domingo, 23 de setembro de 2018

A polarização que cega

Por Tereza Cruvinel, no Jornal do Brasil:

A polarização chegou esta semana e assustou, embora fadada a acontecer quando fosse definido o substituto de Lula, o favorito barrado pela Justiça.

Para o IBOPE, Bolsonaro chegou a 28% e Fernando Haddad firmou-se no segundo lugar com 17%.

O petista cresceu menos, segundo o Datafolha, mas isso não conteve o pavor dos que consideram igualmente nefastas tanto a volta do PT como a vitória da extrema direita.

Enquanto isso, Bolsonaro é que continua crescendo sem fazer campanha, e isso é que devia nos apavorar.

O ex-presidente Fernando Henrique esconjurou em carta pública o perigo de uma “vitória dos extremos” que, agravando a crise, faria o barco afundar.

Trata-se de legítima preocupação, vinda do maior líder do PSDB.

Do mundo acadêmico, interpretação mais precisa do drama brasileiro vem do professor de Harvard Steven Levitsky, autor do livro “Como as democracias morrem”: em artigo publicado ontem na Folha de S. Paulo ele diz que Bolsonaro é que ameaça a democracia brasileira.

Não o PSDB, nem o PT, e todos sabemos porque.

Bolsonaro cresce num leito de hospital. A possibilidade de ele ganhar no primeiro turno existe, embora para isso ele tivesse que devorar os votos de todos os candidatos da centro-direita.

Disputas entre extremos levam os eleitores, dos dois lados, a querer resolver a parada no primeiro turno.

E, embora Haddad ainda possa crescer mais, convertendo votos de Lula ou conquistando eleitores, o tempo não o favorece neste jogo de antecipação.

O crescimento de Haddad, e sobretudo o disparo de 11 pontos revelado pelo IBOPE do dia 19, tirou de foco o avanço contínuo de Bolsonaro. Ontem nova pesquisa XP/IPESP confirmou sua marcha batida. Ele cresceu dois pontos, chegando a 28%. Na pesquisa espontânea, ganhou mais oito pontos percentuais, chegando a 24%.

O petista cresceu 6 pontos na série, chegando a 16%.

Outra pesquisa telefônica, feita pelo Instituto Brasilis para a Genial Investimentos, concluiu que, se a eleição fosse hoje, Bolsonaro teria 30% dos votos, contra 17% de Haddad. Ciro e Alckmin teriam ficado bem para trás, com 7%.

Regionalmente Bolsonaro só não lidera no Nordeste, onde empata com Ciro em 17%, contra 26% de Haddad, segundo o Datafolha.

Na próxima semana seus filhos e uma caravana farão um giro pela região para pescar votos lulistas.

De modo que a ofensiva, neste momento é de Bolsonaro, mas o crescimento do petista é que parece ter incomodado o centro representado por Fernando Henrique.

Quando prega a união do centro, ele busca em verdade quem possa ultrapassar o petista e derrotar o capitão da extrema direita no segundo turno. Mas falta, no centro, quem tenha músculos para tanto.

Regras violadas
Volto, pois, ao artigo de Levitsky, “A erosão das normas democráticas”.

Diz ele que uma boa constituição não basta para que a democracia vá bem. É preciso também que uma sociedade observe regras não-escritas, destacando duas.

Uma, a tolerância mútua. Reconhecer o adversário como legítimo competidor, não como inimigo, respeitando sua vitória quando ele ganha.

Outra, a indulgência, que significaria não fazer uso pleno do poder, e mesmo do “jogo duro” constitucional, de todo o rigor da lei, para esmagar o adversário. Ele acha que no Brasil estas regras não foram observadas nos últimos anos, e deu nisso.

Para quem não leu, conclui ele: “A polarização nublou as percepções. Nem o PSDB nem o PT são uma ameaça à democracia. Os dois partidos deveriam ser rivais acalorados, mas não inimigos temidos. A verdadeira ameaça é Bolsonaro, e a tentação de apoiá-lo, gerada pelo medo. A centro-direita e a centro-esquerda do Brasil precisam perceber a gravidade da situação, antes que seja tarde.”

Afinal, quem mais cultua a ditadura e a tortura, já deu tantas demonstrações de autoritarismo, homofobia, misoginia e racismo, e ainda embala uma agenda tributária não revelada aos eleitores?

Um comentário:

  1. Me desculpe, mas uma eventual vitória de Bolsonaro seria a decretação real do fim da era petista. A candidatura de uma Frente Ampla era a única alternativa racional para enfrentar o fascismo, pois com o fascismo não se joga dados. Não haveria como deixar de responsabilizar os estrategistas do PT por um desastre eleitoral como esse. A luta política degeneraria em violência e a possibilidade de um cenário de guerra civil não estaria descartado. Eu, que perdi a conta de quantas vezes fui ameaçado por militares bolsonaristas à paisana nas ruas de Itajubá,me sentiria correndo sério risco de vida. Vivendo sozinho, isolado em uma kitinet, não teria como me defender se um ódio manifestado sem a menor discrição, inclusive, com o sinal bolsonarista dos dois dedos apontados para mim, passasse das ameaças para as vias de fato. Já encarei vários deles, que também não sou de aceitar ameaças calado, e sigo vivendo sem medo. De qualquer forma, ofereço a minha experiência em uma cidade com forte presença de militares do exército para estimar o futuro fascista que pode estar nos aguardando.

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