Por Margarida Salomão, na revista Fórum:
Desde que a soberania popular reelegeu a presidenta, Dilma Rousseff, com mais de 55,7 milhões de votos no ano passado, a oposição tem buscado de todas as formas transformar o ambiente político nacional em uma extensão do período eleitoral. Não se conformam em respeitar a institucionalidade do país e querem realizar sucessivos terceiros turnos eleitorais.
A situação nos traz à memória a figura dos alquimistas, pela particular obsessão de transformar qualquer tipo de metal em ouro. Estes tipos medievais parecem servir de inspiração à oposição: acham que podem transformar qualquer tipo de coisa em motivo para o impeachment da presidenta Dilma Rousseff, eleita pelo voto popular, frise-se novamente.
A tentativa de retirar a presidenta a qualquer custo faz dos opositores verdadeiros alquimistas às avessas. Diversos experimentos alquímico-golpistas têm sido testados para suplantar a escolha do povo - todos fracassos completos. A investida da vez toma por base o que grosseiramente foi denominado de pedalada fiscal. Não passa, contudo, de mais um artifício, cujas falsificações exigem ser desfeitas.
O rito inicial para a tentativa de golpe ocorreu com a reprovação das contas orçamentárias de 2014 pelo Tribunal de Contas da União (TCU), sob a justificativa de que o governo usou recursos de bancos públicos para custear programas sociais, como o Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida.
É necessário registrar o quão excêntrica é tal decisão. Primeiramente, porque contraria a postura adotada pelo mesmo TCU há décadas. O recurso àquele expediente contábil é feito ao menos desde o governo Fernando Henrique Cardoso, sem nunca ter sido questionado. De outro modo, cabe asseverar que o posicionamento do TCU é consultivo. Apesar do tribunal que o nomeia, sua atribuição se limita a emitir opiniões sobre questões contábeis. Trata-se de aconselhar ao Congresso, este sim responsável por julgar as contas presidenciais.
Ainda assim, o rito de aprovação das contas carece deste sentimento de urgência verbalizado pela oposição. Não é à toa que, até há poucas semanas, as contas de presidentes anteriores não haviam sido sequer apreciadas pelo Congresso. Será que, vinte anos depois, foi descoberto que não podemos passar sem fazer essa avaliação contábil?
À excentricidade, soma-se o puro oportunismo. Em respeito à sociedade, é preciso tratar de outras questões, estas de natureza mais substantivas. De fato, serão as pedaladas uma ilegalidade? Ou apenas um procedimento de gestão contábil? Na prática, tal pedalada foi forma encontrada para assegurar que benefícios sociais sejam pagos em dia para a população. Sim, tais recursos são pagos pelos bancos públicos. Mas a antecipação financeira realizada por estes passam longe de qualquer tipo de operações de crédito ao Tesouro Nacional, por uma simples e evidente razão: é o Tesouro Nacional o verdadeiro credor dos bancos públicos, e não o contrário.
Para se ter ideia, apenas o BNDES deve ao Tesouro Nacional algo em torno de R$ 500 bilhões. Estes valores se referem, em sua maioria, a aportes realizados pelo Tesouro para que o banco pudesse financiar diversos investimentos no país, entre os quais o Programa de Sustentação do Investimento, importante matriz do governo federal para o desenvolvimento da economia brasileira.
Há ainda que se ter em vista que a política orçamentária no Brasil não adota o regime de caixa, mas sim de competência. Isso significa dizer que o resultado orçamentário não é medido pelo nível de superávit ou déficit em determinado momento, mas sim ao longo do ano. Sendo assim, não há a necessidade de o governo antecipar aos bancos os valores das transferências referentes aos programas sociais. Estes podem realizar os pagamentos, já que sabem que, em determinada ocasião posterior, irão receber os recursos do Tesouro Nacional.Ademais, não há como falar em pedaladas no atual mandato da presidenta Dilma com o ano fiscal de 2015 ainda em andamento.
Deste modo, tais pedaladas caracterizam-se como prática contábil, corriqueira e inofensiva. Aliás, sua execução passa longe do Palácio do Planalto. Trata-se de uma atribuição da Secretaria do Tesouro Nacional, vinculada ao Ministério da Fazenda.
Este aspecto põe por terra a argumentação de que a prática das pedaladas constituiriam um crime de responsabilidade. Como ensina o jurista André Ramos Tavares, professor da USP, em recente parecer sobre essas questões, tais infrações são caracterizadas por uma tentativa dolosa de subversão da Constituição. É preciso enorme imaginação, ou alquimia, para acreditar que aqueles atos contábeis -operados de modo apenas técnico, e não político - busquem intencional e positivamente contrariar a ordem constitucional.
Não passam de má-fé, portanto, as movimentações da oposição. Contudo, o trôpego caminhar dos “moralistas sem moral” quer aproximar o país, a cada dia, de sua própria ruína institucional. O custe-o-que-custar oposicionista atenta não ao PT, ou a Dilma e a Lula, mas à própria democracia brasileira. Afinal, mudar de governo é algo a ser feito no momento do voto, de forma democrática e dentro das regras do jogo. Fora desse caminho, a troca de governo não pode ter outro nome além de golpe.
É por isso que a adoção de litigâncias tão mal sustentadas - para além de excêntricas e oportunistas - apenas conferirá ao nosso sistema político uma fragilidade incontornável. É assim que se quer edificar um grande país?
* Margarida Salomão é deputada federal pelo PT-MG.
