Lula em Palmeira das Missões/RS, 22/3/18. Foto: Ricardo Stuckert |
A vitória de Lula no STF, por 7 a 4, merece ser comemorada. Num período de derrotas acumuladas, no qual chega a parecer mais prudente enfrentar disputas políticas com a perspectiva de menor dano, o placar surpreendeu pela eloquência mas não só.
Ainda que seja uma decisão provisória – o julgamento do mérito do pedido de habeas corpus para Lula está marcado para 4 de abril – o impacto benéfico para as garantias democráticas e a democracia brasileira é inegável, com influência sobre o destino de boa parte do mapa político de 2018.
Para começar, diminui a perseguição contra Lula, e protege seus direitos como cidadão, o que afeta a hostilidade contra sua candidatura. Parece pouco, quase nada, quando se recorda o tamanho da injustiça que enfrenta e ainda poderá enfrentar. Mas é bom recordar que, se nada tivesse sido feito, é muito provável que dentro de uma ou duas semanas ele poderia estar preso.
O placar de 7 a 4 mostra uma postura diferenciada do STF em relação Lula, quando se compara com a unanimidade-contra do TRF-4 e do Superior Tribunal de Justiça.
Adversária resoluta da simples ideia de debater o habeas corpus em plenário, Cármen Lúcia só aceitou a proposta para evitar um vexame inédito de ser interpelada em sessão por Marco Aurélio Mello. Acabou sofrendo um golpe definitivo em sua autoridade, cada vez mais associada a intervenções que interessam a TV Globo.
Engajado pessoalmente na defesa da prisão em segunda instância, Sérgio Moro também perdeu. Dias antes da decisão, quando ainda não se sabia se o Supremo iria debater um Habeas Corpus para Lula, ou produzir uma nova jurisprudência sobre a segunda instância, Moro escreveu num despacho: “Com todo o respeito ao Egrégio Supremo Tribunal Federal, uma eventual alteração seria desastrosa para os avanços havidos recentemente em prol do fim da impunidade da grande corrupção no Brasil”.
Seria impossível explicar a decisão por 7 a 4 sem compreender um fator essencial, a mudança no comportamento da maioria dos ministros do STF. Após anos de intimidação, adaptação confortável, omissão e mesmo coisa pior, na tarde de quinta-feira estava claro que um grupo de magistrados havia chegado ao plenário sem medo de cumprir sua obrigação fundamental, que é defender a Constituição.
Sem constrangimentos nem mesuras desnecessárias, sem dar bola para uma mídia que sonhava receber a cabeça de Lula numa bandeja de prata, eles jogaram o tempo inteiro na ofensiva. Fizeram questão de apresentar argumentos articulados, levando cada discussão até o fim. Não deram trégua para descuidos dos adversários, aproveitando cada deslize, cada referência fora do lugar, para encaixar uma crítica no ponto certo, uma observação pertinente.
Mudanças dessa natureza na cúpula de um poder de Estado seriam impossíveis se não destilassem parte de um novo grau de descontentamento, raiva e mau humor em vigor no país.
Não é só o interminável desastre Michel Temer, mas o salário, o desemprego e também o assassinato de Mariella Franco, crime político que tem recebido declarações bovinas – quando não cúmplices – por parte de autoridades que deveriam apurar os fatos.
A votação do mérito não deve ser aguardada como um simples ritual de confirmação da primeira decisão. No final do julgamento, quando a defesa pediu uma liminar para impedir que Lula fosse preso entre o 26 de março, quando deve ocorrer o julgamento dos embargos no TRF-4, e 4 de abril, quando o STF julgará o mérito do habeas corpus. O plenário se dividiu, por margem mais estreita: 6 a 5 a favor de Lula. Na defesa de Lula, aguarda-se por uma operação de guerra – inclusive com denúncias em jornal – para derrubar votos do outro lado na esperança de assegurar que seja preso e silenciado em 2018.
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