Por Felipe Bianchi, no site do Centro de Estudos Barão de Itararé:
“O humor tem a ver com passar a mão na bunda do guarda, não com bater em um morador de rua”. A frase do ator e humorista Gregório Duvivier parece escrachada, mas sintetiza o espírito do que é a cultura e o humor nos tempos sombrios nos quais vivemos. “Olhamos para o noticiário e parece que é fácil fazer humor, afinal, o presidente é uma piada por si só. Mas quando a realidade é cômica, o humorista tem trabalho dobrado”, acrescenta.
Duvivier esteve ao lado, mas à distância, de grandes nomes para debater a cultura e o humor em tempos de cólera, parte da programação do V Curso Nacional de Comunicação do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, no dia 25 de agosto. O ator e dramaturgo Sérgio Mamberti, o cartunista Renato Aroeira, a cineasta Maria Augusta Ramos e Danilo Miranda, diretor do Sesc, construíram um mosaico de reflexões sobre a defesa da cultura em meio a tantos retrocessos.
Cultura é sinônimo de resistência
“No dia 31 de março de 1964 [data em que foi colocado em marcha o golpe militar], eu estava em Porto Alegre, estreando uma peça do Teatro do Absurdo chamado ‘O Inoportuno’, imaginem a ironia”, relata Mamberti. “Naquele momento, perdemos o chão. Mas reagimos bem e o teatro teve uma participação vibrante no processo de resistência. Não esmorecemos. Este é um dos papeis da cultura”.
Tendo ocupado vários cargos no Ministério da Cultura durante os governos de Lula e Dilma Rousseff, Mamberti conhece bem a importância do Estado como indutor de políticas para o setor. “A ditadura foi cruel. Nunca houve isso de ‘ditabranda’, como disse a Folha de S. Paulo naquele editorial. Mas com o bolsonarismo, acrescido da brutalidade e do autoritarismo, há o componente nonsense”, diz. “É um tsunami de monstruosidades surreais que assola o país”.
À frente do Sesc, instituição com papel gigantesco na promoção da cultura brasileira, Danilo Miranda faz coro com Mamberti: “A essência da ação de quem faz cultura e comunicação é de que não adianta comunicar para o vazio. Diante da realidade perversa que vivemos, em meio a uma pandemia que escancara nosso padrão de desigualdade tão profundo, só há um caminho para combatermos esta conjuntura: educação e cultura”.
“Estamos submetidos à cultura do momento em que nascemos ao momento em que nos despedimos do mundo”, acrescenta o gestor cultural. “Por mais que façam força para desmonta-la e destruí-la, a cultura existirá e seguirá existindo. Independente das instituições e de qualquer determinação de caráter restritivo e impositivo”.
Bater não é oprimir
Representante do cinema no debate, mais precisamente do que chama “cinema do real”, Maria Augusta Ramos tem se destacado por dirigir filmes como O Processo (2018), no qual traça um retrato dos bastidores do impeachment de Dilma Rousseff, e acaba de lançar Não toque em meu companheiro (2020). A nova película relembra a luta histórica dos funcionários da Caixa demitidos injustamente pelo governo de Fernando Collor em 1991, após greve da categoria.
“A arte deve revisitar o passado para entender e superar a barbárie'', pontua a cineasta. “Em um momento de ataques do bolsonarismo, temos que ter coragem e força para pensar a cultura e a arte como ferramentas que façam sentido contra a barbárie e que sejam relevantes para este momento histórico”.
De volta ao campo do humor, Renato Aroeira falou sobre a perseguição sofrida pelo governo Bolsonaro após publicar cartum relacionando a cruz vermelha do sistema de saúde de Bolsonaro com uma suástica, diante da indiferença do governo aos milhares de mortos durante a pandemia do coronavírus. "Quando um governo chega ao ponto de perseguir cartunistas, é porque está no fundo do poço. Há um caso célebre, na Alemanha nazista, de um cartunista assassinado em 1944, quase no fim da guerra”, recorda.
“O humor”, segundo Aroeira, “não é uma ferramenta de oprimir, mas é uma ferramenta de bater”. “Por isso, qualquer humorista, formador de opinião e político tem de que decidir de qual lado está”, assevera. “O humor não muda as coisas. Quem muda é a ciência, é o amor, é a organização social, é a política. Mas o humor ajuda. O humor reproduz com muita fidelidade a realidade”.
De volta a Duvivier, o apresentador do programa Greg News, na HBO, comentou o segredo da combinação explosiva entre humor e jornalismo. “Humor com jornalismo é perigoso? Sim, especialmente para a autoridade”.
De acordo com ele, o jornalismo tem como característica estilística ser um papo entre entendidos, enquanto o humor abre os braços para que novos atores participem deste papo. “O jornal é um bonde andando. O jornal não convida o leitor a entrar neste bonde, pois pressupõe que o leitor já está lá dentro. O humor, a crônica, são o convite. É a porta de entrada para entender o encadeamento dos fatos”.
