sábado, 9 de julho de 2016

Mata-se no Brasil por qualquer coisa

Por Jandira Feghali

Mata-se muito no Brasil. Matam pela cor da pele do menino que sai de casa com um saco de pipoca e matam aqueles que praticam sua sexualidade de forma livre, como o século 21 permite.

Matam mulheres por serem mulheres. Agridem, asfixiam, violentam. Somem com elas. As estatísticas se avolumam ano a ano, mostrando que a luta contra a intolerância é uma guerra constante em nosso país.

A OMS já emitiu um alerta quando o assunto é a morte de brasileiras. Com um registro de 4,8 mortes a cada 100 mil mulheres, o feminicídio nos coloca na vergonhosa e inaceitável quinta posição do ranking mundial de “mortes de mulheres por serem mulheres”. Quando há o recorte étnico, esse número se torna mais assustador. Segundo o Mapa da Violência sobre homicídios no público feminino, de 2003 a 2013, o número de assassinatos de mulheres negras cresceu 54%, passando de 1.864 para 2.875.

Os casos de violência doméstica ou estupro dos últimos meses mostram isso e ainda há um enorme trabalho a ser feito quando o assunto é conscientização de nosso povo. Quando uma jovem foi violentada por mais de 30 homens na periferia do Rio ou quando a ex-modelo Luiza Brunet teve quatro costelas quebradas pelo ex-marido, vê-se que essa cultura patriarcal, misógina e machista ainda está impregnada em diferentes nichos de nossa sociedade.

A homofobia e o racismo também vêm saindo do armário em velocidade surpreendente. O jovem estudante Diego Vieira Machado, de 24 anos, encontrado morto às margens da Baía de Guanabara, no campus da UFRJ, é mostra disso. Mata-se inclusive por ser negro, homossexual e pobre.

Num país em que o Parlamento brasileiro tem bancadas obscurantistas, que veneram o escárnio às minorias ou pregam o ódio com normalidade, faz-se urgente um chamado à sociedade para que ajude-nos a impedir retrocessos, avançar com pautas propositivas e que ampliem direitos. Não há a menor condição de que não haja uma reação política em nosso país frente aos absurdos que são registrados dia a dia.

Para enfrentar esse cenário, é preciso desfazer hierarquias sociais naturalizadas que sustentam a superioridade dos homens sobre as mulheres, dos brancos sobre os negros, dos heterossexuais sobre os homossexuais. É necessário também reverter a ruptura democrática que vivemos há dois meses. Com a chegada de um governo ilegítimo no poder e sem votos, fundamentado por conservadores e a extrema-direita criminosa, secretarias representativas quanto aos direitos humanos foram extintas e o orçamento de suas políticas públicas cortado. Lutar contra o golpe em curso no Brasil também é lutar por maior proteção de nossas minorias. Chega de mortes diárias por absurdos. A vida vale muito.

* Jandira Feghali é médica, deputada federal (RJ) e líder da oposição.

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