Por Rodger Richer, no site da UNE:
“Eles querem alguém
Que vem de onde nóis vem
Seja mais humilde, baixe a cabeça
Nunca revide, finja que esqueceu a coisa toda
Eu quero é que eles se…” (Emicida)
O racismo no Brasil é estruturante das relações sociais, econômicas, políticas, culturais, institucionais e ambientais. O sistema capitalista se vale da dominação racial para explorar a classe trabalhadora e se manter hegemônico no mundo. Não há como falarmos de capitalismo sem falarmos de racismo. A classe trabalhadora brasileira tem cor: é negra.
Para compreender se há racismo no Brasil basta responder o seguinte questionamento: onde a população negra está em nossa sociedade?
Nos grandes centros urbanos, as periferias das cidades são compostas majoritariamente por negros(as). Nas universidades existem pouquíssimos(as) professores(as) negros(as). A maioria do povo negro trabalha em empregos informais e o cacetete e a bala da polícia pune e mata seletivamente dia após dia. Tais exemplos são evidentes para constatar que o racismo no Brasil não é velado: ele é escancarado e só não o enxerga quem ainda não enegreceu o olhar para percebê-lo!
Como consequência de uma abolição tardia a população negra brasileira historicamente encontra-se nos piores postos de trabalho, não se vê representada nos livros didáticos e de história, nos meios de comunicação, e tem sido sistematicamente exterminada fruto de uma cultura racista de violência tanto física, quanto simbólica.
Nas universidades há um forte processo em curso de morte da produção de conhecimento da população negra: o epistemicídio. Esse conceito sintetiza o racismo encravado nas estruturas das Instituições de Ensino Superior. Muitos projetos de pesquisa elaborados por negros(as) que tratam do racismo e da população negra são rechaçados pelas bancas de mestrado, doutorado e monografia. Trata-se de uma cláusula de barreira que visa cercear a ocupação do espaço universitário pelos corpos negros e suas consciências. Nas escolas isso também não é diferente. Mesmo com a aprovação da Lei 10.639, que prevê o ensino da história de África, muitos(as) professores(as) não colocam essa questão com centralidade nas aulas.
Todos os dias a mídia retrata a população negra como potencial criminosa. Os programas “policialescos” em pleno horário de almoço mostram corpos negros mortos por confrontos entre a polícia e o tráfico como se não representasse absolutamente nada. Sempre a população negra é retratada nas novelas e programas como ladrões, criminosos e em precárias condições de trabalho, numa relação de subalternidade em relação à população branca. Há uma naturalização das mortes da população negra por parte da grande mídia hegemônica. É preciso regulamentar a mídia para combater essa brutal forma de racismo que tenta impor qual o lugar que a população negra deve estar.
Nossa estética, cultura e identidade são ridicularizadas pelos(as) racistas. Dizem que nosso cabelo não é bom, que nosso nariz é feio, que nossas danças não prestam e que nossa religião é do mal. O racismo constrói uma polarização que coloca a cultura negra como o “mau” e a branca como “boa”. É preciso desconstruir tal perspectiva a partir da afirmação da nossa cultura, identidade e estética como uma forma de se fazer política.
É muito contraditório no Brasil - onde a imensa maioria da população é negra - não observarmos a população negra ocupar proporcionalmente os de espaços de poder. É preciso virar o tabuleiro desse jogo e construirmos uma nova correlação de forças que tenha uma perspectiva afro-centrada. Nós queremos ser protagonistas da nossa própria história e vamos lutar para que as nossas histórias sejam visibilizadas e narradas por nós mesmos!
É necessário que nós, jovens negros e negras, coloquemos em nossas costas a responsabilidade histórica de combater esse sistema racista, patriarcal, LGBTfóbico e capitalista. Muitos(as) de nós somos os(as) primeiros(as) das nossas famílias a entrar no ensino superior, a ter melhores oportunidades de emprego, dentre outros. É preciso lutar para ampliar essas conquistas para os nossos irmãos e irmãs. Por isso, a autoorganização no movimento negro é de suma importância.
As políticas afirmativas são fundamentais para reparar as assimetrias entre negros(as) e brancos(as), incluindo a população negra em espaços como as universidades, concursos públicos federais, dentre outros. É necessário pensar em um novo modelo de segurança pública que não extermine seletivamente negros(as), lutar contra o superencarceramento da população negra e por uma nova política sobre drogas. Precisamos lutar pelo direito de viver, para que possamos estar vivos(as) para estudar, trabalhar e transformar essa sociedade.
