Ministro das Relações Exteriores do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da Defesa de Dilma Rousseff, o diplomata Celso Amorim vê com preocupação tanto a intervenção federal no Rio de Janeiro, anunciada hoje pelo presidente da República, Michel Temer, como as medidas sobre a "vulnerabilidade" em Roraima, prevendo ações de assistência para imigrantes venezuelanos no estado, com a justificativa de que o governo precisa ajudar a enfrentar as dificuldades com a vinda de cidadãos fugindo da crise do país vizinho.
“O tema da segurança passa a ser central no Rio de Janeiro e, por motivos ou situações diferentes, em Roraima. Mas nos dois casos há riscos muitos grandes, como o de se confundir temas específicos de segurança com temas políticos. Num ano eleitoral isso é complicado, e eu diria que essa é a preocupação principal”, diz.
Para o ex-ministro da Defesa, há “um conjunto” de aspectos que merecem atenção. Mesmo assim, ele prefere não fazer previsões sobre o que pode acontecer a partir da intervenção no Rio. “Depende da nossa capacidade de vigilância, de denunciar qualquer abuso e, certamente, no caso do Rio, essa ação não vai resolver o problema, que é estrutural, ligado a várias outras questões. Acho que essa ação pode trazer problemas para os próprios militares”, diz, em entrevista à RBA.
Amorim espera que o bom senso prevaleça, inclusive pela postura do comandante do Exército, Eduardo Villas Boas. “Quero me fiar sempre nos pronunciamentos que têm sido feitos, sobretudo pelo general Villas Bôas, de que as Forças Armadas estão aí para cumprir a Constituição.”
No ano passado, Villas Boas comentou sobre o uso das forças militares na segurança interna e deixou clara sua posição, declarando em rede social que é “desgastante, perigoso e inócuo”.
Sobre as avaliações de que o caso do Rio pode ser o prenúncio de algo mais grave, como a concretização de um estado de exceção, Celso Amorim aponta: “Não quero ser alarmista. Vejo com preocupação. Ver com preocupação não quer dizer que seja isso que vai acontecer. Mas acho que o alerta é necessário.”
O diplomata também espera que o bom senso prevaleça politicamente em 2018, o que pressupõe que a vontade popular seja soberana no processo eleitoral. “O país não pode caminhar para uma divisão dramática em que o povo se sinta inclusive roubado em seu direito de votar na pessoa que escolheu, que escolheria”, diz. “Por isso tenho dado tanta ênfase a essa questão do presidente Lula – não só o direito humano dele, mas é um direito do povo brasileiro.”
Como o senhor avalia a situação deflagrada no Rio?
Tem muitos aspectos. A questão da segurança no Rio de Janeiro é um problema sério, grave, e podia ter sido visto antes num contexto mais adequado, em que também se tratasse de outras questões que são ligadas, como saúde, educação, emprego. Mas claro que a segurança tem um aspecto próprio, sobretudo no curto prazo em que tem que se lidar com ele. Agora, acho que intervenção militar, federal, no Rio, isso é curioso, porque intervenção, até semanticamente, supõe uma decisão à revelia de onde ocorre. Há preocupação com uma excessiva securitização da agenda nacional, num ano de eleições.
Securitização da agenda?
O tema da segurança passa a ser central no Rio de Janeiro e, por motivos ou situações diferentes, em Roraima. Mas nos dois casos há riscos muitos grandes, como o de se confundir temas específicos de segurança com temas políticos. Num ano eleitoral isso é complicado, gera preocupação, e eu diria que essa é a preocupação principal. A outra é uma preocupação muito direta das Forças Armadas em tarefas para as quais não está preparada. Fui ministro da Defesa, e acho que pontualmente, como houve (a ação) no Complexo do Alemão, pode até ajudar, e isso pode acontecer por meio de outros mecanismos que não a intervenção federal, que é uma coisa política, uma ação do governo central em relação aos estados.
Como vê análises segundo as quais o caso do Rio pode ser o prenúncio de algo mais grave, por exemplo, a concretização de um estado de exceção?
Não quero ser alarmista. Vejo com preocupação. Ver com preocupação não quer dizer que seja isso que vai acontecer. Mas acho que o alerta é necessário. Como falei, colocar toda a ênfase na segurança num ano eleitoral, com intervenções do governo em estados, pode até ter outras consequências, até porque o problema da segurança não vai ser resolvido dessa forma. No caso do Rio de Janeiro, no curto prazo, colocar tropas na rua pode até dar uma impressão de segurança, mas isso dura poucos dias.
