Não há nenhum apuro técnico nesse festival de denúncias bancado pela mídia.
Valem-se de um recurso que descrevo em meu livro "O jornalismo dos anos 90", fartamente praticado pela revista Veja.
Juntam-se alguns pontos verdadeiros - porém irrelevantes - e com base neles desenham uma história muito mais ampla, na qual os pontos relevantes são meras suposições, que não vêm acompanhada de fatos.
É o caso da tal "denúncia" do Estadão sobre o lobby junto à Casa Civil para estender os benefícios da redução do IPI às empresas Hyundai e CAOA.
O que diz a matéria do Estadão:
- A manchete, parte principal da matéria, aquela em que o rigor jornalístico tem que ser redobrado, afirma que Medida Provisória "teria sido" comprada.
- Na reportagem, fica-se sabendo de que um tal Mauro Marcondes "teria" acertado o pagamento de R$ 4 milhões a alguém do PT. Mas não teria revelado o nome de ninguém que teria recebido a propina.
- A matéria diz que um dos escritórios repassou R$ 2,4 milhões a um filho de Lula. Assim, parágrafo solto, sem nenhuma informação adicional que corrobore a acusação, sem investigações adicionais nem nada.
- Aí aparece alguém no dossiê dizendo que nada foi pago e que era golpe do Mauro Marcondes para desviar dinheiro.
- Na sequência, constata-se que, quando percebeu que estava sendo vítima do golpe, a CAOA pulou do barco e também não pagou nada. E o escritório ameaçou divulgar gravações das conversas entre eles.
- Por fim, o grande elo perdido: um dos lobista seria Alexandre Paes Santos, supostamente ligado à Erenice Guerra.
Alexandre, ou APS, era ligado à revista Veja, tal qual Carlinhos Cachoeira. Usava a revista para espalhar dossiês contra adversários de seus clientes. Entrou na história sem se saber por que e, dentre todas as ligações dele, supôs-se uma com Erenice, o elo perdido.
No fundo, o que se tem é a história de um espertalhão que tentou passar a perna na CAOA vendendo lobby em favor de uma MP que seria aprovada. Descoberto o golpe, e os desvios de dinheiro, as empresas pularam fora. E ele as chantageou ameaçando com gravações onde elas topavam subornar alguém que só o lobista sabia quem.
A única empresa que acreditou no espertalhão foi o Estadão.
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Alexandre, ou APS, era ligado à revista Veja, tal qual Carlinhos Cachoeira. Usava a revista para espalhar dossiês contra adversários de seus clientes. Entrou na história sem se saber por que e, dentre todas as ligações dele, supôs-se uma com Erenice, o elo perdido.
No fundo, o que se tem é a história de um espertalhão que tentou passar a perna na CAOA vendendo lobby em favor de uma MP que seria aprovada. Descoberto o golpe, e os desvios de dinheiro, as empresas pularam fora. E ele as chantageou ameaçando com gravações onde elas topavam subornar alguém que só o lobista sabia quem.
A única empresa que acreditou no espertalhão foi o Estadão.
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Do Estadão
Documentos apontam que MP editada na gestão Lula foi 'comprada' por lobby
Empresas negociaram pagamento de até R$ 36 milhões a lobistas para conseguir da Casa Civil um 'ato normativo' que prorrogou incentivos fiscais de R$ 1,3 bilhão
Documentos obtidos pelo Estado indicam que uma medida provisória editada em 2009 pelo governo do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria sido “comprada” por meio de lobby e de corrupção para favorecer montadoras de veículos. Empresas do setor negociaram pagamentos de até R$ 36 milhões a lobistas para conseguir do Executivo um “ato normativo” que prorrogasse incentivos fiscais de R$ 1,3 bilhão por ano. Mensagens trocadas entre os envolvidos mencionam a oferta de propina a agentes públicos para viabilizar o texto, em vigor até o fim deste ano.
Para ser publicada, a MP passou pelo crivo da presidente Dilma Rousseff, então ministra da Casa Civil. Anotações de um dos envolvidos no esquema descrevem também uma reunião com o então ministro Gilberto Carvalho para tratar da norma, quatro dias antes de o texto ser editado. Um dos escritórios que atuaram para viabilizar a medida fez repasses de R$ 2,4 milhões a um filho do expresidente Lula, o empresário Luís Cláudio Lula da Silva, em 2011, ano em que a MP entrou em vigor.