“O humor tem a ver com passar a mão na bunda do guarda, não com bater em um morador de rua”. A frase do ator e humorista Gregório Duvivier parece escrachada, mas sintetiza o espírito do que é a cultura e o humor nos tempos sombrios nos quais vivemos. “Olhamos para o noticiário e parece que é fácil fazer humor, afinal, o presidente é uma piada por si só. Mas quando a realidade é cômica, o humorista tem trabalho dobrado”, acrescenta.
Duvivier esteve ao lado, mas à distância, de grandes nomes para debater a cultura e o humor em tempos de cólera, parte da programação do V Curso Nacional de Comunicação do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, no dia 25 de agosto. O ator e dramaturgo Sérgio Mamberti, o cartunista Renato Aroeira, a cineasta Maria Augusta Ramos e Danilo Miranda, diretor do Sesc, construíram um mosaico de reflexões sobre a defesa da cultura em meio a tantos retrocessos.
Cultura é sinônimo de resistência
“No dia 31 de março de 1964 [data em que foi colocado em marcha o golpe militar], eu estava em Porto Alegre, estreando uma peça do Teatro do Absurdo chamado ‘O Inoportuno’, imaginem a ironia”, relata Mamberti. “Naquele momento, perdemos o chão. Mas reagimos bem e o teatro teve uma participação vibrante no processo de resistência. Não esmorecemos. Este é um dos papeis da cultura”.
Tendo ocupado vários cargos no Ministério da Cultura durante os governos de Lula e Dilma Rousseff, Mamberti conhece bem a importância do Estado como indutor de políticas para o setor. “A ditadura foi cruel. Nunca houve isso de ‘ditabranda’, como disse a Folha de S. Paulo naquele editorial. Mas com o bolsonarismo, acrescido da brutalidade e do autoritarismo, há o componente nonsense”, diz. “É um tsunami de monstruosidades surreais que assola o país”.
À frente do Sesc, instituição com papel gigantesco na promoção da cultura brasileira, Danilo Miranda faz coro com Mamberti: “A essência da ação de quem faz cultura e comunicação é de que não adianta comunicar para o vazio. Diante da realidade perversa que vivemos, em meio a uma pandemia que escancara nosso padrão de desigualdade tão profundo, só há um caminho para combatermos esta conjuntura: educação e cultura”.
“Estamos submetidos à cultura do momento em que nascemos ao momento em que nos despedimos do mundo”, acrescenta o gestor cultural. “Por mais que façam força para desmonta-la e destruí-la, a cultura existirá e seguirá existindo. Independente das instituições e de qualquer determinação de caráter restritivo e impositivo”.
Bater não é oprimir
Representante do cinema no debate, mais precisamente do que chama “cinema do real”, Maria Augusta Ramos tem se destacado por dirigir filmes como O Processo (2018), no qual traça um retrato dos bastidores do impeachment de Dilma Rousseff, e acaba de lançar Não toque em meu companheiro (2020). A nova película relembra a luta histórica dos funcionários da Caixa demitidos injustamente pelo governo de Fernando Collor em 1991, após greve da categoria.
“A arte deve revisitar o passado para entender e superar a barbárie'', pontua a cineasta. “Em um momento de ataques do bolsonarismo, temos que ter coragem e força para pensar a cultura e a arte como ferramentas que façam sentido contra a barbárie e que sejam relevantes para este momento histórico”.
De volta ao campo do humor, Renato Aroeira falou sobre a perseguição sofrida pelo governo Bolsonaro após publicar cartum relacionando a cruz vermelha do sistema de saúde de Bolsonaro com uma suástica, diante da indiferença do governo aos milhares de mortos durante a pandemia do coronavírus. "Quando um governo chega ao ponto de perseguir cartunistas, é porque está no fundo do poço. Há um caso célebre, na Alemanha nazista, de um cartunista assassinado em 1944, quase no fim da guerra”, recorda.
“O humor”, segundo Aroeira, “não é uma ferramenta de oprimir, mas é uma ferramenta de bater”. “Por isso, qualquer humorista, formador de opinião e político tem de que decidir de qual lado está”, assevera. “O humor não muda as coisas. Quem muda é a ciência, é o amor, é a organização social, é a política. Mas o humor ajuda. O humor reproduz com muita fidelidade a realidade”.
De volta a Duvivier, o apresentador do programa Greg News, na HBO, comentou o segredo da combinação explosiva entre humor e jornalismo. “Humor com jornalismo é perigoso? Sim, especialmente para a autoridade”.
De acordo com ele, o jornalismo tem como característica estilística ser um papo entre entendidos, enquanto o humor abre os braços para que novos atores participem deste papo. “O jornal é um bonde andando. O jornal não convida o leitor a entrar neste bonde, pois pressupõe que o leitor já está lá dentro. O humor, a crônica, são o convite. É a porta de entrada para entender o encadeamento dos fatos”.
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