Por Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa:
Os jornais anunciam na quarta-feira (17/6) um acordo entre o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, e a liderança do PSDB, para aprovar uma nova versão do projeto de redução da maioridade penal. A proposta tem o apoio dos partidos Democratas, PSB, Solidariedade e siglas de menor expressão, compondo uma aliança que reúne as correntes mais conservadoras do Parlamento. O que os autores chamam de “flexibilização” é a aplicação da pena de prisão para menores entre 16 e 18 anos que cometam crimes hediondos.
Paralelamente, o Poder Executivo busca uma alternativa que impeça a quebra da Doutrina da Proteção Integral de crianças e adolescentes, cujos fundamentos estão inscritos na Constituição e em tratados internacionais firmados pelo Brasil. A aposta é na sugestão do senador José Serra, defendida também pelo governador paulista, Geraldo Alckmin – ambos do PSDB –, que prevê aumento de três para oito anos o período de internação de menores infratores em casos mais graves.
O governo estuda outras sugestões do mesmo PSDB, como o aumento da pena para adultos que induzem menores de 18 anos ao crime ou que utilizam adolescentes em ações violentas. Também está sendo analisada a proposta de condicionar a aplicação da pena de prisão para menores de 18 anos à interpretação de um juiz. Nesse caso, a decisão judicial poderia determinar se um adolescente que pratique um crime hediondo seria processado com base no Código Penal, caso em que cumpriria a pena em estabelecimento separado do sistema prisional para adultos.
Como se vê, a ampliação do debate pode criar uma fórmula que vença o clima de linchamento criado por parlamentares da chamada “bancada da bala” e amplificado pelos programas policiais da televisão e do rádio.
O ponto não negociável, por parte do Executivo e da parcela do PSDB que ainda tem algum vínculo com as origens do partido, é preservar o princípio constitucional que fundamenta a posição do Brasil sobre a questão, para efeito interno e como parte do concerto mundial de nações: um sistema de justiça que garanta tratamento diferenciado a crianças e adolescentes, mesmo em caso de infração penal.
Igreja versus Estado
Até aqui, os argumentos contra a redução pura e simples da maioridade penal, defendida pelo presidente da Câmara com apoio do chamado “baixo clero” do Parlamento, têm obtido mais repercussão da mídia do que as teses daqueles que defendem um Estado garantidor dos direitos humanos, contra a proposta de um Estado punidor.
Por trás do empenho em criminalizar a adolescência vicejam algumas causas inconfessáveis, como o interesse de parlamentares ligados a seitas religiosas, que pretendem retirar a proteção do Estado sobre a parte mais vulnerável da sociedade, para cooptar famílias que têm filhos em situação de risco.
A imprensa tem oferecido pouca contribuição para esse debate, limitando-se a reproduzir declarações de políticos e os movimentos do Congresso. Na noite de terça-feira (16/6), o noticiário da televisão destacou estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) que desmente o mito da impunidade juvenil. Na quarta-feira, apenas o Estado de S. Paulo deu atenção ao trabalho em sua edição de papel.
A pesquisa do Ipea mostra que, ao contrário do que alardeiam muitos jornalistas e os defensores do retrocesso legal, “a justiça juvenil tende a ser aplicada de forma mais dura do que a Justiça penal comum”, diz o texto do jornal. Apesar de não haver estatísticas precisas sobre violência na maioria dos estados, pode-se comprovar que os menores de 18 anos são mais passíveis de internação e cumprem mais rigorosamente as penas de restrição de liberdade do que os adultos infratores.
A imprensa não costuma se empenhar em elucidar esse e outros enganos sobre a questão da maioridade penal. Um exemplo: na sexta-feira (12/6), o Estado de S. Paulo publicou na primeira página uma chamada para reportagem cujo título dizia: “Ato infracional é maior na faixa de 16 a 18 anos”. Lido rapidamente nas bancas, esse texto certamente induz muita gente a apoiar a proposta de redução da maioridade penal.
Também na abertura da seção “Metrópole”, a reportagem principal (ver aqui) anunciava: “7 em cada 10 atos infracionais em SP envolvem adolescentes de 16 a 18 anos” – o que também reforça a ideia de que menores de 18 anos são os grandes responsáveis pela violência na capital paulista.
