprio presidente Lula poderia sim ser um grande aliado.
A reclamação de Lula foi feita em discurso na Convenção do PT que indicou oficialmente Dilma Roussef como candidata presidencial. Ele registrava o desequilíbrio que sente ao assistir pela televisão a cobertura jornalística da campanha eleitoral. Os tempos e o tratamento são obviamente diferenciados. A preferência dos barões da mídia é escandalosa. Há uma unanimidade contra a candidata de Lula. Exceção feita, nas revistas de circulação nacional, à Carta Capital. Exceção que também se verifica na chamada mídia alternativa, porém extremamente pulverizada e de escassa circulação nacional. Com todo o heroísmo que significa a sua sustentação.
No mesmo discurso Lula fala que “ somos todos defensores da imprensa mais livre do mundo” e que não se incomoda com as críticas que recebe. Mas, o que é realmente uma imprensa livre? A que temos no Brasil é prisioneira do poder econômico, controlado pelas classes endinheiradas. Rigorosamente aprisionada dos preconceitos e visões destas classes. Imprensa livre de quem, então? Mais adiante, no mesmo discurso, Lula fala que é preciso ficar atento e “mudar de canal”. Como mudar de canal? Para qual, se não há alternativas!
Neutralidade na imprensa do capital?
Aqui entramos no problema que reiteradamente, não apenas este escriba, mas também outros mais qualificados, vem tratando de enfrentar, propondo a fundação de um programa público de estímulo da edição e leitura de jornais. Certamente, os barões da mídia, advertimos com antecipação, vão gritar escandalizados. Estatização da mídia! Dirão, alguns. Querem o dinheiro público para fazer política! Dirão outros.
Ué, mas isto não vem ocorrendo historicamente?! Como é que se sustenta, esta mesma mídia que ataca editorialmente a participação do estado em ramos essenciais da economia e da sociedade, entre os quais acrescentaria a obrigação de garantir informação diversificada e idônea aos cidadãos? Basta reflefir sobre a informação de que a maior empresa de comunicação do país recebe, apenas ela, mais de 60 por cento das bilionárias verbas públicas federais. Não faz muito tempo, a Revista Veja trazia, numa só edição, 14 páginas de publicidade da Petrobrás, um dos alvos prediletos do cada vez mais precário jornalismo do veículo.
O governo paga para apanhar
Que o governo paga para apanhar, pode ser uma conclusão. Verdadeira, mas não esgota o problema. Aliás, o governo até promoveu um critério novo e mais democrático para a distribuição de sua publicidade. Ainda assim, a grande massa de brasileiros não pode nem mudar de canal, nem pode ler jornal, já que continuamos com a quase unanimidade dos jornais de circulação mais relevantes aprisionados pelos empresários que praticam o desequilíbrio informativo, que estão muito longe da neutralidade sugerida por Lula - aliás, duvido que ela exista.
E também não temos, como em outros países ou como já tivemos no passado, um jornal nacional de ampla circulação que refletisse o ponto de vista das classes populares e nacionalistas, que, afinal, existem na sociedade. Ou não? A tomar pela imprensa do capital hoje, parece que estes outros pontos de vista não existiriam. Paradoxo: estas conseguem eleger o presidente da república, mas não conseguem construir um jornal que tenha a sua cara e os seus sonhos.
A experiência do jornal “Última Hora”
Já tivemos o jornal “Última Hora”, nacionalista e popular. Uma página importantíssima na história da imprensa brasileira, tema já tocado aqui por este escriba e também pelo jornalista Laurindo Leal Filho. Tal como Lula hoje, Vargas também percebia que toda a imprensa se voltava contra o nacionalismo, condenava as leis trabalhistas e previdenciárias, hostilizava o salário mínimo, defendia os interesses das oligarquias e, sobretudo, do capital estrangeiro.
O presidente Vargas comenta então o problema da desinformação crônica do país com o jornalista Samuel Wainer. E sugere: “Por que tu não montas um jornal?” O encorajamento veio de Vargas. Houve um empréstimo do Banco do Brasil e de outras instituições e nasceu o ‘Última Hora”. Hoje, o presidente Lula poderia ir além da reclamação e das críticas corretas que faz à esta imprensa desequilibrada e propor uma solução. Se disserem que é um absurdo que um presidente encoraje á formação de uma iniciativa deste porte, lembraremos as nebulosas condições em que foi criada a maior rede de televisão do Brasil, inclusive afrontando a lei, conforme demonstrou a histórica CPI do Grupo Time-Life. O encorajamento, digamos, veio de longe...
Aliás, a solução já vem sendo proposta reiteradas vezes por segmentos do movimento de democratização da comunicação. Tanto no seminário “A imaginação a serviço do Brasil”, de julho de 2002, que preparou um programa específico entregue ao então candidato Lula, como também nos debates da Confecom e nos Congressos Nacionais de Jornalistas, muito embora nem todos os sindicatos a sustentem de modo militante. Clamam por Diploma! Diploma! Mas onde este exército de jornalistas diplomados, espelidos pela indústria do canudo, irá trabalhar?
Temos fatores soltos que necessitam ser coordenados. Temos um povo praticamente proibido da leitura. Nossos índices de leitura de jornal, segundo a Unesco, perdem para os da Bolívia! Temos um exército de jornalistas e escritores talentosos desempregados, vítimas da propaganda enganosa que foi a explosão de faculdades de comunicação no país, prometendo emprego para todos. E temos uma indústria gráfica com 50 por cento de capacidade ociosa crônica. Gráficas paradas e um povo sem poder ler!
Esta solução trilha por uma Fundação para o Jornalismo Público. Muitos fundos de pensão de empresas públicas, altamente rentáveis, aliás, poderiam associar-se a esta Fundação.
Hipocrisia
Quando os barões da mídia, fingindo-se escandalizados, reclamarem do uso de recursos públicos para um jornalismo de missão pública, que não é o deles, apresentaremos uma tabela com todos os monumentais recursos que durante décadas estas empresas de mídia drenaram do estado. E diremos que estamos apenas reivindicando isonomia. Por que o BNDES pode oferecer empréstimos para a Vale do Rio Doce, para grandes empresários e até poderosas empresas estrangeiras, ou para as empresas de comunicação já instaladas, e esta Fundação para um Jornalismo Público não pode também receber? Que a dívida que grandes empresas de mídia possuem com o INSS seja convertida em favor de um programa que edifique um programa público de leitura e edição de jornais no Brasil é algo ser examinado.
E também denunciaremos a hipocrisia desta mídia que ataca o estado editorialmente, mas ante qualquer dificuldade de caixa bate exatamente às portas deste mesmo estado para o uso, sim, do dinheiro público. Elas não se transformaram nestes poderosos conglomerados por eficiência empresarial, mas, sobretudo, por irrigação privilegiada de recursos do estado para sua contabilidade privada!
Jornal popular, nacionalista, a baixo preço
O papel essencial desta Fundação é a de editar e distribuir nacionalmente um jornal de grande circulação, a preços populares, estabelecendo a diversidade informativa preconizada na Constituição. Não é livre uma imprensa aprisionada por uma única classe social poderosa que edita apenas seus desejos e sua vassalagem ante aos grandes interesses. Não esqueceremos jamais: esta mídia que aí está a atacar o fortalecimento das políticas públicas atuais, foi a mesma que atacou Vargas por criar a Petrobrás, chegando até mesmo a proclamar - pasmem - que no Brasil não havia petróleo!
Nesta onda de recall das grandes empresas, bateu a inspiração para escrever artigo com o título “E o dia em que fizerem o recall da mídia?”. Quanta informação adulterada, defeituosa, falsificada! Será possível corrigir? Afinal, não estamos falando de um tapete, um pedal ou um cabo de freio... Estamos falando de informação, pedra preciosa para a cidadania!
A solução é construir, expandir e qualificar o campo da mídia pública. Mudanças mais audazes nos critérios de distribuição de publicidade oficial já ajudariam muito a reequilibrar o campo de mídia. Com o valor das 14 páginas de publicidade dadas exclusivamente à Veja, uma TV Comunitária se sustenta por vários anos!
Escola de jornalismo
Além de editar um jornal, esta Fundação para o Jornalismo Público bem que poderia ter uma escola de jornalismo, pois a ideologia da notícia emanada pela imprensa comercial hoje já penetrou de tal modo nas escolas de comunicação que, em certos casos, parece uma cooptação informativo-cultural em torno de valores alheios e até mesmo antagônicos aos do povo brasileiro, dos que produzem e constroem este país. E jornalismo não é fábrica de sabão.
Não é pecado sonhar em ter uma escola de jornalismo nesta Fundação sob a orientação de geniais jornalistas, como Mauro Santayanna, por exemplo, que trabalhou naquele valente Última Hora. E tantos outros. É preciso abrir uma página nova no jornalismo brasileiro, pensando nas próximas gerações. E também poderia instalar nesta Fundação uma editora especializada em temas que permitissem ao povo brasileiro ter acesso a livros de qualidade, a baixo custo, e, tematicamente, ajudando na superação das vulnerabilidades ideológicas, padrões de informação e de cultura que querem nos impingir alguns governos intervencionistas, pelos braços de suas ONGs, alardeando ambíguas e ardilosas bandeiras democráticas.
Se nasceu a TV Brasil, a EBC, em sintonia com inúmeras mudanças democráticas da comunicação em vários países da América Latina, por que não avançamos? Por que não ir além da constatação de que estamos padecendo de uma manipulação informativa clamorosa? Denunciar é rigorosamente necessário, tanto quanto apresentar caminhos a seguir.
Na Argentina, existe o jornal Página 12 e o fortalecimento da TV e rádio públicas, além de uma nova lei de comunicação que proíbe o monopólio. Na Bolívia nasceu o jornal Câmbio e em oito meses de vida já vende tanto quanto o mais antigo jornal do país, o La Razón, com 70 anos de vida. Na Venezuela, nasceu o jornal Correio do Orenoco, resgatando o jornal original de Simon Bolívar, no qual foi redator o general pernambucano Abreu e Lima, que lutou ao lado do Libertador. No México há o jornal La Jornada, uma espécie de cooperativa.
Já passou da hora do povo brasileiro dar um passo novo para fazer uma nova história do jornalismo. Se oferecemos ao mundo com engenhosidade e criatividade a mais bela festa popular do planeta, se já oferecemos ao mundo um Alberto Santos Dumont, se já lançamos ao mundo um Paulo Freire, um Josué de Castro, um Oscar Niemeyer e uma música de inventividade admirável, por que não podemos pretender criar um outro caminho para um jornalismo tal como previsto na Constituição: humanista, diversificado, plural, respeitando os mais elevados valores da nação, sua diversidade cultural e coibindo o daninho processo de concentração midiática?
Para os que temem nesta proposta alguma nostalgia guttemberguiana, nada disso: o povo brasileiro pode, finalmente, entrar na Era de Guttemberg e, simultamentemente, fazer este jornalismo espalhar-se pelo digital, sobretudo agora que a Telebrás pública irá cuidar de democratizar a banda larga. Mas, é preciso fazer jornalismo, o velho e bom jornalismo, de Jack London, de John Reed, do Barão de Itararé, de Barbosa Lima Sobrinho
E bem que o presidente Lula, deixando a presidência, pode ser uma espécie de presidente de honra desta Fundação para um Jornalismo Público
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sábado, 19 de junho de 2010
Futebol, um esporte vendido à TV
Reproduzo artigo do professor Laurindo Lalo Leal Filho, publicado no sítio Carta Maior:
Enquanto a Copa segue hegemônica nos noticiários de TV, o silêncio cobre outros fatos importantes ligados ao futebol. Na mesma semana da estreia do Brasil, os vereadores de São Paulo deram uma guinada espetacular e mantiveram o veto do prefeito Kassab à lei, por eles mesmos aprovada, que proibia jogos de futebol na cidade com início depois das 21h15.
Quem marca o horário dos jogos noturnos para às 21h50 são os programadores da Rede Globo. Para eles o futebol é apenas mais um programa da emissora que, por critérios mercadológicos, deve ser transmitido depois da novela.
Em abril, com 43 votos a favor e apenas dois contra a lei aprovada passava a impressão de altivez da Câmara, fato raro na vida política do município. Foi só impressão. Ao invés de manterem seus votos e derrubarem o veto do prefeito, os vereadores paulistanos, com quatro honrosas exceções, curvaram-se aos interesses da Globo. Até um dos autores do projeto, vereador Antonio Goulart, mudou de lado. O outro, Agnaldo Timóteo não apareceu para votar.
