sexta-feira, 23 de agosto de 2013

O racismo na rede Pão de Açucar

Da revista Fórum:

Uma estátua utilizada na decoração de uma unidade da rede de supermercados Pão de Açucar, localizada no bairro Vila Romana, em São Paulo, está causando revolta nas redes sociais desde a última segunda-feira (19). A estátua em questão representa uma criança negra, com grilhões nos tornozelos, segurando uma cesta de pães.

A comunidade negra se sentiu ofendida e considerou de absoluto mau gosto a peça de decoração. Mensagens em rede sociais defendem que a estátua remete à escravidão e ao racismo. Além disso, o Grupo Pão de Açúcar também é acusado pelos internautas de fazer apologia ao trabalho infantil, uma vez que a estátua retrata uma criança carregando uma cesta de pães de tamanho e peso incompatível com o seu.

Após a repercussão negativa na internet, o Grupo Pão de Açúcar divulgou uma nota oficial afirmando que “a estátua em questão foi adquirida como parte de uma coleção de peças decorativas de loja, sem intenção ou apologia a qualquer tipo de discriminação. A rede agradece os contatos recebidos dos clientes e lamenta o fato ocorrido, uma vez que pauta suas ações na ética, promoção e respeito à diversidade. Assim que tomou ciência do caso, o Pão de Açúcar providenciou a retirada da estátua das lojas e está revendo o processo de seleção de peças decorativas.”

Mesmo com a nota e a decisão do Grupo Pão de Açúcar de retirar a estátua, a AMNB (Articulação de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras) divulgou nesta quinta-feira 22, uma carta em que manifesta seu repúdio ao caso e cobra da rede de supermercados uma retratação pública. “Neste sentido que nos dirigimos ao Senhor, Diretor Presidente do Grupo Pão de Açúcar, Sr. Enéas Neto, para dizer que estamos esperando que este Grupo faça uma retratação publicamente, mesmo tendo retirado a estátua colocada de sua loja, reconhecendo neste ato como fortalecedor do racismo no Brasil”, diz a carta.

Leia a íntegra da carta divulgada pela ANMB:

Ao Sr. Enéas César Pestana Neto

Diretor Presidente

Grupo Pão de Açúcar

Senhor Diretor,

A Articulação de Organizações de Mulheres Negras (AMNB) é uma rede de organizações de mulheres negras, constituída atualmente por 28 organizações distribuídas por todas as Regiões do Brasil. Nossa missão está calcada no enfrentamento ao racismo e das desigualdades econômicas, sociais deste País.

Segundo dados levantados pela Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio (PNAD, 2011)), O Brasil tem cerca de 192 milhões de brasileiros, destes, 51% se auto-declararam negros e negras, o que faz do Brasil, o pais com a segunda maior população de negros de todo mundo – 97 milhões, atrás apenas da Nigéria, com aproximadamente 160 milhões.

A identidade de um povo é construída a partir de suas relações sociais. O estado brasileiro, escravista durante mais de trezentos anos, deixou marcas extremamente fortes nesta população, marcas estas que são reforçadas pela manutenção de atitudes como essa.

Nos deixa extremamente atônitas o fato de tomarmos conhecimento da estátua exposta decorativamente no Supermercado Pão de Açúcar, no bairro Vila Romana, na cidade de São Paulo, que retrata uma criança negra com grilhões nos pés portando uma cesta de pães (em anexo).

Queremos chamar atenção para dois aspectos: (1) Esta imagem contribui para a manutenção do racismo, pois é a materialização do inconsciente coletivo que coloca o negro sempre num lugar social e simbólico, de subalternidade; não é por acaso que esse menino continua com os grilhões nos pés, símbolo de escravização. (2) Ela, também, compactua e autoriza, de forma subliminar, o trabalho infantil, que no Brasil é realizado por uma maioria de crianças negras.

