Capa do JP 534 |
Na charge da capa do JP 534 temos um magistrado retalhando o mapa do Estado do Pará. Ao lado, o filão, a imensa propriedade destinada ao empresário Cecílio Rego de Almeida, que hoje dorme no pequeno pedaço de terra que lhe coube nesse latifúndio, como diria João Cabral. Morreu em 2008, aos 78 anos de idade, imaginando, com a sua Ceciolândia, se tornar um dos homens mais poderosos do mundo.
Qualquer cidadão neste mundo não deixa de se perguntar: o que leva um ser humano ambicionar uma imensa leva de terra como se fosse de uma antiga capitania hereditária? Com que direito e legitimidade se apossa de um território significativo de um Estado do país? Terras que, segundo o jornalista, são avaliadas pelo valor do tamanho de 35 eclusas de Tucuruí, quando se sabe que é impossível tirar algum rendimento que não seja por meio da especulação?
A correspondência "O cheiro da morte e o cheiro da vida”, enviada por um ex-militante do PT e agora no PSOL, o paranaense Edmar Macedo, expõe algo que me faz lembrar aquilo que o grande psicanalista vienense chamou de "desejo de morte”; uma pulsão tão fortemente presente no mundo político com seus rituais necrófilos, comuns nos enterros políticos simbólicos de adversários, que nos faz lembrar Totem e Tabu.
O PT, que não nasceu tão puro como se imagina, agora, segundo Macedo, tem cheiro de podre porque se desviou dos princípios que tanto defendia quando era oposição. A história nos dirá daqui a alguns anos se o "puro” PSOL – que nas eleições passada apoiou partidos não tão puros, em nome do realismo político (como no Amapá) – conservará o cheiro da vida, como anuncia.
Tenho receio do discurso da pureza, principalmente na seara política, onde, muitas vezes, como dizia o velho existencialista, Sartre, é necessário por a mão na merda. O tempo tem ensinado, desde que o mundo é mundo, que na política os caminhos por onde se trafega nem sempre são nítidos e retilíneos. Os que se arvoram portadores da boa nova, com suas propostas utópicas e messiânicas, dificilmente, quando chegam ao poder, conseguem manter o mesmo idealismo forjado nas suas origens. O PT, que queria ser diferente de tudo que está ai, enveredou e aceitou o realismo político. Hoje é muito diferente daquilo que pretendia ser, desde a sua fundação no Colégio Sion muitos anos atrás. Nesses últimos doze anos governa o país através de uma coalizão e teve que abrir mão de seus caros princípios porque não governa sozinho.
Na página 4 do JP temos a proposta do jornalista sobre o marco regulatório. Ele discorda da proposta do governo (onde anda?) para a mídia. É a favor da democratização dos meios de comunicação e oferece sugestões que me parecem interessante se vivêssemos em um país realmente onde a democracia fosse uma realidade real e concreta, o que não é o nosso caso.
Estariam as empresas dispostas em abrir seu capital? E – ainda mais – ter que submeter a um conselho consultivo com um terço de seus integrantes eleitos por uma assembleia de clientes, e um ombudsman ?
Lúcio é um jornalista experiente e conhece os subterrâneos da imprensa tupiniquim. Sabe que cerca de sete famílias controlam os jornais, cadeias de televisão, rádios etc. A proposta me parece boa e seria muito bom se posta em prática. Mas duvido que um Congresso como esse, com boa parte de políticos financiados por 200 empresas, e que têm posições conservadoras, seria capaz de aprová-la. Isso sem contar com políticos proprietários de rádios e cadeias de televisão.
A longa matéria que se estende da página 6 a 8 do JP não deixou de me sensibilizar, pois Lúcio, ao falar um pouco de sua trajetória me fez lembrar os vários momentos de minha vida em Belém do Pará. São fragmentos da história de uma geração que chamei de Geração Belém-Brasília, no tempo em que a cidade era isolada do resto do Brasil e teve que se adaptar aos novos tempos, principalmente quando saíamos da adolescência e iniciávamos a juventude, tendo que conviver com os tempos duros da ditadura, que se radicalizou no que poderíamos chamar o segundo golpe de 1968.
Lúcio fala de seus pais fundadores. Em especial do velho Elias Ribeiro Pinto (contabilizei no artigo 12 referências feitas no artigo sobre seu pai), de Getúlio Vargas (eu não sabia quem eu era, mas uma coisa eu sabia: era getulista – diz Lúcio).