E assim os jogos na capital continuam terminando quase à meia-noite. Até pela TV, para quem tem que trabalhar cedo no dia seguinte, como faz a maioria da população, o horário é ruim. Agora para quem gosta de ir ao estádio é um sacrifício desumano.
Os vereadores paulistanos não se dobraram apenas aos interesses da Rede Globo. Eles passaram um atestado de incapacidade absoluta para enfrentar um modelo perverso imposto nas últimas décadas ao futebol brasileiro.
Até o final dos anos 1960 ainda havia algo de lúdico na prática e no espetáculo futebolístico. Lembro do Torneio Início, jogado uma semana antes da abertura do campeonato paulista, num dia só, com a participação de todos os clubes da primeira divisão. Eram jogos mata-mata, de 30 minutos (15 por 15) de duração onde, em caso de empate, ganhava o time que havia obtido mais escanteios a favor, antes da disputa dos pênaltis se fosse necessária.
Curioso era ver os maiores craques do futebol paulista, em volta do gramado, assistindo os jogos dos outros times enquanto esperavam a vez de entrar em campo. Havia um que de amadorismo resistindo às investidas da profissionalização definitiva. O Pacaembu ainda era, nessa época, uma extensão glamorosa dos campos de várzea que se espalhavam por toda a cidade.
A especulação imobiliária nunca contida pelos vereadores paulistanos – em qualquer legislatura – acabou com a várzea e quase acaba com o futebol na cidade. A sua sobrevivência se deu num outro nível, o da mercantilização absoluta. Dos jogadores e do jogo.
Os primeiros passaram a ser formados pelas escolinhas, acessíveis apenas à classe média, ou pelos centros de adestramento criados por empresários cujo objetivo é preparar os seus “produtos” para vendê-los no exterior.
O futebol assume nesse estágio a forma mercadoria em todas as suas etapas. Do berço do jogador à Copa do Mundo nada escapa. O esporte popular das ruas e das várzeas transformou-se num produto caro e altamente sofisticado, operando num nível elevadíssimo de racionalidade capitalista.
Diferente de outros setores da economia e mesmo da cultura, onde o Estado ainda atua para conter de alguma forma a voracidade do mercado, no futebol isso não acontece. Os objetivos privados são absolutos nem que para serem alcançados sacrifiquem-se atletas, torcedores e, no limite o próprio esporte, reduzido cada vez mais a um espetáculo de televisão.
Perderam os vereadores paulistanos a grande oportunidade de colocar o interesse público em primeiro lugar. Resta agora esperar, com bastante ceticismo, que projeto semelhante, apresentado na Câmara dos Deputados, e válido para todo o Brasil, prospere.
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Enquanto a Copa segue hegemônica nos noticiários de TV, o silêncio cobre outros fatos importantes ligados ao futebol. Na mesma semana da estreia do Brasil, os vereadores de São Paulo deram uma guinada espetacular e mantiveram o veto do prefeito Kassab à lei, por eles mesmos aprovada, que proibia jogos de futebol na cidade com início depois das 21h15.
Quem marca o horário dos jogos noturnos para às 21h50 são os programadores da Rede Globo. Para eles o futebol é apenas mais um programa da emissora que, por critérios mercadológicos, deve ser transmitido depois da novela.
Em abril, com 43 votos a favor e apenas dois contra a lei aprovada passava a impressão de altivez da Câmara, fato raro na vida política do município. Foi só impressão. Ao invés de manterem seus votos e derrubarem o veto do prefeito, os vereadores paulistanos, com quatro honrosas exceções, curvaram-se aos interesses da Globo. Até um dos autores do projeto, vereador Antonio Goulart, mudou de lado. O outro, Agnaldo Timóteo não apareceu para votar.
E assim os jogos na capital continuam terminando quase à meia-noite. Até pela TV, para quem tem que trabalhar cedo no dia seguinte, como faz a maioria da população, o horário é ruim. Agora para quem gosta de ir ao estádio é um sacrifício desumano.
Os vereadores paulistanos não se dobraram apenas aos interesses da Rede Globo. Eles passaram um atestado de incapacidade absoluta para enfrentar um modelo perverso imposto nas últimas décadas ao futebol brasileiro.
Até o final dos anos 1960 ainda havia algo de lúdico na prática e no espetáculo futebolístico. Lembro do Torneio Início, jogado uma semana antes da abertura do campeonato paulista, num dia só, com a participação de todos os clubes da primeira divisão. Eram jogos mata-mata, de 30 minutos (15 por 15) de duração onde, em caso de empate, ganhava o time que havia obtido mais escanteios a favor, antes da disputa dos pênaltis se fosse necessária.
Curioso era ver os maiores craques do futebol paulista, em volta do gramado, assistindo os jogos dos outros times enquanto esperavam a vez de entrar em campo. Havia um que de amadorismo resistindo às investidas da profissionalização definitiva. O Pacaembu ainda era, nessa época, uma extensão glamorosa dos campos de várzea que se espalhavam por toda a cidade.
A especulação imobiliária nunca contida pelos vereadores paulistanos – em qualquer legislatura – acabou com a várzea e quase acaba com o futebol na cidade. A sua sobrevivência se deu num outro nível, o da mercantilização absoluta. Dos jogadores e do jogo.
Os primeiros passaram a ser formados pelas escolinhas, acessíveis apenas à classe média, ou pelos centros de adestramento criados por empresários cujo objetivo é preparar os seus “produtos” para vendê-los no exterior.
O futebol assume nesse estágio a forma mercadoria em todas as suas etapas. Do berço do jogador à Copa do Mundo nada escapa. O esporte popular das ruas e das várzeas transformou-se num produto caro e altamente sofisticado, operando num nível elevadíssimo de racionalidade capitalista.
Diferente de outros setores da economia e mesmo da cultura, onde o Estado ainda atua para conter de alguma forma a voracidade do mercado, no futebol isso não acontece. Os objetivos privados são absolutos nem que para serem alcançados sacrifiquem-se atletas, torcedores e, no limite o próprio esporte, reduzido cada vez mais a um espetáculo de televisão.
Perderam os vereadores paulistanos a grande oportunidade de colocar o interesse público em primeiro lugar. Resta agora esperar, com bastante ceticismo, que projeto semelhante, apresentado na Câmara dos Deputados, e válido para todo o Brasil, prospere.
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O erro de Fidel: Maradona não é o melhor
Reproduzo artigo de Breno Altman, publicado no sítio Opera Mundi:
O líder histórico da revolução cubana, em artigo publicado na imprensa cubana nessa quinta-feira (17/06), intitulado “A contenda inevitável”, lá pelas tantas declara que Diego Maradona foi “o melhor jogador da história do esporte”. Fiquei estarrecido com a avaliação. Como é que pode um dirigente experiente e culto abraçar assim a ilusão que embala os argentinos?
Não é a primeira vez que expressa tal opinião. No final de 2001, durante reunião do Foro de São Paulo (a entidade que congrega os partidos de esquerda da América Latina), realizada em Havana, ouvi a mesma consideração. Estava cobrindo o evento para uma revista brasileira quando Fidel, depois do discurso de encerramento, derreteu-se em elogios ao boleiro portenho diante dos jornalistas presentes.
Confesso que fiquei indignado. Protestei com veemência, da platéia. Seguiu-se discussão ardida, mas bem-humorada. Logo vi que o comandante não entendia bulhufas de futebol. Estava era encantando com a solidariedade de Maradona à revolução cubana. Fiz o que qualquer apreciador sensato de futebol faria, contrapondo Pelé à sua nova idolatria. Meus argumentos, como era de se esperar, parecem ter sido solenemente desconsiderados.
Diego Maradona foi, sem dúvida, um grande craque. Brilhou nas equipes do Boca Juniors e Napoli. Conquistou a Copa do Mundo com o selecionado argentino em 1986, apresentando um desempenho espetacular. No saldo geral de sua carreira, marcou 345 gols em 678 partidas, em vinte anos nos gramados.
Driblava como um mágico. Tinha uma canhota impiedosa, que compensava sua direita meio cega. Baixinho e troncudo, o cabeceio não era seu forte. Mas equilibrava essas poucas debilidades com uma tremenda visão de jogo. Era um armador nato, sensacional, que servia ao time. Está entre os melhores, no panteão da glória esportiva.
Apenas os argentinos, contudo, por razões afetivas e patrióticas, têm direito de considerá-lo o número um. Ainda que, dizem as más línguas, nossos vizinhos ao sul achem Maradona o melhor do mundo e um dos melhores jogadores portenhos de todos os tempos...
A um líder do quilate de Fidel, porém, não caberia comprar esse gato por lebre. Se pudesse estudar o futebol com uma enésima parte do empenho e racionalidade que dedica aos problemas políticos e econômicos, perceberia o grave erro que está cometendo em sua afirmação. Maradona pode ser mais progressista que Pelé, mas revela-se abissal a distância entre o futebol dos dois astros.
Incomparável é a expressão mais modesta que pode ser dita sobre a estrela máxima do Santos e da seleção brasileira. Não é à toa que foi chamado, aos 18 anos incompletos, de rei do futebol. Meia como Maradona, marcou 1217 gols em 1285 partidas oficiais. Fez de seu time o melhor esquadrão jamais visto. Por três vezes esteve em campeonatos mundiais vencidos pelo Brasil.
Especialistas de todos os continentes o indicaram como o maior atleta do século XX. Era perfeito em todos os fundamentos da bola. Driblando, cabeceando, batendo de esquerda ou direita, dentro ou fora da área, em todas as formas e cores forjou-se como jogador insuperável. Nunca houve nem haverá craque como Pelé. Seu trono é uno e indivisível.
Sua arte alcançou tamanha estatura que fez dele, ao lado do pugilista Muhammad Ali e do corredor Jesse Owens, os únicos esportistas guindados ao cume da história humana, ao lado dos grandes artistas, intelectuais e líderes políticos, entre eles Fidel Castro Ruz.
Sem Pelé, talvez fosse inimaginável o papel do futebol como entretenimento de multidões e fator de construção da identidade nacional de tantos povos. Suas idéias e valores eventualmente tenham sido sempre conservadores, mas foi um dos primeiros negros e pobres a conquistar espaço em um mundo de ricos brancos.
O comandante deveria prestar mais atenção a essa história. Aos fatos, números, cenas e conquistas. Maradona é um amigo, mora do lado esquerdo do peito, companheiro Fidel, mas não é primus inter pares. Em nome da unidade latino-americana, e por seus próprios méritos, basta que seja tratado como o mais talentoso e rebelde súdito do rei de todos os campos e estádios, de todas as épocas e gerações.
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O líder histórico da revolução cubana, em artigo publicado na imprensa cubana nessa quinta-feira (17/06), intitulado “A contenda inevitável”, lá pelas tantas declara que Diego Maradona foi “o melhor jogador da história do esporte”. Fiquei estarrecido com a avaliação. Como é que pode um dirigente experiente e culto abraçar assim a ilusão que embala os argentinos?
Não é a primeira vez que expressa tal opinião. No final de 2001, durante reunião do Foro de São Paulo (a entidade que congrega os partidos de esquerda da América Latina), realizada em Havana, ouvi a mesma consideração. Estava cobrindo o evento para uma revista brasileira quando Fidel, depois do discurso de encerramento, derreteu-se em elogios ao boleiro portenho diante dos jornalistas presentes.
Confesso que fiquei indignado. Protestei com veemência, da platéia. Seguiu-se discussão ardida, mas bem-humorada. Logo vi que o comandante não entendia bulhufas de futebol. Estava era encantando com a solidariedade de Maradona à revolução cubana. Fiz o que qualquer apreciador sensato de futebol faria, contrapondo Pelé à sua nova idolatria. Meus argumentos, como era de se esperar, parecem ter sido solenemente desconsiderados.
Diego Maradona foi, sem dúvida, um grande craque. Brilhou nas equipes do Boca Juniors e Napoli. Conquistou a Copa do Mundo com o selecionado argentino em 1986, apresentando um desempenho espetacular. No saldo geral de sua carreira, marcou 345 gols em 678 partidas, em vinte anos nos gramados.
Driblava como um mágico. Tinha uma canhota impiedosa, que compensava sua direita meio cega. Baixinho e troncudo, o cabeceio não era seu forte. Mas equilibrava essas poucas debilidades com uma tremenda visão de jogo. Era um armador nato, sensacional, que servia ao time. Está entre os melhores, no panteão da glória esportiva.
