Por Tereza Cruvinel, em seu blog:
Entre 2003 e 2005 eles foram os dois pilares fortes do governo Lula. Dirceu comandava a articulação política e a coordenação de governo, Palocci pilotava a economia. Apontados como possíveis sucessores, disputavam poder e influência mas colocavam “o projeto” acima de tudo. Os adversários miraram primeiro em Dirceu, que começou a cair em 2004, com o caso Waldomiro, e foi abatido no ano seguinte, com o mensalão. Em 2006, foi a vez de Palocci, seguidamente acusado de ter feito negócios ilícitos quando prefeito de Ribeirão Preto. Caiu em 2006 no episódio da quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo.
Entre 2003 e 2005 eles foram os dois pilares fortes do governo Lula. Dirceu comandava a articulação política e a coordenação de governo, Palocci pilotava a economia. Apontados como possíveis sucessores, disputavam poder e influência mas colocavam “o projeto” acima de tudo. Os adversários miraram primeiro em Dirceu, que começou a cair em 2004, com o caso Waldomiro, e foi abatido no ano seguinte, com o mensalão. Em 2006, foi a vez de Palocci, seguidamente acusado de ter feito negócios ilícitos quando prefeito de Ribeirão Preto. Caiu em 2006 no episódio da quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo.
Sem os dois pilares, Lula perderia o prumo, calculavam os adversários. Erraram. O crescimento e a distribuição de renda garantiram sua reeleição. Por coincidência, nesta quarta-feira, dez anos depois, seus destinos e biografias separaram-se irreconciliavelmente. Dirceu, que na prisão manteve comportamento de preso político, não admitindo qualquer hipótese de delação de companheiros de partido, foi condenado pela manhã a 30 anos de prisão pelo TRF-4. Como ele tem 71 anos, é caso de prisão perpétua, embora a Constituição a proíba. No início da noite, circulou a carta de Palocci, em que rompe com o PT e faz a Lula as mais pérfidas acusações, “queimando os navios” em busca da delação premiada.
Sempre houve em Dirceu um culto respeitoso ao martírio político. Um fascínio pelos que são capazes de pagar até com a vida pelas convicções. No dia 2 de janeiro de 2003, em seu discurso de posse como ministro-chefe do Gabinete Civil de Lula, declarou com olhos marejados. "Um bom dia a todos. Estou muito emocionado, vou falar de improviso. Vejo aqui, praticamente, várias fases, vários momentos da minha vida e das nossas vidas. Quiseram o protocolo e o destino que eu subisse, ontem, a rampa junto com o general Jorge Armando Félix, que é o responsável pelo Gabinete de Segurança Institucional. E, ao subir a rampa, evidentemente que, em primeiro lugar, subir com a minha geração. Então, a minha primeira palavra, sem rancor, sem ressentimento, é para aqueles que viveram, lutaram e não puderam estar conosco no dia de ontem. Não os esqueço, trago em meu coração, em minha memória, a imagem de cada um e os ideais de todos. E quero dizer, hoje, aos seus familiares, que sintam todos, aqui, nesta cerimônia.”
Referia-se aos que tombaram com ele na luta contra a ditadura, como os companheiros do Molipo, que foram abatidos como pássaros pela repressão ao regressarem ao Brasil depois de um treinamento em Cuba. Preso após a condenação na AP 470, e depois por Sergio Moro, na Lava Jato, portou-se como preso político. “É preciso estar atento e forte, não temos tempo de temer a morte”. Ele gosta do verso. Ontem, logo depois da condenação, distribuiu nota em que agradece à militância petista e à presidente Gleisi Hoffmann pelo apoio e solidariedade. Sem queixar-se da própria sorte, declarou-se feliz pela absolvição de João Vaccari. Jamais reclamou do pouco que o PT fez por ele, tanto agora como em 2012, quando foi condenado pelo STF com base na teoria do domínio do fato. Acusado de ser o comandante dos esquemas de arrecadação do PT, jamais disse que acima dele havia Lula.