Mas o texto que se segue esclarece que “sete em cada dez atos infracionais cometidos por adolescentes na cidade de São Paulo tiveram como autor um menor entre 16 e 18 anos” – mas os crimes hediondos, como latrocínio, cometidos por adolescentes, representam menos de 3% desses crimes.
É com base em textos obtusos como esse que se manifestam os arautos do obscurantismo.
Paralelamente, o Poder Executivo busca uma alternativa que impeça a quebra da Doutrina da Proteção Integral de crianças e adolescentes, cujos fundamentos estão inscritos na Constituição e em tratados internacionais firmados pelo Brasil. A aposta é na sugestão do senador José Serra, defendida também pelo governador paulista, Geraldo Alckmin – ambos do PSDB –, que prevê aumento de três para oito anos o período de internação de menores infratores em casos mais graves.
O governo estuda outras sugestões do mesmo PSDB, como o aumento da pena para adultos que induzem menores de 18 anos ao crime ou que utilizam adolescentes em ações violentas. Também está sendo analisada a proposta de condicionar a aplicação da pena de prisão para menores de 18 anos à interpretação de um juiz. Nesse caso, a decisão judicial poderia determinar se um adolescente que pratique um crime hediondo seria processado com base no Código Penal, caso em que cumpriria a pena em estabelecimento separado do sistema prisional para adultos.
Como se vê, a ampliação do debate pode criar uma fórmula que vença o clima de linchamento criado por parlamentares da chamada “bancada da bala” e amplificado pelos programas policiais da televisão e do rádio.
O ponto não negociável, por parte do Executivo e da parcela do PSDB que ainda tem algum vínculo com as origens do partido, é preservar o princípio constitucional que fundamenta a posição do Brasil sobre a questão, para efeito interno e como parte do concerto mundial de nações: um sistema de justiça que garanta tratamento diferenciado a crianças e adolescentes, mesmo em caso de infração penal.
Igreja versus Estado
Até aqui, os argumentos contra a redução pura e simples da maioridade penal, defendida pelo presidente da Câmara com apoio do chamado “baixo clero” do Parlamento, têm obtido mais repercussão da mídia do que as teses daqueles que defendem um Estado garantidor dos direitos humanos, contra a proposta de um Estado punidor.
Por trás do empenho em criminalizar a adolescência vicejam algumas causas inconfessáveis, como o interesse de parlamentares ligados a seitas religiosas, que pretendem retirar a proteção do Estado sobre a parte mais vulnerável da sociedade, para cooptar famílias que têm filhos em situação de risco.
A imprensa tem oferecido pouca contribuição para esse debate, limitando-se a reproduzir declarações de políticos e os movimentos do Congresso. Na noite de terça-feira (16/6), o noticiário da televisão destacou estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) que desmente o mito da impunidade juvenil. Na quarta-feira, apenas o Estado de S. Paulo deu atenção ao trabalho em sua edição de papel.
A pesquisa do Ipea mostra que, ao contrário do que alardeiam muitos jornalistas e os defensores do retrocesso legal, “a justiça juvenil tende a ser aplicada de forma mais dura do que a Justiça penal comum”, diz o texto do jornal. Apesar de não haver estatísticas precisas sobre violência na maioria dos estados, pode-se comprovar que os menores de 18 anos são mais passíveis de internação e cumprem mais rigorosamente as penas de restrição de liberdade do que os adultos infratores.
A imprensa não costuma se empenhar em elucidar esse e outros enganos sobre a questão da maioridade penal. Um exemplo: na sexta-feira (12/6), o Estado de S. Paulo publicou na primeira página uma chamada para reportagem cujo título dizia: “Ato infracional é maior na faixa de 16 a 18 anos”. Lido rapidamente nas bancas, esse texto certamente induz muita gente a apoiar a proposta de redução da maioridade penal.
Também na abertura da seção “Metrópole”, a reportagem principal (ver aqui) anunciava: “7 em cada 10 atos infracionais em SP envolvem adolescentes de 16 a 18 anos” – o que também reforça a ideia de que menores de 18 anos são os grandes responsáveis pela violência na capital paulista.
Mas o texto que se segue esclarece que “sete em cada dez atos infracionais cometidos por adolescentes na cidade de São Paulo tiveram como autor um menor entre 16 e 18 anos” – mas os crimes hediondos, como latrocínio, cometidos por adolescentes, representam menos de 3% desses crimes.
É com base em textos obtusos como esse que se manifestam os arautos do obscurantismo.
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