Apenas os argentinos, contudo, por razões afetivas e patrióticas, têm direito de considerá-lo o número um. Ainda que, dizem as más línguas, nossos vizinhos ao sul achem Maradona o melhor do mundo e um dos melhores jogadores portenhos de todos os tempos...
A um líder do quilate de Fidel, porém, não caberia comprar esse gato por lebre. Se pudesse estudar o futebol com uma enésima parte do empenho e racionalidade que dedica aos problemas políticos e econômicos, perceberia o grave erro que está cometendo em sua afirmação. Maradona pode ser mais progressista que Pelé, mas revela-se abissal a distância entre o futebol dos dois astros.
Incomparável é a expressão mais modesta que pode ser dita sobre a estrela máxima do Santos e da seleção brasileira. Não é à toa que foi chamado, aos 18 anos incompletos, de rei do futebol. Meia como Maradona, marcou 1217 gols em 1285 partidas oficiais. Fez de seu time o melhor esquadrão jamais visto. Por três vezes esteve em campeonatos mundiais vencidos pelo Brasil.
Especialistas de todos os continentes o indicaram como o maior atleta do século XX. Era perfeito em todos os fundamentos da bola. Driblando, cabeceando, batendo de esquerda ou direita, dentro ou fora da área, em todas as formas e cores forjou-se como jogador insuperável. Nunca houve nem haverá craque como Pelé. Seu trono é uno e indivisível.
Sua arte alcançou tamanha estatura que fez dele, ao lado do pugilista Muhammad Ali e do corredor Jesse Owens, os únicos esportistas guindados ao cume da história humana, ao lado dos grandes artistas, intelectuais e líderes políticos, entre eles Fidel Castro Ruz.
Sem Pelé, talvez fosse inimaginável o papel do futebol como entretenimento de multidões e fator de construção da identidade nacional de tantos povos. Suas idéias e valores eventualmente tenham sido sempre conservadores, mas foi um dos primeiros negros e pobres a conquistar espaço em um mundo de ricos brancos.
O comandante deveria prestar mais atenção a essa história. Aos fatos, números, cenas e conquistas. Maradona é um amigo, mora do lado esquerdo do peito, companheiro Fidel, mas não é primus inter pares. Em nome da unidade latino-americana, e por seus próprios méritos, basta que seja tratado como o mais talentoso e rebelde súdito do rei de todos os campos e estádios, de todas as épocas e gerações.
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Mídia e Copa: o mundo reduzido ao futebol
Reproduzo artigo do professor Venício Lima, publicado no Observatório da Imprensa:
Não existe melhor exemplo para expressar aquilo que o professor canadense Marshall McLuhan (1911-1980) denominou “aldeia global”, há mais de quatro décadas. A tecnologia tornou possível que as imagens da Copa do Mundo de Futebol estejam disponíveis em todo o planeta, ao vivo, simultaneamente.
Haverá outro evento midiático capaz de interessar e mobilizar tanta gente? No Brasil, quando está envolvida a “seleção canarinho”, já dizia com propriedade Nelson Rodrigues: é a pátria que está de chuteiras.
São trinta dias corridos, cerimônias de abertura e encerramento, 64 jogos ao vivo (124 horas), treinos, entrevistas, reportagens especiais, etc. etc. Duas redes abertas – a Globo e a Band –, os canais de esporte da TV paga e as demais emissoras (que não estão transmitindo os jogos), com programação especial. Só a Globo tem 300 pessoas na Copa: 220 profissionais que foram do Brasil e mais 80 terceirizados contratados na África do Sul. E, por óbvio, não é só a televisão, nem o rádio. Jornais e revistas também “entram no clima” da Copa.
Ademais, é neste dias que a predominância da lógica comercial da grande mídia se revela em sua dimensão plena. Além da “Jabulani” que rola, há muito dinheiro em jogo. E claro, o mundo da grande mídia parece reduzido ao futebol.
A British Petroleum
Um amigo chama minha atenção para a cobertura “enviesada” que a grande mídia está fazendo, nestes dias de Copa do Mundo, do gigantesco vazamento de óleo provocado pela empresa “inglesa” Bristish Petroleum, no golfo do México. Segundo ele, este pode ter sido o maior desastre ecológico do mundo. Todo o golfo poderá ter sua fauna e flora marinha comprometida de forma irreversível. E, no entanto, a grande mídia, não dá ao desastre a dimensão que ele deveria ter.
Primeiro, na maioria das vezes, a grande mídia se refere à British Petroleum apenas como “BP”. Estaria em andamento uma estratégia de RP para, escamotear de qual país é a empresa responsável pelo desastre ecológico?
Segundo, onde está o Greenpeace? Onde estão O Globo, a Rede Globo, a Folha, o Estadão, a CBN e seus “analistas políticos”, os "econômicos", os "apresentadores", as "ONGs", ambientalistas, verdes, igrejas, atores hollywoodianos? Onde estão todos que se manifestaram ruidosamente por ocasião do leilão da hidrelétrica de Belo Monte?
Terceiro, a grande mídia faz o jogo da Casa Branca, anunciando que o presidente Barack Obama “quer saber em quem ele tem que dar um chute no traseiro”, como se um acidente que é devastador para a humanidade pudesse ser resolvido dessa forma.
E por último, há comentaristas que tentam até mesmo trazer a questão para o Brasil insinuando que o desastre no Golfo do México “deve alertar os brasileiros para a exploração e prospecção da Petrobrás no pré-sal”.
Interesse público
Por óbvio, os problemas da cobertura do desastre ecológico provocado pela British Petroleum no golfo do México não ocorrem apenas em períodos quando a agenda midiática está inteiramente submetida à lógica comercial de eventos da proporção de uma Copa do Mundo. Nestes períodos eles apenas se acentuam.
Por isso – e apesar de todo o envolvimento histórico cultural que os brasileiros temos com o esporte bretão – nunca é demais lembrar que, mesmo em época de Copa, o interesse público vai muito além do entretenimento e o mundo não se reduz ao futebol.
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Não existe melhor exemplo para expressar aquilo que o professor canadense Marshall McLuhan (1911-1980) denominou “aldeia global”, há mais de quatro décadas. A tecnologia tornou possível que as imagens da Copa do Mundo de Futebol estejam disponíveis em todo o planeta, ao vivo, simultaneamente.
Haverá outro evento midiático capaz de interessar e mobilizar tanta gente? No Brasil, quando está envolvida a “seleção canarinho”, já dizia com propriedade Nelson Rodrigues: é a pátria que está de chuteiras.
São trinta dias corridos, cerimônias de abertura e encerramento, 64 jogos ao vivo (124 horas), treinos, entrevistas, reportagens especiais, etc. etc. Duas redes abertas – a Globo e a Band –, os canais de esporte da TV paga e as demais emissoras (que não estão transmitindo os jogos), com programação especial. Só a Globo tem 300 pessoas na Copa: 220 profissionais que foram do Brasil e mais 80 terceirizados contratados na África do Sul. E, por óbvio, não é só a televisão, nem o rádio. Jornais e revistas também “entram no clima” da Copa.
Ademais, é neste dias que a predominância da lógica comercial da grande mídia se revela em sua dimensão plena. Além da “Jabulani” que rola, há muito dinheiro em jogo. E claro, o mundo da grande mídia parece reduzido ao futebol.
A British Petroleum
Um amigo chama minha atenção para a cobertura “enviesada” que a grande mídia está fazendo, nestes dias de Copa do Mundo, do gigantesco vazamento de óleo provocado pela empresa “inglesa” Bristish Petroleum, no golfo do México. Segundo ele, este pode ter sido o maior desastre ecológico do mundo. Todo o golfo poderá ter sua fauna e flora marinha comprometida de forma irreversível. E, no entanto, a grande mídia, não dá ao desastre a dimensão que ele deveria ter.
Primeiro, na maioria das vezes, a grande mídia se refere à British Petroleum apenas como “BP”. Estaria em andamento uma estratégia de RP para, escamotear de qual país é a empresa responsável pelo desastre ecológico?
Segundo, onde está o Greenpeace? Onde estão O Globo, a Rede Globo, a Folha, o Estadão, a CBN e seus “analistas políticos”, os "econômicos", os "apresentadores", as "ONGs", ambientalistas, verdes, igrejas, atores hollywoodianos? Onde estão todos que se manifestaram ruidosamente por ocasião do leilão da hidrelétrica de Belo Monte?
Terceiro, a grande mídia faz o jogo da Casa Branca, anunciando que o presidente Barack Obama “quer saber em quem ele tem que dar um chute no traseiro”, como se um acidente que é devastador para a humanidade pudesse ser resolvido dessa forma.
E por último, há comentaristas que tentam até mesmo trazer a questão para o Brasil insinuando que o desastre no Golfo do México “deve alertar os brasileiros para a exploração e prospecção da Petrobrás no pré-sal”.
Interesse público
Por óbvio, os problemas da cobertura do desastre ecológico provocado pela British Petroleum no golfo do México não ocorrem apenas em períodos quando a agenda midiática está inteiramente submetida à lógica comercial de eventos da proporção de uma Copa do Mundo. Nestes períodos eles apenas se acentuam.
Por isso – e apesar de todo o envolvimento histórico cultural que os brasileiros temos com o esporte bretão – nunca é demais lembrar que, mesmo em época de Copa, o interesse público vai muito além do entretenimento e o mundo não se reduz ao futebol.
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Copa 2010: Consensos de Roma e Washington
Reproduzo artigo de Breno Altman, publicado no sítio Opera Mundi:
O ano de 1990 foi marcante por vários motivos. A última década do século XX abria-se com os derradeiros suspiros da União Soviética e a consolidação da hegemonia dos Estados Unidos. O modelo vitorioso, baseado no predomínio do livre-mercado, era oficialmente adotado como receita oficial pelas instituições financeiras. Em homenagem à cidade onde economistas do FMI, do Banco Mundial e do Departamento do Tesouro norte-americano elencaram seus mandamentos, a fórmula acabou batizada como Consenso de Washington.
No universo paralelo do futebol, a Itália abrigava a XIV Copa do Mundo. Na opinião de muitos analistas, a mais feia e encardida de todas as disputas entre seleções desde 1930. Como se as utopias e os sonhos de uma nova sociedade, fulminados pela derrocada soviética, tivessem seu ocaso transposto, de alguma maneira, também para o império da bola. Mas em um sentido eventualmente inverso: a magia e a arte cediam lugar à tecnocracia e à engenharia.
Com a exceção solitária da esfuziante equipe de Camarões, as demais seleções sucumbiram ao futebol-força praticado pelos europeus, particularmente alemães e italianos. Forjava-se o Consenso de Roma. Bons resultados somente seriam alcançados com estratégias de predomínio defensivo, meio-campo dedicado à marcação, submissão da técnica à tática, velocidade de contra-ataque e substituição do toque e do drible pelos lances aéreos e bolas paradas.
Os argentinos de Maradona e Caniggia, é verdade, resistiram um pouco à ofensiva conservadora. Mas foram apenas uma sombra do selecionado criativo e audaz de 1986. Caíram na final, diante da Alemanha, exibindo um futebol desidratado e sem inspiração. Ao contrário do que ocorrera na copa anterior, quando derrotaram o mesmo adversário em uma partida cheia de emoção e invenção.
O caso mais emblemático de subordinação aos ditames europeus, no entanto, provavelmente tenha sido a seleção brasileira. Pelo papel que representa no imaginário dos estádios, a capitulação do time dirigido por Sebastião Lazaroni expressou momento sublime para a consolidação do futebol-planilha. O Brasil, lendário bastião da liberdade e do espetáculo nos campos da bola, se dobrava à hegemonia de líberos e volantes mesmo às custas da humilhação.
O técnico Lazaroni é um personagem menor, quase insignificante. Mas a ele coube a missão de domesticar o futebol brasileiro depois das derrotas de 1982 e 1986. Não deixa de ser ilustrativo que um treinador irrelevante tenha sido o coveiro da tradição brasileira. Outros vieram depois dele, mais preparados e vitoriosos. O criador da era Dunga, porém, do alto de sua mediocridade, foi quem abriu os portões para a cavalaria tártara do burocratismo ítalo-saxônico.
Essa tarefa somente poderia estar nas mãos de uma figura inexpressiva, que pudesse ser moldada pelos interesses da elite futebolística e seus patrocinadores. O longo tempo sem títulos mundiais atrapalhava os negócios. O estilo reverenciado por Telê Santana passou a ser visto como incompatível com o triunfo e a caixa registradora.