Não tem condição e nem as Forças Armadas são preparadas para esse trabalho. Que haja insatisfação com o problema da segurança no Rio, principalmente, ou em outros estados, é perfeitamente compreensível. Agora, o instrumento, na minha opinião, é mais espetáculo político do que efetividade. Se tiver efetividade, mesmo assim tem esse outro risco, que é de, num ano eleitoral, você ter as Forças Amadas nas ruas. É uma coisa perigosa.
Quero me fiar sempre nos pronunciamentos que têm sido feitos, sobretudo pelo general Villas Bôas, de que as Forças Armadas estão aí para cumprir a Constituição etc. Mas há uma preocupação. Vamos enfrentar um ano eleitoral e às vezes pode não se distinguir o criminoso de adversários políticos, sobretudo quando são movimentos sociais. No caso de Roraima, o Brasil tem direito de cuidar da sua fronteira, mas isso requer uma ação extremamente cuidadosa, ainda mais com declarações de que pode haver golpe na Venezuela. A Colômbia está com desdobramento na fronteira, o Brasil também. Isso eu vejo com preocupação.
Há um conjunto de coisas que preocupa. Daí a dizer o que vai acontecer, não sei. Depende da nossa capacidade de vigilância, de denunciar qualquer abuso, e certamente no caso do Rio essa ação não vai resolver o problema, que é estrutural, ligado a várias outras questões. Acho que essa ação pode trazer problemas para os próprios militares.
Qual a repercussão que a medida do Rio teria nas Forças Armadas? Teria respaldo?
Não posso dizer. As Forças Armadas, nesse ponto, até onde pude ver como ministro da Defesa, são muito disciplinadas e seguem as orientações da chefia e de quem está no poder, na presidência da República. Acho, pelas próprias declarações do general Villas Boas, e pelo que conheço, que as Forças Armadas e o Exército, particularmente, não veem com bons olhos ter que lidar contra o crime. Não é tarefa deles, é uma tarefa de polícia. As Forças Armadas, só numa emergência, numa ação tópica, situações como a Copa do Mundo, a Rio + 20, ou mesmo como foi a questão do Alemão, mas não é sua vocação tratar desses temas.
Não há o risco de a população apoiar uma medida como essa?
O problema é o seguinte: há uma necessidade psicológica tão grande, porque existe o sentimento de insegurança, que essa medida pode ter sido demagógica, mas vai ter apoio. Acho que, talvez no curto prazo, pode ser. A minha sensação é que isso não resolve o problema da criminalidade no longo prazo, e levanta suspeitas. As próprias Forças Armadas, as que eu conheci pelo menos, não gostam disso, gostam de mostrar seu lado imparcial. É uma medida de efeito publicitário muito grande, provavelmente, mas que tem problemas, tanto de não ir a fundo nas causas da violência quanto o risco que representa uma presença militar num ano eleitoral.
Faz sentido associar as medidas adotadas no Rio e em Roraima a uma eventual intervenção na Venezuela, com a participação do Brasil, ou isso é uma teoria da conspiração?
Não sei. Acho até que as Forças Armadas brasileiras não se prestariam a esse serviço. São muito respeitosas do princípio da não intervenção, da autodeterminação dos povos. O que tem de ser feito dentro do território nacional é os militares ajudarem na vacinação, nas questões humanitárias, tudo bem. A gente tem direito de cuidar da nossa fronteira, mas isso tem que ser feito com extremo cuidado, porque essas questões são muito sensíveis. Território, o respeito à soberania territorial, é uma coisa sagrada. Fico preocupado que possa haver uma provocação, por exemplo.
E, digamos, não deixa de haver também, até pela maneira como o noticiário internacional cuida da questão, uma visão de que todo mundo está preocupado com a Venezuela por uma questão de segurança. Acho que temos que cuidar da parte humanitária, mas tomando muito cuidado para que não sirva de pretexto ou não dê a impressão de servir de pretexto para alguma ação intervencionista.
E o que o senhor espera para o Brasil em 2018?
Paz, bom senso. O país não pode caminhar para uma divisão dramática em que o povo se sinta inclusive roubado em seu direito de votar na pessoa que escolheu, que escolheria. Esse é um ponto importante e por isso tenho dado tanta ênfase a essa questão do presidente Lula – não só o direito humano dele, mas é um direito do povo brasileiro. Faz parte da soberania popular você poder escolher o seu presidente.
Mas parece que o Judiciário está querendo evitar isso...
Mas isso é um outro assunto. Não posso falar do Judiciário em geral. No STF a gente não sabe o que vai resultar. Enquanto não acontece nada, vamos confiar que o bom senso prevaleça.
“O tema da segurança passa a ser central no Rio de Janeiro e, por motivos ou situações diferentes, em Roraima. Mas nos dois casos há riscos muitos grandes, como o de se confundir temas específicos de segurança com temas políticos. Num ano eleitoral isso é complicado, e eu diria que essa é a preocupação principal”, diz.
Para o ex-ministro da Defesa, há “um conjunto” de aspectos que merecem atenção. Mesmo assim, ele prefere não fazer previsões sobre o que pode acontecer a partir da intervenção no Rio. “Depende da nossa capacidade de vigilância, de denunciar qualquer abuso e, certamente, no caso do Rio, essa ação não vai resolver o problema, que é estrutural, ligado a várias outras questões. Acho que essa ação pode trazer problemas para os próprios militares”, diz, em entrevista à RBA.
Amorim espera que o bom senso prevaleça, inclusive pela postura do comandante do Exército, Eduardo Villas Boas. “Quero me fiar sempre nos pronunciamentos que têm sido feitos, sobretudo pelo general Villas Bôas, de que as Forças Armadas estão aí para cumprir a Constituição.”
No ano passado, Villas Boas comentou sobre o uso das forças militares na segurança interna e deixou clara sua posição, declarando em rede social que é “desgastante, perigoso e inócuo”.
Sobre as avaliações de que o caso do Rio pode ser o prenúncio de algo mais grave, como a concretização de um estado de exceção, Celso Amorim aponta: “Não quero ser alarmista. Vejo com preocupação. Ver com preocupação não quer dizer que seja isso que vai acontecer. Mas acho que o alerta é necessário.”
O diplomata também espera que o bom senso prevaleça politicamente em 2018, o que pressupõe que a vontade popular seja soberana no processo eleitoral. “O país não pode caminhar para uma divisão dramática em que o povo se sinta inclusive roubado em seu direito de votar na pessoa que escolheu, que escolheria”, diz. “Por isso tenho dado tanta ênfase a essa questão do presidente Lula – não só o direito humano dele, mas é um direito do povo brasileiro.”
Como o senhor avalia a situação deflagrada no Rio?
Tem muitos aspectos. A questão da segurança no Rio de Janeiro é um problema sério, grave, e podia ter sido visto antes num contexto mais adequado, em que também se tratasse de outras questões que são ligadas, como saúde, educação, emprego. Mas claro que a segurança tem um aspecto próprio, sobretudo no curto prazo em que tem que se lidar com ele. Agora, acho que intervenção militar, federal, no Rio, isso é curioso, porque intervenção, até semanticamente, supõe uma decisão à revelia de onde ocorre. Há preocupação com uma excessiva securitização da agenda nacional, num ano de eleições.
Securitização da agenda?
O tema da segurança passa a ser central no Rio de Janeiro e, por motivos ou situações diferentes, em Roraima. Mas nos dois casos há riscos muitos grandes, como o de se confundir temas específicos de segurança com temas políticos. Num ano eleitoral isso é complicado, gera preocupação, e eu diria que essa é a preocupação principal. A outra é uma preocupação muito direta das Forças Armadas em tarefas para as quais não está preparada. Fui ministro da Defesa, e acho que pontualmente, como houve (a ação) no Complexo do Alemão, pode até ajudar, e isso pode acontecer por meio de outros mecanismos que não a intervenção federal, que é uma coisa política, uma ação do governo central em relação aos estados.
Como vê análises segundo as quais o caso do Rio pode ser o prenúncio de algo mais grave, por exemplo, a concretização de um estado de exceção?
Não quero ser alarmista. Vejo com preocupação. Ver com preocupação não quer dizer que seja isso que vai acontecer. Mas acho que o alerta é necessário. Como falei, colocar toda a ênfase na segurança num ano eleitoral, com intervenções do governo em estados, pode até ter outras consequências, até porque o problema da segurança não vai ser resolvido dessa forma. No caso do Rio de Janeiro, no curto prazo, colocar tropas na rua pode até dar uma impressão de segurança, mas isso dura poucos dias.
Não tem condição e nem as Forças Armadas são preparadas para esse trabalho. Que haja insatisfação com o problema da segurança no Rio, principalmente, ou em outros estados, é perfeitamente compreensível. Agora, o instrumento, na minha opinião, é mais espetáculo político do que efetividade. Se tiver efetividade, mesmo assim tem esse outro risco, que é de, num ano eleitoral, você ter as Forças Amadas nas ruas. É uma coisa perigosa.
Quero me fiar sempre nos pronunciamentos que têm sido feitos, sobretudo pelo general Villas Bôas, de que as Forças Armadas estão aí para cumprir a Constituição etc. Mas há uma preocupação. Vamos enfrentar um ano eleitoral e às vezes pode não se distinguir o criminoso de adversários políticos, sobretudo quando são movimentos sociais. No caso de Roraima, o Brasil tem direito de cuidar da sua fronteira, mas isso requer uma ação extremamente cuidadosa, ainda mais com declarações de que pode haver golpe na Venezuela. A Colômbia está com desdobramento na fronteira, o Brasil também. Isso eu vejo com preocupação.
Há um conjunto de coisas que preocupa. Daí a dizer o que vai acontecer, não sei. Depende da nossa capacidade de vigilância, de denunciar qualquer abuso, e certamente no caso do Rio essa ação não vai resolver o problema, que é estrutural, ligado a várias outras questões. Acho que essa ação pode trazer problemas para os próprios militares.
Qual a repercussão que a medida do Rio teria nas Forças Armadas? Teria respaldo?
Não posso dizer. As Forças Armadas, nesse ponto, até onde pude ver como ministro da Defesa, são muito disciplinadas e seguem as orientações da chefia e de quem está no poder, na presidência da República. Acho, pelas próprias declarações do general Villas Boas, e pelo que conheço, que as Forças Armadas e o Exército, particularmente, não veem com bons olhos ter que lidar contra o crime. Não é tarefa deles, é uma tarefa de polícia. As Forças Armadas, só numa emergência, numa ação tópica, situações como a Copa do Mundo, a Rio + 20, ou mesmo como foi a questão do Alemão, mas não é sua vocação tratar desses temas.
Não há o risco de a população apoiar uma medida como essa?
O problema é o seguinte: há uma necessidade psicológica tão grande, porque existe o sentimento de insegurança, que essa medida pode ter sido demagógica, mas vai ter apoio. Acho que, talvez no curto prazo, pode ser. A minha sensação é que isso não resolve o problema da criminalidade no longo prazo, e levanta suspeitas. As próprias Forças Armadas, as que eu conheci pelo menos, não gostam disso, gostam de mostrar seu lado imparcial. É uma medida de efeito publicitário muito grande, provavelmente, mas que tem problemas, tanto de não ir a fundo nas causas da violência quanto o risco que representa uma presença militar num ano eleitoral.
Faz sentido associar as medidas adotadas no Rio e em Roraima a uma eventual intervenção na Venezuela, com a participação do Brasil, ou isso é uma teoria da conspiração?
Não sei. Acho até que as Forças Armadas brasileiras não se prestariam a esse serviço. São muito respeitosas do princípio da não intervenção, da autodeterminação dos povos. O que tem de ser feito dentro do território nacional é os militares ajudarem na vacinação, nas questões humanitárias, tudo bem. A gente tem direito de cuidar da nossa fronteira, mas isso tem que ser feito com extremo cuidado, porque essas questões são muito sensíveis. Território, o respeito à soberania territorial, é uma coisa sagrada. Fico preocupado que possa haver uma provocação, por exemplo.
E, digamos, não deixa de haver também, até pela maneira como o noticiário internacional cuida da questão, uma visão de que todo mundo está preocupado com a Venezuela por uma questão de segurança. Acho que temos que cuidar da parte humanitária, mas tomando muito cuidado para que não sirva de pretexto ou não dê a impressão de servir de pretexto para alguma ação intervencionista.
E o que o senhor espera para o Brasil em 2018?
Paz, bom senso. O país não pode caminhar para uma divisão dramática em que o povo se sinta inclusive roubado em seu direito de votar na pessoa que escolheu, que escolheria. Esse é um ponto importante e por isso tenho dado tanta ênfase a essa questão do presidente Lula – não só o direito humano dele, mas é um direito do povo brasileiro. Faz parte da soberania popular você poder escolher o seu presidente.
Mas parece que o Judiciário está querendo evitar isso...
Mas isso é um outro assunto. Não posso falar do Judiciário em geral. No STF a gente não sabe o que vai resultar. Enquanto não acontece nada, vamos confiar que o bom senso prevaleça.
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