quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Operação Zelotes pode atingir a Globo

Por Eduardo Guimarães, no Blog da Cidadania:

Há cerca de uma semana, o jornal Valor Econômico divulgou que “entre o fim de agosto e início de setembro o Ministério Público Federal encaminhará à Justiça a primeira leva de denúncias baseadas nas apurações da Operação Zelotes, da Polícia Federal”.

A informação foi dada pelo procurador responsável pelo caso, Frederico Paiva. “O número de denunciados será elevado”, diz ele.

Deflagrada no fim de março, a Operação decorreu de uma carta anônima entregue num envelope pardo à Polícia Federal. A Zelotes investiga um dos maiores esquemas de sonegação fiscal já descobertos no país.

A suspeita é a de que quadrilhas atuavam junto ao Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), órgão ligado ao Ministério da Fazenda, para reverter ou anular multas por sonegação fiscal

A entidade é um tribunal administrativo formado por representantes da Fazenda e dos contribuintes (empresas) que julga hoje processos que chegam ao montante estratosférico de R$ 580 bilhões.

Nesse aspecto, vale comentar que o nível espantoso de sonegação de impostos no Brasil é responsável pela má qualidade dos serviços públicos e pela alta carga tributária. Como muitos sonegam, os impostos têm que ser mais altos para que quem não tem como fugir de pagá-los (como bancos e trabalhadores, que têm desconto dos impostos na folha de pagamento) pague a conta dos que têm.

Apesar disso, criou-se, no Brasil, um conceito absurdo – inaceitável em qualquer país civilizado – de que “sonegar não é crime”.

Esse conceito é verbalizado e escrito abertamente, de uma forma tão descarada que na manifestação contra o governo Dilma, no último domingo, vários manifestantes portavam cartazes pregando sonegação.



Não se pode, no entanto, culpar cem por cento essas pessoas, já que o culto à sonegação é imenso, no Brasil.

Isso ocorre em nível tão alto que meliantes travestidos de “jornalistas” chegam a escrever artigos defendendo a sonegação, como no texto publicado no ano passado no site Jus Brasil que leva um título que reproduz a frase contida na imagem acima:

O artigo “Sonegar imposto é errado? Nem sempre. No Brasil, é legítima defesa”, foi escrito por um tal de Aluízio Couto. O autor faz uma defesa apaixonada da sonegação de impostos e chega a relatar que seus amigos sonegam porque não concordam em “ter o governo como sócio”.

Essa gente costuma se referir aos Estados Unidos como modelo a ser seguido. Se alguém escrevesse um artigo como esse por lá, no entanto, iria ver o sol nascer quadrado rapidinho.

O crime de sonegação fiscal, porém, deixa o de corrupção no chinelo. Deixa-se de recolher 500 bilhões de reais por ano aos cofres públicos, calcula o presidente do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional, Heráclio Camargo.

Já o custo anual médio da corrupção no Brasil, em valores de 2013, corresponde a 67 bilhões, informa José Ricardo Roriz Coelho, diretor-titular do Departamento de Competitividade e Tecnologia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, com base em cálculos recentes.

A Operação Zelotes, portanto, poderia tirar o Brasil do ajuste fiscal, se vingasse. Estima-se que envolve o montante sonegado de 19 bilhões de reais, muito mais do que o ajuste fiscal do governo, agora reduzido para cerca de 8 bilhões de reais.

O nome Zelotes vem do adjetivo zelote, referente àquele que finge ter zelo. O nome da Operação da PF faz alusão ao contraste entre a função dos conselheiros do Carf de resguardar os cofres públicos e os possíveis desvios que efetuaram.

À frente da investigação está o procurador do Ministério Público Federal Frederico Paiva. Recentemente, ele palestrou no seminário “O novo Carf: o que esperar do colegiado com as mudanças”. O evento foi promovido pela InterNews na quarta-feira (12/8), em São Paulo.

Paiva prega que os cerca de 200 conselheiros do Carf passem a ser remunerados e sejam servidores públicos concursados, já que ter conselheiros vinculados às empresas que não recebem nada para atuar no órgão seria a causa da corrupção.