Lazaroni foi parido pelo complexo de inferioridade tão próprio às oligarquias nacionais, inclusive aquelas que mandam no futebol. As derrotas nas duas copas anteriores não podiam ser analisadas, por essa gente e seus áulicos na imprensa, como eventualidades ou acidentes naturais ao esporte. Nada disso: a seleção brasileira tinha perdido porque insistira em ser diferente quando o mundo era cada vez mais homogêneo.
O que veio em seguida é história. O Brasil ganhou e perdeu copas nos marcos desse conservadorismo. Mesmo com alguns jogadores fantásticos, nunca mais voltou a dar espetáculos como na safra do tricampeonato ou nas antológicas derrotas de 1950 e 1982. O medo nos fez escolher sermos iguais aos piores. A vitória de 1994, para tristeza da arte, carimbou essa opção como virtuosa.
Sequer os novatos africanos, a bem da verdade, escaparam dessa força gravitacional que empurra o futebol para o lugar comum. O livre fluxo de atletas e treinadores, determinado pelos recursos financeiros dos clubes europeus, consolidou um pensamento único também no mundo da bola.
Aqui termina, contudo, o paralelo entre os dois consensos. O de Washington, afinal, foi estraçalhado pela crise financeira atual. O de Roma ainda vive em apogeu. Quem sabe alguma seleção terá a coragem de romper com seu primado nos campos da África do Sul. Muito difícil que esse papel seja exercido pelo time de Dunga, o filhote de Lazaroni.
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O ano de 1990 foi marcante por vários motivos. A última década do século XX abria-se com os derradeiros suspiros da União Soviética e a consolidação da hegemonia dos Estados Unidos. O modelo vitorioso, baseado no predomínio do livre-mercado, era oficialmente adotado como receita oficial pelas instituições financeiras. Em homenagem à cidade onde economistas do FMI, do Banco Mundial e do Departamento do Tesouro norte-americano elencaram seus mandamentos, a fórmula acabou batizada como Consenso de Washington.
No universo paralelo do futebol, a Itália abrigava a XIV Copa do Mundo. Na opinião de muitos analistas, a mais feia e encardida de todas as disputas entre seleções desde 1930. Como se as utopias e os sonhos de uma nova sociedade, fulminados pela derrocada soviética, tivessem seu ocaso transposto, de alguma maneira, também para o império da bola. Mas em um sentido eventualmente inverso: a magia e a arte cediam lugar à tecnocracia e à engenharia.
Com a exceção solitária da esfuziante equipe de Camarões, as demais seleções sucumbiram ao futebol-força praticado pelos europeus, particularmente alemães e italianos. Forjava-se o Consenso de Roma. Bons resultados somente seriam alcançados com estratégias de predomínio defensivo, meio-campo dedicado à marcação, submissão da técnica à tática, velocidade de contra-ataque e substituição do toque e do drible pelos lances aéreos e bolas paradas.
Os argentinos de Maradona e Caniggia, é verdade, resistiram um pouco à ofensiva conservadora. Mas foram apenas uma sombra do selecionado criativo e audaz de 1986. Caíram na final, diante da Alemanha, exibindo um futebol desidratado e sem inspiração. Ao contrário do que ocorrera na copa anterior, quando derrotaram o mesmo adversário em uma partida cheia de emoção e invenção.
O caso mais emblemático de subordinação aos ditames europeus, no entanto, provavelmente tenha sido a seleção brasileira. Pelo papel que representa no imaginário dos estádios, a capitulação do time dirigido por Sebastião Lazaroni expressou momento sublime para a consolidação do futebol-planilha. O Brasil, lendário bastião da liberdade e do espetáculo nos campos da bola, se dobrava à hegemonia de líberos e volantes mesmo às custas da humilhação.
O técnico Lazaroni é um personagem menor, quase insignificante. Mas a ele coube a missão de domesticar o futebol brasileiro depois das derrotas de 1982 e 1986. Não deixa de ser ilustrativo que um treinador irrelevante tenha sido o coveiro da tradição brasileira. Outros vieram depois dele, mais preparados e vitoriosos. O criador da era Dunga, porém, do alto de sua mediocridade, foi quem abriu os portões para a cavalaria tártara do burocratismo ítalo-saxônico.
Essa tarefa somente poderia estar nas mãos de uma figura inexpressiva, que pudesse ser moldada pelos interesses da elite futebolística e seus patrocinadores. O longo tempo sem títulos mundiais atrapalhava os negócios. O estilo reverenciado por Telê Santana passou a ser visto como incompatível com o triunfo e a caixa registradora.
Lazaroni foi parido pelo complexo de inferioridade tão próprio às oligarquias nacionais, inclusive aquelas que mandam no futebol. As derrotas nas duas copas anteriores não podiam ser analisadas, por essa gente e seus áulicos na imprensa, como eventualidades ou acidentes naturais ao esporte. Nada disso: a seleção brasileira tinha perdido porque insistira em ser diferente quando o mundo era cada vez mais homogêneo.
O que veio em seguida é história. O Brasil ganhou e perdeu copas nos marcos desse conservadorismo. Mesmo com alguns jogadores fantásticos, nunca mais voltou a dar espetáculos como na safra do tricampeonato ou nas antológicas derrotas de 1950 e 1982. O medo nos fez escolher sermos iguais aos piores. A vitória de 1994, para tristeza da arte, carimbou essa opção como virtuosa.
Sequer os novatos africanos, a bem da verdade, escaparam dessa força gravitacional que empurra o futebol para o lugar comum. O livre fluxo de atletas e treinadores, determinado pelos recursos financeiros dos clubes europeus, consolidou um pensamento único também no mundo da bola.
Aqui termina, contudo, o paralelo entre os dois consensos. O de Washington, afinal, foi estraçalhado pela crise financeira atual. O de Roma ainda vive em apogeu. Quem sabe alguma seleção terá a coragem de romper com seu primado nos campos da África do Sul. Muito difícil que esse papel seja exercido pelo time de Dunga, o filhote de Lazaroni.
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A face ocultada do futebol
Reproduzo artigo do professor Laurindo Lalo Leal Filho, publicado no sítio Carta Maior:
Está no ar o maior espetáculo de televisão. Em audiência nada bate a Copa do Mundo. Na Alemanha, em 2006, os 64 jogos foram vistos por 26 bilhões de telespectadores, número que neste ano pode alcançar os 30 bilhões.
São 60 bilhões de olhos vendidos pela FIFA para as emissoras de TV comercializarem com os seus anunciantes. As cifras envolvidas em dinheiro são estratosféricas. Ganham a Federação internacional, as empresas de televisão e os anunciantes reforçando marcas e alavancando a venda de produtos e serviços.
Um ciclo perfeito, onde nada pode ser criticado. Normalmente, a TV no Brasil não critica os jogos transmitidos já que, dentro da lógica empresarial, seria um contrasenso mostrar defeitos do próprio produto. E o futebol, para a TV, nada mais é do que um dos seus produtos, assim como as novelas e os programas de auditório.
Dessa forma se todos ganham e não há criticas, o grande espetáculo do futebol, em sua dimensão máxima que é a Copa do Mundo, chegaria as raias da perfeição. Pelo menos é que mostra a TV.
Mas, e ainda bem que há um mas nessa história, a TV Brasil e a TV Câmara mostraram no programa VerTV alguns aspectos da face do futebol que é ocultada pela TV comercial. Sócrates, o capitão da seleção brasileira de 1982 e o jornalista José Cruz, levantaram algumas pontas do véu que cobre, não apenas o futebol, mas grande parte de toda a estrutura esportiva existente no Brasil.
Para começar não é verdade que todos ganham. Há quem perda, e são muitos. Por exemplo, os jovens que por força da TV associam desde cedo o sucesso esportivo com o consumo de cerveja. Ou desprezam o estudo, uma vez que seus ídolos não precisaram dele para alcançar a glória e a fama.
No programa, Sócrates foi enfático: “A TV vende o sonho do consumo. Vende atitude, aparência, comportamento, moda. Mas, é incapaz de vender educação. E vender esporte sem educação é um crime. Mostram ídolos do futebol que não estudam e são um péssimo exemplo para a sociedade. E não por culpa deles apenas. O sistema estimula que saiam da escola”.
Afirmação que desperta uma curiosidade. A mídia revela diariamente minúcias da vida dos jogadores. Onde vivem, que carros possuem, como são suas casas e suas famílias. Só não dizem até que ano estudaram, em quais escolas, como eram enquanto alunos. Por que será? Sócrates responde: “a ignorância dos jogadores é estimulada pelo sistema. A ele não interessam profissionais com possibilidade de critica”.
O jornalista José Cruz mostra outras perdas. De toda a sociedade. Por exemplo, com a irresponsabilidade dos dirigentes esportivos nos clubes, federações e confederações. Embora privadas, essas entidades recebem dinheiro público e, por isso, deveriam prestar contas publicamente. “As loterias esportivas repassam dinheiro para o futebol. A Timemania está hoje tapando o buraco das dívidas fiscais dos clubes produzidas por dirigentes irresponsáveis”.
E mostra outras perdas sociais. A do dinheiro público desperdiçado, por exemplo, nos Jogos Panamericanos do Rio, em 2007. Dá dois exemplos retirados do relatório do Tribunal de Contas da União: “a compra de 5 mil tochas para serem acesas no evento, das quais só chegaram 500 e, ainda assim apenas 380 foram aproveitadas e a descoberta, depois dos Jogos, pelos auditores do TCU, de 880 caixas contendo aparelhos de ar condicionado que sequer foram abertas. E tudo isso segue impune”.
Tanto Sócrates, como José Cruz, alertam para o fato da seleção nacional e dos seus jogos serem eventos públicos que, no entanto, estão totalmente privatizados. “A seleção brasileira – que usa as cores, o hino e a bandeira do nosso pais – deveria ter parte de suas receitas revertidas para o futebol brasileiro, muito pobre em várias regiões do Brasil”, diz o jornalista.
Sócrates lamenta o volume de recursos jogados fora pela falta de uma política esportiva de Estado. Para ele “o esporte deveria ser um braço da saúde e da educação. Se não ele fica solto” e aponta a deficiência dos cursos de Educação Física: “não há um que trate o esporte com viés comunitário. É tudo individualista”.
E há mais. Quem quiser saber basta entrar no site da TV Câmara, clicar em “conhecer os programas” e depois no VerTV. Lá revela-se um pouco do que a TV comercial teima em ocultar.
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Está no ar o maior espetáculo de televisão. Em audiência nada bate a Copa do Mundo. Na Alemanha, em 2006, os 64 jogos foram vistos por 26 bilhões de telespectadores, número que neste ano pode alcançar os 30 bilhões.
São 60 bilhões de olhos vendidos pela FIFA para as emissoras de TV comercializarem com os seus anunciantes. As cifras envolvidas em dinheiro são estratosféricas. Ganham a Federação internacional, as empresas de televisão e os anunciantes reforçando marcas e alavancando a venda de produtos e serviços.
Um ciclo perfeito, onde nada pode ser criticado. Normalmente, a TV no Brasil não critica os jogos transmitidos já que, dentro da lógica empresarial, seria um contrasenso mostrar defeitos do próprio produto. E o futebol, para a TV, nada mais é do que um dos seus produtos, assim como as novelas e os programas de auditório.
Dessa forma se todos ganham e não há criticas, o grande espetáculo do futebol, em sua dimensão máxima que é a Copa do Mundo, chegaria as raias da perfeição. Pelo menos é que mostra a TV.
Mas, e ainda bem que há um mas nessa história, a TV Brasil e a TV Câmara mostraram no programa VerTV alguns aspectos da face do futebol que é ocultada pela TV comercial. Sócrates, o capitão da seleção brasileira de 1982 e o jornalista José Cruz, levantaram algumas pontas do véu que cobre, não apenas o futebol, mas grande parte de toda a estrutura esportiva existente no Brasil.
Para começar não é verdade que todos ganham. Há quem perda, e são muitos. Por exemplo, os jovens que por força da TV associam desde cedo o sucesso esportivo com o consumo de cerveja. Ou desprezam o estudo, uma vez que seus ídolos não precisaram dele para alcançar a glória e a fama.
No programa, Sócrates foi enfático: “A TV vende o sonho do consumo. Vende atitude, aparência, comportamento, moda. Mas, é incapaz de vender educação. E vender esporte sem educação é um crime. Mostram ídolos do futebol que não estudam e são um péssimo exemplo para a sociedade. E não por culpa deles apenas. O sistema estimula que saiam da escola”.
