quarta-feira, 27 de julho de 2016

Michelzinho e o papel ridículo da mídia

Por Altamiro Borges

A mídia chapa-branca, talvez na caça de um bilionário ‘jabaculê’ – termo usado nos meios jornalísticos referente à corrupção, suborno, propina –, perdeu totalmente o senso de ridículo. Nos telejornais desta terça-feira (26), a cena patética de repórteres e cinegrafistas disputando espaços para transmitir imagens do usurpador Michel Temer indo buscar seu filho, o ricaço prodígio Michelzinho, em uma escola particular em Brasília. O teatrinho medíocre foi montado previamente pela equipe de aspones do golpista, que ligou para as redações avisando da “agenda familiar”. As recentes pesquisas de opinião, que confirmam o acelerado desgaste do “golpe dos corruptos”, ajudam a explicar o marketing rastaquera.

Segundo a própria Folha – talvez tentando se redimir da grosseira manipulação da pesquisa do Datafolha –, tudo foi montado. “Em uma tentativa de suavizar sua imagem pública, o presidente interino, Michel Temer, interrompeu seu expediente nesta terça-feira para buscar pessoalmente seu filho caçula, Michel Temer Filho, no primeiro dia de aula dele em Brasília. Para registrar as imagens da visita, o Palácio do Planalto informou previamente aos veículos de imprensa sobre a intenção do peemedebista de comparecer à unidade de ensino... A iniciativa faz parte de estratégia do peemedebista de criar uma imagem mais simpática com a população” na véspera da votação do impeachment de Dilma no Senado.

Ainda de acordo com o jornalista Gustavo Uribe, a encenação teve custos para os cofres públicos. “Na companhia de sua mulher, Marcela Temer, o presidente interino chegou ao local pela entrada principal quinze minutos antes do horário normal de saída. Na chegada, acompanhado por seguranças e assessores, ele acenou aos câmeras e fotógrafos. A visita teve a presença ainda da equipe de imagem da Presidência da República, que seguiu o casal até o interior do colégio. O casal deixou a unidade de ensino com o filho também pelo portão principal. O peemedebista foi questionado se o buscaria todos os dias a partir de agora. ‘Só hoje’, disse”. A Folha registra, ainda, que a encenação “incomodou pais de outros alunos. ‘Por que vocês não vão atrás dos corruptos? É apenas uma criança’, reclamou uma mãe”.

A própria mídia poderia usar melhor suas equipes profissionais para averiguar o curioso enriquecimento de Michelzinho, que “não é apenas uma criança”. Segundo reportagem de José Roberto de Toledo e Daniel Bramatti, publicada no Estadão em 30 de maio último, o menino já é dono de uma baita fortuna. “Aos 7 anos de idade, completados em 2 de maio, Michel Miguel Elias Temer Lulia Filho, mais conhecido como Michelzinho, é proprietário de pelo menos dois imóveis cujos valores somados superam R$ 2 milhões. O pai, Michel Miguel Elias Temer Lulia, de 75 anos, presidente em exercício da República, passou para o nome do único herdeiro do seu casamento com Marcela Temer dois conjuntos comerciais que abrigam seu escritório político em São Paulo”.

A matéria do insuspeito Estadão, um ativo promotor do “golpe dos corruptos”, ainda demonstra certa estranheza com o vertiginoso crescimento do patrimônio do líder golpista desde 2006. “Naquele ano, Temer foi candidato a deputado federal e declarou bens no valor de R$ 2.293.645,53. Se corrigido pelo IGP-M da Fundação Getúlio Vargas, eles corresponderiam, em 2014, a R$ 3.678.526,22. Porém, seu patrimônio declarado à Justiça Eleitoral em 2014 já havia crescido para R$ 7.521.799,27. Ou seja, mais do que dobrou acima da inflação entre duas eleições – e isso sem levar em conta a valorização dos imóveis”.

Estes e outros estranhos fatos – como as denúncias sobre os esquemas de Michel Temer no Porto de Santos – levantaram até a suspeita de que Michelzinho, o menino prodígio, seria um típico “laranja”. A mídia chapa-branca, porém, preferiu não dar continuidade as investigações sobre os imóveis do filho do usurpador – assim como evita tratar do explosivo tema portuário. Ela prefere cobrir a cena idílica do golpista Michel Temer buscando o filho na escola. Que coisa mais linda! Ainda sobre esta cena patética, reproduzo abaixo o artigo de Kiko Nogueira, postado no blog Diário do Centro do Mundo:

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O que levou Temer a usar o filho de 7 anos num operação de marketing rasteiro

A biografia de Michel Temer acaba de cruzar com a de Fernando Henrique Cardoso em mais um aspecto lamentável — e não me refiro à vocação golpista.

No mês passado, numa entrevista à Al Jazeera, FHC evocou o filho Tomás para provar ao jornalista Mehdi Hasan que era um cidadão de bem.

“Essa senhora [Mírian Dutra] tem um filho. Ela diz que é meu”, disse ele. “O DNA provou que não é. De qualquer jeito, eu gosto do cara. Eu banquei sua educação o tempo todo com meu dinheiro, usando o Banco Central. Eu mandei dinheiro para o cara.”

O rapaz surgiu na discussão por obra e graça do velho, que se amparou nele como uma tábua de salvação moral.

Na terça, 26, o interino, tentando ver se conseguia transmitir uma imagem de normalidade, provavelmente preocupado com o resultado trágico das pesquisas, resolveu expor estupidamente o filho Michel, de 7 anos.

Temer mandou seus assessores — e eles obedeceram — avisarem a imprensa que estaria na escola dele com a mulher, Marcela.

Um dos golpes mais baixos no manual da busca pela popularidade. E a imprensa amiga obedeceu e cobriu e mostrou.

Era o primeiro dia de aulas do pequeno Michel. Ele saiu antes dos colegas para encontrar os pais e todos poderem posar para as câmeras. De longe, Temer acenava para os fotógrafos enquanto orientava o caçula sobre como proceder diante dos paparazzi de casa.

Alguém lhe questionou se ele passaria a fazer aquilo todos os dias. Temer, solerte, respondeu: “Só hoje! Só hoje!”. O sujeito estava representando um papel que não vai mais se repetir. Michel Jr. deve estar achando que o pai fez aquilo numa boa, por puro amor e consideração, e que repetiria o gesto.

No tumulto, uma mãe gritou para os profissionais da mídia: “Vai ser todo dia essa palhaçada?”. “Vão atrás dos corruptos, ele é só uma criança”, falou outra. Elas seriam, depois, informadas que o Planalto havia convocado a galera e que podiam ficar tranquilas. O tempo de ir atrás dos corruptos passou.

Que tipo de homem coloca sua criança de 7 anos como peça de um plano de marketing mequetrefe? Quem ele pensa que engana? Alguém pensou no moleque ou está combinado que ele serve apenas para enfeitar o museu de cera de Michel, assim como mamãe?

E por que a imprensa compareceu em peso a essa encenação meia boca?

Numa entrevista com Dilma, eu quis saber se ela esperava que o vice decorativo a fosse trair e se o confrontou quando a conspiração ficou clara. Dilma disse que o interpelou e que não achava que ele fosse capaz de fazer o que fez “por um motivo não mencionável”.

A cada demonstração da elasticidade do caráter de Temer, esse motivo não mencionável cresce e fica mais misterioso e feio.


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