Por Altamiro Borges
O pedido de desculpas, entretanto, não deve convencer ninguém. Afinal, o programa da Band já é conhecido pelo seu “humor” preconceituoso, invasivo e reacionário. A direção do “Pânico” só se manifestou porque a rejeição ao quadro racista teve enorme repercussão nas redes sociais e ainda pode resultar em multas e outras penalidades. A Comissão Nacional da Verdade da Escravidão Negra no Brasil, ligada ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), solicitou à Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) da Presidência da República que tome providências imediatas contra o programa.
Walmyr Junior *
A prática do “blackface” no Brasil deixa um rastro de vergonha. Nascido no berço do racismo cultural dos Estados Unido, a prática de se passar por negro para ser engraçado surgiu no meio de atores brancos que pintavam seus rostos com carvão ou carbono para representar, de forma estereotipada e pejorativa, um personagem negro.
A ideia surgiu no início do século 20 e tinha duas funções sistemáticas: ridicularizar o homem e a mulher negra e não dar espaço para que atores negros ganhassem notoriedade nas telas do cinema "holiudiano". As práticas recorrentes dos “blackface” catalisaram o racismo por suas piadinhas de péssimo gosto que satirizam a tradição, história e religião do povo negro africano.
Em nota divulgada nesta segunda-feira (10), a direção do
programa “Pânico”, da Band – emissora privada que explora uma concessão
pública –, finalmente pediu desculpas aos
telespectadores pelo personagem racista “Africano”, interpretado pelo “humorista”
Eduardo Sterblitch. A nota, porém, é marota. Ela justifica “a criação de
personagens, sejam eles inspirados em personalidades, profissões ou em
diferentes culturas” e não explicita se vetará o quadro “satírico”. Na maior
pureza – e cinismo –, a direção do Pânico afirma que “jamais teve a intenção de
ofender, mas sim, levar entretenimento com seu humor característico” e “pede
desculpas ao público que se ofendeu com o personagem".
O pedido de desculpas, entretanto, não deve convencer ninguém. Afinal, o programa da Band já é conhecido pelo seu “humor” preconceituoso, invasivo e reacionário. A direção do “Pânico” só se manifestou porque a rejeição ao quadro racista teve enorme repercussão nas redes sociais e ainda pode resultar em multas e outras penalidades. A Comissão Nacional da Verdade da Escravidão Negra no Brasil, ligada ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), solicitou à Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) da Presidência da República que tome providências imediatas contra o programa.
O personagem “Africano” foi destaque no
quadro de paródia ao reality show de culinária “Master Chef”. Ele é
interpretado por Eduardo Sterblitch, um “humorista” branco que se pinta de
negro – com a técnica do “blackface”. O personagem sempre aparece como selvagem, soltando gritos e grunhidos. No último domingo (9), a “atração” gerou revolta na internet. No Facebook,
a página “Repúdio ao Racismo do Personagem O Africano” obteve mais 2,7 mil adesões. Ela exigiu o fim imediato do quadro,
considerado “nojento” pelo seu estímulo ao racismo. A “atração” também
repercutiu na imprensa africana. O jornal "Sene Web" acusou o
programa de ridicularizar os afrodescendentes.
Diante da repercussão negativa, a famiglia Saad, proprietária
da Rede Bandeirantes, até insinuou que daria “um puxão de orelhas” na equipe do
“Pânico”, segundo revelou a jornalista Keila Jimenez, do site R7. Mas quem conhece
a história desta emissora, que exibe vários programas sensacionalistas e
preconceituosos, sabe que isto é puro jogo de cena para escapar de qualquer
punição. Para Humberto Adami, presidente da Comissão Nacional da Verdade da Escravidão Negra da OAB, o pedido de desculpa e mesmo a extinção do personagem não são suficientes para redimir o grave crime. "O dano já existe. É só uma questão do Ministério Público ou dos grupos interessados na questão racial postularem uma ação judicial. Era melhor que eles [a direção da Band] já fizessem a reparação, seria um exemplo sadio de como a emissora consegue buscar um outro tipo de atitude".
Nas redes sociais, o próprio "ator" Eduardo Sterblitch tentou limpar a sua barra. "Eu não sou racista e também estou chorando... A quem deixei triste ou pior, peço desculpas por minha ignorância. Que, pelo menos, eu sirva de exemplo para que isso não aconteça mais". O seu apelo, porém, também não sensibilizou a criadora da página de repúdio ao personagem no Facebook. "Não acredito na inocência dele", afirmou a jovem carioca Sandy dos Anjos, ao site F5, da Folha. "Não é a primeira vez que me sinto incomodada com esse programa. Esse quadro passou de todos os limites... Vi aquele vídeo, toda aquela gente rindo e zombando e me senti mal. É esse tipo de coisa que reforça esteriótipos de que nós negros somos uma raça inferior".