Dias como o 20 de Novembro são importantes para refletirmos sobre a necessidade urgente de romper com esse sistema racista e opressor. Tal data simboliza o dia da consciência negra em homenagem à Zumbi dos Palmares: símbolo de resistência e luta contra a escravidão no Brasil. Contudo, é fundamental lembrarmos todos os dias da consciência, vida e cultura negra! A luta antirracista e anticapitalista deve ser travada cotidianamente.
Em uma conjuntura de crise econômica, social e política que penaliza a classe trabalhadora (que é majoritariamente negra) é de extrema importância pensarmos em saídas para essa crise que apontem um caminho pela esquerda. Isso necessariamente perpassa por pensar novas formas de se fazer política que coloquem como eixo estratégico o enfrentamento ao racismo. A saída para a crise não é unificar a SEPPIR, SPM e SDH em um só Ministério, muito menos imprimir um Ajuste Fiscal que penaliza os andares de baixo. Os ricos que devem pagar por ela! Da mesma maneira não podemos tolerar que figuras como o Eduardo Cunha organizem sucessivas derrotas para o povo negro no Brasil, como a recente aprovação da PEC 171 na Câmara dos deputados que prevê a redução da idade penal. Tal figura representa um grande retrocesso para o povo brasileiro! Uma das nossas tarefas centrais enquanto movimento social é lutar pela sua saída da presidência da câmara e barrar a redução da idade penal!
Nesse cenário político tensionado em que se encontra o nosso país, é necessário que nós negros e negras estejamos bastante unidos(as) para construir as transformações necessárias e declarar guerra aos nossos reais inimigos: o racismo e o capitalismo! Vamos nos contrapor à essa constante investida conservadora e reacionária que ao longo da nossa história sempre tentou nos impor derrotas. Lá atrás lutaram pela manutenção da escravidão no país e em defesa da Ditadura Militar. Lá atrás organizaram manifestações contra as cotas e em defesa da meritocracia. Agora, defendem a redução da idade penal e a polícia militarizada que visa exterminar e cercear as liberdades da população negra. Essas figuras são nossos inimigos é pra eles que declaramos guerra: Não passarão!
Paz entre nós e guerra ao racismo!
* Rodger Richer é estudante de Ciência Política na UFBA, diretor de Combate ao Racismo da UNE e membro do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial (CNPIR).
“Eles querem alguém
Que vem de onde nóis vem
Seja mais humilde, baixe a cabeça
Nunca revide, finja que esqueceu a coisa toda
Eu quero é que eles se…” (Emicida)
O racismo no Brasil é estruturante das relações sociais, econômicas, políticas, culturais, institucionais e ambientais. O sistema capitalista se vale da dominação racial para explorar a classe trabalhadora e se manter hegemônico no mundo. Não há como falarmos de capitalismo sem falarmos de racismo. A classe trabalhadora brasileira tem cor: é negra.
Para compreender se há racismo no Brasil basta responder o seguinte questionamento: onde a população negra está em nossa sociedade?
Nos grandes centros urbanos, as periferias das cidades são compostas majoritariamente por negros(as). Nas universidades existem pouquíssimos(as) professores(as) negros(as). A maioria do povo negro trabalha em empregos informais e o cacetete e a bala da polícia pune e mata seletivamente dia após dia. Tais exemplos são evidentes para constatar que o racismo no Brasil não é velado: ele é escancarado e só não o enxerga quem ainda não enegreceu o olhar para percebê-lo!
Como consequência de uma abolição tardia a população negra brasileira historicamente encontra-se nos piores postos de trabalho, não se vê representada nos livros didáticos e de história, nos meios de comunicação, e tem sido sistematicamente exterminada fruto de uma cultura racista de violência tanto física, quanto simbólica.
Nas universidades há um forte processo em curso de morte da produção de conhecimento da população negra: o epistemicídio. Esse conceito sintetiza o racismo encravado nas estruturas das Instituições de Ensino Superior. Muitos projetos de pesquisa elaborados por negros(as) que tratam do racismo e da população negra são rechaçados pelas bancas de mestrado, doutorado e monografia. Trata-se de uma cláusula de barreira que visa cercear a ocupação do espaço universitário pelos corpos negros e suas consciências. Nas escolas isso também não é diferente. Mesmo com a aprovação da Lei 10.639, que prevê o ensino da história de África, muitos(as) professores(as) não colocam essa questão com centralidade nas aulas.
