Por Isaías Dalle, no site da Fundação Perseu Abramo:
O Ministério da Saúde de Cuba anunciou nesta quarta-feira que vai retirar os profissionais de saúde do programa Mais Médicos. Através de nota oficial, o governo cubano atribui aos ataques e críticas do presidente eleito Jair Bolsonaro a decisão de romper com o projeto, criado na gestão da presidenta Dilma Rousseff em 2013.
O Mais Médicos emprega mais de 8 mil profissionais de saúde que atendem prioritariamente áreas de difícil acesso – como florestas e o sertão – e nas periferias das regiões metropolitanas, onde a presença de médicos e equipes de saúde era até então escassa. Com a saída dos cubanos, maioria absoluta entre aqueles que se engajaram no programa, quem perde são as parcelas mais pobres da população – clientela menos rentável e, portanto, pouco atrativa para médicos que priorizam rentabilidade em detrimento da função social da profissão.
O ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha, idealizador do mais Médicos, gravou video nas redes sociais lamentando o episódio e criticando a postura beligerante do futuro presidente do Brasil e aquilo que classificou como despreparo.
“Data triste para a saúde brasileira e para a política externa brasileira”, afirmou Padilha, deputado federal eleito. “É isso que dá colocar o espírito da guerra na frente dos interesses do povo”, completou.
95% da população atendida pelo Mais Médicos aprovaram os serviços, segundo pesquisa realizada pela Universidade Federal de Minas. O fotógrafo Araquém Alcântara, que rodou o Brasil registrando ações desse programa, disse ter fotografado pessoas que jamais haviam visto um médico antes na vida.
A Rede de Médicas e Médicos Populares divulgou nota lamentando a saída dos colegas cubanos e elogiando o programa: “Exemplo de que as favelas, o sertão e a Amazônia podem ter médicos. Exemplo de que o pobre pode ser médico. Exemplo que o negro pode ser médico. Exemplo de que o Estado deve garantir Saúde como um Direito. Exemplo de amor latino-americano”, declarou o coletivo. Já o Conselho Federal de Medicina, crítico de primeira hora do programa Mais Médicos, não se pronunciou a respeito até o final da tarde desta quarta-feira.
O principal ponto da discórdia foi o anúncio de que o futuro governo exigirá revalidação dos diplomas dos cubanos para permitir a continuidade do trabalho deles e que só permitirá a contratação individual, o que desrespeita os termos de acordo com a OPAS (Organização Panamericana de Saúde). Xenofobia, desconhecimento da realidade, interesses corporativos, ilusão da ameaça comunista: qual a dose de cada um desses ingredientes na receita bolsonarista?
Veja íntegra da nota emitida pelo governo cubano:
***
O presidente eleito do Brasil, Jair Bolsonaro, lançando mão de referências diretas, depreciativas e ameaçando a presença de nossos médicos nesse país, disse e reiterou que vai modificar os termos e condições do Programa Mais Médicos, com desrespeito para a Organização Pan-Americana da Saúde.
O Ministério da Saúde Pública da República de Cuba, comprometido com os princípios de solidariedade e humanistas que nortearam a cooperação médica cubana por 55 anos, está envolvido desde a sua criação, em agosto de 2013, no Programa Mais Médicos para o Brasil. A iniciativa de Dilma Rousseff, na época presidenta da República Federativa do Brasil, tinha o nobre propósito de garantir atendimento médico para o maior número da população brasileira, em consonância com o princípio da cobertura universal da saúde, promovida pela Organização Mundial da Saúde.
Esse programa previu a presença de médicos brasileiros e estrangeiros para trabalharem em áreas pobres e remotas daquele país.
A participação cubana na mesma é feita através da Organização Pan-Americana da Saúde e se distinguiu pela ocupação de vagas não cobertas por médicos brasileiros ou de outras nacionalidades.
Nestes cinco anos de trabalho, cerca de 20 mil colaboradores cubanos atenderam 113,3 milhões de pacientes (113.359.000) em mais de 3.600 municípios, chegando a ser atingidos por eles um universo de 60 milhões de brasileiros, constituindo 80% de todos os médicos participantes do programa. Mais de 700 municípios tiveram um médico pela primeira vez na história.
