domingo, 1 de maio de 2016

A total falta de dignidade dos golpistas

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Por Sandro Ari Andrade de Miranda, no site Sul-21:

Não há dúvidas sobre o fato de Nicolau Maquiavel ser um dos maiores responsáveis pela construção dos mecanismos utilizados até hoje para análise política. Embora defensor da república, o mestre italiano escreveu “O Príncipe” como um manual para chegar e manter o poder, livro este que fundou a ciência política moderna.

Embora não tenha sido corretamente compreendido, inclusive resultando na sua perseguição por movimentos preconceituosos como a inquisição, Maquiavel foi capaz de traduzir com precisão a atuação concreta dos dirigentes do estado para administrar o poder. Contudo, existe um elemento fundamental que permeia toda a obra e que muitas vezes é esquecido: a “virtude”, ou, na tradução italiana, “virtu”.

Para ser um verdadeiro príncipe, não basta atingir o poder. É necessário merecê-lo, ter legitimidade, ter dignidade, ter, em essência, virtude. Um príncipe sem virtude não é um príncipe. Pode ser um golpista, um ditador, um conspirador, jamais um príncipe. A virtude é tão importante que Maquiavel criticava os príncipes que se utilizavam de “exércitos mercenários”, exércitos de ocasião pagos exclusivamente para vencerem as batalhas, mas que poderiam mudar de lado conforme a pressão do vento. É fundamental ter o seu próprio exército, legitimamente construído, formado na base e com sentimento de pertencimento à pátria ou projeto defendido. O exército pode ser pequeno, mas deve honrar e acreditar nos ideais que protege, em síntese: “deve, também, ter virtude”.

Faço esta pequena introdução para destacar a total falta de dignidade, honra e virtude dos principais articulistas do golpe, como Eduardo Cunha (PMDB/RJ), Michel Temer (PMDB/SP) e Aécio Neves (PSDB/MG). Assentar uma maioria de ocasião para botar “panos quentes” nas investigações sobre corrupção que atingem mais de 2/3 do Parlamento, além do aproveitamento de oportunistas ressentidos com as derrotas eleitorais e falta de espaço no Governo, não é uma justificava virtuosa, ao contrário, é a compra de mercenários.

O que verificamos no dia 17 de abril, e ainda podemos observar no Senado é, indiscutivelmente, um movimento golpista, no qual predominou a falta de preocupação com a legitimidade social. Tanto é verdade, que para construir a sua base parlamentar, Temer, que nunca encabeçou nenhuma chapa majoritária e saiu vencedor, conta com o apoio massivo de vários políticos que foram derrotados nos seus redutos eleitorais, além do PSDB e do DEM, que foram derrotados no voto nos últimos 4 processos eleitorais. Ou seja, uma base sem legitimidade social alguma. Aécio Neves, por sinal, quando candidato à Presidente da República, foi derrotado no primeiro turno para os votos brancos e nulos. Somente chegou ao segundo turno por erro estratégico de Marina Silva somado ao apelo oportunístico a um discurso de dar inveja a Benito Mussolini.

Desta forma, por mais que Michel Temer reclame do fato de ser chamado reiteradamente pela imprensa internacional de conspirador, não existe outro adjetivo mais adequado para descrevê-lo. O que Temer, Eduardo Cunha e a oposição conduzem no Congresso é, indiscutivelmente, sob o ponto de vista da ciência política, um golpe de estado. O golpista não precisa manejar forças armadas para chegar ao poder, basta que se utilize de instrumentos ilícitos e ilegítimos, como a afastamento da Presidenta da República, legitimamente eleita, por um crime que não existe. E, mesmo que existisse, deveria repercutir, também, no afastamento de Michel Temer.

Assim, não há menor sentido em chamar os condutores do golpe de maquiavélicos. Tal interpretação seria uma ofensa ao “Grande Mestre Florentino”. Falta um atributo essencial às lideranças golpistas. Algo que em momento algum eles conseguirão atingir: “a virtude”! Quem chega ao poder sem virtude jamais será um Príncipe. Será sempre considerado pela história com um patético golpista.

* Sandro Ari Andrade de Miranda é advogado e mestre em ciências sociais.

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