Todos os dias a mídia retrata a população negra como potencial criminosa. Os programas “policialescos” em pleno horário de almoço mostram corpos negros mortos por confrontos entre a polícia e o tráfico como se não representasse absolutamente nada. Sempre a população negra é retratada nas novelas e programas como ladrões, criminosos e em precárias condições de trabalho, numa relação de subalternidade em relação à população branca. Há uma naturalização das mortes da população negra por parte da grande mídia hegemônica. É preciso regulamentar a mídia para combater essa brutal forma de racismo que tenta impor qual o lugar que a população negra deve estar.
Nossa estética, cultura e identidade são ridicularizadas pelos(as) racistas. Dizem que nosso cabelo não é bom, que nosso nariz é feio, que nossas danças não prestam e que nossa religião é do mal. O racismo constrói uma polarização que coloca a cultura negra como o “mau” e a branca como “boa”. É preciso desconstruir tal perspectiva a partir da afirmação da nossa cultura, identidade e estética como uma forma de se fazer política.
É muito contraditório no Brasil - onde a imensa maioria da população é negra - não observarmos a população negra ocupar proporcionalmente os de espaços de poder. É preciso virar o tabuleiro desse jogo e construirmos uma nova correlação de forças que tenha uma perspectiva afro-centrada. Nós queremos ser protagonistas da nossa própria história e vamos lutar para que as nossas histórias sejam visibilizadas e narradas por nós mesmos!
É necessário que nós, jovens negros e negras, coloquemos em nossas costas a responsabilidade histórica de combater esse sistema racista, patriarcal, LGBTfóbico e capitalista. Muitos(as) de nós somos os(as) primeiros(as) das nossas famílias a entrar no ensino superior, a ter melhores oportunidades de emprego, dentre outros. É preciso lutar para ampliar essas conquistas para os nossos irmãos e irmãs. Por isso, a autoorganização no movimento negro é de suma importância.
As políticas afirmativas são fundamentais para reparar as assimetrias entre negros(as) e brancos(as), incluindo a população negra em espaços como as universidades, concursos públicos federais, dentre outros. É necessário pensar em um novo modelo de segurança pública que não extermine seletivamente negros(as), lutar contra o superencarceramento da população negra e por uma nova política sobre drogas. Precisamos lutar pelo direito de viver, para que possamos estar vivos(as) para estudar, trabalhar e transformar essa sociedade.
Dias como o 20 de Novembro são importantes para refletirmos sobre a necessidade urgente de romper com esse sistema racista e opressor. Tal data simboliza o dia da consciência negra em homenagem à Zumbi dos Palmares: símbolo de resistência e luta contra a escravidão no Brasil. Contudo, é fundamental lembrarmos todos os dias da consciência, vida e cultura negra! A luta antirracista e anticapitalista deve ser travada cotidianamente.
Em uma conjuntura de crise econômica, social e política que penaliza a classe trabalhadora (que é majoritariamente negra) é de extrema importância pensarmos em saídas para essa crise que apontem um caminho pela esquerda. Isso necessariamente perpassa por pensar novas formas de se fazer política que coloquem como eixo estratégico o enfrentamento ao racismo. A saída para a crise não é unificar a SEPPIR, SPM e SDH em um só Ministério, muito menos imprimir um Ajuste Fiscal que penaliza os andares de baixo. Os ricos que devem pagar por ela! Da mesma maneira não podemos tolerar que figuras como o Eduardo Cunha organizem sucessivas derrotas para o povo negro no Brasil, como a recente aprovação da PEC 171 na Câmara dos deputados que prevê a redução da idade penal. Tal figura representa um grande retrocesso para o povo brasileiro! Uma das nossas tarefas centrais enquanto movimento social é lutar pela sua saída da presidência da câmara e barrar a redução da idade penal!
Nesse cenário político tensionado em que se encontra o nosso país, é necessário que nós negros e negras estejamos bastante unidos(as) para construir as transformações necessárias e declarar guerra aos nossos reais inimigos: o racismo e o capitalismo! Vamos nos contrapor à essa constante investida conservadora e reacionária que ao longo da nossa história sempre tentou nos impor derrotas. Lá atrás lutaram pela manutenção da escravidão no país e em defesa da Ditadura Militar. Lá atrás organizaram manifestações contra as cotas e em defesa da meritocracia. Agora, defendem a redução da idade penal e a polícia militarizada que visa exterminar e cercear as liberdades da população negra. Essas figuras são nossos inimigos é pra eles que declaramos guerra: Não passarão!
Paz entre nós e guerra ao racismo!
* Rodger Richer é estudante de Ciência Política na UFBA, diretor de Combate ao Racismo da UNE e membro do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial (CNPIR).
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comente: