Por Paulo Kliass, no site Vermelho:
A proximidade do pleito de outubro próximo começa a deixar um pouco agitado e ansioso o campo da direita e da centro-direita em nosso país. Afinal, ao contrário do que havia sido prometido desde a derrota de Aécio Neves na disputa presidencial em 2014, não foi suficiente o êxito em chancelar o golpeachment aprovado pelo Congresso Nacional.
O PSDB questionou o resultado das urnas eletrônicas, uma vez que tinha certeza de que ganhariam as eleições. Eduardo Cunha foi eleito presidente da Câmara dos Deputados e assumiu a missão de infernizar a vida da presidenta recém-eleita. O resultado de tudo isso foi o afastamento da vitoriosa no pleito.
A ampla campanha de apoio midiático e o suporte político de boa parte de nossas elites empresariais apareciam como a garantia de que tudo se resolveria no dia seguinte à retirada de Dilma Rousseff do Palácio do Planalto, em razão daquela medida inconstitucional. A chegada do time dos sonhos no comando da economia era comemorada por todos os simpatizantes da turma dos endinheirados. Afinal, “la crème de la crème” tinha certeza de que nada melhor do que dois legítimos banqueiros para botar ordem na bagunça.
Meirelles e Goldfajn são apresentados como uma espécie de unanimidade para a solução de todos os problemas brasileiros. Agora sim, a competência técnica e a seriedade profissional seriam guindadas ao primeiro plano do Ministério da Fazenda (MF) e do Banco Central (BC).
Pouco ou quase nada se falava respeito da participação do ex-presidente internacional do Bank of Boston na presidência do Conselho de Administração da JBS. Além disso, a grande imprensa permanecia calada frente aos escândalos bilionários dos perdões gentilmente oferecidos pelo CARF (órgão do MF) às sonegações praticadas pelo Banco Itaú. O inferno são os outros.
Aposta no golpeachment e decepção posterior
O tempo foi passando, os escândalos seguiram se sucedendo e boa parte do primeiro escalão do governo Temer está sendo processado, condenado ou cumprindo na prisão. Mas nada disso é relevante, pois o que interessa é que a credibilidade da política econômica seria recuperada. Só que não! As consequências da estratégia de aprofundamento do austericídio foram implacáveis. O desemprego explodiu a níveis jamais conhecidos até então. A redução do ritmo da atividade econômica empurrou o Brasil em direção ao precipício da maior e mais longa recessão de nossa História.
Como bons economistas que são, a duplinha dinâmica encarregada de implementar o desastre sabia muito bem o que estavam provocando. A manutenção dos juros na estratosfera desde meados de 2016 e a opção pelo garroteamento das despesas orçamentárias não poderiam levar a outra quadro que não a estagnação generalizada. Na verdade, a intenção era exatamente essa. Ambos conheciam o final da estória dessa combinação explosiva de juros altos e arrocho fiscal. A intenção era mesmo provocar a quebradeira generalizada de forma premeditada, pois ela seria a única receita para impedir a elevação dos preços. Uma loucura!
Ocorre que a expectativa gerada na maioria dos apoiadores do golpe era exatamente a oposta. Os meses se sucediam e o milagre da retomada da economia em “bases responsáveis” não aparecia no horizonte. Muito pelo contrário. A compressão da renda das famílias, a expansão da pobreza e o ressurgimento da miséria em níveis impressionantes contribuíram para abafar a demanda. Com isso, é óbvio, os preços cederam e a inflação caiu. A recessão inquestionável acabou obrigando o próprio Copom a promover a redução tardia da Selic. Mas a cumplicidade da direção do BC frente aos crimes cometidos pelo oligopólio da banca contra a grande maioria da sociedade garantiu a continuidade do regime de espoliação financeira.
“Deixou de piorar” e “fundo do poço”
O desconforto dos colunistas econômicos dos grandes meios de comunicação era evidente. Afinal, tinham que dialogar com sua base de leitores, que haviam acreditado piamente naquilo que se revelou como um enorme estelionato jornalístico. Dali para frente, a saída foi forçar a barra a cada nova publicação oficial de dados. Mas revelou-se difícil essa tarefa inglória de retirar leite de pedra. O discurso assumiu o tom do hilário “deixou de piorar”. Até que, finalmente, veio a boa notícia a respeito do PIB de 2017. Após 2 anos sucessivos de queda, finalmente a economia havia oferecido um crescimento modesto de 1%.
