Marcelo Camargo/Agência Brasil |
Ao longo desta semana, milhares de camponeses e camponesas organizados pelo MST realizaram seu VI Congresso Nacional em Brasília. Na pauta de debates, a organização e luta do movimento para os próximos cinco anos e a apresentação do novo programa agrário, a chamada Reforma Agrária Popular. Uma marcha com 15 mil pessoas ocupou Brasília e a praça dos Três Poderes e foi o 5º assunto mais comentado no mundo através do Twitter. Após isso, uma reação policial que indignou cada militante social ali presente.
Só com essa introdução, este post poderia abordar a cobertura tendenciosa realizada uma vez mais pela grande mídia brasileira de uma ação do MST. Manifestação virou sinônimo de vandalismo. Não se discute as causas que levaram 15 mil pessoas às ruas em profundidade. E isso não ocorre somente com o MST, mas sim com qualquer protesto que envolva trabalhadores e trabalhadoras deste País.
Mas quero trazer aqui uma outra face do MST. Aquela em que a comunicação se torna um componente importante para a luta pela terra e por reforma agrária.
Para os sem terra, a comunicação popular é fundamental no processo coletivo de formação e organização, sendo mais antiga que o próprio MST, como movimento nacional, que completou 30 anos em janeiro. O Jornal Sem Terra, por exemplo, é um dos precursores do jornalismo popular camponês. Lançado em 1981, no acampamento da Encruzilhada Natalino, em Ronda Alta (RS), o jornal é mais que um instrumento de divulgação das bandeiras de luta; ele serve para a formação e mobilização de camponeses e camponesas Sem Terra.
Hoje, o MST conta com uma série de outros meios de comunicação. A página do movimento na internet, por exemplo, é um contraponto à mídia burguesa em uma série de matérias e reportagens que mostram a vida no campo de forma diferente dos grandes jornais alinhados à visão política do monopólio midiático.
As rádios dentro dos assentamentos são outro exemplo de luta e organização. São rádios populares, que representam a grande comunidade que é um assentamento rural. Outra iniciativa está na inserção política do MST nas redes sociais, em uma experiência de tornar coletivo o que é individual por natureza, como é o caso do Facebook e o Twitter.
Mais recentemente, o movimento passou a investir na formação de comunicadores populares através do curso de jornalismo da terra na UFC (Universidade Federal do Ceará). Em 2013, 44 filhos e filhas de assentados romperam as cercas da universidade e, hoje, estão capacitados para atuar na comunicação de seus estados, realizando coberturas das ações e do dia a dia do MST.
Vale ressaltar que a legislação brasileira acerca da comunicação dificilmente leva em conta o campo brasileiro. Se citarmos o rádio, o limite de 1km de alcance de transmissão imposto para o funcionamento de uma rádio comunitária não atende nem de perto às grandes extensões dos assentamentos rurais. Ao mesmo tempo, a internet, já dentro do cotidiano das áreas urbanas, ainda é um problema nas áreas camponesas, onde o sinal telefônico não chega - o que dizer então da banda larga.
E quando se trata da organização dos trabalhadores camponeses, o enfrentamento às barreiras do monopólio é cotidiano. A criminalização e a invisibilização das lutas camponesas faz parte de um posicionamento da grande mídia monopolizada em poucas famílias e ideologicamente alinhadas ao latifúndio e ao agronegócio.
Assim, o MST se soma à luta pela democratização da comunicação e faz dela uma de suas principais bandeiras. Está firme na coleta de assinaturas para o projeto de lei de iniciativa popular da mídia democrática e é um aliado de peso contra o latifúndio da comunicação, tão cruel quanto o latifúndio da terra. Nesses 30 anos do MST, essas duas lutas caminham mais juntas do que nunca.
* Mayrá Lima é jornalista e mestra em Ciências Sociais, integrante do setor de comunicação do MST e do Conselho Diretor do Intervozes.
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