Charge: Rico Cartum |
Nos discursos de posse no Congresso e no Parlatório do Palácio do Planalto, Bolsonaro optou por uma retórica de guerra.
É improvável que tenha sido uma escolha acidental ou tresloucada. A probabilidade maior, ao invés disso, é de que por trás dessa escolha tem cálculo político e projeção estratégica.
Teoricamente, Bolsonaro mais perderia do que ganharia com esta pregação odiosa e agressiva logo no primeiro ato como presidente empossado. Em regra, todo governo que assume o poder naturalmente conta com a trégua e a relativa parcimônia inicial da imprensa, da sociedade e até mesmo da oposição.
Desaproveitar essa premissa, e da maneira acintosa como foi no discurso e no descaso com a imprensa, em tese beneficia a oposição e prejudica o governo.
O bolsonarismo, entretanto, calcula que a reiteração do discurso de guerra da campanha funciona como ímã que fideliza seus seguidores, muitos deles fanatizados e dispostos a práticas milicianas, para o combate ao inimigo encarnado nos movimentos sociais, nos símbolos, nas políticas e nos partidos progressistas, socialistas e de esquerda.
Diante de fanáticos que acompanhavam o discurso no Planalto aos gritos de “Mito, Mito” [nos anos 1920 na Itália, as massas ovacionavam Mussolini como “Duce, Duce”], Bolsonaro prometeu, para delírio e transe geral dos seus seguidores: “Nossa bandeira jamais será vermelha! Só será vermelha se for preciso o nosso sangue para mantê-la verde e amarela”.
A guerra permanente contra os opositores do regime será a estratégia deste governo de extrema-direita com tendências nitidamente fascistas.
O cenário que se anuncia pede muita luta, muita unidade política e social para resistir ao macarthismo e às perseguições, à restrição da liberdade de imprensa e de expressão e, em especial, à instauração da violência, da repressão e do terror estatal contra a cidadania e as organizações populares.
É só com a repressão brutal e o aniquilamento da oposição que o regime conseguirá aplacar as resistências do povo aos retrocessos e desmontes observados já nos decretos do primeiro dia do governo.
A execução do programa ultraliberal não se viabiliza em contextos democráticos; ele precisa de um ambiente ditatorial e de forte déficit de democracia, como aconteceu no Chile do Pinochet.
Para o establishment, a superação do conflito distributivo agravado pela crise do capitalismo em 2008 pressupõe
[1] o rompimento do pacto social de 1988 – daí o golpe e a instauração do regime de exceção com a Lava Jato;
[2] um novo pacto de dominação burguesa, que se materializa num programa executado por qualquer governo no qual não caibam políticas distributivas e de igualdade social – daí o imperativo da farsa jurídica contra o Lula, e
[3] o consenso, no seio das classes dominantes, de que a selvageria ultraliberal é o remédio prescrito para o atual estágio do capitalismo periférico do Brasil.
Não se trata de algo trivial. Este novo pacto de dominação burguesa devasta a economia nacional, transfere riquezas, reservas e bens públicos ao capital estrangeiro, aprofunda o desemprego e a recessão e converte o Brasil num consulado sul-americano dos EUA. Um programa, enfim, que rima com autoritarismo, subserviência e neocolonialismo.
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