No entanto, as perspectivas não se revelam nada seguras quanto à possível continuidade de tal ritmo. O resultado foi obtido graças ao extraordinário desempenho oferecido pela agricultura, que cresceu 13% ao longo dos 12 meses. Serviços e indústria permaneceram calados, com “crescimento” de praticamente 0%. Além disso, o item que mais puxou o crescimento permaneceu sendo o consumo, o que evidencia a continuidade de um modelo frágil e pouco sustentável.
O comportamento mais relevante para análises prospectivas refere-se ao investimento. E nesse quesito fica mais do que evidenciado o compasso de espera que atravessa a economia brasileira. A taxa de investimento do PIB permanece bastante distante dos 25% que boa parte dos analistas considera essencial de ser atingida. Em 2017 ela ficou em apenas 15,6%. Essa taxa só é superior ao que foi apurado em 1996, ou seja, vivemos um recuo de 22 anos em aspecto essencial de nossa capacidade econômica.
O resto é disputa de metade do copo cheio ou vazio. O governo e os jornalões chapa-branca tentam vender a impressão de que uma criação de algumas dezenas de milhares de emprego é um avanço. Mas nada comentam a respeito da permanência de um estoque de quase 13 milhões de desempregados. A equipe econômica e alguns de seus colunistas especializados de plantão disputam o momento em que afinal teríamos tocado o fundo do poço, mas os índices oficiais resistem a tal afirmação categórica.
Compasso de espera e eleições de outubro
O desempenho da indústria é cristalino a esse respeito. Depois de comemorar enfaticamente quatro meses de crescimento do setor, agora os dados do IBGE relativos a janeiro apontam para uma nova queda no produto industrial. Assim, o crescimento acumulado de setembro a dezembro do ano passado (4,3%) foi quase revertido com a queda (2,4%) observada no primeiro mês de 2018. Na verdade, o fato é que boa parte das vendas ocorre com base em estoques acumulados e o crescimento observado na produção é realizado apenas com base na recuperação da capacidade ociosa. Não há ampliação das plantas nem contratação de força de trabalho.
O fato concreto é que a retomada do crescimento da economia em bases sustentáveis exige aumento expressivo do investimento. E isso pressupõe confiança do empresariado no cenário futuro. O desmonte provocado pela equipe impôs um quadro grave de incerteza e insegurança. Só agora parece que começa a cair a ficha dos que se iludiram com os imensos prejuízos provocados pela irresponsabilidade criminosa praticada pelos liberaloides de plantão. Volta a frequentar as páginas dos jornais aquilo que os economistas críticos desse modelo não cansávamos de alertar. A retomada da economia depende de que seja recuperado o protagonismo do Estado à frente das grandes decisões estratégicas.
Não bastaram as fadinhas mágicas das expectativas. O Brasil não só estagnou, como recuou muito e caminhou bastante para trás. A economia brasileira só deixará o atual compasso de espera em que nos encontramos à medida que foram se tornando mais claros os horizontes de curto e médio para os empresários. Afinal, esse governo já terminou e os responsáveis pela economia não se atreverão a mexer uma palha para retomar investimentos públicos ou adotar estímulos de políticas públicas na direção de um projeto de desenvolvimento. Boa parte dos integrantes sairão para concorrer a cargos eletivos e os remanescentes não terão credibilidade alguma para encerrar esse triste fim de feira.
Ao que tudo indica, as definições quanto aos cenários para o próximo quadriênio só virão mesmo com os resultados de outubro. Permanecem as dúvidas quanto à participação de Lula ou não no pleito. Se insistirem nesse escandaloso cerceamento, abrem espaço para o “risco Bolsonaro”. Por outro lado, pipocam aqui e ali sinais importantes de mudança de avaliação no interior das classes dominantes quanto à óbvia necessidade de flexibilizar as amarras impostas pela EC 95 e pela regra de ouro. Ganha força a ideia de um referendo revogatório para zerar o jogo imposto por Temer e iniciar uma nova caminhada. Mas até lá, tudo indica que continuaremos a afundar ainda um pouco mais no pântano que tem caracterizado o atual quadro de imobilismo.