Outro grande prejuízo é o impacto negativo desta imagem para a autoestima das crianças negras e para a construção uma referencia positiva de si, que as leve a se sentir em iguais condições na companhia das crianças brancas. Como vocês acham que se sentem as crianças negras que frequentam esta loja?

Nós mulheres negras e indígenas vimos sendo tratadas, sob a escravização e o racismo, como objetos, vulneráveis á todos os tipos de violência pessoal, estrutural. Conhecemos, portanto, a profunda dor das violências que nos atingem. E temos lutado, ao longo de todos os séculos da história do Brasil, por justiça e reparação, pelo o direito de viver a cidadania plena.

Neste sentido que nos dirigimos ao Senhor, Diretor Presidente do Grupo Pão de Açúcar, Sr. Enéas Neto, para dizer que estamos esperando que este Grupo faça uma retratação publicamente, mesmo tendo retirado a estátua colocada de sua loja, reconhecendo neste ato como fortalecedor do racismo no Brasil.

É necessário, e estamos disponíveis a contribuir com essa instituição, a construção de uma ação reparadora que sensibilize clientes e trabalhadores, em toda sua rede, na direção de um país onde a diferença seja compreendida como um valor positivo.
Sem mais,

Simone Cruz

Secretária Executiva AMNB

Organizações Integrantes da AMNB:

ACMUN – Associação Cultural de Mulheres Negras – RS
BAMIDELÊ – Organização de Mulheres Negras na Paraíba – PB
CACES – Centro de Atividades Culturais, Econômicas e Sociais – RJ
Casa Laudelina de Campos Mello – SP
Casa da Mulher Catarina – SC
CEDENPA – Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará – PA
CRIOLA – Organização de Mulheres Negras – RJ
CONAQ – Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Quilombolas – MG
GELEDÉS – Instituto da Mulher Negra – SP
Grupo de Mulheres Negras Felipa de Sousa – RJ
Grupo de Mulheres Negras Mãe Andressa – MA
Grupo de Mulheres Negras Malunga – GO
IMENA – Instituto de Mulheres Negras do AP
INEGRA – Instituto Negra do Ceará – CE
Instituto AMMA Psique e Negritude – SP
IROHIN – DF
KILOMBO – Organização Negra do Rio Grande do Norte – RN
Maria Mulher – Organização de Mulheres Negras – RS
Mulheres em União – Centro de Apoio e Defesa dos Direitos da Mulher – MG
NZINGA – Coletivo de Mulheres Negras de Belo Horizonte
Observatório Negro – PE
ODARA – Instituto da Mulher Negra – BA
OMIN – Organização de Mulheres Negras Maria do Egito – SE
Rede Mulheres Negras do Paraná – PR
Uiala Mukaji – Sociedade das Mulheres Negras de Pernambuco – PE

6 comentários:

  1. http://ajusticeiradeesquerda.blogspot.com.br/2013/08/propinoduto-tucano-policia-federal.html
    http://www.youtube.com/watch?v=gOscr7TU9hU

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  2. Nossa, é difícil de acreditar que alguém escolheu uma estátua dessas como peça decorativa. Se me contassem eu não acreditaria, é simplesmente surreal. Que tempos são esses?

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  3. Que isso?! É inacreditável que o Grupo Pão de Açúcar tenha visto nesta estátua apenas uma peça decorativa...
    Precisam trocar os óculos!

    Elisa

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  4. É claro. Para os portugueses os negros sempre foram (e devem continuar sendo) escravos.
    Porque os índios (nós) não servem pra isso. São indolentes...
    Ou vocês acham que em 513 anos as coisas mudaram tanto assim?

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  5. Como é possivel a gente ver isso nos dias de hoje, tem que ter um jeito de processar essa rede, isso é um absurdo.

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  6. Loucos,poder-se-ia dizer, mas não; querem mesmo é gerar conflitos.Acabar com o país é o propósito: luta de classes, religiosas e étnicas.

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