O Ministério da Saúde de Cuba anunciou nesta quarta-feira que vai retirar os profissionais de saúde do programa Mais Médicos. Através de nota oficial, o governo cubano atribui aos ataques e críticas do presidente eleito Jair Bolsonaro a decisão de romper com o projeto, criado na gestão da presidenta Dilma Rousseff em 2013.
O Mais Médicos emprega mais de 8 mil profissionais de saúde que atendem prioritariamente áreas de difícil acesso – como florestas e o sertão – e nas periferias das regiões metropolitanas, onde a presença de médicos e equipes de saúde era até então escassa. Com a saída dos cubanos, maioria absoluta entre aqueles que se engajaram no programa, quem perde são as parcelas mais pobres da população – clientela menos rentável e, portanto, pouco atrativa para médicos que priorizam rentabilidade em detrimento da função social da profissão.
O ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha, idealizador do mais Médicos, gravou video nas redes sociais lamentando o episódio e criticando a postura beligerante do futuro presidente do Brasil e aquilo que classificou como despreparo.
“Data triste para a saúde brasileira e para a política externa brasileira”, afirmou Padilha, deputado federal eleito. “É isso que dá colocar o espírito da guerra na frente dos interesses do povo”, completou.
95% da população atendida pelo Mais Médicos aprovaram os serviços, segundo pesquisa realizada pela Universidade Federal de Minas. O fotógrafo Araquém Alcântara, que rodou o Brasil registrando ações desse programa, disse ter fotografado pessoas que jamais haviam visto um médico antes na vida.
A Rede de Médicas e Médicos Populares divulgou nota lamentando a saída dos colegas cubanos e elogiando o programa: “Exemplo de que as favelas, o sertão e a Amazônia podem ter médicos. Exemplo de que o pobre pode ser médico. Exemplo que o negro pode ser médico. Exemplo de que o Estado deve garantir Saúde como um Direito. Exemplo de amor latino-americano”, declarou o coletivo. Já o Conselho Federal de Medicina, crítico de primeira hora do programa Mais Médicos, não se pronunciou a respeito até o final da tarde desta quarta-feira.
O principal ponto da discórdia foi o anúncio de que o futuro governo exigirá revalidação dos diplomas dos cubanos para permitir a continuidade do trabalho deles e que só permitirá a contratação individual, o que desrespeita os termos de acordo com a OPAS (Organização Panamericana de Saúde). Xenofobia, desconhecimento da realidade, interesses corporativos, ilusão da ameaça comunista: qual a dose de cada um desses ingredientes na receita bolsonarista?
Veja íntegra da nota emitida pelo governo cubano:
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O presidente eleito do Brasil, Jair Bolsonaro, lançando mão de referências diretas, depreciativas e ameaçando a presença de nossos médicos nesse país, disse e reiterou que vai modificar os termos e condições do Programa Mais Médicos, com desrespeito para a Organização Pan-Americana da Saúde.
O Ministério da Saúde Pública da República de Cuba, comprometido com os princípios de solidariedade e humanistas que nortearam a cooperação médica cubana por 55 anos, está envolvido desde a sua criação, em agosto de 2013, no Programa Mais Médicos para o Brasil. A iniciativa de Dilma Rousseff, na época presidenta da República Federativa do Brasil, tinha o nobre propósito de garantir atendimento médico para o maior número da população brasileira, em consonância com o princípio da cobertura universal da saúde, promovida pela Organização Mundial da Saúde.
Esse programa previu a presença de médicos brasileiros e estrangeiros para trabalharem em áreas pobres e remotas daquele país.
A participação cubana na mesma é feita através da Organização Pan-Americana da Saúde e se distinguiu pela ocupação de vagas não cobertas por médicos brasileiros ou de outras nacionalidades.