A proximidade do pleito de outubro próximo começa a deixar um pouco agitado e ansioso o campo da direita e da centro-direita em nosso país. Afinal, ao contrário do que havia sido prometido desde a derrota de Aécio Neves na disputa presidencial em 2014, não foi suficiente o êxito em chancelar o golpeachment aprovado pelo Congresso Nacional.
O PSDB questionou o resultado das urnas eletrônicas, uma vez que tinha certeza de que ganhariam as eleições. Eduardo Cunha foi eleito presidente da Câmara dos Deputados e assumiu a missão de infernizar a vida da presidenta recém-eleita. O resultado de tudo isso foi o afastamento da vitoriosa no pleito.
A ampla campanha de apoio midiático e o suporte político de boa parte de nossas elites empresariais apareciam como a garantia de que tudo se resolveria no dia seguinte à retirada de Dilma Rousseff do Palácio do Planalto, em razão daquela medida inconstitucional. A chegada do time dos sonhos no comando da economia era comemorada por todos os simpatizantes da turma dos endinheirados. Afinal, “la crème de la crème” tinha certeza de que nada melhor do que dois legítimos banqueiros para botar ordem na bagunça.
Meirelles e Goldfajn são apresentados como uma espécie de unanimidade para a solução de todos os problemas brasileiros. Agora sim, a competência técnica e a seriedade profissional seriam guindadas ao primeiro plano do Ministério da Fazenda (MF) e do Banco Central (BC).
Pouco ou quase nada se falava respeito da participação do ex-presidente internacional do Bank of Boston na presidência do Conselho de Administração da JBS. Além disso, a grande imprensa permanecia calada frente aos escândalos bilionários dos perdões gentilmente oferecidos pelo CARF (órgão do MF) às sonegações praticadas pelo Banco Itaú. O inferno são os outros.
Aposta no golpeachment e decepção posterior
O tempo foi passando, os escândalos seguiram se sucedendo e boa parte do primeiro escalão do governo Temer está sendo processado, condenado ou cumprindo na prisão. Mas nada disso é relevante, pois o que interessa é que a credibilidade da política econômica seria recuperada. Só que não! As consequências da estratégia de aprofundamento do austericídio foram implacáveis. O desemprego explodiu a níveis jamais conhecidos até então. A redução do ritmo da atividade econômica empurrou o Brasil em direção ao precipício da maior e mais longa recessão de nossa História.
Como bons economistas que são, a duplinha dinâmica encarregada de implementar o desastre sabia muito bem o que estavam provocando. A manutenção dos juros na estratosfera desde meados de 2016 e a opção pelo garroteamento das despesas orçamentárias não poderiam levar a outra quadro que não a estagnação generalizada. Na verdade, a intenção era exatamente essa. Ambos conheciam o final da estória dessa combinação explosiva de juros altos e arrocho fiscal. A intenção era mesmo provocar a quebradeira generalizada de forma premeditada, pois ela seria a única receita para impedir a elevação dos preços. Uma loucura!
Ocorre que a expectativa gerada na maioria dos apoiadores do golpe era exatamente a oposta. Os meses se sucediam e o milagre da retomada da economia em “bases responsáveis” não aparecia no horizonte. Muito pelo contrário. A compressão da renda das famílias, a expansão da pobreza e o ressurgimento da miséria em níveis impressionantes contribuíram para abafar a demanda. Com isso, é óbvio, os preços cederam e a inflação caiu. A recessão inquestionável acabou obrigando o próprio Copom a promover a redução tardia da Selic. Mas a cumplicidade da direção do BC frente aos crimes cometidos pelo oligopólio da banca contra a grande maioria da sociedade garantiu a continuidade do regime de espoliação financeira.
“Deixou de piorar” e “fundo do poço”
O desconforto dos colunistas econômicos dos grandes meios de comunicação era evidente. Afinal, tinham que dialogar com sua base de leitores, que haviam acreditado piamente naquilo que se revelou como um enorme estelionato jornalístico. Dali para frente, a saída foi forçar a barra a cada nova publicação oficial de dados. Mas revelou-se difícil essa tarefa inglória de retirar leite de pedra. O discurso assumiu o tom do hilário “deixou de piorar”. Até que, finalmente, veio a boa notícia a respeito do PIB de 2017. Após 2 anos sucessivos de queda, finalmente a economia havia oferecido um crescimento modesto de 1%.
