Por Luis Nassif, no Jornal GGN:
Os jornais estão entrando em uma encrenca cada vez maior.
Diz-se que o jornalismo é o exercício do caráter. Especialmente no jornalismo opinativo e na linha editorial dos jornais, o caráter é ponto central. Constrói-se o caráter de cada publicação analisando seu apego aos fatos, sua generosidade ou dureza de julgamento, sua capacidade de mediação ou parcialidade gritante. E, principalmente, sua credibilidade, o respeito com que trata a informação. Houve um bom período em que mesmo os adversários mais ferrenhos do Estadão respeitavam a seriedade com que tratava os fatos.
Desde que a mídia brasileira caiu de cabeça no pós-verdade e no jornalismo de guerra, esse quadro mudou.
No Olimpo da mídia de massa, há dois tipos de jornalistas e de celebridades: os que seguem cegamente a linha criada pelos veículos; e os que já têm ou caminham para ter personalidade própria, inclusive para se contrapor aos movimentos de manada.
Nesse grupo abrigado pela mídia, pequeno, mas influente, há um mal-estar crescente em relação ao governo Temer, à parcialidade da Lava Jato e ao próprio esforço da mídia em dourar a pílula do governo com um jornalismo eminentemente chapa-branca.
Por outro lado, após perder os leitores de esquerda, a velha mídia começa a perder os de direita, que se agrupam em torno de outros veículos. E está diante de um grave problema moral e jornalístico: qual a cara dos jornais? Que tipo de pensamento eles representam? Qual é seu caráter?
A imagem que passam é dúbia. E a aproximação com Temer agravou radicalmente esse quadro:
1. Eu sei, os jornais sabem, a torcida do Flamengo sabe que o governo Temer é eminentemente corrupto.
2. Mesmo assim, os jornais teimam em apoiá-lo, depois de justificar o impeachment como combate à corrupção.
Como pretendem se diferenciar dos blogs e sites jornalísticos sem tradição? Publicando artigos sobre a pós-verdade e, ao mesmo tempo, continuando adeptos incondicionais do jornalismo de guerra? E, agora, perdendo qualquer veleidade de encenação de superioridade moral, apoiando uma plutocracia unanimemente reconhecida como corrupta.
Os jornais estão entrando em uma encrenca cada vez maior.
Diz-se que o jornalismo é o exercício do caráter. Especialmente no jornalismo opinativo e na linha editorial dos jornais, o caráter é ponto central. Constrói-se o caráter de cada publicação analisando seu apego aos fatos, sua generosidade ou dureza de julgamento, sua capacidade de mediação ou parcialidade gritante. E, principalmente, sua credibilidade, o respeito com que trata a informação. Houve um bom período em que mesmo os adversários mais ferrenhos do Estadão respeitavam a seriedade com que tratava os fatos.
Desde que a mídia brasileira caiu de cabeça no pós-verdade e no jornalismo de guerra, esse quadro mudou.
No Olimpo da mídia de massa, há dois tipos de jornalistas e de celebridades: os que seguem cegamente a linha criada pelos veículos; e os que já têm ou caminham para ter personalidade própria, inclusive para se contrapor aos movimentos de manada.
Nesse grupo abrigado pela mídia, pequeno, mas influente, há um mal-estar crescente em relação ao governo Temer, à parcialidade da Lava Jato e ao próprio esforço da mídia em dourar a pílula do governo com um jornalismo eminentemente chapa-branca.
Por outro lado, após perder os leitores de esquerda, a velha mídia começa a perder os de direita, que se agrupam em torno de outros veículos. E está diante de um grave problema moral e jornalístico: qual a cara dos jornais? Que tipo de pensamento eles representam? Qual é seu caráter?
A imagem que passam é dúbia. E a aproximação com Temer agravou radicalmente esse quadro:
1. Eu sei, os jornais sabem, a torcida do Flamengo sabe que o governo Temer é eminentemente corrupto.
2. Mesmo assim, os jornais teimam em apoiá-lo, depois de justificar o impeachment como combate à corrupção.
Como pretendem se diferenciar dos blogs e sites jornalísticos sem tradição? Publicando artigos sobre a pós-verdade e, ao mesmo tempo, continuando adeptos incondicionais do jornalismo de guerra? E, agora, perdendo qualquer veleidade de encenação de superioridade moral, apoiando uma plutocracia unanimemente reconhecida como corrupta.