Afirmação que desperta uma curiosidade. A mídia revela diariamente minúcias da vida dos jogadores. Onde vivem, que carros possuem, como são suas casas e suas famílias. Só não dizem até que ano estudaram, em quais escolas, como eram enquanto alunos. Por que será? Sócrates responde: “a ignorância dos jogadores é estimulada pelo sistema. A ele não interessam profissionais com possibilidade de critica”.
O jornalista José Cruz mostra outras perdas. De toda a sociedade. Por exemplo, com a irresponsabilidade dos dirigentes esportivos nos clubes, federações e confederações. Embora privadas, essas entidades recebem dinheiro público e, por isso, deveriam prestar contas publicamente. “As loterias esportivas repassam dinheiro para o futebol. A Timemania está hoje tapando o buraco das dívidas fiscais dos clubes produzidas por dirigentes irresponsáveis”.
E mostra outras perdas sociais. A do dinheiro público desperdiçado, por exemplo, nos Jogos Panamericanos do Rio, em 2007. Dá dois exemplos retirados do relatório do Tribunal de Contas da União: “a compra de 5 mil tochas para serem acesas no evento, das quais só chegaram 500 e, ainda assim apenas 380 foram aproveitadas e a descoberta, depois dos Jogos, pelos auditores do TCU, de 880 caixas contendo aparelhos de ar condicionado que sequer foram abertas. E tudo isso segue impune”.
Tanto Sócrates, como José Cruz, alertam para o fato da seleção nacional e dos seus jogos serem eventos públicos que, no entanto, estão totalmente privatizados. “A seleção brasileira – que usa as cores, o hino e a bandeira do nosso pais – deveria ter parte de suas receitas revertidas para o futebol brasileiro, muito pobre em várias regiões do Brasil”, diz o jornalista.
Sócrates lamenta o volume de recursos jogados fora pela falta de uma política esportiva de Estado. Para ele “o esporte deveria ser um braço da saúde e da educação. Se não ele fica solto” e aponta a deficiência dos cursos de Educação Física: “não há um que trate o esporte com viés comunitário. É tudo individualista”.
E há mais. Quem quiser saber basta entrar no site da TV Câmara, clicar em “conhecer os programas” e depois no VerTV. Lá revela-se um pouco do que a TV comercial teima em ocultar.
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Homenagens do MST a José Saramago
Reproduzo mensagem de João Pedro Stedile e poema de Ademar Bogo, dirigentes do MST:
A partida de nosso amigo Saramago!
A literatura universal e portuguesa, em especial, perde seu patrono maior. Samarago projetou como ninguem a beleza de nosso idioma em seus contos e ensaios. Como militante social, soube refletir no seu primeiro livro a tragedia do camponês português, "Plantados do chão", na luta para ver a terra dividida.
O MST teve o privilégio e a honra de ter seu envolvimento militante, quando somou-se ao projeto de Sebastiao Salgado e Chico Buarque, e nos ajudou a difundir com sua letra a exposição “Terra”. E graças aos livros e fotos dos três, pudemos iniciar a construção de nossa escola nacional. Seremos sempre gratos à sua solidariedade.
Pessoalmente, sinto-me extremamente lisonjeado por ter podido conhecê-lo. Deixou um legado enorme na literatura, na militancia e no compromisso com as causas justas. Por isso será eterno (João Pedro Stedile).
Suspiros Lusitanos (Ademar Bogo)
Se um suspiro, leve e lusitano
Zumbir nas almas das nações imensas
É o comunista que para além das crenças
Silenciosamente da vida física se dispensa.
Vai pessoalmente viver a eternidade
E olhar de perto na tez do criador
Que pelas criaturas foi subjugado
E obrigado a justificar o horror.
Irá verificar que as guerras entre os deuses não existem
Pois são apenas conflitos da existência
Que os homens criam e põe-se a conflitar
Pedindo a Deus que tome providências.
E faça sempre o mais forte vitorioso
Abençoado pelas cruéis vitórias
Para deixar nos livros registrados
Os escritos que reflitam a superior memória.
Tudo o que disse são sobre os seus dilemas
Ficam como dizeres formulados
Se não dava nem acreditava em conselhos
É porque queria vê-los por conta experimentados.
Os próprios passos seriam os conselheiros
E os conselheiros caminhantes e aprendizes;
Se os erros deveriam ser experiênciados
Com os acertos formariam matrizes.
Era a crença de um apaixonado
Que a si mesmo o saber se concedeu
Porque acima de todas as verdades
Acreditava que não existe o absoluto ateu.
Por sobre as oliveiras e as corticeiras
Versos e letras irradiarão verdades
A qualquer tempo virarão consciências
E viverás nos povos em forma de saudades.
Assim abrimos o tempo enlutado
Para purgar a dor do prejuízo humano
Se no passado choramos escravizados
Hoje, nossos suspiros também são lusitanos.
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A partida de nosso amigo Saramago!
A literatura universal e portuguesa, em especial, perde seu patrono maior. Samarago projetou como ninguem a beleza de nosso idioma em seus contos e ensaios. Como militante social, soube refletir no seu primeiro livro a tragedia do camponês português, "Plantados do chão", na luta para ver a terra dividida.
O MST teve o privilégio e a honra de ter seu envolvimento militante, quando somou-se ao projeto de Sebastiao Salgado e Chico Buarque, e nos ajudou a difundir com sua letra a exposição “Terra”. E graças aos livros e fotos dos três, pudemos iniciar a construção de nossa escola nacional. Seremos sempre gratos à sua solidariedade.
Pessoalmente, sinto-me extremamente lisonjeado por ter podido conhecê-lo. Deixou um legado enorme na literatura, na militancia e no compromisso com as causas justas. Por isso será eterno (João Pedro Stedile).
Suspiros Lusitanos (Ademar Bogo)
Se um suspiro, leve e lusitano
Zumbir nas almas das nações imensas
É o comunista que para além das crenças
Silenciosamente da vida física se dispensa.
Vai pessoalmente viver a eternidade
E olhar de perto na tez do criador
Que pelas criaturas foi subjugado
E obrigado a justificar o horror.
Irá verificar que as guerras entre os deuses não existem
Pois são apenas conflitos da existência
Que os homens criam e põe-se a conflitar
Pedindo a Deus que tome providências.
E faça sempre o mais forte vitorioso
Abençoado pelas cruéis vitórias
Para deixar nos livros registrados
Os escritos que reflitam a superior memória.
Tudo o que disse são sobre os seus dilemas
Ficam como dizeres formulados
Se não dava nem acreditava em conselhos
É porque queria vê-los por conta experimentados.
Os próprios passos seriam os conselheiros
E os conselheiros caminhantes e aprendizes;
Se os erros deveriam ser experiênciados
Com os acertos formariam matrizes.
Era a crença de um apaixonado
Que a si mesmo o saber se concedeu
Porque acima de todas as verdades
Acreditava que não existe o absoluto ateu.
Por sobre as oliveiras e as corticeiras
Versos e letras irradiarão verdades
A qualquer tempo virarão consciências
E viverás nos povos em forma de saudades.
Assim abrimos o tempo enlutado
Para purgar a dor do prejuízo humano
Se no passado choramos escravizados
Hoje, nossos suspiros também são lusitanos.
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sexta-feira, 18 de junho de 2010
José Saramago, o militante comunista
Reproduzo nota do Partido Comunista Português, que ressalta a militância política do genial escritor José Saramago – coisa que a mídia hegemônica tentará apagar nas suas mensagens de condolências:
A morte de José Saramago constitui uma perda irreparável para Portugal, para o povo português, para a cultura portuguesa.
A dimensão intelectual, artística, humana, cívica, de José Saramago fazem dele uma figura maior da nossa História.
A sua vasta, notável e singular obra literária – reconhecida com a atribuição, em 1998, do Prémio Nobel da Literatura - ficará como marca impressiva na História da Literatura Portuguesa, da qual ele é um dos nomes mais relevantes.
Construtor de Abril, enquanto interveniente ativo na resistência ao fascismo, ele deu continuidade a essa intervenção no período posterior ao Dia da Liberdade como protagonista do processo revolucionário que viria a transformar profunda e positivamente o nosso país com a construção de uma democracia que tinha como referência primeira a defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo e do país.
José Saramago era militante do Partido Comunista Português desde 1969 e a sua morte constitui uma perda para todo o coletivo partidário comunista - para o Partido que ele quis que fosse o seu até ao fim da sua vida.
O Secretariado do Comité Central do PCP manifesta o seu profundo pesar, a sua enorme mágoa pela morte do camarada José Saramago – e expressa as suas sentidas condolências à sua companheira, Pilar del Rio, e restante família.
Um sonho chamado Saramago
Reproduzo artigo de Rosângela Ribeiro Gil, publicado no sítio do Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC) em novembro de 2005. Ela reenviou o texto como uma singela homenagem ao grande escritor português, falecido nesta manhã:
Quando li a notícia não sosseguei mais. Coloquei na cabeça que iria chegar perto dele e até fazer uma entrevista. Fui atrás. Enviei mensagem para um, para outro. Até chegar no lugar certo: na assessoria da editora Companhia das Letras. Fiz contato. Fui cadastrada como jornalista ao lançamento mundial do livro “As intermitências da morte”, de José Saramago.
Mais de mil pessoas acompanharam as palavras do prêmio Nobel de Literatura de 1998, no anfiteatro do Sesc Pinheiros, em São Paulo, no dia 27 de outubro último. Estávamos lá, representando o NPC, quase na fila do gargarejo. Mas Saramago estava totalmente “inviolável” ao assédio da imprensa, do público e dos fãs. O escritor tomou assento à mesa no centro de um palco totalmente negro. Ele também de preto, como se estivesse de luto. Bem comportado, o escritor português falou para o público por mais de 30 minutos. Fez o público rir. Foi aplaudido várias vezes. E, ao final, foi aplaudido de pé por um público rendido ao ídolo.
Levantou-se, cumprimentou mais uma vez o público e sumiu por de trás do palco entre as cortinas negras. Em frações de segundos. Não deu tempo nem de chegar perto do palco. Saramago já havia sumido. Fez a sua intermitência.
O público deu meia volta. E, como numa procissão, bem devagar, e com certa paciência, seguiu por escadas rolantes até chegar a uma pequena rampa onde aguardou o início da noite de autógrafos. A fila era imensa (será que todos esperaram a sua vez?).
Saramago chegou à mesa de autógrafo logo depois das 22 horas. Com o seu terno preto impecável, andar calmo e firme, ainda consegui parar por alguns segundos o escritor e entregar a agenda “A Comunicação dia-a-dia 2005” do Núcleo Piratininga de Comunicação. Balbuciei algumas palavras... “um presente para o senhor”. O segurança ao lado já logo olhou e fez o caminho ser seguido. Ainda deu tempo de Saramago fazer um gesto de agradecimento com a mão direita. No mais, aquela noite era para os fãs, mesmo à distância. A imprensa apenas pôde fotografar e filmar. A entrevista coletiva seria no dia seguinte, às 10h30, também no Sesc Pinheiros.
No meio de uma frustração, já que queria trazer em primeira-mão uma entrevista exclusiva para os leitores do Boletim NPC, acabei pensando numa alternativa para brindar os nossos amigos. Foi daí que surgiu a idéia de transcrever a apresentação de Saramago naquele dia 27 de outubro.
Saramago escreve sobre um dos temas mais caros para a humanidade. Objeto do pensamento ocidental ao longo da nossa História, a morte, ou a vontade da eternidade, está na ciência, na arte, na filosofia, na literatura. Assunto recorrente, a morte estará nas páginas bíblicas, nos versos de Ilíada e da Odisséia. Enfim, em tudo. Estará em toda a nossa vida.
Heidegger, Spinoza, Hegel, Sartre, Platão e tantos outros vão tratar, de uma forma ou de outra, do significado da morte, ou do seu reverso, a vida. “Nunca encontrei, ainda, a mulher da qual desejaria ter filhos, a não ser esta mulher que amo: pois eu te amo, ó eternidade!”, assim falou Zaratustra, de Nietzsche. Para Saramago, a morte também é feminina.
Não podemos deixar de mencionar o gesto carinhoso com o qual José Saramago se despediu do público naquela noite paulistana. Cruzou os dois braços à frente do seu peito como num abraço bem apertado e próximo do coração.
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Um novo barão da mídia
Reproduzo artigo de Anselmo Massad, publicado na edição de junho da Revista do Brasil:
Se as comunicações no Brasil são dominadas por dez famílias ou grupos empresariais, um novo barão surge para confrontar a mídia convencional. O Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé foi lançado em maio.