No entanto, as perspectivas não se revelam nada seguras quanto à possível continuidade de tal ritmo. O resultado foi obtido graças ao extraordinário desempenho oferecido pela agricultura, que cresceu 13% ao longo dos 12 meses. Serviços e indústria permaneceram calados, com “crescimento” de praticamente 0%. Além disso, o item que mais puxou o crescimento permaneceu sendo o consumo, o que evidencia a continuidade de um modelo frágil e pouco sustentável.
O comportamento mais relevante para análises prospectivas refere-se ao investimento. E nesse quesito fica mais do que evidenciado o compasso de espera que atravessa a economia brasileira. A taxa de investimento do PIB permanece bastante distante dos 25% que boa parte dos analistas considera essencial de ser atingida. Em 2017 ela ficou em apenas 15,6%. Essa taxa só é superior ao que foi apurado em 1996, ou seja, vivemos um recuo de 22 anos em aspecto essencial de nossa capacidade econômica.
O resto é disputa de metade do copo cheio ou vazio. O governo e os jornalões chapa-branca tentam vender a impressão de que uma criação de algumas dezenas de milhares de emprego é um avanço. Mas nada comentam a respeito da permanência de um estoque de quase 13 milhões de desempregados. A equipe econômica e alguns de seus colunistas especializados de plantão disputam o momento em que afinal teríamos tocado o fundo do poço, mas os índices oficiais resistem a tal afirmação categórica.
Compasso de espera e eleições de outubro
O desempenho da indústria é cristalino a esse respeito. Depois de comemorar enfaticamente quatro meses de crescimento do setor, agora os dados do IBGE relativos a janeiro apontam para uma nova queda no produto industrial. Assim, o crescimento acumulado de setembro a dezembro do ano passado (4,3%) foi quase revertido com a queda (2,4%) observada no primeiro mês de 2018. Na verdade, o fato é que boa parte das vendas ocorre com base em estoques acumulados e o crescimento observado na produção é realizado apenas com base na recuperação da capacidade ociosa. Não há ampliação das plantas nem contratação de força de trabalho.
O fato concreto é que a retomada do crescimento da economia em bases sustentáveis exige aumento expressivo do investimento. E isso pressupõe confiança do empresariado no cenário futuro. O desmonte provocado pela equipe impôs um quadro grave de incerteza e insegurança. Só agora parece que começa a cair a ficha dos que se iludiram com os imensos prejuízos provocados pela irresponsabilidade criminosa praticada pelos liberaloides de plantão. Volta a frequentar as páginas dos jornais aquilo que os economistas críticos desse modelo não cansávamos de alertar. A retomada da economia depende de que seja recuperado o protagonismo do Estado à frente das grandes decisões estratégicas.
Não bastaram as fadinhas mágicas das expectativas. O Brasil não só estagnou, como recuou muito e caminhou bastante para trás. A economia brasileira só deixará o atual compasso de espera em que nos encontramos à medida que foram se tornando mais claros os horizontes de curto e médio para os empresários. Afinal, esse governo já terminou e os responsáveis pela economia não se atreverão a mexer uma palha para retomar investimentos públicos ou adotar estímulos de políticas públicas na direção de um projeto de desenvolvimento. Boa parte dos integrantes sairão para concorrer a cargos eletivos e os remanescentes não terão credibilidade alguma para encerrar esse triste fim de feira.
Ao que tudo indica, as definições quanto aos cenários para o próximo quadriênio só virão mesmo com os resultados de outubro. Permanecem as dúvidas quanto à participação de Lula ou não no pleito. Se insistirem nesse escandaloso cerceamento, abrem espaço para o “risco Bolsonaro”. Por outro lado, pipocam aqui e ali sinais importantes de mudança de avaliação no interior das classes dominantes quanto à óbvia necessidade de flexibilizar as amarras impostas pela EC 95 e pela regra de ouro. Ganha força a ideia de um referendo revogatório para zerar o jogo imposto por Temer e iniciar uma nova caminhada. Mas até lá, tudo indica que continuaremos a afundar ainda um pouco mais no pântano que tem caracterizado o atual quadro de imobilismo.
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