Peça 2 – o jornalismo chapa-branca
A maneira como os jornais atuam, sempre de forma concatenada, é sinal indiscutível de uma articulação, como a de um cartel combinando preços.
Analisem os jornais de hoje. Todos batem em três teclas simultaneamente: a de melhoria da economia e a leitura enviesada do depoimento de Marcelo Odebrecht, e a repetição das denúncias contra o PT, todas buscando beneficiar o governo Temer.
A crise está longe de ser vencida. Persiste a crise fiscal da União e dos estados, os principais setores – como o automobilístico – amargam quedas recordes, o pior bimestre nos últimos 11 anos, o desemprego avança de forma avassaladora. E a cada dia que passa mais se escancara a natureza fundamentalmente corrupta do governo Temer.
Como gerar notícias positivas?
O Valor Econômico, que já praticou um jornalismo mais objetivo, recorre a uma entrevista com Michel Temer e transforma em manchete sua “previsão”: “Temer aposta em alta do PIB acima de 3% em 2018” (https://goo.gl/tMvvs5). Fantástico! Um deputado que jamais se interessou por temas econômicos, que não tem nenhum histórico de previsões ou cenários, “aposta” em PIB acima de 3% e a aposta merece manchete principal do jornal.
Já a Folha prefere transformar a pessoa física de Temer em “gestão Temer”, e coloca na manchete principal a extraordinária informação de que a gestão vê retomada da economia e diminui corte orçamentário. E quais os indicadores? A informação de que a arrecadação continua caindo, sim, mas em ritmo mais lento. Ou seja, após 8% de queda do PINB, ainda não se chegou ao fundo do poço.
Em outros cantos, o jogo de previsões sombrias de que a saída de Temer poderia comprometer a salvação nacional, que são as reformas constitucionais empurradas goela abaixo da população – e, por isso mesmo, extremamente vulneráveis a futuros governos.
Assim, o jornalismo econômico e político na velha mídia fica dependendo de alguns raros praticantes de jornalismo efetivo, como José Paulo Kupfer, do Globo, e Vinicius Torres, da Folha. Ou ainda de analistas políticos escondidos pelo jornal, como José Roberto Toledo, do Estadão, ou, menos escondida, Maria Cristina Fernandes, do Valor e Bernardo Mello Franco, da Folha, Kennedy Alencar, da CBN. E os referenciais de sempre, como Jânio de Freitas.
A maneira como os jornais atuam, sempre de forma concatenada, é sinal indiscutível de uma articulação, como a de um cartel combinando preços.
Analisem os jornais de hoje. Todos batem em três teclas simultaneamente: a de melhoria da economia e a leitura enviesada do depoimento de Marcelo Odebrecht, e a repetição das denúncias contra o PT, todas buscando beneficiar o governo Temer.
A crise está longe de ser vencida. Persiste a crise fiscal da União e dos estados, os principais setores – como o automobilístico – amargam quedas recordes, o pior bimestre nos últimos 11 anos, o desemprego avança de forma avassaladora. E a cada dia que passa mais se escancara a natureza fundamentalmente corrupta do governo Temer.
Como gerar notícias positivas?
O Valor Econômico, que já praticou um jornalismo mais objetivo, recorre a uma entrevista com Michel Temer e transforma em manchete sua “previsão”: “Temer aposta em alta do PIB acima de 3% em 2018” (https://goo.gl/tMvvs5). Fantástico! Um deputado que jamais se interessou por temas econômicos, que não tem nenhum histórico de previsões ou cenários, “aposta” em PIB acima de 3% e a aposta merece manchete principal do jornal.