Há dois meses, Dirceu vaticinou sobre Palocci. “Vai virar cachorro”. Cachorro era como os presos políticos da ditadura chamavam os quem se passavam para o lado da repressão. Haviam sido massacrados pela tortura, passado pelo pau de arara e por sessões de choques elétricos. Alguns resistiram, outros não. Palocci, preso há mais de um ano, sucumbiu. A carta, como disse Gleisi Hoffman, foi endereçada ao PT mas parece haver mesmo nela um claro esforço para convencer a Lava Jato a aceitar sua delação. É possível que ela seja aceita, e que ele consiga reduzir sua condenação, agora que diz ter optado apenas pela família, embora se contradiga numa passagem. Ele o faz quando tenta explicar sua opção pela delação como uma atitude política, pautada por certo civismo: “por acreditar ser este o caminho mais correto a seguir, buscando acelerar o processo em curso de apuração de ilegalidades e de reformas na legislação de procedimentos públicos e na legislação partidária-eleitoral, que reclamam urgente modernização”. Esta parte era dispensável. Bastava dizer que o fez no interesse próprio e no da família. Palocci, como os presos que a ditadura 'quebrou', sucumbiu à maquina da Lava Jato.
Dirceu será lembrado como mártir. Palocci, como colaboracionista. De todo modo, são duas vidas moídas pelos tempos estranhos que vivemos.
Sempre houve em Dirceu um culto respeitoso ao martírio político. Um fascínio pelos que são capazes de pagar até com a vida pelas convicções. No dia 2 de janeiro de 2003, em seu discurso de posse como ministro-chefe do Gabinete Civil de Lula, declarou com olhos marejados. "Um bom dia a todos. Estou muito emocionado, vou falar de improviso. Vejo aqui, praticamente, várias fases, vários momentos da minha vida e das nossas vidas. Quiseram o protocolo e o destino que eu subisse, ontem, a rampa junto com o general Jorge Armando Félix, que é o responsável pelo Gabinete de Segurança Institucional. E, ao subir a rampa, evidentemente que, em primeiro lugar, subir com a minha geração. Então, a minha primeira palavra, sem rancor, sem ressentimento, é para aqueles que viveram, lutaram e não puderam estar conosco no dia de ontem. Não os esqueço, trago em meu coração, em minha memória, a imagem de cada um e os ideais de todos. E quero dizer, hoje, aos seus familiares, que sintam todos, aqui, nesta cerimônia.”
Referia-se aos que tombaram com ele na luta contra a ditadura, como os companheiros do Molipo, que foram abatidos como pássaros pela repressão ao regressarem ao Brasil depois de um treinamento em Cuba. Preso após a condenação na AP 470, e depois por Sergio Moro, na Lava Jato, portou-se como preso político. “É preciso estar atento e forte, não temos tempo de temer a morte”. Ele gosta do verso. Ontem, logo depois da condenação, distribuiu nota em que agradece à militância petista e à presidente Gleisi Hoffmann pelo apoio e solidariedade. Sem queixar-se da própria sorte, declarou-se feliz pela absolvição de João Vaccari. Jamais reclamou do pouco que o PT fez por ele, tanto agora como em 2012, quando foi condenado pelo STF com base na teoria do domínio do fato. Acusado de ser o comandante dos esquemas de arrecadação do PT, jamais disse que acima dele havia Lula.
Há dois meses, Dirceu vaticinou sobre Palocci. “Vai virar cachorro”. Cachorro era como os presos políticos da ditadura chamavam os quem se passavam para o lado da repressão. Haviam sido massacrados pela tortura, passado pelo pau de arara e por sessões de choques elétricos. Alguns resistiram, outros não. Palocci, preso há mais de um ano, sucumbiu. A carta, como disse Gleisi Hoffman, foi endereçada ao PT mas parece haver mesmo nela um claro esforço para convencer a Lava Jato a aceitar sua delação. É possível que ela seja aceita, e que ele consiga reduzir sua condenação, agora que diz ter optado apenas pela família, embora se contradiga numa passagem. Ele o faz quando tenta explicar sua opção pela delação como uma atitude política, pautada por certo civismo: “por acreditar ser este o caminho mais correto a seguir, buscando acelerar o processo em curso de apuração de ilegalidades e de reformas na legislação de procedimentos públicos e na legislação partidária-eleitoral, que reclamam urgente modernização”. Esta parte era dispensável. Bastava dizer que o fez no interesse próprio e no da família. Palocci, como os presos que a ditadura 'quebrou', sucumbiu à maquina da Lava Jato.
Dirceu será lembrado como mártir. Palocci, como colaboracionista. De todo modo, são duas vidas moídas pelos tempos estranhos que vivemos.
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