Nestes cinco anos de trabalho, cerca de 20 mil colaboradores cubanos atenderam 113,3 milhões de pacientes (113.359.000) em mais de 3.600 municípios, chegando a ser atingidos por eles um universo de 60 milhões de brasileiros, constituindo 80% de todos os médicos participantes do programa. Mais de 700 municípios tiveram um médico pela primeira vez na história.
O trabalho dos médicos cubanos em locais de extrema pobreza, nas favelas do Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador de Bahia, nos 34 Distritos Especiais Indígenas, especialmente na Amazônia, foi amplamente reconhecido pelos governos federal, estaduais e municipais daquele país e pela sua população, que concedeu 95% de aceitação, segundo um estudo encomendado pelo Ministério da Saúde do Brasil à Universidade Federal de Minas Gerais.
Em 27 de setembro de 2016, o Ministério da Saúde Pública, em uma declaração oficial, informou perto da data de expiração do contrato e em meio dos eventos em torno do golpe de Estado legislativo e judiciário contra a presidenta Dilma Rousseff que Cuba «continuaria participando do acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde para a aplicação do Programa Mais Médicos, desde que fossem mantidas as garantias oferecidas pelas autoridades locais», o que foi respeitado até agora.
Em 27 de setembro de 2016, o Ministério da Saúde Pública, em uma declaração oficial, informou perto da data de expiração do contrato e em meio dos eventos em torno do golpe de Estado legislativo e judiciário contra a presidenta Dilma Rousseff que Cuba «continuaria participando do acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde para a aplicação do Programa Mais Médicos, desde que fossem mantidas as garantias oferecidas pelas autoridades locais», o que foi respeitado até agora.
O presidente eleito do Brasil, Jair Bolsonaro, com referências diretas, depreciativas e ameaçando a presença de nossos médicos, disse e reiterou que vai modificar os termos e condições do Programa Mais Médicos, com desrespeito para a Organização Pan-Americana da Saúde e o que foi acordado por ela com Cuba, ao questionar a preparação de nossos médicos e condicionar sua permanência no programa à revalidação do título e como única forma a contratação individual.
As mudanças anunciadas impõem condições inaceitáveis e descumprem as garantias acordadas desde o início do programa, que foram ratificadas em 2016 com a renegociação do Acordo de Cooperação entre a Organização Pan-Americana da Saúde e o Ministério da Saúde do Brasil e o Acordo de Cooperação entre a Organização Pan-Americana da Saúde e o Ministério da Saúde Pública de Cuba. Essas condições inadmissíveis impossibilitam a manutenção da presença dos profissionais cubanos no Programa.
Portanto, perante esta triste realidade, o Ministério da Saúde Pública de Cuba tomou a decisão de não continuar participando do programa Mais Médicos e assim foi comunicado ao diretor da Organização Pan-Americana da Saúde e aos líderes políticos brasileiros que fundaram e defenderam essa iniciativa.
Não é aceitável questionar a dignidade, o profissionalismo e o altruísmo dos colaboradores cubanos que, com o apoio de suas famílias, prestam atualmente serviços em 67 países. Em 55 anos, 600.000 missões internacionalistas foram realizadas em 164 países, envolvendo mais de 400.000 trabalhadores da saúde, que em muitos casos cumpriram essa honrosa tarefa em mais de uma ocasião. Destaque para as façanhas da luta contra o Ebola na África, a cegueira na América Latina e no Caribe, a cólera no Haiti e a participação de 26 brigadas do Contingente Internacional de Médicos Especializados em Desastres e Grandes Epidemias «Henry Reeve» no Paquistão, Indonésia, México, Equador, Peru, Chile e Venezuela, entre outros países.
Na esmagadora maioria das missões concluídas, as despesas foram assumidas pelo governo cubano. Da mesma forma, em Cuba, 35.613 profissionais de saúde de 138 países foram capacitados gratuitamente, como expressão de nossa solidariedade e vocação internacionalista.
Aos colaboradores lhes foi mantido, em todos os momentos, seu posto de trabalho e 100% do seu salário em Cuba, com todo o trabalho e garantias sociais, tal como aos outros funcionários do Sistema Nacional de Saúde.