Já a Folha prefere transformar a pessoa física de Temer em “gestão Temer”, e coloca na manchete principal a extraordinária informação de que a gestão vê retomada da economia e diminui corte orçamentário. E quais os indicadores? A informação de que a arrecadação continua caindo, sim, mas em ritmo mais lento. Ou seja, após 8% de queda do PINB, ainda não se chegou ao fundo do poço.
Em outros cantos, o jogo de previsões sombrias de que a saída de Temer poderia comprometer a salvação nacional, que são as reformas constitucionais empurradas goela abaixo da população – e, por isso mesmo, extremamente vulneráveis a futuros governos.
Assim, o jornalismo econômico e político na velha mídia fica dependendo de alguns raros praticantes de jornalismo efetivo, como José Paulo Kupfer, do Globo, e Vinicius Torres, da Folha. Ou ainda de analistas políticos escondidos pelo jornal, como José Roberto Toledo, do Estadão, ou, menos escondida, Maria Cristina Fernandes, do Valor e Bernardo Mello Franco, da Folha, Kennedy Alencar, da CBN. E os referenciais de sempre, como Jânio de Freitas.
Peça 3 – a desinformação de quem informa
Esses contrapontos são utilizados pelos jornais não como elementos de análise, mas como exemplo restritíssimo de biodiversidade política. No fundo, a inteligência interna, a visão estratégica dos veículos é tão rasa quanto a do público que cultivam, tal o desleixo com que trabalham as notícias, tal a mesmice das análises econômicas e políticas, sem nenhum controle de qualidade, nenhuma punição aos grandes erros factuais, e nenhuma visão de futuro.
Foi esse mesmo espírito que levou, no início de 1999, as empresas jornalísticas à maior crise da história porque acreditaram em suas fontes do mercado financeiro – e, muitas delas, em seus colunistas financeiros – de que não haveria desvalorização do real.
Agora, incorrem na mesma falta de visão estratégica, no simplismo de quem não consegue analisar os múltiplos desdobramentos do quadro econômico e político e, especialmente, as resultantes da própria ação midiática.
Mesmo estando em jogo o futuro do jornalismo e deles, como empresas, são incapazes de montar um conselho diversificado, capaz de traçar cenários minimamente complexos para orientar as estratégias editoriais. Subordinam-se à cartelização, provavelmente montada dentro do fórum do Instituto Millenium, que é a melhor maneira de minimizar responsabilidades: afinal, se houver erros, será coletivo. Para quem não sabe o que fazer, não deixa de ser um consolo.
Se não houver uma correção de rumos, se terá o seguinte quadro pela frente:
1. A velha mídia vai continuar bancando um plano econômico sem nenhuma condição de superar a crise. O plano não tem nenhum componente anticíclico. Vai apenas prolongar a recessão e aprofundar as tensões sociais e políticas.
2. Passar o desmonte da Previdência e do fim dos direitos sociais, sem nenhuma espécie de negociação, em um quadro de ampla recessão, é jogar gasolina na fogueira.
3. Como intermediária e avalista da Lava Jato e, agora, de Temer perante a classe média, conseguirá se desmoralizar cada vez mais perante seu público, a exemplo do que está acontecendo com seus candidatos do PSDB, nenhum deles em condição competitiva para 2018. Apesar de merecer esse fim, não é bom para o país. Será o fracasso definitivo da sociedade civil, uma das últimas formas de articulação da institucionalidade, embora profundamente corroída por anos de discursos de ódio.
Esses contrapontos são utilizados pelos jornais não como elementos de análise, mas como exemplo restritíssimo de biodiversidade política. No fundo, a inteligência interna, a visão estratégica dos veículos é tão rasa quanto a do público que cultivam, tal o desleixo com que trabalham as notícias, tal a mesmice das análises econômicas e políticas, sem nenhum controle de qualidade, nenhuma punição aos grandes erros factuais, e nenhuma visão de futuro.
Foi esse mesmo espírito que levou, no início de 1999, as empresas jornalísticas à maior crise da história porque acreditaram em suas fontes do mercado financeiro – e, muitas delas, em seus colunistas financeiros – de que não haveria desvalorização do real.
Agora, incorrem na mesma falta de visão estratégica, no simplismo de quem não consegue analisar os múltiplos desdobramentos do quadro econômico e político e, especialmente, as resultantes da própria ação midiática.