Para entender o procurador, basta refletir sobre por que advogados e outros representantes de empresas trabalhariam de graça se não fosse para terem como dar “jeitinhos” nos processos de seus amigos e clientes – eles vendem “pedidos de vista”, por exemplo, por valores que vão de 50 a 300 mil reais; esses pedidos de vista interrompem a tramitação dos processos de cobrança de impostos sonegados.

Paiva confessou que inveja o tratamento que o juiz federal Sergio Moro tem dado aos pedidos dos membros do Ministério Público Federal paranaense na operação “lava jato”, já que só agora conseguiu fazer a investigação andar após ter conseguido a substituição de um juiz que estava “trancando o caso”.

O procurador ainda acusa a mídia de não se interessar por crimes contra a ordem pública que lesam muito mais o país do que a corrupção de políticos. Segundo Paiva, a mídia só se interessa por escândalos se envolverem certos políticos – ou seja, os do PT e seus aliados.

Contudo, o procurador conseguiu fazer o processo andar. Não estava andando por conta da atuação do juiz federal Ricardo Augusto Soares Leite, da 10ª Vara Federal de Brasília. Soares Leite rejeitou todos os pedidos de prisão temporária e quebras de sigilo dos investigados. O MPF, então, representou ao Conselho Nacional de Justiça e conseguiu substituir o juiz “engavetador” pela juíza Marianne Bezerra Sahtler Borré, quem Leite considera “dedicada” e na qual manifestou “confiança”.

Os casos mais consistentes, segundo o procurador, envolvem as empresas Rede Brasil Sul (RBS), Gerdau, Cimento Penha, Boston Negócios, JG.Rodrigues, café Irmãos Júlio, Mundial-Eberle, Ford, Mistubishi, Santander e Safra.

Eis uma boa razão para a investigação não andar, não é mesmo?

Algumas dessas empresas, porém, mantêm vínculos estreitos com grupos de mídia, sobretudo com a Globo.

O Grupo Gerdau, por exemplo, teria subornado conselheiros do Carf para cancelar multas no montante de incrível R$ 1,2 bilhão. O dono do negócio, Jorge Gerdau Johannpeter, é um dos financiadores do Instituto Millenium, criado em parceria com a Editora Abril e que vem tendo forte atuação política contra os governos do PT.

Já a RBS, que retransmite a programação da Globo no Sul do país, é acusada de pagar R$ 15 milhões em propinas para anular dívidas de mais de R$ 150 milhões de reais com a Receita Federal. Porém, os débitos totais da RBS chegam a R$ 672 milhões.

A página do Grupo RBS na internet afirma que a empresa é “Uma das maiores empresas de comunicação multimídia do Brasil e maior afiliada da Rede Globo”.

Quando o grupo da família Sirotsky descobriu que estava sendo investigado pela Polícia Federal, em março, emitiu uma nota que, sem assinatura, seria confundida com as que políticos divulgam quando são flagrados em esquemas de corrupção:

“Desde a manhã deste sábado, o Grupo RBS tem sido citado entre as empresas que estariam sendo investigadas na chamada Operação Zelotes. Essa notícia foi difundida inclusive por nossos veículos no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, conforme os preceitos editoriais que regem nossa relação com o público.

A empresa divulgou a seguinte nota aos veículos que a procuraram: “A RBS desconhece o teor da investigação e nega qualquer irregularidade em suas relações com a Receita Federal”. Adicionalmente, a empresa transmite a todos os seus colaboradores e ao público a sua total tranquilidade quanto à lisura e à transparência dos procedimentos junto ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), bem como em todos os seus atos externos e internos em todas as áreas.

A RBS não foi procurada para fornecer qualquer informação sobre a suposta investigação e confia na atuação das instituições responsáveis pela apuração para o devido esclarecimento dos fatos, que, como sempre, seguirão tendo cobertura normal de nossos veículos”


Poucos dias depois da emissão dessa nota, o presidente Executivo do grupo RBS, Duda Sirotsky, mudou um pouco a versão da empresa que dirige e fez um pedido “emocionado”:

“A Receita Federal deve estar falando de uma operação que fizemos com a Telefônica, supostamente em 2011. Mas a RBS não agiu por mal. Nós apenas contratamos, inadvertidamente, um dos escritórios de advocacia hoje identificado como sendo de lobistas que subornavam conselheiros do Carf. Por favor, acreditem: eu não sabia de nada”.

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