O primeiro, o pai biológico, filho de imigrante nordestino, e o segundo o pai simbólico, nos tempos em que a figura do pai possuía peso determinante em nossas vidas (e tínhamos vários pais simbólicos, diga-se de passagem, diferente da geração atual, para a qual a figura do pai esvanece e declina).
O pai preocupado com a repressão. O pai que lhe trouxe ao mundo, o pai político que lhe proporcionou o encontro com Getúlio Vargas, o pai empresário, o que lhe levou às rodas políticas, o pai líder político em Santarém e tantas imagens do pai.
Concordo com sua observação: precoce, a nossa geração amadureceu no tranco. É verdade. Tenho a mesma idade do Lúcio e passamos uma boa parte de nossas vidas numa ditadura que durou mais de 25 anos, deixando suas marcas, que não deixam saudades. Aos 19 anos, quando eu nem sabia quem era eu, como diz ele, experimentei a prisão, por causa de uma greve no conhecido Paes de Carvalho nos tempos de luta do movimento estudantil em 1969.
Fui julgado e condenado pela Justiça Militar. Um mês de Presídio São José, agora um museu onde são exibidos os objetos de tortura. Quando de lá sai experimentei outra prisão: o exilio em minha própria terra, pois fui impedido de voltar aos bancos escolares. Rumei para o Rio de Janeiro pela Belém-Brasília e pude presencia as tropas do Exército trafegando em direção ao Araguaia.
Não podia contar com a ajuda de meu pai, que faleceu pouco antes do golpe militar. Depois de dois anos retornei para Belém e poucos anos depois fui para São Paulo, cidade que transformou minha vida e que, definitivamente, me desprovincializou e desterritorializou – para empregar uma expressão deleuziana.
Felizmente, Lúcio nos seus 63 anos não pediu para que se esquecesse de tudo aquilo que viveu e escreveu e continua no front, travando, como diz, um bom combate, mesmo com toda a censura que sofre diariamente.
A trajetória de nossa geração ainda não foi escrita. Ela está passando e, certamente, deixará suas marcas na história. A vida é feita de aposta, de riscos; uma aposta nas incertezas, aos trancos e barrancos, mas é preciso ter esperança, mesmo no ceticismo que toma conta de nós. A luta continua, ainda, o que o mais importante.
Qualquer cidadão neste mundo não deixa de se perguntar: o que leva um ser humano ambicionar uma imensa leva de terra como se fosse de uma antiga capitania hereditária? Com que direito e legitimidade se apossa de um território significativo de um Estado do país? Terras que, segundo o jornalista, são avaliadas pelo valor do tamanho de 35 eclusas de Tucuruí, quando se sabe que é impossível tirar algum rendimento que não seja por meio da especulação?
A correspondência "O cheiro da morte e o cheiro da vida”, enviada por um ex-militante do PT e agora no PSOL, o paranaense Edmar Macedo, expõe algo que me faz lembrar aquilo que o grande psicanalista vienense chamou de "desejo de morte”; uma pulsão tão fortemente presente no mundo político com seus rituais necrófilos, comuns nos enterros políticos simbólicos de adversários, que nos faz lembrar Totem e Tabu.
O PT, que não nasceu tão puro como se imagina, agora, segundo Macedo, tem cheiro de podre porque se desviou dos princípios que tanto defendia quando era oposição. A história nos dirá daqui a alguns anos se o "puro” PSOL – que nas eleições passada apoiou partidos não tão puros, em nome do realismo político (como no Amapá) – conservará o cheiro da vida, como anuncia.
Tenho receio do discurso da pureza, principalmente na seara política, onde, muitas vezes, como dizia o velho existencialista, Sartre, é necessário por a mão na merda. O tempo tem ensinado, desde que o mundo é mundo, que na política os caminhos por onde se trafega nem sempre são nítidos e retilíneos. Os que se arvoram portadores da boa nova, com suas propostas utópicas e messiânicas, dificilmente, quando chegam ao poder, conseguem manter o mesmo idealismo forjado nas suas origens. O PT, que queria ser diferente de tudo que está ai, enveredou e aceitou o realismo político. Hoje é muito diferente daquilo que pretendia ser, desde a sua fundação no Colégio Sion muitos anos atrás. Nesses últimos doze anos governa o país através de uma coalizão e teve que abrir mão de seus caros princípios porque não governa sozinho.