"Eu não acredito e tampouco aceito o pedido de desculpas dele, uma tentativa de enganar bobo. Não acredito que Eduardo seja burro e tenha encenado aquele quadro vergonhoso na 'inocência de fazer humor'. Fez sabendo, sim, que ofenderia muita gente e mesmo assim o fez porque ele, como pessoa privilegiada, não acha mal zombar de pessoas que são humilhadas pela cor da pele... Eduardo achou legal rir de pessoas que, por sua etnia, têm inúmeras dificuldades a mais na vida, são mortos, não têm seu corpo e cultura respeitados... Queremos uma resposta do programa e de seus patrocinadores. Que tipo de 'entretenimento' é esse que eles irresponsavelmente põe na TV? Temos pessoas do Brasil todo afim de levar isso a frente", garantiu. Outro petardo contra o racismo da Band e do Pânico foi postado pelo líder comunitário Walmyr Junior no site do Jornal do Brasil. Vale conferir:
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Nas redes sociais, o próprio "ator" Eduardo Sterblitch tentou limpar a sua barra. "Eu não sou racista e também estou chorando... A quem deixei triste ou pior, peço desculpas por minha ignorância. Que, pelo menos, eu sirva de exemplo para que isso não aconteça mais". O seu apelo, porém, também não sensibilizou a criadora da página de repúdio ao personagem no Facebook. "Não acredito na inocência dele", afirmou a jovem carioca Sandy dos Anjos, ao site F5, da Folha. "Não é a primeira vez que me sinto incomodada com esse programa. Esse quadro passou de todos os limites... Vi aquele vídeo, toda aquela gente rindo e zombando e me senti mal. É esse tipo de coisa que reforça esteriótipos de que nós negros somos uma raça inferior".
"Eu não acredito e tampouco aceito o pedido de desculpas dele, uma tentativa de enganar bobo. Não acredito que Eduardo seja burro e tenha encenado aquele quadro vergonhoso na 'inocência de fazer humor'. Fez sabendo, sim, que ofenderia muita gente e mesmo assim o fez porque ele, como pessoa privilegiada, não acha mal zombar de pessoas que são humilhadas pela cor da pele... Eduardo achou legal rir de pessoas que, por sua etnia, têm inúmeras dificuldades a mais na vida, são mortos, não têm seu corpo e cultura respeitados... Queremos uma resposta do programa e de seus patrocinadores. Que tipo de 'entretenimento' é esse que eles irresponsavelmente põe na TV? Temos pessoas do Brasil todo afim de levar isso a frente", garantiu. Outro petardo contra o racismo da Band e do Pânico foi postado pelo líder comunitário Walmyr Junior no site do Jornal do Brasil. Vale conferir:
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Blackface no 'Pânico na TV': racismo, intolerância e
xenofobia
Walmyr Junior *
A prática do “blackface” no Brasil deixa um rastro de vergonha. Nascido no berço do racismo cultural dos Estados Unido, a prática de se passar por negro para ser engraçado surgiu no meio de atores brancos que pintavam seus rostos com carvão ou carbono para representar, de forma estereotipada e pejorativa, um personagem negro.
A ideia surgiu no início do século 20 e tinha duas funções sistemáticas: ridicularizar o homem e a mulher negra e não dar espaço para que atores negros ganhassem notoriedade nas telas do cinema "holiudiano". As práticas recorrentes dos “blackface” catalisaram o racismo por suas piadinhas de péssimo gosto que satirizam a tradição, história e religião do povo negro africano.
Agora no século XXI é a vez da TV e teatro brasileiros
reproduzir a mesma forma reprovável e xenofóbica o que os americanos usaram no
inicio do século XX. Apesar do Movimento Negro historicamente contestar essa
reprodução, me parece que a manutenção do racismo é mais interessante para a
elite branca e dominante.
Quem não se lembra do ator do programa Zorra Total, da Rede
Globo, que por muito tempo exibiu um quadro onde um homem se fantasiava de
mulher negra, pintando a pele, utilizando cabelos crespos e intensificando o
deboche com dentes podres, fala “errada” e roupas esfarrapadas? E a peça da
companhia de teatro Os Fofos Encenam, que faria apresentações no espaço Itaú
Cultural que foi bombardeada pelo Movimento Negro por fazer também uso da
prática do “blackface”?
Então saíram esses atores e chegou a vez do programa Pânico
na Band da Rede Bandeirantes. Eduardo Sterblitch interpreta o personagem
Africano, com o corpo pintado de preto, ridicularizando rituais de matriz
africana, falando em uma língua incompreensível, fazendo chacota de toda
ancestralidade e riqueza cultural dos povos africanos em rede nacional, com uma
plateia que se diverte com o racismo e que aplaude a xenofobia.
Já não basta o povo negro ser violentado, escravizado e
abandonado? Ainda temos que ser ridicularizado em rede nacional? Nosso povo
sofre diariamente com a intolerância religiosa, com o racismo na hora de
conseguir um emprego, com a violência que criminaliza constantemente a nossa
juventude preta, com a falta de acesso a educação superior, e com um genocídio
em curso que quer exterminar o povo negro da terra.
O Brasil vai mostrando de novo o seu racismo que se escondia
em um discurso fajuto de um ‘povo brasileiro, sem raça e sem cor’. Um ator
representar um negro africano como um selvagem, um ator que ridiculariza as
religiões de matriz africana e ainda faz danças e gestos que remetem a um
macaco é um artista deplorável que só se importa em ganhar dinheiro
desumanizando o povo negro. É um artista que sustenta um discurso nazista que
determina que raças não negras são sempre superiores à raça negra.
O racismo estruturante, como já disse, impacta em todas as
dimensões da vida, desde a procura do trabalho a hora de dar luz. Ligada a um
processo de dominação e opressão promove impactos negativos e profundos na
contramão da tentativa de dar garantia de direitos ao povo negro, pobre e
favelado.
* Walmyr Júnior é morador de Marcílio Dias, no conjunto de
favelas da Maré, é professor e representante do Coletivo Enegrecer como
Conselheiro Nacional de Juventude (Conjuve). Integra a Pastoral Universitária
da PUC-Rio. Representou a sociedade civil no encontro com o Papa Francisco no
Theatro Municipal, durante a JMJ.
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Boicotar os patrocinadores do programa.
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