Por Paulo Nogueira, no blog Diário do Centro do Mundo:
A Justiça brasileira lida de duas formas com processos de imprensa.
Quando o processo é contra blogueiros indefesos, ela é rigorosa.
Quando o processo é contra jornalistas de grandes companhias, ela é o oposto.
O caso Collor X Augusto Nunes, do site da Veja, é exemplar. Collor foi chamado de chefe de bando e coisas do gênero. Na ação que moveu, lembrou que o STF – tão louvado por Nunes – o absolveu das acusações.
Nem isso foi suficiente para que ele ganhasse a causa. Não houve ofensa, segundo a Justiça.
A mesma boa vontade dos juízes não se observa quando os processados são blogueiros. É mais ou menos como Sheherazade ao julgar Justin Bieber e o “marginalzinho”. Risos e amor para um, caretas e ódio para o outro.
As várias ações movidas por Ali Kamel contra eles provam a diferença de tratamento para blogueiros diante de juízes.
O caso mais recente envolve Marco Aurélio de Mello (não confundir com o magnífico homônimo).
Mello trabalhou com Kamel na Globo. Saiu há sete anos, e hoje está na Record. Mantém – ou mantinha, porque afirmou que se afastará dele – o blog Doladodelá.
Dias atrás, Mello anunciou que estava sendo processado por Kamel por um texto em que fez críticas ao antigo chefe e ao jornalismo da Globo.
Mello diz que Kamel adotou o jornalismo “bolinha de papel” na Globo, e que inspira terror na equipe. Mas não disse nada parecido com “chefe de bando”. Dos tempos em que participei de reuniões ao lado de Kamel no Conedit, o conselho editorial da Globo, lembro que ele era extremamente sério e reacionário.
Jamais o vi sorrir, jamais o vi contar uma piada, jamais o vi ser agradável com os presentes. Timidez? Insegurança? Arrogância? Não sei. De toda forma, não gostaria de tê-lo como chefe.
Mello já perdeu uma ação movida por Kamel, e está recorrendo dela, o que não é barato. O novo processo o deixou preocupado com o estado de suas contas. E então ele decidiu pedir doações para poder enfrentar Kamel.
Não sou juiz para entrar no mérito das causas de Kamel.
Mas existe uma injustiça no quadro. Kamel tem enorme vantagem competitiva diante dos juízes brasileiros.
Quem quer se indispor com o chefe do telejornalismo da Globo? Na contrapartida, que juiz não quer ser bem visto pela Globo?
Do ponto de vista econômico, é também um massacre, um combate entre desiguais. Mover um processo para Kamel é uma coisa simples. Uma secretária pode cuidar de quase tudo aquilo que toma tempo de quem aciona alguém.
Ele pode obter orientação do departamento jurídico da Globo, e advogado nenhum vai cobrar excessivamente dele.
Dada a vaidade dos advogados, eles podem acalentar a esperança de um dia aparecer numa reportagem do Jornal Nacional, caso trabalhem numa causa de Kamel, e esta exposição com certeza traria clientela e honorários mais altos.
Não estou dizendo que isto aconteça, mas as coisas, nos bastidores, são menos bonitas e desinteressadas do que gostaríamos que fossem.
Mello, ao contrário de Kamel, não tem uma Globo por trás. Suas armas são bem mais modestas, incluída aí a possibilidade financeira de bancar disputas judiciais.
É uma disputa fundamentalmente injusta.
Num mundo menos imperfeito – na Dinamarca, por exemplo – um sistema jurídico menos inclinado aos poderosos talvez igualasse as forças na contenda.
Mas estamos a 10 mil km da Dinamarca, e a muitos anos de sua sociedade quase utópica.
E então blogueiros de grandes companhias podem chamar as pessoas de bandidas, corruptas, bêbadas, e sair por aí dando risada e se gabando diante dos amigos.
Mas blogueiros como Marco Aurélio de Mello recebem um tratamento completamente diferente, e é uma mostra de quanto temos que avançar como país.
A Justiça brasileira lida de duas formas com processos de imprensa.