Mesmo estando em jogo o futuro do jornalismo e deles, como empresas, são incapazes de montar um conselho diversificado, capaz de traçar cenários minimamente complexos para orientar as estratégias editoriais. Subordinam-se à cartelização, provavelmente montada dentro do fórum do Instituto Millenium, que é a melhor maneira de minimizar responsabilidades: afinal, se houver erros, será coletivo. Para quem não sabe o que fazer, não deixa de ser um consolo.
Se não houver uma correção de rumos, se terá o seguinte quadro pela frente:
1. A velha mídia vai continuar bancando um plano econômico sem nenhuma condição de superar a crise. O plano não tem nenhum componente anticíclico. Vai apenas prolongar a recessão e aprofundar as tensões sociais e políticas.
2. Passar o desmonte da Previdência e do fim dos direitos sociais, sem nenhuma espécie de negociação, em um quadro de ampla recessão, é jogar gasolina na fogueira.
3. Como intermediária e avalista da Lava Jato e, agora, de Temer perante a classe média, conseguirá se desmoralizar cada vez mais perante seu público, a exemplo do que está acontecendo com seus candidatos do PSDB, nenhum deles em condição competitiva para 2018. Apesar de merecer esse fim, não é bom para o país. Será o fracasso definitivo da sociedade civil, uma das últimas formas de articulação da institucionalidade, embora profundamente corroída por anos de discursos de ódio.
Peça 4 – o desafio das delações da Odebrecht
É assim, sem nenhuma visão, que a mídia entrará agora na cobertura das delações da Odebrecht.
Já está delineada uma estratégia para impedir que a Lava Jato chegue nos seus.
1 A denúncia dos abusos cometidos no período anterior, no qual as vítimas foram Lula e o PT. O destaque dado pelo Estadão à entrevista do ex-Ministro Nelson Jobim – no qual ele desanca as ilegalidades da Lava Jato e reclama da falta de punição aos abusos mais ostensivos – com mais de um ano de atraso.
2 A parceria renovada de Jobim com Gilmar Mendes.
3 Os inquéritos internos contra os delegados da Lava Jato, pela colocação de escuta clandestina na cela de Alberto Yousseff e outros. Até agora empurrou-se com a barriga o inquérito. Bastará trata-lo com seriedade para se enquadrar os dois principais delegados da Lava Jato. Que, assim como José Serra, decidiram abdicar de seus cargos em Curitiba e buscar paragens mais amenas.
4 O jogo de postergações de inquéritos envolvendo os parceiros da mídia e da Procuradoria Geral da República (PGR).
Todos esses movimentos são carne fresca a alimentar o leão das ruas, que vem embalando os sonhos de Bolsonaro, ou os sonhos com o general Villas Boas.
É assim, sem nenhuma visão, que a mídia entrará agora na cobertura das delações da Odebrecht.
Já está delineada uma estratégia para impedir que a Lava Jato chegue nos seus.
1 A denúncia dos abusos cometidos no período anterior, no qual as vítimas foram Lula e o PT. O destaque dado pelo Estadão à entrevista do ex-Ministro Nelson Jobim – no qual ele desanca as ilegalidades da Lava Jato e reclama da falta de punição aos abusos mais ostensivos – com mais de um ano de atraso.
2 A parceria renovada de Jobim com Gilmar Mendes.
3 Os inquéritos internos contra os delegados da Lava Jato, pela colocação de escuta clandestina na cela de Alberto Yousseff e outros. Até agora empurrou-se com a barriga o inquérito. Bastará trata-lo com seriedade para se enquadrar os dois principais delegados da Lava Jato. Que, assim como José Serra, decidiram abdicar de seus cargos em Curitiba e buscar paragens mais amenas.
4 O jogo de postergações de inquéritos envolvendo os parceiros da mídia e da Procuradoria Geral da República (PGR).
Todos esses movimentos são carne fresca a alimentar o leão das ruas, que vem embalando os sonhos de Bolsonaro, ou os sonhos com o general Villas Boas.
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