domingo, 6 de junho de 2010

O dossiê do simulacro de imprensa

Reproduzo artigo enviado pelo amigo Gilson Caroni:

Pena que a ficção tenha durado tão pouco. Mas a trama era tão frágil que foi desconstruída com um simples artigo de Luiz Nassif. Trabalhando com a lógica dos fatos, o blogueiro mostrou que o anunciado “novo escorregão petista" era, na verdade, um livro do jornalista Amaury Ribeiro Jr. Uma obra tão reveladora dos bastidores tucanos que, antes mesmo de existir editorialmente, já virou leitura obrigatória.

Quem acompanha a história da imprensa brasileira sabe de suas conexões com interesses dominantes na sociedade fracionada. Conhece, e bem, como são editados fatos e discursos. Tem noção aguda de que a autonomia relativa de uma redação encontra seus limites nos interesses do patronato. Franklin Martins, Helena Chagas e Rodrigo Viana, demitidos em 2006, estão aí como “respaldo de provas robustas”, “evidências empíricas", sempre solicitadas pelos defensores da grande mídia corporativa quando acusados de trabalhar para partidos da direita, com doses descomunais de panfletarismo.

É de autoria de Paulo Francis a máxima segundo a qual “a história é monótona, a cada minuto nasce um leitor idiota”. Parece que, pelo que temos visto nos últimos oito anos, a suposta idiotia do leitor é algo datado, sem sinalização concreta nos dias atuais. Ainda assim, convém confrontar supostas espertezas que podem custar caro ao campo democrático-popular. Quando isso ocorre, a direita comemora com blocos editorializados no Jornal Nacional. E, claro, a nau dos insensatos ainda chama de bom jornalismo o que não passa de desabrida propaganda ideológica.

Na verdade, os jornalões produzem noticiário somente para leitores alinhados com sua política editorial e os colunistas, do alto de sua insignificância, escrevem para prestar conta apenas a seus patrões. Laurindo Leal Lalo Filho foi preciso ao definir o papel que sobrou o jornalismo impresso protofascista: ser fonte de munição para os veículos eletrônicos (rádio, TV e internet).

Faltou pouco para que a última edição do JN (sábado, 6/6) tivesse fundo musical. Afinal, era comemorativa e o regozijo com um suposto gol contra do adversário é conhecido do torcedor brasileiro. Se servir para ocultar as conquistas do atual governo, e o crescimento da candidatura de Dilma Roussef, tanto melhor. Saímos do campo futebolístico e adentramos a arena da luta de classes, sempre com a elegância da boa diagramação e o capricho nos títulos fortes.

O "dossiê", supostamente produzido pelo núcleo de campanha da ex-ministra, envolvendo Serra e pessoas próximas a ele, foi um presente “inesperado” para aqueles 5% que não se conformam com a reedição de um fenômeno inédito até 2006: uma vitória política, já consolidada no imaginário do eleitorado, não se desdobrar em vitória eleitoral.

Sejamos francos, só mesmo sendo muito ingênuo para cair no “conto do dossiê”. Qualquer pessoa, com um mínimo de bom senso, farejaria de longe a óbvia “trampa”. Um mínimo de pragmatismo saberia que vídeos e papéis, ainda que bombásticos, não teriam qualquer efeito prático à essa altura do campeonato em que, para o PT, a terceira eleição para a presidência da República é um fato altamente provável.

Tentou-se, sem o menor cuidado investigativo, reeditar a aventura midiática de 2006. Qual foi a construção que se procurou vender à época, no chamado “escândalo dos aloprados”? Um pouco de tática de luta sindical misturada ao desespero da facção paulista do partido, ávida por assegurar uma hegemonia em risco, poderia explicar o tiro eleitoral que quase acertou o pé. Ainda mais quando se farejavam as intenções de tucanos lacerdistas e os seguidos pronunciamentos do presidente do TSE (Marco Aurélio Mello) a lhes prometer sustentação legal em sua aventura. Os desmentidos não tardaram a aparecer e o "escândalo", tal como o do “mensalão”, passou a ter valor tão somente como provisão para efetiva perda de estoque informativo.

