Por Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa:
Trecho de uma reportagem publicada pelo Globo na edição de quinta-feira (1/5) esclarece como os operadores de crimes financeiros se sentem seguros e confortáveis em suas atividades. A personagem principal da história é a doleira Nelma Kodama, considerada responsável por uma das quatro maiores centrais de movimentação ilegal de moeda estrangeira no Brasil.
O texto relata que a doleira cansou de ver sua casa de câmbio, em Santo André, na região metropolitana de São Paulo, ser devassada pela polícia, e agora recebe seus clientes num imóvel dissimulado como restaurante chinês. Ali não existe a hipótese de se apreciar os rolinhos primavera, ou, como diz a repórter, “comer sukiyaki é bem difícil”: o que a casa oferece é câmbio de moedas. Segundo o Globo, seus clientes costumam entregar a ela grandes somas, em alguns casos volumes com mais de R$ 100 mil, e circulam em seu esquema pelo menos R$ 4 milhões por mês.
A doleira foi apanhada com 200 mil euros escondidos sob a roupa, durante a Operação Lava-Jato, que trouxe novamente às primeiras páginas o nome de Alberto Youssef, apontado como o articulador da principal quadrilha que se dedica à lavagem de dinheiro em contas no exterior.
A Polícia Federal afirma que, somente entre maio e novembro de 2013, ela remeteu ilegalmente para fora do país um total de US$ 5,2 milhões, usando 91 operações fictícias de importação, para as quais utilizou apenas uma de suas várias empresas de fachada. Foi apanhada em flagrante quando tentava embarcar para a Europa com os 200 mil euros porque, segundo a imprensa, detalhes sobre a Operação Lava-Jato haviam vazado dos inquéritos sigilosos.
O Estado de S.Paulo e a Folha de S.Paulo noticiam, também na quinta-feira (1/5), que Alberto Youssef e Nelma Kodama planejavam fugir porque souberam que a investigação iria resultar na prisão dos dois. Gravações de conversas entre os doleiros revelam, segundo os jornais, que eles tinham um helicóptero preparado para retirá-los de cena.
Material de campanha
Deixemos de lado, por enquanto, o noticiário sobre o suposto vazamento de informações de um inquérito da Polícia Federal, porque não contém qualquer novidade: a longa carreira dos grandes lavadores de dinheiro, sob a mais límpida impunidade, só pode ser explicada pela certeza que eles sempre tiveram de que o esquema está resguardado pela omissão ou a cumplicidade de autoridades. Fiquemos, então, com o relato do Globo sobre o perfil da doleira Nelma Kodama, cuja fonte parece ser a Polícia Federal.
Espanta, nessa reportagem, como ela movimenta tanto dinheiro há tanto tempo, tendo sido investigada já em 2006, durante a CPI dos Bingos, e sendo considerada pela polícia como uma das maiores operadoras do câmbio ilegal no país. Gravações cujo conteúdo é citado pela repórter do jornal carioca mostram que a doleira trata sua situação com ironia: numa das conversas, ela diz que não possui bens em seu nome – o que tem de seu é apenas um chip de telefone celular.
No processo em que aparece como ré, na Justiça Federal do Paraná, busca-se o paradeiro de nada menos do que R$ 103 milhões, que passaram por oito empresas de fachada e seis contas bancárias controladas por ela em nove países. Trata-se, portanto, de um esquema amplo, que, como já foi revelado em outras operações policiais, envolve políticos de vários partidos, empresários, atletas de futebol, artistas, publicitários e muito mais.
O texto do Globo reforça a ideia de que a Operação Lava-Jato levanta apenas uma borda do amplo tapete sob o qual se esconde o dinheiro da corrupção, da sonegação, da evasão de lucros e provavelmente também do tráfico de drogas. No entanto, o que diz o título da reportagem que traça o perfil da acusada? Diz assim: “A doleira que teria trabalhado para o PT”.
Ou seja, usa-se como fonte um inquérito que já virou processo judicial, no qual se revela um amplo e diversificado esquema criminoso, e o jornal joga toda a suspeição num único partido.
Por que não dizer “a doleira que trabalhou para políticos e empresários”? Porque a imprensa não tem interesse em desvendar o grande esquema de lavagem de dinheiro, mas usar uma parcela das informações para apontar o dedo em uma direção específica. Afinal, é desse material jornalístico que se municiam os marqueteiros de campanha.