A experiência do Programa Mais Médicos para o Brasil e a participação cubana no mesmo demonstram que um programa de cooperação Sul-Sul pode ser estruturado, sob os auspícios da Organização Pan-Americana da Saúde para promover seus objetivos em nossa região. O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e a Organização Mundial da Saúde qualificam-no como o principal exemplo de boas práticas na cooperação triangular e na implementação da Agenda 2030 com os seus Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
Os povos da nossa América e do resto do mundo sabem que sempre poderão contar com a vocação humanista e solidária de nossos profissionais.
O povo brasileiro, que fez do programa Mais Médicos uma conquista social, que teve confiança desde o início nos médicos cubanos, aprecia suas virtudes e agradece o respeito, sensibilidade e profissionalismo com que eles o atenderam, e será capaz de entender sobre quem recai a responsabilidade que nossos médicos não possam continuar fornecendo sua contribuição de solidariedade naquele país.
Havana, 14 de novembro de 2018
As mudanças anunciadas impõem condições inaceitáveis e descumprem as garantias acordadas desde o início do programa, que foram ratificadas em 2016 com a renegociação do Acordo de Cooperação entre a Organização Pan-Americana da Saúde e o Ministério da Saúde do Brasil e o Acordo de Cooperação entre a Organização Pan-Americana da Saúde e o Ministério da Saúde Pública de Cuba. Essas condições inadmissíveis impossibilitam a manutenção da presença dos profissionais cubanos no Programa.
Portanto, perante esta triste realidade, o Ministério da Saúde Pública de Cuba tomou a decisão de não continuar participando do programa Mais Médicos e assim foi comunicado ao diretor da Organização Pan-Americana da Saúde e aos líderes políticos brasileiros que fundaram e defenderam essa iniciativa.
Não é aceitável questionar a dignidade, o profissionalismo e o altruísmo dos colaboradores cubanos que, com o apoio de suas famílias, prestam atualmente serviços em 67 países. Em 55 anos, 600.000 missões internacionalistas foram realizadas em 164 países, envolvendo mais de 400.000 trabalhadores da saúde, que em muitos casos cumpriram essa honrosa tarefa em mais de uma ocasião. Destaque para as façanhas da luta contra o Ebola na África, a cegueira na América Latina e no Caribe, a cólera no Haiti e a participação de 26 brigadas do Contingente Internacional de Médicos Especializados em Desastres e Grandes Epidemias «Henry Reeve» no Paquistão, Indonésia, México, Equador, Peru, Chile e Venezuela, entre outros países.
Na esmagadora maioria das missões concluídas, as despesas foram assumidas pelo governo cubano. Da mesma forma, em Cuba, 35.613 profissionais de saúde de 138 países foram capacitados gratuitamente, como expressão de nossa solidariedade e vocação internacionalista.
Aos colaboradores lhes foi mantido, em todos os momentos, seu posto de trabalho e 100% do seu salário em Cuba, com todo o trabalho e garantias sociais, tal como aos outros funcionários do Sistema Nacional de Saúde.
A experiência do Programa Mais Médicos para o Brasil e a participação cubana no mesmo demonstram que um programa de cooperação Sul-Sul pode ser estruturado, sob os auspícios da Organização Pan-Americana da Saúde para promover seus objetivos em nossa região. O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e a Organização Mundial da Saúde qualificam-no como o principal exemplo de boas práticas na cooperação triangular e na implementação da Agenda 2030 com os seus Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
Os povos da nossa América e do resto do mundo sabem que sempre poderão contar com a vocação humanista e solidária de nossos profissionais.
O povo brasileiro, que fez do programa Mais Médicos uma conquista social, que teve confiança desde o início nos médicos cubanos, aprecia suas virtudes e agradece o respeito, sensibilidade e profissionalismo com que eles o atenderam, e será capaz de entender sobre quem recai a responsabilidade que nossos médicos não possam continuar fornecendo sua contribuição de solidariedade naquele país.
Havana, 14 de novembro de 2018
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