O roteiro para influenciar as políticas de desoneração do governo e emplacar a MP é descrito em contratos de lobby pactuados antes da edição da norma. Conforme os documentos, a MMC Automotores, subsidiária da Mitsubishi no Brasil, e o Grupo CAOA (fabricante de veículos Hyundai e revendedora das marcas Ford, Hyundai e Subaru) pagariam honorários a um “consórcio” formado pelos escritórios SGR Consultoria Empresarial, do advogado José Ricardo da Silva, e Marcondes & Mautoni Empreendimentos, do empresário Mauro Marcondes Machado, para obter a extensão das benesses fiscais por ao menos cinco anos. Os incentivos expirariam em 31 de dezembro de 2010, caso não fossem prorrogados.
IPI. Os contratos obtidos pelo Estado datam de 11 e 19 de novembro de 2009. No dia 20 daquele mês, o expresidente Lula assinou a MP 471, esticando de 2011 até 2015 a política de descontos no IPI de carros produzidos nas três regiões (Norte, Nordeste e Centro-Oeste). À época, a Ford tinha uma fábrica na Bahia e CAOA e Mitsubishi fábricas em Goiás. A norma corresponde ao que era pleiteado nos documentos. Em março do ano seguinte, o Congresso aprovou o texto, convertendoo na Lei 12.218/2010. Suspeitas de corrupção para viabilizar a medida provisória surgiram em emails trocados por envolvidos no caso.
Uma das mensagens, de 15 de outubro de 2010, diz que houve “acordo para aprovação da MP 471” e que Mauro Marcondes pactuou a entrega de R$ 4 milhões a “pessoas do governo, PT”, mas faltou com o compromisso. Além disso, o texto sugere a participação de “deputados e senadores” nas negociações. Não há, no entanto, menção a nomes dos agentes públicos supostamente envolvidos.
Acordo. O email diz que a negociação costurada por representantes das empresas de lobby viabilizou a MP 471. O remetente – que se identifica como “Raimundo Lima”, mas cujo verdadeiro nome é mantido sob sigilo – pede que o sóciofundador da MMC no Brasil, Eduardo Sousa Ramos, interceda junto à CAOA para que ela retome pagamentos.
Diferentemente da representante da Mitsubishi no Brasil, a CAOA teria participado do acerto, mas recuado na hora de fazer pagamentos. Um dos lobistas não teria repassado dinheiro a outros envolvidos.“Este (Mauro Marcondes Machado) vem desviando recursos, os quais não vêm chegando às pessoas devidas (...) Comunico ao senhor do acordo fechado para a aprovação da MP 471, valor este do seu conhecimento. (...) o sr. Mauro Marcondes alega ter entregado a pessoas do atual governo, PT, a quantia de R$ 4 milhões, o qual (sic) não é verdade”, alega.
A mensagem, intitulada “Eduardo Sousa Ramos (confidencial)” foi enviada às 16h54 por “Raimundo” à secretária do executivo da MMC, Lilian Pina, que a repassou a Marcondes meia hora depois. O remetente escreve que, se o dinheiro não fluísse, poderia expor um dossiê e gravações com detalhes das tratativas. “A forma de denúncia a ser utilizada serão as gravações pelas vezes em que estive com Mauro Marcondes, Carlos Alberto e Anuar”, avisa, referindose a empresários da CAOA. “Dou até o dia 21 para que me seja repassada a quantia de US$ 1,5 milhão”, ameaça.
Os dois escritórios de consultoria confirmam ter atuado para emplacar a MP 471, mas negam que o trabalho envolvesse lobby ou pagamento de propina.
Ambos são investigados por atuar para as montadoras no esquema de corrupção no Carf. A MMC e a CAOA informam ter contratado a Marcondes & Mautoni, mas negam que o objetivo fosse a “compra” da Medida Provisória. Dono da SGR, José Ricardo era parceiro de negócios do lobista Alexandre Paes dos Santos, ligado à advogada Erenice Guerra, secretária executiva de Dilma na Casa Civil quando a MP foi discutida. Marcondes é vicepresidente da Anfavea, na qual representa a MMC e a CAOA.
PS - Caso de confirme pagamento de R$ 2,4 milhões da Marcondes para o filho de Lula (clique aqui) tem-se, agora, um caso à espera de uma explicação.
Como fica um crime desses, impune??
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