Trecho de uma reportagem publicada pelo Globo na edição de quinta-feira (1/5) esclarece como os operadores de crimes financeiros se sentem seguros e confortáveis em suas atividades. A personagem principal da história é a doleira Nelma Kodama, considerada responsável por uma das quatro maiores centrais de movimentação ilegal de moeda estrangeira no Brasil.
O texto relata que a doleira cansou de ver sua casa de câmbio, em Santo André, na região metropolitana de São Paulo, ser devassada pela polícia, e agora recebe seus clientes num imóvel dissimulado como restaurante chinês. Ali não existe a hipótese de se apreciar os rolinhos primavera, ou, como diz a repórter, “comer sukiyaki é bem difícil”: o que a casa oferece é câmbio de moedas. Segundo o Globo, seus clientes costumam entregar a ela grandes somas, em alguns casos volumes com mais de R$ 100 mil, e circulam em seu esquema pelo menos R$ 4 milhões por mês.
A doleira foi apanhada com 200 mil euros escondidos sob a roupa, durante a Operação Lava-Jato, que trouxe novamente às primeiras páginas o nome de Alberto Youssef, apontado como o articulador da principal quadrilha que se dedica à lavagem de dinheiro em contas no exterior.
A Polícia Federal afirma que, somente entre maio e novembro de 2013, ela remeteu ilegalmente para fora do país um total de US$ 5,2 milhões, usando 91 operações fictícias de importação, para as quais utilizou apenas uma de suas várias empresas de fachada. Foi apanhada em flagrante quando tentava embarcar para a Europa com os 200 mil euros porque, segundo a imprensa, detalhes sobre a Operação Lava-Jato haviam vazado dos inquéritos sigilosos.
O Estado de S.Paulo e a Folha de S.Paulo noticiam, também na quinta-feira (1/5), que Alberto Youssef e Nelma Kodama planejavam fugir porque souberam que a investigação iria resultar na prisão dos dois. Gravações de conversas entre os doleiros revelam, segundo os jornais, que eles tinham um helicóptero preparado para retirá-los de cena.
Material de campanha
Deixemos de lado, por enquanto, o noticiário sobre o suposto vazamento de informações de um inquérito da Polícia Federal, porque não contém qualquer novidade: a longa carreira dos grandes lavadores de dinheiro, sob a mais límpida impunidade, só pode ser explicada pela certeza que eles sempre tiveram de que o esquema está resguardado pela omissão ou a cumplicidade de autoridades. Fiquemos, então, com o relato do Globo sobre o perfil da doleira Nelma Kodama, cuja fonte parece ser a Polícia Federal.
Espanta, nessa reportagem, como ela movimenta tanto dinheiro há tanto tempo, tendo sido investigada já em 2006, durante a CPI dos Bingos, e sendo considerada pela polícia como uma das maiores operadoras do câmbio ilegal no país. Gravações cujo conteúdo é citado pela repórter do jornal carioca mostram que a doleira trata sua situação com ironia: numa das conversas, ela diz que não possui bens em seu nome – o que tem de seu é apenas um chip de telefone celular.
No processo em que aparece como ré, na Justiça Federal do Paraná, busca-se o paradeiro de nada menos do que R$ 103 milhões, que passaram por oito empresas de fachada e seis contas bancárias controladas por ela em nove países. Trata-se, portanto, de um esquema amplo, que, como já foi revelado em outras operações policiais, envolve políticos de vários partidos, empresários, atletas de futebol, artistas, publicitários e muito mais.
O texto do Globo reforça a ideia de que a Operação Lava-Jato levanta apenas uma borda do amplo tapete sob o qual se esconde o dinheiro da corrupção, da sonegação, da evasão de lucros e provavelmente também do tráfico de drogas. No entanto, o que diz o título da reportagem que traça o perfil da acusada? Diz assim: “A doleira que teria trabalhado para o PT”.
Ou seja, usa-se como fonte um inquérito que já virou processo judicial, no qual se revela um amplo e diversificado esquema criminoso, e o jornal joga toda a suspeição num único partido.
Por que não dizer “a doleira que trabalhou para políticos e empresários”? Porque a imprensa não tem interesse em desvendar o grande esquema de lavagem de dinheiro, mas usar uma parcela das informações para apontar o dedo em uma direção específica. Afinal, é desse material jornalístico que se municiam os marqueteiros de campanha.
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