Por Marlos Mello, no Observatório da Imprensa:
Em meio à agenda de questões que pautam o país, uma não sai ou não deveria sair de nossas discussões: qual o poder de uma denúncia feita pela imprensa brasileira? Por favor, peço que não se espantem e reflitam comigo durante este curto espaço-tempo que temos.
Primeiramente, pretendo apresentar algumas hipóteses de como as denúncias se formam, depois vou aproveitar para fazer algumas provocações sobre o comportamento d@s brasileir@s frente aos escândalos políticos e ao final vou insurgir problematizando o papel da blogosfera progressista na sociedade brasileira.
Num primeiro olhar, minha análise concerne ao sentido de relacionar denúncias a mitos. Digo isso porque tanto as denúncias como os mitos surgem sempre em períodos de crises, em tom de grande descoberta. Assim, não passa pela cabeça de ninguém negar, ou ao menos pensar, o que, aparentemente, se apresenta como óbvio. Ora, as concepções de uma denúncia e de um mito são claramente expressas nas suas “evidências” e a sua natureza é deliberada na argumentação do provável, do que não tem razão em não ser. Dessa forma, na maioria das denúncias, a qualificação dos denunciantes acaba ficando em segundo plano e, em alguns casos, nem é levada em conta.
Escândalos políticos
Com efeito, no Brasil, uma denúncia divulgada por uma grande empresa de comunicação (por exemplo, jornais e revistas de grande circulação) pode, por muito tempo, figurar como verdade nos mais diversos e diferentes órgãos de imprensa. Para os partidários de tal denúncia, parece natural presumir que ela seja verdade. Semelhante lógica de pensamento é retratada por Cármides na comédia de Plauto, onde ele diz: “Se a moça te agrada, o dote que ela traz deve agradar-te também.” Ou seja, se a denúncia “te agrada”, as consequências dela devem te agradar também. Daí resulta o método de contentamento com as opiniões dos comentaristas e comunicadores que, atualmente, estão de plantão nas portas das rádios e televisões dos grandes grupos de comunicação exercendo o papel de legitimadores do “óbvio”, ou seja, do que não pode ser negado, do “só não vê quem não quer”, algo assim.
Nos últimos anos, assistimos a uma enxurrada de denúncias propagadas pela imprensa brasileira, geralmente relacionadas a questões políticas e, especialmente, aos políticos. Evidentemente, não podemos nos fixar apenas na análise, nas causas e nas consequências dessas denúncias. Nossa intenção é pensar o comportamento d@s brasileir@s frente a essas denúncias, chamadas ocasionalmente de escândalos políticos.
Não é de hoje que ouvimos falar de escândalos políticos e por isso não entraremos no mérito do seu significado. No entanto, sugerimos o livro O Escândalo Político, de John Thompson, de 2002, como uma boa opção para quem desejar se aprofundar nesse conceito. Porém, não podemos deixar de lado a tese do livro de Thompson, que sugere estarmos vivendo num contexto onde os escândalos são uma “característica endêmica da cultura política” (p. 151). Nesse sentido, pode-se dizer que os escândalos políticos não são situações ocasionais que ocorrem isoladamente.
A coerência das denúncias
Segundo Thompson, “o escândalo se tornou um risco inerente à profissão dos que transitam pelo espaço público” (p. 151) e, a despeito de sua ocorrência, há uma tendência ao comportamento ambivalente por parte da população. Por um lado, “muitas pessoas podem achar que os escândalos trazem uma contribuição legitima, embora às vezes sensacionalista, à vida política” (p. 152), mas por outro, “muitas pessoas podem estar cansadas de escândalos e desacreditarem da intenção da mídia” (p. 152). Esse “cansaço” é chamado por Thompson de “exaustão de escândalo”.
Nesse sentido, acreditamos que a população brasileira também está sofrendo desse fenômeno mundial – exaustão de escândalo – citado por Thompson. A banalização, a quantidade de escândalos e a forma como eles são propagados pela imprensa brasileira pode estar causando nas pessoas uma dificuldade de discernir o que deve ser levado em conta e o que é especulação.
É importante destacar que os grandes grupos de comunicação utilizam duas estratégias principais para propagar os escândalos: a repetição e a especulação. A primeira porque, de tanto repetir um mesmo fato, ele acaba ganhando mais força e, em tese, maior credibilidade. No entanto, é através da especulação que os escândalos ganham vida. A especulação funciona como uma conversa que, a cada momento, a cada dia, ganha novas valorações e interpretações por parte dos comunicadores e comentaristas. Para que o leitor não se perca, pense nos capítulos de uma novela e, por favor, compare se não há uma semelhança na forma como a imprensa conduz os escândalos políticos. Na prática, o que ocorre é uma “costura” lógica entre as informações propagadas e as interpretações e valorações daqueles que as emitem.
Assim, o que o leitor/ouvinte/telespectador/internauta debate é, certamente, a imagem dos fatos pela ótica daquele que a emite. No entanto, a própria imagem de escândalo político está sendo questionada, tanto na sua prática quanto conceitualmente. Toda uma variedade de práticas, dentre elas o acesso às diversas e diferentes tecnologias, tem posto em questão a unidade, a naturalidade e a coerência das denúncias divulgadas pela imprensa.
