Proibido de escrever sobre política em sua coluna no jornal "O Estado de Minas" - que deu apoio ao cambaleante Aécio Neves na disputa presidencial, inclusive com a presença do chefão da empresa no palanque do tucano -, o jornalista João Paulo Cunha pediu demissão nesta terça-feira (16). A decisão foi tomada após uma reunião com a diretoria do veículo, o mais tradicional e conservador do Estado. A chefia informou que ele não poderia mais escrever sobre política e o jornalista pediu as contas.
A demissão de João Paulo Cunha reforça a denúncia contra o estado de censura que impera em Minas Gerais desde a chegada de Aécio Neves ao governo estadual há doze anos. Através do contato direto com os barões da mídia e da concessão de publicidade e outras favores, o tucanato calou a imprensa local. Muitos jornalistas já foram perseguidos e demitidos e outros optaram pela autocensura para garantir seus empregos. Antes das eleições presidenciais, pesquisas revelaram que os mineiros sequer sabiam das denúncias de irregularidades e corrupção contra os três últimos governos do PSDB.
Na avaliação de João Paulo Cunha, a censura dos seus artigos confirma que o jornal adotou uma linha editorial "francamente a favor de Aécio Neves". O autoritarismo virou regra na redação. "Acho inadmissível que um jornal censure seus profissionais. A luta histórica que tivemos no Brasil é para termos o jornalismo como instrumento de cidadania”, afirma. Na sua última coluna no suplemento mensal "Pensar", intitulada "Síndrome de Capitu", o jornalista criticou o movimento golpista contra a presidenta Dilma e defendeu a reforma política como "agenda prioritária para a sociedade".
"A coluna que escreveu deve ter desagradado interesses do jornal e de alguns políticos, que fizeram a represália a ele... Infelizmente, o 'Estado de Minas' perde qualidade e credibilidade com essa atitude. A gente espera que esse seja o último caso de censura da era tucana em Minas, mas talvez seja o mais emblemático, pelo que João Paulo representava para o jornalismo", afirma Kerison Lopes, presidente do Sindicato dos Jornalistas de Minas Gerais. A entidade repudiou a censura e vários profissionais também expressaram sua solidariedade ao colega demitido, que era muito respeitado na redação.
Em entrevista à repórter Rafaella Dotta, do jornal Brasil de Fato, João Paulo Cunha - que trabalhava há 18 anos no 'Estado de Minas" e, atualmente, era o editor chefe do caderno de cultura e do suplemento que circula aos sábados, "Pensar" - falou sobre os motivos da sua demissão. Reproduzo abaixo:
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Na sua opinião, o que motivou a censura jornalística a você?
O jornal, como todos, tem uma linha editorial própria, sobre a realidade política, social e econômica. Isso é legítimo. Como eu tenho uma linha de pensamento diferente, que discordava do jornal, avisaram que eu estava a partir daquele momento proibido de escrever ideias sobre política.
Para você, é admissível que donos de um jornal ditem o que os jornalistas vão escrever?
Não. Acho inadmissível que um jornal censure seus profissionais. A luta histórica que tivemos no Brasil é para termos o jornalismo como instrumento de cidadania. Ao censurar a imprensa ou o jornalista, você está tirando dele o mais importante, que é a liberdade de expressão e a possibilidade de trazer várias visões de mundo.
Sempre há denúncias de que há censura no Estado de Minas, inclusive durante as eleições. Isso realmente acontece?
Na minha área de trabalho, que é a cultura, nunca tive nenhum tipo de cerceamento com relação aos conteúdos. Mas ficou nítida nessa última eleição uma linha explícita a favor de Aécio Neves, sempre positivando as ações dele, e críticas e negativas a Dilma Rousseff. Hoje há um nítido direcionamento, que favorece Aécio.
Por que isso prejudica o jornalismo?
A base do nosso trabalho é ampliar a capacidade das pessoas de se relacionar com o mundo, para tomar suas decisões da melhor forma e viver em sociedade. Quanto mais informação ele divulga, maior o compromisso do jornal com a sociedade. Se você limita as ideias a apenas uma posição, você está impedindo que o jornalismo faça o que é sua função essencial: levar informação de qualidade, reflexão e visão de mundo plural para todas as pessoas.
Sempre há denúncias de que há censura no Estado de Minas, inclusive durante as eleições. Isso realmente acontece?
Na minha área de trabalho, que é a cultura, nunca tive nenhum tipo de cerceamento com relação aos conteúdos. Mas ficou nítida nessa última eleição uma linha explícita a favor de Aécio Neves, sempre positivando as ações dele, e críticas e negativas a Dilma Rousseff. Hoje há um nítido direcionamento, que favorece Aécio.
Por que isso prejudica o jornalismo?
A base do nosso trabalho é ampliar a capacidade das pessoas de se relacionar com o mundo, para tomar suas decisões da melhor forma e viver em sociedade. Quanto mais informação ele divulga, maior o compromisso do jornal com a sociedade. Se você limita as ideias a apenas uma posição, você está impedindo que o jornalismo faça o que é sua função essencial: levar informação de qualidade, reflexão e visão de mundo plural para todas as pessoas.
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Ainda bem que este cambaleante não ganhou.
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