Quando o processo é contra blogueiros indefesos, ela é rigorosa.
Quando o processo é contra jornalistas de grandes companhias, ela é o oposto.
O caso Collor X Augusto Nunes, do site da Veja, é exemplar. Collor foi chamado de chefe de bando e coisas do gênero. Na ação que moveu, lembrou que o STF – tão louvado por Nunes – o absolveu das acusações.
Nem isso foi suficiente para que ele ganhasse a causa. Não houve ofensa, segundo a Justiça.
A mesma boa vontade dos juízes não se observa quando os processados são blogueiros. É mais ou menos como Sheherazade ao julgar Justin Bieber e o “marginalzinho”. Risos e amor para um, caretas e ódio para o outro.
As várias ações movidas por Ali Kamel contra eles provam a diferença de tratamento para blogueiros diante de juízes.
O caso mais recente envolve Marco Aurélio de Mello (não confundir com o magnífico homônimo).
Mello trabalhou com Kamel na Globo. Saiu há sete anos, e hoje está na Record. Mantém – ou mantinha, porque afirmou que se afastará dele – o blog Doladodelá.
Dias atrás, Mello anunciou que estava sendo processado por Kamel por um texto em que fez críticas ao antigo chefe e ao jornalismo da Globo.
Mello diz que Kamel adotou o jornalismo “bolinha de papel” na Globo, e que inspira terror na equipe. Mas não disse nada parecido com “chefe de bando”. Dos tempos em que participei de reuniões ao lado de Kamel no Conedit, o conselho editorial da Globo, lembro que ele era extremamente sério e reacionário.
Jamais o vi sorrir, jamais o vi contar uma piada, jamais o vi ser agradável com os presentes. Timidez? Insegurança? Arrogância? Não sei. De toda forma, não gostaria de tê-lo como chefe.
Mello já perdeu uma ação movida por Kamel, e está recorrendo dela, o que não é barato. O novo processo o deixou preocupado com o estado de suas contas. E então ele decidiu pedir doações para poder enfrentar Kamel.
Não sou juiz para entrar no mérito das causas de Kamel.
Mas existe uma injustiça no quadro. Kamel tem enorme vantagem competitiva diante dos juízes brasileiros.
Quem quer se indispor com o chefe do telejornalismo da Globo? Na contrapartida, que juiz não quer ser bem visto pela Globo?
Do ponto de vista econômico, é também um massacre, um combate entre desiguais. Mover um processo para Kamel é uma coisa simples. Uma secretária pode cuidar de quase tudo aquilo que toma tempo de quem aciona alguém.
Ele pode obter orientação do departamento jurídico da Globo, e advogado nenhum vai cobrar excessivamente dele.
Dada a vaidade dos advogados, eles podem acalentar a esperança de um dia aparecer numa reportagem do Jornal Nacional, caso trabalhem numa causa de Kamel, e esta exposição com certeza traria clientela e honorários mais altos.
Não estou dizendo que isto aconteça, mas as coisas, nos bastidores, são menos bonitas e desinteressadas do que gostaríamos que fossem.
Mello, ao contrário de Kamel, não tem uma Globo por trás. Suas armas são bem mais modestas, incluída aí a possibilidade financeira de bancar disputas judiciais.
É uma disputa fundamentalmente injusta.
Num mundo menos imperfeito – na Dinamarca, por exemplo – um sistema jurídico menos inclinado aos poderosos talvez igualasse as forças na contenda.
Mas estamos a 10 mil km da Dinamarca, e a muitos anos de sua sociedade quase utópica.
E então blogueiros de grandes companhias podem chamar as pessoas de bandidas, corruptas, bêbadas, e sair por aí dando risada e se gabando diante dos amigos.
Mas blogueiros como Marco Aurélio de Mello recebem um tratamento completamente diferente, e é uma mostra de quanto temos que avançar como país.
Hoje as grandes forças reacionárias do Brasil são a imprensa empresarial (o pig) e amplos setores (majoritários) do judiciário. Luta desigual, mas nunca tivemos igualdade de forças (nem ganhando eleição federal), e estamos ai, na luta.
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