Desde que a soberania popular reelegeu a presidenta, Dilma Rousseff, com mais de 55,7 milhões de votos no ano passado, a oposição tem buscado de todas as formas transformar o ambiente político nacional em uma extensão do período eleitoral. Não se conformam em respeitar a institucionalidade do país e querem realizar sucessivos terceiros turnos eleitorais.
A situação nos traz à memória a figura dos alquimistas, pela particular obsessão de transformar qualquer tipo de metal em ouro. Estes tipos medievais parecem servir de inspiração à oposição: acham que podem transformar qualquer tipo de coisa em motivo para o impeachment da presidenta Dilma Rousseff, eleita pelo voto popular, frise-se novamente.
A tentativa de retirar a presidenta a qualquer custo faz dos opositores verdadeiros alquimistas às avessas. Diversos experimentos alquímico-golpistas têm sido testados para suplantar a escolha do povo - todos fracassos completos. A investida da vez toma por base o que grosseiramente foi denominado de pedalada fiscal. Não passa, contudo, de mais um artifício, cujas falsificações exigem ser desfeitas.
O rito inicial para a tentativa de golpe ocorreu com a reprovação das contas orçamentárias de 2014 pelo Tribunal de Contas da União (TCU), sob a justificativa de que o governo usou recursos de bancos públicos para custear programas sociais, como o Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida.
É necessário registrar o quão excêntrica é tal decisão. Primeiramente, porque contraria a postura adotada pelo mesmo TCU há décadas. O recurso àquele expediente contábil é feito ao menos desde o governo Fernando Henrique Cardoso, sem nunca ter sido questionado. De outro modo, cabe asseverar que o posicionamento do TCU é consultivo. Apesar do tribunal que o nomeia, sua atribuição se limita a emitir opiniões sobre questões contábeis. Trata-se de aconselhar ao Congresso, este sim responsável por julgar as contas presidenciais.
Ainda assim, o rito de aprovação das contas carece deste sentimento de urgência verbalizado pela oposição. Não é à toa que, até há poucas semanas, as contas de presidentes anteriores não haviam sido sequer apreciadas pelo Congresso. Será que, vinte anos depois, foi descoberto que não podemos passar sem fazer essa avaliação contábil?
À excentricidade, soma-se o puro oportunismo. Em respeito à sociedade, é preciso tratar de outras questões, estas de natureza mais substantivas. De fato, serão as pedaladas uma ilegalidade? Ou apenas um procedimento de gestão contábil? Na prática, tal pedalada foi forma encontrada para assegurar que benefícios sociais sejam pagos em dia para a população. Sim, tais recursos são pagos pelos bancos públicos. Mas a antecipação financeira realizada por estes passam longe de qualquer tipo de operações de crédito ao Tesouro Nacional, por uma simples e evidente razão: é o Tesouro Nacional o verdadeiro credor dos bancos públicos, e não o contrário.
Para se ter ideia, apenas o BNDES deve ao Tesouro Nacional algo em torno de R$ 500 bilhões. Estes valores se referem, em sua maioria, a aportes realizados pelo Tesouro para que o banco pudesse financiar diversos investimentos no país, entre os quais o Programa de Sustentação do Investimento, importante matriz do governo federal para o desenvolvimento da economia brasileira.
Há ainda que se ter em vista que a política orçamentária no Brasil não adota o regime de caixa, mas sim de competência. Isso significa dizer que o resultado orçamentário não é medido pelo nível de superávit ou déficit em determinado momento, mas sim ao longo do ano. Sendo assim, não há a necessidade de o governo antecipar aos bancos os valores das transferências referentes aos programas sociais. Estes podem realizar os pagamentos, já que sabem que, em determinada ocasião posterior, irão receber os recursos do Tesouro Nacional.Ademais, não há como falar em pedaladas no atual mandato da presidenta Dilma com o ano fiscal de 2015 ainda em andamento.
Deste modo, tais pedaladas caracterizam-se como prática contábil, corriqueira e inofensiva. Aliás, sua execução passa longe do Palácio do Planalto. Trata-se de uma atribuição da Secretaria do Tesouro Nacional, vinculada ao Ministério da Fazenda.
Este aspecto põe por terra a argumentação de que a prática das pedaladas constituiriam um crime de responsabilidade. Como ensina o jurista André Ramos Tavares, professor da USP, em recente parecer sobre essas questões, tais infrações são caracterizadas por uma tentativa dolosa de subversão da Constituição. É preciso enorme imaginação, ou alquimia, para acreditar que aqueles atos contábeis -operados de modo apenas técnico, e não político - busquem intencional e positivamente contrariar a ordem constitucional.
Não passam de má-fé, portanto, as movimentações da oposição. Contudo, o trôpego caminhar dos “moralistas sem moral” quer aproximar o país, a cada dia, de sua própria ruína institucional. O custe-o-que-custar oposicionista atenta não ao PT, ou a Dilma e a Lula, mas à própria democracia brasileira. Afinal, mudar de governo é algo a ser feito no momento do voto, de forma democrática e dentro das regras do jogo. Fora desse caminho, a troca de governo não pode ter outro nome além de golpe.
É por isso que a adoção de litigâncias tão mal sustentadas - para além de excêntricas e oportunistas - apenas conferirá ao nosso sistema político uma fragilidade incontornável. É assim que se quer edificar um grande país?
* Margarida Salomão é deputada federal pelo PT-MG.
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