Na sede do Sindicato dos Engenheiros de São Paulo, um debate reuniu jornalistas e blogueiros para uma série de discussões. Na primeira, Paulo Henrique Amorim, Maria Inês Nassif e Leandro Fortes discutiram a mídia e as eleições deste ano.
O nome da organização homenageia o jornalista Apparício Torelli, que criou o pseudônimo Barão de Itararé, em referência à cidade paranaense palco de uma batalha – que não se concretizou – na Revolução de 1930. O gaúcho radicou-se no Rio de Janeiro, onde fundou o jornal A Manha, com características progressistas, condizentes com suas opções ideológicas. Ele chegou a ser eleito vereador carioca pelo então Partido Comunista Brasileiro, o PCB de Luiz Carlos Prestes.
Para Altamiro Borges, presidente do Centro, entre os objetivos do barão está a busca pela democratização da comunicação, fortalecer mídias alternativas, comunitárias e públicas, investir em formação crítica de produtores de mídia e estudar o setor.
“Há mais pessoas hoje preocupadas com o direito à comunicação, antenadas com essa questão estratégica, mas sem uma militância mais permanente”, avalia Borges. “Um dos nossos objetivos é ajudar a formar essa militância que luta pelo fortalecimento das mídias alternativas”, explica.
A entidade nasce com um conselho consultivo de 48 pessoas – e crescendo –, com representantes de entidades sintonizadas na luta pelo direito à informação e por outra mídia. Paulo Salvador, do Núcleo de Planejamento da Revista do Brasil, está entre os integrantes.
O barão, por sua vez, é autor de frases de efeito que se tornaram pérolas da sabedoria popular. Uma delas, destacada pelos organizadores, vem bem a calhar: “Nunca desista de seu sonho. Se ele acabou numa padaria, procure em outra”.
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Venício Lima: “A mídia fala pelo povo”
Reproduzo entrevista concecida à jornalista Paula Thomaz para o sítio da revista CartaCapital:
Em entrevista à CartaCapital o sociólogo e jornalista Venício A. de Lima, que é coordenador e pesquisador sênior do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política da UnB, fala de seu livro “Liberdade de imprensa x Liberdade de expressão – Direito à comunicação e democracia”, recém lançado pela editora Publisher Brasil.
Lima questiona o paradoxo nos debates sobre o tema de sua obra e a diferenciação entre os conceitos de liberdade de imprensa e de expressão. O sociólogo afirma que os grandes grupos de mídia se utilizam de seus veículos para dizer o que querem, como se fosse a própria expressão da sociedade. Lima critica essa atitude dos conglomerados, que, ao publicarem o que bem entendem, agem como censores e que há um consenso sobre a privatização da censura que acontece muito mais fora do Estado do que pelo próprio Estado, já que o cidadão não pode intervir. Para ele, a mídia tradicional tem resistido a qualquer tipo de regras para o setor. “E tem sido muito eficiente em dizer que qualquer tipo de regulação é censura”.
CartaCapital:O que fica marcante na sua obra é a disparidade que existe no conceito entre liberdade de imprensa e liberdade de expressão. Foi inevitável chegar a isso?
Venício A. de Lima: Inevitável eu acho que não. Foi ocorrendo historicamente e acabou num interesse da instituição imprensa que foi sendo criada, que foi se constituindo historicamente e esses conceitos foram sendo confundidos. Mas uma coisa que para mim é, num certo sentido, paradoxal é que eu tento fazer isso na introdução do livro e nos anexos dos documentos, que são em geral, usados como referência pela grande mídia e pelo judiciário para a discussão dessas questões. Em todos eles, sem exceção, há diferença entre os conceitos. Do primeiro ao último. Se você pegar qualquer um deles, por exemplo, a primeira constituição americana, tem liberdade de “speech”, a tradução correta para nós seria liberdade de expressão, liberdade de palavra e liberdade de “press”, que é a liberdade de imprensa.
A diferença existe desde sempre e mesmo quando a liberdade de imprensa aparece como liberdade fundamental que precisa ser defendida, historicamente ela se refere primeiro ao direito de imprimir, que é “print”, que é diferente de “press”, e depois há uma imprensa que não é a instituição imprensa do século XXI, ou mesmo da segunda metade do século XX. Era quase uma extensão do direito da fala, que queria dizer o direito individual de imprimir. Há um acordo no debate sobre essas questões que é feito fora do Brasil, de que, quando se refere à liberdade de imprensa, referindo-se ao início da publicação de algo – que poderia ser entendido como um periódico – ainda antes da existência de alguma coisa que pudesse ser parecida com os jornais, que nós temos hoje, são coisas muito diferentes.
A epígrafe do William Hocking, que cito no livro, ele toma como referência à revolução gloriosa na Inglaterra e a primeira emenda americana e fala que nós já temos experiência nesse assunto, mas as coisas mudaram muito e isso tem que ser repensado. Quer dizer, a imprensa não é mais aquela imprensa da época em que o conceito apareceu e, claro, nunca você pode comparar, do meu ponto de vista, sem fazer discussão jurídica, o direito individual de fala, de expressão, com o direito dos grandes grupos empresariais que publicam o que querem.
Nesse sentido eles são os próprios censores hoje.
Isso não é você nem eu que estamos falando. Claro que no Brasil tudo isso é diferente, estamos atrasados quase um século, pelo menos 60 e 70 anos. Nós estamos falando agora em autorregulação. Nos Estados Unidos isso existe desde a década de 20, no caso da indústria de cinema. Há consenso sobre a privatização da censura que acontece muito mais fora do Estado do que pelo Estado, inclusive no reconhecimento de que quando você faz critérios sobre liberdade de imprensa, são incluídos critérios sobre concentração da mídia. A OEA acabou de soltar um relatório imenso que coloca como condição para liberdade de imprensa uma desconcentração da propriedade. A nossa constituição fala nisso, mas o que acontece? Na hora dos julgamentos do Supremo essa condição para o exercício da liberdade de imprensa não é lembrada.
Desconcentração é a saída para reverter essa situação...
Cumprir a Constituição é uma coisa, é atacar de frente essa questão da concentração de propriedade que no Brasil é muito complicada, porque nunca houve qualquer preocupação da nossa legislação, que é praticamente inexistente nessa área, sobre propriedade cruzada. Nossos grupos de mídia mais importantes e os seus parceiros regionais são grupos multimídia porque foram fundados na propriedade cruzada, que é uma coisa regulamentada no mundo inteiro. No mesmo mercado, o mesmo grupo empresarial controla rádio AM, FM, televisão, provedor de internet.
Um monólogo midiático...
Eu morei no Rio Grande do Sul e lá, isso que você acabou de dizer é o fato cotidiano. A RBS controla rádios FM, AM, o jornal popular, o jornal de classe média, a TV aberta, a TV comunitária, o provedor de internet, os colunistas são os mesmos. Quer dizer, você não escapa. Agora, tem várias outras instituições liberais que já foram incorporadas pelas constituições de países como Alemanha, Espanha, Portugal, direito de resposta difuso, direito de antena, coisas que no Brasil não tem nem discussão. Você veja na Confecom, os empresários não querem nem participar, não querem discutir isso.
Nós, nessa área, realmente estamos com um atraso fenomenal em relação a outros países da América Latina que, recentemente, conseguiram, de uma forma ou de outra, por processos que, por mais polêmicos que sejam, pela polêmica que a grande mídia cria, foram processos dentro de um espaço democratizado, como no caso da Argentina, implementar uma lei de meios que a avança em muitas áreas no sentido da universalização da liberdade de expressão individual que, para mim, é o ponto crítico, de uma forma que nós ainda estamos há séculos [de distância]. Na semana passada, o ministro [da Comunicação Social] Franklin Martins falou numa audiência na Câmara que não há nenhuma chance de implementar nada da Confecom esse ano, que vai ficar para o próximo governo. Quer dizer, nós não vamos conseguir mandar.
Você acha que a Confecom ainda não obteve o reconhecimento esperado?
Obteve no sentido de que foi convocada pelo governo, podia não ter sido. Acho que foi positivo. Mas veja, seis meses depois é que saiu o caderno oficial com as propostas que estão sendo organizadas. Existe uma comissão lá na Câmara que viu quais as propostas que já são objeto de projetos que estão tramitando, mas concretamente (a proposta de criação de um Conselho Nacional de Comunicação como um órgão, um espaço de debate dessa questões etc., teria de regulamentar) o próprio Franklin descartou completamente, disse que isso é no final do processo e não no início. O próprio Conselho de Comunicação que é um órgão auxiliar do Congresso não se reúne desde 2006 porque a mesa diretora não nomeia os novos membros. Nós estamos muito atrasados.
Você cita o caso da ANJ e a utilização dos termos dessa maneira confusa na publicidade que comemora os 30 anos da entidade. Teoricamente isso não deveria acontecer.
É uma confusão deliberada. Quem é que é contra a liberdade de expressão, você conhece? Não existe. Isso eles associam a um direito básico que ninguém é contra e se coloca na posição de defesa de algo que ninguém é contra. É a linha da ANJ. Essa ANJ é dirigida pela Judith Brito que é superintende do Grupo Folha, ela admitiu publicamente que os jornais são partidarizados, fazem oposição ao governo, tudo escancarado.
Falta debate público?
Nós não temos tradição de debate público nessa área. Nossos jornais são jornais historicamente elitistas. A situação dos nossos veículos impressos, por exemplo, houve épocas de tiragem importantes, mas sempre pequenas, à exceção da Veja que diz tirar um milhão de exemplares – que é um número impressionante por qualquer critério. Quer dizer, os jornais impressos circulam muito pouco. O debate promovido nesse espaço público, onde os jornais são capazes de construir agenda, são espaços muito limitados. A Confecom, por exemplo ajudou a abrir um pouco o debate a nível nacional, houve conferências em todos os estados. Eu mesmo participei em tudo que foi canto: igreja, sindicato, universidade. Houve uma ampliação do debate, para mim essa foi a coisa mais positiva da Confecom. Mas não há debate. É um caminho longo a percorrer. Os passos são curtos e lentos.
Recentemente tivemos a criação do Centro de Mídia Alternativa Barão de Itararé que é um ganho nessa discussão.
Isso é muito positivo. Os movimentos decorrentes das propostas da Confecom, debates que estão acontecendo para implementar as propostas, tudo isso é avanço, mas do ponto de vista concreto, de políticas públicas, se você peneirar nos últimos anos eu tenho dito que ação da EBC [Empresa Brasileira de Comunicação] é a realização da Confecom, nós não conseguimos avançar.
Você acha que o Brasil, assim como no caso da Guerrilha do Araguaia, pode vir a ser julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos?
Acho muito difícil. A importância desses relatórios serve de debate interno de referência, mas interferência objetiva na situação brasileira é muito difícil. É mais fácil que a SIP [Sociedade Interamericana de Imprensa] com essas decisões que toma todo dia com representantes dos grandes grupos, das Américas, faz mais barulho, mais efeito do que decisões da OEA.
Nós precisamos de uma mídia alternativa ou de uma mídia interativa?
Acho que uma coisa se confunde com a outra. Que precisamos de uma mídia alternativa, isso eu não tenho dúvida, por isso que eu falei na EBC porque é um sistema público. A Constituição prevê complementaridade de sistemas e não havia nada positivado nessa área. Foi aprovada uma legislação que diz que ela é uma empresa pública. Então você tem uma referência para discussão do sistema público e você tem que apoiar, melhorar se você discorda de alguma coisa. Agora eu sempre apoiei, sempre achei necessários esses projetos de mídia alternativa e está incluída a nova mídia, sobretudo a internet, os sites e isso já está operando, e muito, a importância dos formadores de opinião tradicionais. Eu acho que é por aí, mídia alternativa, claro.
Esse sistema tradicional de mídia está enfrentando certas dificuldades que não são próprias do Brasil, aqui tem certas particularidades mas e vai se virar e vai sobreviver de alguma forma, o que tem que haver é uma outra mídia e, evidentemente, tentar uma regulação dessa que está aí. Que é uma regulação, isso é que precisa insistir no Brasil. No Brasil, historicamente, essa mídia, essa velha mídia, a mídia tradicional, tem resistido a qualquer tipo de regulação. E tem sido muito eficiente em dizer que qualquer tipo de regulação é censura. Coisas que absolutamente não procedem, porque são procedimentos regulatórios, que existem nas democracias liberais, que são referência para a nossa. Não tem nada, absolutamente nada de censura na existência de um marco regulatório dessa atividade. Por exemplo, regular o mercado. Garantir competição. Tem um princípio da máxima de expressão da propriedade: quanto mais proprietários melhor. Enfim, essas coisas que existem em outros lugares e que aqui não se pode nem discutir. Aqui temos um déficit nessa área que é um negócio incrível. É um negócio fantástico. Não se discute, não tem debate político no conteúdo das nossas principais emissoras de TV. Nós estamos ainda muito atrás.