Na página 4 do JP temos a proposta do jornalista sobre o marco regulatório. Ele discorda da proposta do governo (onde anda?) para a mídia. É a favor da democratização dos meios de comunicação e oferece sugestões que me parecem interessante se vivêssemos em um país realmente onde a democracia fosse uma realidade real e concreta, o que não é o nosso caso.
Estariam as empresas dispostas em abrir seu capital? E – ainda mais – ter que submeter a um conselho consultivo com um terço de seus integrantes eleitos por uma assembleia de clientes, e um ombudsman ?
Lúcio é um jornalista experiente e conhece os subterrâneos da imprensa tupiniquim. Sabe que cerca de sete famílias controlam os jornais, cadeias de televisão, rádios etc. A proposta me parece boa e seria muito bom se posta em prática. Mas duvido que um Congresso como esse, com boa parte de políticos financiados por 200 empresas, e que têm posições conservadoras, seria capaz de aprová-la. Isso sem contar com políticos proprietários de rádios e cadeias de televisão.
A longa matéria que se estende da página 6 a 8 do JP não deixou de me sensibilizar, pois Lúcio, ao falar um pouco de sua trajetória me fez lembrar os vários momentos de minha vida em Belém do Pará. São fragmentos da história de uma geração que chamei de Geração Belém-Brasília, no tempo em que a cidade era isolada do resto do Brasil e teve que se adaptar aos novos tempos, principalmente quando saíamos da adolescência e iniciávamos a juventude, tendo que conviver com os tempos duros da ditadura, que se radicalizou no que poderíamos chamar o segundo golpe de 1968.
Lúcio fala de seus pais fundadores. Em especial do velho Elias Ribeiro Pinto (contabilizei no artigo 12 referências feitas no artigo sobre seu pai), de Getúlio Vargas (eu não sabia quem eu era, mas uma coisa eu sabia: era getulista – diz Lúcio).
O primeiro, o pai biológico, filho de imigrante nordestino, e o segundo o pai simbólico, nos tempos em que a figura do pai possuía peso determinante em nossas vidas (e tínhamos vários pais simbólicos, diga-se de passagem, diferente da geração atual, para a qual a figura do pai esvanece e declina).
O pai preocupado com a repressão. O pai que lhe trouxe ao mundo, o pai político que lhe proporcionou o encontro com Getúlio Vargas, o pai empresário, o que lhe levou às rodas políticas, o pai líder político em Santarém e tantas imagens do pai.
Concordo com sua observação: precoce, a nossa geração amadureceu no tranco. É verdade. Tenho a mesma idade do Lúcio e passamos uma boa parte de nossas vidas numa ditadura que durou mais de 25 anos, deixando suas marcas, que não deixam saudades. Aos 19 anos, quando eu nem sabia quem era eu, como diz ele, experimentei a prisão, por causa de uma greve no conhecido Paes de Carvalho nos tempos de luta do movimento estudantil em 1969.
Fui julgado e condenado pela Justiça Militar. Um mês de Presídio São José, agora um museu onde são exibidos os objetos de tortura. Quando de lá sai experimentei outra prisão: o exilio em minha própria terra, pois fui impedido de voltar aos bancos escolares. Rumei para o Rio de Janeiro pela Belém-Brasília e pude presencia as tropas do Exército trafegando em direção ao Araguaia.
Não podia contar com a ajuda de meu pai, que faleceu pouco antes do golpe militar. Depois de dois anos retornei para Belém e poucos anos depois fui para São Paulo, cidade que transformou minha vida e que, definitivamente, me desprovincializou e desterritorializou – para empregar uma expressão deleuziana.
Felizmente, Lúcio nos seus 63 anos não pediu para que se esquecesse de tudo aquilo que viveu e escreveu e continua no front, travando, como diz, um bom combate, mesmo com toda a censura que sofre diariamente.
A trajetória de nossa geração ainda não foi escrita. Ela está passando e, certamente, deixará suas marcas na história. A vida é feita de aposta, de riscos; uma aposta nas incertezas, aos trancos e barrancos, mas é preciso ter esperança, mesmo no ceticismo que toma conta de nós. A luta continua, ainda, o que o mais importante.
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