Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:
Se o governo Dilma Rousseff não enfrentasse uma situação de defensiva absoluta, procurando encontrar oxigênio de qualquer maneira, seria mais fácil refazer um debate político essencial para os rumos do Brasil e o futuro dos brasileiros.
O colapso de US$ 3 trilhões de dólares, até agora, produzido pelas bolsas da China, poderia servir de um estímulo poderoso para passar a limpo um conjunto de lendas e mitos que circulam pelo país desde a posse de Dilma e o anúncio do ajuste econômico. Gostaria de acreditar que isso é verdade.
Ao assumir as linhas gerais de uma orientação que sempre fez parte da cartilha de seus adversários até a vitória no segundo turno, o Planalto permitiu aos adversários ir à revanche no debate sobre os rumos da política econômica, que irá definir o futuro do país nos próximos anos e o padrão de vida das próximas gerações.
Parece consolidado, em grande parte dos meios políticos, a noção de que as dificuldades que o Brasil enfrenta, em 2015, são responsabilidade exclusiva do governo federal, que nos últimos anos teria desperdiçado excelentes oportunidades para ajustar a economia e colocar o país no compasso de um crescimento que - supostamente - permitiu à maioria dos países do planeta deixar o desemprego e a recessão para trás. Muitas pessoas se referem ao assunto como matéria vencida, aquelas verdades tão óbvias que nem se deveria perder tempo discutindo.
Os fundamentos reais dessa visão são muito discutíveis - pelo menos. Diz o Wall Street Journal, reproduzido no Valor de hoje: "os Estados Unidos têm sido a tartaruga na corrida global, atravessando uma expansão lenta, mas estável, enquanto a China dá sinais de exaustão e o resto do mundo patina." Engraçado, não?
A utilidade prática de uma teoria sem base real é obvia. Ao colocar a questão interna no foco, ela ajuda a pressionar o Planalto a negociar um conjunto de medidas que, derrotadas pelas urnas de 2014, podem ser recuperadas em função das necessidades políticas de 2015. Este é o sentido da Agenda Brasil.
O que se pretende é transformar um ajuste temporário - como foi anunciado na posse - num programa duradouro para ser executado até o final do governo.
O tombo chinês permite questionar esse conto de fadas externo.
Confirma - como Dilma não cansou de repetir corajosamente nos últimos anos - que vive-se um momento de fraqueza na economia mundial. Só para dar um dado que vale por todos os outros. Em 2014, o saldo comercial entre Brasil e China chegou a US$ 3,2 bilhões contra US$ 8,7 bilhões em 2013 e até US$ 11,5 em 2011. Para 2015, a projeção é um saldo de US$ 2,6 bilhões, levemente superior ao de US$ 2,3 em 2003, quando os dois países apenas iniciavam o salto comercial que marcou os dez anos seguintes, em volumes desiguais, nem sempre para cima, mas numa tendência óbvia de alta.
A questão deixada pelo sumiço de US$ 3 trilhões e um número ainda não avaliado de empregos envolve o que fazer para recuperar o crescimento -- sem esperanças milagrosas, vamos ter clareza.
A tartaruga norte-americana mantém o passo graças a uma política de estímulo a investimentos, a começar por juros a nível zero. Embora não faltem pressões do mercado para que essa política seja abandonada, a prudência tem prevalecido até agora - postura que deve ser reforçada com o colapso chinês, como alertou ontem Lawrence Summers, professor de Harvard e antigo assessor de Obama. O crescimento chinês, em queda, encontra-se em torno de 5% e 6% - o que é pouco pelo passado, mas uma enormidade no cenário atual.
Entre as economias mais relevantes, que tem o poder de modificar o horizonte mundial, a União Européia transformou-se num atoleiro planetário. Não cresce e, pelo tamanho de seu mercado consumidor, o maior do mundo, não deixa crescer. Isso ocorre porque ali se instituiu, desde o colapso de 2008/2009, uma política permanente de austeridade, que programa a destruição do Estado de bem-estar social mais antigo do planeta e o equilíbrio de sociedades que há várias gerações criaram formas de permanente distribuição de renda. Colocando a situação em termos resumidos e até grosseiros -- mas reais. Planejada como a fábrica do século XXI, o enfraquecimento da China só se compreende pelo empobrecimento dos consumidores europeus que deveriam adquirir suas mercadorias.
Essa é a questão que interessa ao mundo inteiro.