E quando vamos ver uma prática jornalística realmente alternativa e autônoma...
É uma luta permanente. Eu tenho 65 anos e mexo com isso desde que eu era estudante universitário e tento fazer um balanço, acho que avançamos muito pouco. Isso é uma luta, uma meta, um ideal, tempo eu não sei.
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Em entrevista à CartaCapital o sociólogo e jornalista Venício A. de Lima, que é coordenador e pesquisador sênior do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política da UnB, fala de seu livro “Liberdade de imprensa x Liberdade de expressão – Direito à comunicação e democracia”, recém lançado pela editora Publisher Brasil.
Lima questiona o paradoxo nos debates sobre o tema de sua obra e a diferenciação entre os conceitos de liberdade de imprensa e de expressão. O sociólogo afirma que os grandes grupos de mídia se utilizam de seus veículos para dizer o que querem, como se fosse a própria expressão da sociedade. Lima critica essa atitude dos conglomerados, que, ao publicarem o que bem entendem, agem como censores e que há um consenso sobre a privatização da censura que acontece muito mais fora do Estado do que pelo próprio Estado, já que o cidadão não pode intervir. Para ele, a mídia tradicional tem resistido a qualquer tipo de regras para o setor. “E tem sido muito eficiente em dizer que qualquer tipo de regulação é censura”.
CartaCapital:O que fica marcante na sua obra é a disparidade que existe no conceito entre liberdade de imprensa e liberdade de expressão. Foi inevitável chegar a isso?
Venício A. de Lima: Inevitável eu acho que não. Foi ocorrendo historicamente e acabou num interesse da instituição imprensa que foi sendo criada, que foi se constituindo historicamente e esses conceitos foram sendo confundidos. Mas uma coisa que para mim é, num certo sentido, paradoxal é que eu tento fazer isso na introdução do livro e nos anexos dos documentos, que são em geral, usados como referência pela grande mídia e pelo judiciário para a discussão dessas questões. Em todos eles, sem exceção, há diferença entre os conceitos. Do primeiro ao último. Se você pegar qualquer um deles, por exemplo, a primeira constituição americana, tem liberdade de “speech”, a tradução correta para nós seria liberdade de expressão, liberdade de palavra e liberdade de “press”, que é a liberdade de imprensa.
A diferença existe desde sempre e mesmo quando a liberdade de imprensa aparece como liberdade fundamental que precisa ser defendida, historicamente ela se refere primeiro ao direito de imprimir, que é “print”, que é diferente de “press”, e depois há uma imprensa que não é a instituição imprensa do século XXI, ou mesmo da segunda metade do século XX. Era quase uma extensão do direito da fala, que queria dizer o direito individual de imprimir. Há um acordo no debate sobre essas questões que é feito fora do Brasil, de que, quando se refere à liberdade de imprensa, referindo-se ao início da publicação de algo – que poderia ser entendido como um periódico – ainda antes da existência de alguma coisa que pudesse ser parecida com os jornais, que nós temos hoje, são coisas muito diferentes.
A epígrafe do William Hocking, que cito no livro, ele toma como referência à revolução gloriosa na Inglaterra e a primeira emenda americana e fala que nós já temos experiência nesse assunto, mas as coisas mudaram muito e isso tem que ser repensado. Quer dizer, a imprensa não é mais aquela imprensa da época em que o conceito apareceu e, claro, nunca você pode comparar, do meu ponto de vista, sem fazer discussão jurídica, o direito individual de fala, de expressão, com o direito dos grandes grupos empresariais que publicam o que querem.
Nesse sentido eles são os próprios censores hoje.
Isso não é você nem eu que estamos falando. Claro que no Brasil tudo isso é diferente, estamos atrasados quase um século, pelo menos 60 e 70 anos. Nós estamos falando agora em autorregulação. Nos Estados Unidos isso existe desde a década de 20, no caso da indústria de cinema. Há consenso sobre a privatização da censura que acontece muito mais fora do Estado do que pelo Estado, inclusive no reconhecimento de que quando você faz critérios sobre liberdade de imprensa, são incluídos critérios sobre concentração da mídia. A OEA acabou de soltar um relatório imenso que coloca como condição para liberdade de imprensa uma desconcentração da propriedade. A nossa constituição fala nisso, mas o que acontece? Na hora dos julgamentos do Supremo essa condição para o exercício da liberdade de imprensa não é lembrada.
Desconcentração é a saída para reverter essa situação...
Cumprir a Constituição é uma coisa, é atacar de frente essa questão da concentração de propriedade que no Brasil é muito complicada, porque nunca houve qualquer preocupação da nossa legislação, que é praticamente inexistente nessa área, sobre propriedade cruzada. Nossos grupos de mídia mais importantes e os seus parceiros regionais são grupos multimídia porque foram fundados na propriedade cruzada, que é uma coisa regulamentada no mundo inteiro. No mesmo mercado, o mesmo grupo empresarial controla rádio AM, FM, televisão, provedor de internet.
Um monólogo midiático...
Eu morei no Rio Grande do Sul e lá, isso que você acabou de dizer é o fato cotidiano. A RBS controla rádios FM, AM, o jornal popular, o jornal de classe média, a TV aberta, a TV comunitária, o provedor de internet, os colunistas são os mesmos. Quer dizer, você não escapa. Agora, tem várias outras instituições liberais que já foram incorporadas pelas constituições de países como Alemanha, Espanha, Portugal, direito de resposta difuso, direito de antena, coisas que no Brasil não tem nem discussão. Você veja na Confecom, os empresários não querem nem participar, não querem discutir isso.
Nós, nessa área, realmente estamos com um atraso fenomenal em relação a outros países da América Latina que, recentemente, conseguiram, de uma forma ou de outra, por processos que, por mais polêmicos que sejam, pela polêmica que a grande mídia cria, foram processos dentro de um espaço democratizado, como no caso da Argentina, implementar uma lei de meios que a avança em muitas áreas no sentido da universalização da liberdade de expressão individual que, para mim, é o ponto crítico, de uma forma que nós ainda estamos há séculos [de distância]. Na semana passada, o ministro [da Comunicação Social] Franklin Martins falou numa audiência na Câmara que não há nenhuma chance de implementar nada da Confecom esse ano, que vai ficar para o próximo governo. Quer dizer, nós não vamos conseguir mandar.
Você acha que a Confecom ainda não obteve o reconhecimento esperado?
Obteve no sentido de que foi convocada pelo governo, podia não ter sido. Acho que foi positivo. Mas veja, seis meses depois é que saiu o caderno oficial com as propostas que estão sendo organizadas. Existe uma comissão lá na Câmara que viu quais as propostas que já são objeto de projetos que estão tramitando, mas concretamente (a proposta de criação de um Conselho Nacional de Comunicação como um órgão, um espaço de debate dessa questões etc., teria de regulamentar) o próprio Franklin descartou completamente, disse que isso é no final do processo e não no início. O próprio Conselho de Comunicação que é um órgão auxiliar do Congresso não se reúne desde 2006 porque a mesa diretora não nomeia os novos membros. Nós estamos muito atrasados.
Você cita o caso da ANJ e a utilização dos termos dessa maneira confusa na publicidade que comemora os 30 anos da entidade. Teoricamente isso não deveria acontecer.
É uma confusão deliberada. Quem é que é contra a liberdade de expressão, você conhece? Não existe. Isso eles associam a um direito básico que ninguém é contra e se coloca na posição de defesa de algo que ninguém é contra. É a linha da ANJ. Essa ANJ é dirigida pela Judith Brito que é superintende do Grupo Folha, ela admitiu publicamente que os jornais são partidarizados, fazem oposição ao governo, tudo escancarado.
Falta debate público?
Nós não temos tradição de debate público nessa área. Nossos jornais são jornais historicamente elitistas. A situação dos nossos veículos impressos, por exemplo, houve épocas de tiragem importantes, mas sempre pequenas, à exceção da Veja que diz tirar um milhão de exemplares – que é um número impressionante por qualquer critério. Quer dizer, os jornais impressos circulam muito pouco. O debate promovido nesse espaço público, onde os jornais são capazes de construir agenda, são espaços muito limitados. A Confecom, por exemplo ajudou a abrir um pouco o debate a nível nacional, houve conferências em todos os estados. Eu mesmo participei em tudo que foi canto: igreja, sindicato, universidade. Houve uma ampliação do debate, para mim essa foi a coisa mais positiva da Confecom. Mas não há debate. É um caminho longo a percorrer. Os passos são curtos e lentos.
Recentemente tivemos a criação do Centro de Mídia Alternativa Barão de Itararé que é um ganho nessa discussão.
Isso é muito positivo. Os movimentos decorrentes das propostas da Confecom, debates que estão acontecendo para implementar as propostas, tudo isso é avanço, mas do ponto de vista concreto, de políticas públicas, se você peneirar nos últimos anos eu tenho dito que ação da EBC [Empresa Brasileira de Comunicação] é a realização da Confecom, nós não conseguimos avançar.
Você acha que o Brasil, assim como no caso da Guerrilha do Araguaia, pode vir a ser julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos?
Acho muito difícil. A importância desses relatórios serve de debate interno de referência, mas interferência objetiva na situação brasileira é muito difícil. É mais fácil que a SIP [Sociedade Interamericana de Imprensa] com essas decisões que toma todo dia com representantes dos grandes grupos, das Américas, faz mais barulho, mais efeito do que decisões da OEA.
Nós precisamos de uma mídia alternativa ou de uma mídia interativa?
Acho que uma coisa se confunde com a outra. Que precisamos de uma mídia alternativa, isso eu não tenho dúvida, por isso que eu falei na EBC porque é um sistema público. A Constituição prevê complementaridade de sistemas e não havia nada positivado nessa área. Foi aprovada uma legislação que diz que ela é uma empresa pública. Então você tem uma referência para discussão do sistema público e você tem que apoiar, melhorar se você discorda de alguma coisa. Agora eu sempre apoiei, sempre achei necessários esses projetos de mídia alternativa e está incluída a nova mídia, sobretudo a internet, os sites e isso já está operando, e muito, a importância dos formadores de opinião tradicionais. Eu acho que é por aí, mídia alternativa, claro.
Esse sistema tradicional de mídia está enfrentando certas dificuldades que não são próprias do Brasil, aqui tem certas particularidades mas e vai se virar e vai sobreviver de alguma forma, o que tem que haver é uma outra mídia e, evidentemente, tentar uma regulação dessa que está aí. Que é uma regulação, isso é que precisa insistir no Brasil. No Brasil, historicamente, essa mídia, essa velha mídia, a mídia tradicional, tem resistido a qualquer tipo de regulação. E tem sido muito eficiente em dizer que qualquer tipo de regulação é censura. Coisas que absolutamente não procedem, porque são procedimentos regulatórios, que existem nas democracias liberais, que são referência para a nossa. Não tem nada, absolutamente nada de censura na existência de um marco regulatório dessa atividade. Por exemplo, regular o mercado. Garantir competição. Tem um princípio da máxima de expressão da propriedade: quanto mais proprietários melhor. Enfim, essas coisas que existem em outros lugares e que aqui não se pode nem discutir. Aqui temos um déficit nessa área que é um negócio incrível. É um negócio fantástico. Não se discute, não tem debate político no conteúdo das nossas principais emissoras de TV. Nós estamos ainda muito atrás.
E quando vamos ver uma prática jornalística realmente alternativa e autônoma...
É uma luta permanente. Eu tenho 65 anos e mexo com isso desde que eu era estudante universitário e tento fazer um balanço, acho que avançamos muito pouco. Isso é uma luta, uma meta, um ideal, tempo eu não sei.
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Lançamento do livro de Venício de Lima
Reproduzo artigo publicado no sítio Carta Maior:
O livro “Liberdade de Imprensa x Liberdade de Expressão”, de Venício de Lima, será lançado nesta segunda-feira, dia 21, às 19 horas, na sede do Sindicato dos Engenheiros (rua Genebra, 25, próximo à Câmara Municipal de São Paulo). O debate de lançamento da obra reunirá Venício Lima, Fabio Konder Comparato (que assina o prefácio), Luis Nassif e Mino Carta. O evento é uma promoção da Publisher Brasil, que editou o livro, e do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé.