Democratização da comunicação
De qualquer modo, antes de seguirmos adiante não podemos deixar de destacar que os escândalos políticos deram origem a um fenômeno chamado jornalismo especulativo. Nesse caso, segundo Vera Chaia, os jornalistas se consideram “guardiões do interesse público” e atuam no sentido de revelar os segredos dos poderes. Também não se pode deixar de considerar que existe um interesse comercial na divulgação dos escândalos, já que esse fenômeno “vende”.
As novas tecnologias perturbam a naturalidade das denúncias divulgadas pela imprensa e suas fronteiras em relação ao que é eficazmente reproduzido ao longo de muito tempo. Se antes uma notícia publicada pela imprensa demorava muito tempo para ser desmentida – e, muitas vezes, nem era –, atualmente, muito por causa dos blogueiros, há uma transformação no exercício do poder político na democracia brasileira. Ou seja, a blogosfera está transformando a forma pela qual o brasileiro está tendo acesso às informações e discussões que pautam o seu cotidiano. Nesse sentido, é possível acreditar que estamos no caminho de uma verdadeira democracia, em que todos tenham voz.
Não entraremos no mérito da discussão se a blogosfera é progressista ou não, como já foi feito em outros artigos. Nosso interesse é considerar o papel transformador dos blogueiros. Estes, através da organização de encontros regionais, estão discutindo e consolidando o seu papel na democracia brasileira. Assim, acreditamos que a luta pela democratização da comunicação, contra qualquer tipo de censura e por políticas públicas de incentivo à pluralidade e à diversidade informativas, é a grande marca dos blogueiros brasileiros.
Na prática, ainda é cedo para enfatizarmos essa mudança, porém salta à vista que há uma articulação para que a democratização da comunicação se torne uma realidade. No entanto, para que ela aconteça é preciso prudência e firmeza para seguir adiante.
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2º Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas
Abaixo está a programação do encontro, que ocorrerá nos dias 17, 18 e 19 de junho em Brasília.
Programação
Dia 17 de junho, sexta-feira
17 horas - Início do credenciamento
19 horas - Palestra do ministro Paulo Bernardo sobre os desafios da comunicação no governo Dilma Rousseff;
21 horas - Festa de confraternização
Dia 18 de junho, sábado
9 horas - A luta por um novo marco regulatório da comunicação
- Deputada Luiza Erundina – coordenadora da Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão;
- Jurista Fábio Konder Comparato – autor da Ação de Omissão (ADO) do Congresso Nacional na regulamentação da comunicação;
- Professor Venício Lima – autor do livro recém-lançado Regulação das comunicações
14 horas - Oficinas autogestionadas e simultâneas
1 - Os partidos e a luta pela democratização da comunicação
- José Dirceu (PT), João Arruda (PMDB), Brizola Neto (PDT), Renato Rabelo (PCdoB), Randolfe Rodrigues (PSOL) – Mediação: José Augusto Valente;
2 - O sindicalismo na era da internet
- Artur Henrique (CUT), Luis Carlos Mota (FS), Nivaldo Santana (CTB), Ricardo Patah (UGT), Ubiraci Dantas (CGTB) e Toninho (Diap) – Mediação: Rita Casaro;
3 - A política da internet, tecnologias e a neutralidade na rede
- Sérgio Amadeu, Marcelo Branco, Ricardo Poppi, José Carlos Caribé, Tatiane Pires – mediação: Diego Casaes;
4 - “Arte, humor, militância e compromisso: agora por nós mesmos. Compartilhando experiências”
- Mediação: Sérgio Teles e Paula Marcondes;
5 - Reforma agrária e as perspectivas na comunicação.
- Gilmar Mauro, Rodrigo Vianna, Letícia Silva, Sergio Sauer – Mediação: Igor Felippe;
6 - Mulheres na blogosfera
- Luka da Rosa, Amanda Vieira, Mayara Melo – Mediação: Niara de Oliveira;
7 - Perseguição e censura contra a blogosfera
- Paulo Henrique Amorim, Esmael Morais e Lino Bocchini – Mediação: Altamiro Borges.
8 - A militância digital e as redes sociais
- Eduardo Guimarães, Luis Carlos Azenha, Conceição Oliveira (Maria Frô) – Mediação: Conceição Lemes
9 - Lan houses e a internet na periferia
- Mediação: Mario Brandão.
10 - A economia da outra comunicação: os caminhos e desafios da sustentabilidade da blogosfera
- Ladislau Dowbor, Marcio Pochmann, Clayton Mello – Mediação: Renato Rovai
• Oficina sobre ferramentas do blog – Mesa: Marcos Lemos;
Dia 19 de junho, domingo
9 horas - Reuniões em grupo: troca de experiência, balanço e desafios da blogosfera progressista;
14 horas - Plenária final: aprovação da carta dos blogueiros e constituição da nova comissão nacional organizadora
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Referências
CHAIA, VERA e TEIXEIRA, MARCO ANTONIO. Democracia e escândalos políticos.São Paulo Perspec. [online]. 2001, vol.15 n.4, pp.62-75. ISSN 0102-8839. doi: 10.1590/S0102-88392001000400008.
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* Psicólogo social, Porto Alegre.