Por Flavio Aguiar, de Berlim
Quando olho para o Brasil, aqui dos longes europeus, mas tão de perto, na tela do meu computador, o que vejo?
Uma enorme balbúrdia.
Uma torre de Babel sem Deus que a redima nem destrua.
Às esquerdas, vejo debates de sempre: trata-se de uma Frente Ampla ou Popular?
Ou ambas, combinadas em diferentes proporções?
Discute-se sem parar o sexo dos manifestos, como em Constantinopla, segundo a legenda, discutia-se o dos anjos diante da invasão turca que chegava.
Há uma diferença.
A invasão já houve. Não foi a dos turcos.
Foi da Cavalaria Americana, que expulsou os índios do Forte Apache no Palácio do Planalto.
Os cavalarianos tomaram o governo federal, acuaram as esquerdas, embora até o momento não tenham tido sucesso em destrui-la ou sequer tritura-la, como aconteceu no golpe de 64 e depois no enfrentamento da luta armada a partir de 67/68.
Desta vez as esquerdas - espero que tenham consciência da importância deste plural - conseguiram sobreviver aos golpes armados desde 2013, efetivados em 2016 e depois nas eleições de 2018.
Estão combalidas, reduzidas a bolsões ecológicos de diversas espécies - bancadas minoritárias em Brasília, governos no Nordeste, municipalidades por aqui e por ali, mídias alternativas aqui e acolá, etc. - mas sobreviveram, e podem se reaglutinar como as gotas do metal líquido mercúrio, desde que aceitem a sua pluralidade e sua capilaridade com setores liberais.
A ver. As eleições municipais deste ano serão o termômetro.
A novidade vem mesmo da direita.
Conseguiram, com golpes mais ou menos toscos e mais ou menos hábeis, neutralizar as esquerdas no plano federal, desarticular o desafio que o Brasil vinha representando para o establishment norte-americano, graças à sua hoje passada política “altiva e soberana”, porém a um custo nunca dantes navegado.
O custo chama-se Bolsonaro e seu governo de templários aloprados.
De início, Bolsonaro não era a opção de ninguém com um mínimo de articulação dentro ou com a tradicional direita brasileira, e com o establishment norte-americano, que tudo supervisionava å distância.
Foi o simultâneo derretimento da direita conspícua.
Que Amoedo conseguisse poucos votos em 2018, isto não foi surpresa.
Nem a pífia exibição de Meirelles.
O desastre foi o retumbante fracasso do favorito das direitas, Alckmin.
O derretimento do PSDB.
A debacle que se seguiu neste campo foi estrondosa.
Dória ascendeu no vazio. Bolsonaro idem.
E neutralizado Lula, a Lava Jato entrou em crise sistêmica, de onde não saiu até hoje.
As milícias cariocas cresceram, com assassinatos e tudo.
E hoje assistimos a uma briga de foice entre diferentes facções da direita.
Todas com seus campeões å mostra: Bolsonaro e seu governo desastroso e desastrado, Moro que já nem sabe muito bem quem ou o quê é, Daranhol que se defende como pode e inventa, Doria que tenta sobreviver à maré pandêmica, Witzel que, por ora, é o elo mais fraco e sossobrante disto tudo, por inconsistência própria mais do que por outra coisa.
Há as forças colaterais: os Nordestes, que passaram de ontem serem currais eleitorais do PFL a esteios progressistas nacionais, Minas que não sabe muito bem onde sempre esteve, o Cerrado trancafiado num nó com Ronaldo Caiado, que, se não é solução, pelo menos é uma rima, o Norte precarizado em seu sistema de saúde, o Rio Grande do Sul, antes berço do Fórum Social Mundial, hoje pilar de uma direita que vai se afogando na pandemia, e assim por diante.
O governo se desgoverna cada vez mais.
Facções? Quadrilhas, isto sim, que disputam espaços como se estivessem na Chicago dos anos 20/30.
Incluindo os militares ávidos das boquinhas que estão conseguindo lamber.
Sei que isto é controverso, mas não consigo ver um “poder militar” emergente.
Vejo oportunistas fardados que se locupletam num governo sem direção, valendo-se da força das armas que supostamente representam, acolhidos por um idiota esperto que que se valer do prestígio cada vez menor do verde-oliva.
Há mensagens promissoras também, como sinais de fumaça dos faroestes de antigamente.
Organizações inteiras, como o MST, o MTST, não foram abatidas.
Os estudantes continuam a ser uma referência.
O movimento sindical está em refluxo, mas não desapareceu.
As mulheres, os movimentos anti-racistas, as lutas LGBTIs, indígenas, continuam.
A mídia alternativa não desapareceu.
A CNBB continua rezando.
Os evangélicos, embora de peso, não são o monólito que muitos pensam que são.
Há mais fissuras neles do que rachadinhas no Planalto e vizinhanças.
A direita tradicional vem peitando o governo, via STF.
A mídia tradicional é hoje anti-Bolsonarista, embora para mim isto seja voo de galinha.
Pode nem mesmo atravessar o alambrado do galinheiro.
Verdades vêm à tona: FHC anulou o voto!
Ora, ora, quem diria…
A gente já sabia que Ciro correra em disparada para Paris (podia ter sido pior: Miami…).
Bilio e milionários estão arrependidos… Muita classe média também.
O que podemos fazer, além de rezar e esperar?
Aqui falo como jornalista.
Em primeiro lugar, manter a credibilidade e o auto-respeito.
Não ceder à tentação de assumir a mesma linguagem chula e abusiva e os métodos devassos do bolsonarismo e vizinhanças.
Vejo muito correligionário de esquerda recorrer agora a palavrões e a ataques pessoais, invocando um sensacionalismo barato. Deploro.
Temos de continuar a checar informações, a resistir à manchete fácil e continuar provocando com a busca da veracidade.
Além disto, valorizar as informações positivas.
O MST distribui cestas básicas para famílias carentes em todo o Brasil?
Isto deve ir para a manchete, ao invés da dondoca de Copacabana, bolsonarista, que agride o vigilante sanitário (embora isto deva também ser noticiado).
Em próximo artigo, abordaremos o Brasil na mídia internacional e os efeitos nefastos da política externa messiânica e milenarista do sr. Ernesto Araujo, inspirada neste estranho documento chamado Orvil.
Quando olho para o Brasil, aqui dos longes europeus, mas tão de perto, na tela do meu computador, o que vejo?
Uma enorme balbúrdia.
Uma torre de Babel sem Deus que a redima nem destrua.
Às esquerdas, vejo debates de sempre: trata-se de uma Frente Ampla ou Popular?
Ou ambas, combinadas em diferentes proporções?
Discute-se sem parar o sexo dos manifestos, como em Constantinopla, segundo a legenda, discutia-se o dos anjos diante da invasão turca que chegava.
Há uma diferença.
A invasão já houve. Não foi a dos turcos.
Foi da Cavalaria Americana, que expulsou os índios do Forte Apache no Palácio do Planalto.
Os cavalarianos tomaram o governo federal, acuaram as esquerdas, embora até o momento não tenham tido sucesso em destrui-la ou sequer tritura-la, como aconteceu no golpe de 64 e depois no enfrentamento da luta armada a partir de 67/68.
Desta vez as esquerdas - espero que tenham consciência da importância deste plural - conseguiram sobreviver aos golpes armados desde 2013, efetivados em 2016 e depois nas eleições de 2018.
Estão combalidas, reduzidas a bolsões ecológicos de diversas espécies - bancadas minoritárias em Brasília, governos no Nordeste, municipalidades por aqui e por ali, mídias alternativas aqui e acolá, etc. - mas sobreviveram, e podem se reaglutinar como as gotas do metal líquido mercúrio, desde que aceitem a sua pluralidade e sua capilaridade com setores liberais.
A ver. As eleições municipais deste ano serão o termômetro.
A novidade vem mesmo da direita.
Conseguiram, com golpes mais ou menos toscos e mais ou menos hábeis, neutralizar as esquerdas no plano federal, desarticular o desafio que o Brasil vinha representando para o establishment norte-americano, graças à sua hoje passada política “altiva e soberana”, porém a um custo nunca dantes navegado.
O custo chama-se Bolsonaro e seu governo de templários aloprados.
De início, Bolsonaro não era a opção de ninguém com um mínimo de articulação dentro ou com a tradicional direita brasileira, e com o establishment norte-americano, que tudo supervisionava å distância.
O que elegeu Bolsonaro e sua trupe a um tempo sinistra e cômica não foi a fragilização da esquerda, conseguida a marretadas pela mídia tradicional e pela Lava Jato.
Foi o simultâneo derretimento da direita conspícua.
Que Amoedo conseguisse poucos votos em 2018, isto não foi surpresa.
Nem a pífia exibição de Meirelles.
O desastre foi o retumbante fracasso do favorito das direitas, Alckmin.
O derretimento do PSDB.
A debacle que se seguiu neste campo foi estrondosa.
Dória ascendeu no vazio. Bolsonaro idem.
E neutralizado Lula, a Lava Jato entrou em crise sistêmica, de onde não saiu até hoje.
As milícias cariocas cresceram, com assassinatos e tudo.
E hoje assistimos a uma briga de foice entre diferentes facções da direita.
Todas com seus campeões å mostra: Bolsonaro e seu governo desastroso e desastrado, Moro que já nem sabe muito bem quem ou o quê é, Daranhol que se defende como pode e inventa, Doria que tenta sobreviver à maré pandêmica, Witzel que, por ora, é o elo mais fraco e sossobrante disto tudo, por inconsistência própria mais do que por outra coisa.
Há as forças colaterais: os Nordestes, que passaram de ontem serem currais eleitorais do PFL a esteios progressistas nacionais, Minas que não sabe muito bem onde sempre esteve, o Cerrado trancafiado num nó com Ronaldo Caiado, que, se não é solução, pelo menos é uma rima, o Norte precarizado em seu sistema de saúde, o Rio Grande do Sul, antes berço do Fórum Social Mundial, hoje pilar de uma direita que vai se afogando na pandemia, e assim por diante.
O governo se desgoverna cada vez mais.
Facções? Quadrilhas, isto sim, que disputam espaços como se estivessem na Chicago dos anos 20/30.
Incluindo os militares ávidos das boquinhas que estão conseguindo lamber.
Sei que isto é controverso, mas não consigo ver um “poder militar” emergente.
Vejo oportunistas fardados que se locupletam num governo sem direção, valendo-se da força das armas que supostamente representam, acolhidos por um idiota esperto que que se valer do prestígio cada vez menor do verde-oliva.
Há mensagens promissoras também, como sinais de fumaça dos faroestes de antigamente.
Organizações inteiras, como o MST, o MTST, não foram abatidas.
Os estudantes continuam a ser uma referência.
O movimento sindical está em refluxo, mas não desapareceu.
As mulheres, os movimentos anti-racistas, as lutas LGBTIs, indígenas, continuam.
A mídia alternativa não desapareceu.
A CNBB continua rezando.
Os evangélicos, embora de peso, não são o monólito que muitos pensam que são.
Há mais fissuras neles do que rachadinhas no Planalto e vizinhanças.
A direita tradicional vem peitando o governo, via STF.
A mídia tradicional é hoje anti-Bolsonarista, embora para mim isto seja voo de galinha.
Pode nem mesmo atravessar o alambrado do galinheiro.
Verdades vêm à tona: FHC anulou o voto!
Ora, ora, quem diria…
A gente já sabia que Ciro correra em disparada para Paris (podia ter sido pior: Miami…).
Bilio e milionários estão arrependidos… Muita classe média também.
O que podemos fazer, além de rezar e esperar?
Aqui falo como jornalista.
Em primeiro lugar, manter a credibilidade e o auto-respeito.
Não ceder à tentação de assumir a mesma linguagem chula e abusiva e os métodos devassos do bolsonarismo e vizinhanças.
Vejo muito correligionário de esquerda recorrer agora a palavrões e a ataques pessoais, invocando um sensacionalismo barato. Deploro.
Temos de continuar a checar informações, a resistir à manchete fácil e continuar provocando com a busca da veracidade.
Além disto, valorizar as informações positivas.
O MST distribui cestas básicas para famílias carentes em todo o Brasil?
Isto deve ir para a manchete, ao invés da dondoca de Copacabana, bolsonarista, que agride o vigilante sanitário (embora isto deva também ser noticiado).
Em próximo artigo, abordaremos o Brasil na mídia internacional e os efeitos nefastos da política externa messiânica e milenarista do sr. Ernesto Araujo, inspirada neste estranho documento chamado Orvil.
* Artigo divulgado pelo Instituto Brasileiro de Estudos Políticos (IBEP).
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