Se o governo Dilma Rousseff não enfrentasse uma situação de defensiva absoluta, procurando encontrar oxigênio de qualquer maneira, seria mais fácil refazer um debate político essencial para os rumos do Brasil e o futuro dos brasileiros.
O colapso de US$ 3 trilhões de dólares, até agora, produzido pelas bolsas da China, poderia servir de um estímulo poderoso para passar a limpo um conjunto de lendas e mitos que circulam pelo país desde a posse de Dilma e o anúncio do ajuste econômico. Gostaria de acreditar que isso é verdade.
Ao assumir as linhas gerais de uma orientação que sempre fez parte da cartilha de seus adversários até a vitória no segundo turno, o Planalto permitiu aos adversários ir à revanche no debate sobre os rumos da política econômica, que irá definir o futuro do país nos próximos anos e o padrão de vida das próximas gerações.
Parece consolidado, em grande parte dos meios políticos, a noção de que as dificuldades que o Brasil enfrenta, em 2015, são responsabilidade exclusiva do governo federal, que nos últimos anos teria desperdiçado excelentes oportunidades para ajustar a economia e colocar o país no compasso de um crescimento que - supostamente - permitiu à maioria dos países do planeta deixar o desemprego e a recessão para trás. Muitas pessoas se referem ao assunto como matéria vencida, aquelas verdades tão óbvias que nem se deveria perder tempo discutindo.
Os fundamentos reais dessa visão são muito discutíveis - pelo menos. Diz o Wall Street Journal, reproduzido no Valor de hoje: "os Estados Unidos têm sido a tartaruga na corrida global, atravessando uma expansão lenta, mas estável, enquanto a China dá sinais de exaustão e o resto do mundo patina." Engraçado, não?
A utilidade prática de uma teoria sem base real é obvia. Ao colocar a questão interna no foco, ela ajuda a pressionar o Planalto a negociar um conjunto de medidas que, derrotadas pelas urnas de 2014, podem ser recuperadas em função das necessidades políticas de 2015. Este é o sentido da Agenda Brasil.
O que se pretende é transformar um ajuste temporário - como foi anunciado na posse - num programa duradouro para ser executado até o final do governo.
O tombo chinês permite questionar esse conto de fadas externo.
Confirma - como Dilma não cansou de repetir corajosamente nos últimos anos - que vive-se um momento de fraqueza na economia mundial. Só para dar um dado que vale por todos os outros. Em 2014, o saldo comercial entre Brasil e China chegou a US$ 3,2 bilhões contra US$ 8,7 bilhões em 2013 e até US$ 11,5 em 2011. Para 2015, a projeção é um saldo de US$ 2,6 bilhões, levemente superior ao de US$ 2,3 em 2003, quando os dois países apenas iniciavam o salto comercial que marcou os dez anos seguintes, em volumes desiguais, nem sempre para cima, mas numa tendência óbvia de alta.
A questão deixada pelo sumiço de US$ 3 trilhões e um número ainda não avaliado de empregos envolve o que fazer para recuperar o crescimento -- sem esperanças milagrosas, vamos ter clareza.
A tartaruga norte-americana mantém o passo graças a uma política de estímulo a investimentos, a começar por juros a nível zero. Embora não faltem pressões do mercado para que essa política seja abandonada, a prudência tem prevalecido até agora - postura que deve ser reforçada com o colapso chinês, como alertou ontem Lawrence Summers, professor de Harvard e antigo assessor de Obama. O crescimento chinês, em queda, encontra-se em torno de 5% e 6% - o que é pouco pelo passado, mas uma enormidade no cenário atual.
Entre as economias mais relevantes, que tem o poder de modificar o horizonte mundial, a União Européia transformou-se num atoleiro planetário. Não cresce e, pelo tamanho de seu mercado consumidor, o maior do mundo, não deixa crescer. Isso ocorre porque ali se instituiu, desde o colapso de 2008/2009, uma política permanente de austeridade, que programa a destruição do Estado de bem-estar social mais antigo do planeta e o equilíbrio de sociedades que há várias gerações criaram formas de permanente distribuição de renda. Colocando a situação em termos resumidos e até grosseiros -- mas reais. Planejada como a fábrica do século XXI, o enfraquecimento da China só se compreende pelo empobrecimento dos consumidores europeus que deveriam adquirir suas mercadorias.
Essa é a questão que interessa ao mundo inteiro.
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