No prefácio ao livro, Fabio Konder Comparato destaca que Venício de Lima, ao fazer uma crítica aguda à desorganização dos meios de comunicação de massa, contribui para o debate sobre a necessidade de uma reforma do sistema político brasileiro:
“Não somos uma verdadeira república, porque o bem comum do povo, que os romanos denominavam exatamente res publica, não prevalece sobre os interesses particulares dos ricos e poderosos. Não somos uma autêntica democracia, porque o poder soberano não pertence ao povo, mas a uma minoria de grupos ou pessoas abastadas; o que é a própria definição de oligarquia. Tampouco constituímos um Estado de Direito, porque, com escandalosa frequência, as pessoas investidas em cargos públicos – no Executivo, no Legislativo e até mesmo no Judiciário – exercem um poder sem controle, e logram pôr sua vontade e seus interesses próprios acima do disposto na Constituição e nas leis”.
Em seu novo livro, Venício de Lima opõe os conceitos de liberdade de expressão e liberdade de imprensa, ressaltando que esta última, no sistema capitalista, foi transformada em liberdade de empresa. Ainda no prefácio, Comparato lembra que, por ocasião da independência dos Estados Unidos, James Madison afirmou que um governo democrático, sem uma imprensa controlada pelo povo, seria um prelúdio à farsa, à tragédia, ou a ambas as coisas. E emenda:
"No Brasil, a criação do oligopólio empresarial dos meios de comunicação de massa durante o regime militar (1964 a 1985) logrou, de fato, unir a farsa à tragédia. Não foi por outra razão que esse amálgama monstruoso mereceu de um jornal de São Paulo a leviana qualificação de ditabranda".
Baseado em 23 artigos que abordam aspectos diferentes dessa relação entre liberdade de expressão e liberdade de imprensa, o livro de Venício de Lima tem cinco capítulos que foram organizados em torno de alguns subtemas específicos: “O ensinamento dos clássicos”, “O ponto de vista dos empresários”, “A posição das ONGs”, “Questões em Debate”, e “As Decisões Judiciais”.
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quinta-feira, 17 de junho de 2010
Sucesso do Barão de Itararé em Minas
Reproduzo artigo de Pedro Leão, publicado no sítio Vermelho:
A sede do sindicato dos jornalistas, palco de tantos momentos importantes na política mineira, recebeu na noite de ontem (16) um prestigiado evento. O debate “O PIG está na UTI e que de lá não saia” promovido pelos jornalistas Paulo Henrique Amorim e Altamiro Borges marcou o lançamento do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé em Minas Gerais.
Na platéia, dezenas de jornalistas, estudantes e militantes dos movimentos sociais das mais diversas correntes. Primeiro a falar, Paulo Henrique Amorim analisou a construção do monopólio das comunicações e a intrínseca ligação dos barões da mídia com o governo militar e com os governos de Fernando I e II (Collor e FHC). Amorim citou o exemplo da lei aprovada na República Argentina como uma maneira eficaz de controlar o poder onipotente das grandes empresas midiáticas.
Sobre a situação da mídia no Brasil, o jornalista foi taxativo. “É um absurdo, a Rede Globo deter 42% da audiência da TV brasileira e levar 80% de toda a verba publicitária, essa concentração é uma afronta ao regime democrático. O que tem aí em baixo? 10 bilhões do mercado publicitário, ou seja, os irmãos Marinho ficam com 8 bi da propaganda. É tudo um conluio de interesses”, afirmou.
A construção de canais alternativos de mídia foi apontada por Amorim como uma forte arma contra o monopólio das informações. Para ele, é preciso proteger os blogs das leis de controle, se referindo ao projeto do Senador Tucano, Eduardo Azeredo. “A elite controla a TV e a imprensa escrita, mas ainda não controla a internet”, comemorou. O plano nacional de banda larga foi também defendido como um instrumento importante de fortalecimento da Internet e, conseqüentemente, da quebra do monopólio da informação.
Ao falar sobre os 13 processos que carrega, o jornalista se disse orgulhoso. “Diga quem te processas e eu direi quem és”. Para Amorim, o Partido da Imprensa Golpista está em pleno funcionamento no Brasil já há alguns anos. “O PIG foi contra o trabalhismo de Vargas, tentou impedir a posse de Jucelino. O maior dos ‘piguistas’, Carlos Lacerda, certa vez disse: ‘Juscelino não será candidato, se for, não ganha, se ganhar, não toma posse, se tomar posse, não governa’. O PIG também derrubou Jango, governou com os militares e confabulou contra Brizola”. Sobre a posição do PIG frente ao governo Lula, Amorim foi enfático “Lula desarticulou a oposição que tem no PIG sua única voz”.
O presidente nacional do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, Altamiro Borges, felicitou os mineiros pela iniciativa pioneira em lançar a entidade no estado. Borges fez uma análise da participação da grande mídia em páginas tenebrosas da história brasileira. “Os barões da mídia se aliaram à ditadura dos generais, se posicionam contra os direitos dos trabalhadores, produziram o presidente Collor e criaram uma fábrica de crises no Brasil. Isso tudo é o desespero da direita que está sem projeto, sem discurso e sem vice”, afirmou Borges.
Para o jornalista Kerison Lopes, um dos organizadores do evento, o lançamento do “Barão de Itararé” em Minas não poderia estar mais bem representado do que na figura de Paulo Henrique Amorim, que, Lopes aponta como um fiel seguidor do Barão, unindo a pontual critica com um humor único. Na última fala do debate, Amorim resumiu em uma frase o que para ele é o papel das novas mídias no confronto com as velhas: “É Davi enfrentando Golias diariamente pelo celular”.
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Encontro de blogueiros será em Brasília
Reproduzo artigo de Conceição Lemes, publicado no blog Viomundo:
A ideia do Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas nasceu em maio. Sugerida por Luiz Carlos Azenha, foi aprovada durante o lançamento, em São Paulo, do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé.
No final de maio, tivemos uma primeira conversa, da qual participaram o próprio Azenha, Altamiro Borges, Eduardo Guimarães, Rodrigo Vianna e eu. Azenha lançou a ideia no Viomundo. A receptividade foi excelente. Tivemos, aqui, mais de 400 comentários. Fora a acolhida calorosa em vários outros blogs.
Resultado: o Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas é indispensável, imperioso e vai sair, sim.
Tivemos, ontem (15), a segunda reunião. Foi na sede do Conversa Afiada. Participaram Paulo Henrique Amorim (Conversa Afiada), Altamiro Borges (do Barão de Itararé e do blog do Miro), Conceição Oliveira (Maria-Fro), Eduardo Guimarães (Blog da Cidadania), Diego Casaes (Global Voices) e eu (do Viomundo, representando também o Azenha, derrubado por uma tremenda gripe).
Avançamos alguns pontos. Ficou decidido que:
1) O Encontro Nacional de Blogueiros será em Brasília. A opção se deveu a dois motivos: fugir do eixo Rio-São Paulo; os vôos de todas as regiões do Brasil passam por lá, o que facilitará a vida dos blogueiros.
2) Ocorrerá, provavelmente, nos dias 20 (abertura à noite), 21 e 22 de agosto. Como ainda estamos estudando a viabilidade de oferecer ao menos acomodações e passagens, até o início de julho bateremos o martelo sobre a data definitiva.
3)A organização ficará a cargo do Centro de Estudos de Mídia Alternativa Barão de Itararé.
4) Na programação, haverá mesas redondas com palestras de grandes blogueiros do país. Algumas já propostas: os rumos da internet no Brasil; marco regulatório (mesa na qual serão discutidas a legislação atual, a necessidade de aprimorá-la e as tentativas de amordaçar alguns espaços críticos); e experiências de blogueiros de vários estados do Brasil.
5) Haverá, também, oficinas para ensinar blogueiros a otimizarem os recursos da internet. Por exemplo, twitter, produção de vídeos e de rádio web.
6) Realização de painéis, para que blogueiros possam se conhecer, conversar e trocar experiências.
7) Transmissão do evento pela internet. Como há possibilidade de as oficinas ocorrerem simultaneamente, a ideia é gravar todas para que depois possam ser acessadas por todos os participantes e blogueiros de qualquer parte do país. O objetivo é o de que as oficinas se transformem em conteúdo, mesmo.
8) A necessidade de buscar patrocínios, para tornar viável o encontro e ter maior número de participantes.
9) Abertura de uma lista para troca de ideias — por exemplo, sugestão de convidados, programação, oficinas, viabilização financeira, entre outras.
Esses são os primeiros passos, elaborados com ajuda de vocês. A intenção é a de que o encontro não olhe para o próprio umbigo, mas reflita preocupações de blogueiros com os vários sotaques do Brasil. Também pedimos a cada um que nos ajude a aperfeiçoar instrumentos que atendam às necessidades dos blogueiros e dos próprios brasileiros.
Sugestões serão muito bem-vindas. Afinal, o objetivo de todos nós é contribuir para a democratização dos meios de comunicação e fortalecer as mídias alternativas no país.
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A ideia do Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas nasceu em maio. Sugerida por Luiz Carlos Azenha, foi aprovada durante o lançamento, em São Paulo, do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé.
No final de maio, tivemos uma primeira conversa, da qual participaram o próprio Azenha, Altamiro Borges, Eduardo Guimarães, Rodrigo Vianna e eu. Azenha lançou a ideia no Viomundo. A receptividade foi excelente. Tivemos, aqui, mais de 400 comentários. Fora a acolhida calorosa em vários outros blogs.
Resultado: o Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas é indispensável, imperioso e vai sair, sim.
Tivemos, ontem (15), a segunda reunião. Foi na sede do Conversa Afiada. Participaram Paulo Henrique Amorim (Conversa Afiada), Altamiro Borges (do Barão de Itararé e do blog do Miro), Conceição Oliveira (Maria-Fro), Eduardo Guimarães (Blog da Cidadania), Diego Casaes (Global Voices) e eu (do Viomundo, representando também o Azenha, derrubado por uma tremenda gripe).
Avançamos alguns pontos. Ficou decidido que:
1) O Encontro Nacional de Blogueiros será em Brasília. A opção se deveu a dois motivos: fugir do eixo Rio-São Paulo; os vôos de todas as regiões do Brasil passam por lá, o que facilitará a vida dos blogueiros.
2) Ocorrerá, provavelmente, nos dias 20 (abertura à noite), 21 e 22 de agosto. Como ainda estamos estudando a viabilidade de oferecer ao menos acomodações e passagens, até o início de julho bateremos o martelo sobre a data definitiva.
3)A organização ficará a cargo do Centro de Estudos de Mídia Alternativa Barão de Itararé.
4) Na programação, haverá mesas redondas com palestras de grandes blogueiros do país. Algumas já propostas: os rumos da internet no Brasil; marco regulatório (mesa na qual serão discutidas a legislação atual, a necessidade de aprimorá-la e as tentativas de amordaçar alguns espaços críticos); e experiências de blogueiros de vários estados do Brasil.
5) Haverá, também, oficinas para ensinar blogueiros a otimizarem os recursos da internet. Por exemplo, twitter, produção de vídeos e de rádio web.
6) Realização de painéis, para que blogueiros possam se conhecer, conversar e trocar experiências.
7) Transmissão do evento pela internet. Como há possibilidade de as oficinas ocorrerem simultaneamente, a ideia é gravar todas para que depois possam ser acessadas por todos os participantes e blogueiros de qualquer parte do país. O objetivo é o de que as oficinas se transformem em conteúdo, mesmo.
8) A necessidade de buscar patrocínios, para tornar viável o encontro e ter maior número de participantes.
9) Abertura de uma lista para troca de ideias — por exemplo, sugestão de convidados, programação, oficinas, viabilização financeira, entre outras.
Esses são os primeiros passos, elaborados com ajuda de vocês. A intenção é a de que o encontro não olhe para o próprio umbigo, mas reflita preocupações de blogueiros com os vários sotaques do Brasil. Também pedimos a cada um que nos ajude a aperfeiçoar instrumentos que atendam às necessidades dos blogueiros e dos próprios brasileiros.
Sugestões serão muito bem-vindas. Afinal, o objetivo de todos nós é contribuir para a democratização dos meios de comunicação e fortalecer as mídias alternativas no país.
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