Para piorar, nas eleições passadas, ainda haveria outro “dossiê” a ser escondido no noticiário global. E ele veio do Pnad (Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio). Para desespero dos expoentes da Teoria da Dependência, que agora elegeram a UDN como modelo, o nível de pobreza caiu 19,18% nos três primeiros anos do governo Lula, o maior recuo em dez anos. Somemos a isso a retomada do emprego, estagnada há uma década, segundo Marcelo Néri, coordenador da pesquisa.

Mas, há quatro anos, o que mais impressionava no “dossiê” a ser ocultado viria a seguir: Os pobres e ricos tiveram obtiveram ganhos. Porém, segundo Néri, "50% dos mais pobres aumentaram sua renda em 8,5%, enquanto os 10% mais ricos, depois de cinco anos de perdas, tiveram ganhos de cerca 6%. A classe média teve um crescimento um pouco menor, de 5,5% da renda.”

Era esse o governo que tinha privilegiado banqueiros? Os editores se calaram. Aqueles que deveriam sempre se pautar por evidências empíricas que valem o sal de todo mês ficaram calados. Desde então, a grande imprensa se condenou a não cobrir questões programáticas, fugir da grande política, chafurdando no sistema de valências, da desqualificação pessoal e de histórias fantasiosas.

Se a grande mídia acreditasse em suas próprias representações, seria desnecessário reiterar que, se existem indícios, por mais tênues que sejam, de possível envolvimento de José Serra com os irregularidades da privataria, por ação ou omissão, tal possibilidade deveria ser investigada. Para um jornalismo correto denúncias não são liminarmente desqualificadas.

Para gáudio dos golpistas, seu colosso midiático produzirá edições inesquecíveis de Vejas e Épocas nas próximas semanas. Muito embora a população já tenha sinalizado que a direita pode estar gastando tinta e papel em vão, a dobradinha TSE-TV Globo estará no ar “orientando” os eleitores a não votar em candidatos envolvidos em “escândalos”. Claro que não relembra que a maioria deles é peça de ficção produzida nas melhores redações. Nunca, desde 1964, o empenho em derrotar uma liderança foi tão evidente a ponto de pôr no chão o marketing editorial de várias publicações.

Com tudo isso, creio que é bom lembrar que sobressaltos no período eleitoral já eram esperados. Mas alguns, convenhamos, são evitáveis. A direita não se deu sequer ao trabalho de atualizar métodos. A “venezuelização” do monopólio global já lançou sua palavra de ordem: a eleição não será televisionada. Este é o mote que assusta. E, que me desculpem os observadores mais apaixonados pelo ofício, as generalizações não incorrem em risco de erro. Lanzettas e Onésimos frequentarão páginas e telas por um bom tempo ainda. São os personagens à procura de um autor. Pobre Pirandello.

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Em tempo: Nunca as evidências estiveram tão à mostra e custaram tão barato. O pesquisador deve ir à banca e procurar pelos seguintes títulos: O Globo, O Estado de S.Paulo e Zero Hora. Uma olhada nas manchetes e títulos das dobras superiores já será de grande valia. Se quiser uma amostragem repleta de cores e luzes, deve procurar por publicações semanais. São um pouco mais caras, mas são muito piores.

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Na disputa por espaços de expressão

Reproduzo artigo do professor Venício A. de Lima, publicado no sítio Carta Maior:

O início das transmissões do canal internacional da TV Brasil da EBC – Empresa Brasil de Comunicação, na segunda feira (24/4), coloca o Brasil na velha e renovada disputa por um lugar não subalterno no cenário mundial.

Por razões de afinidade histórica, o canal internacional escolheu começar levando seu sinal ao continente africano onde estará disponível, inicialmente, para 49 dos 53 países. Na solenidade realizada no Itamaraty, em Brasília, o presidente de Moçambique, Armando Guebuza, fez uma saudação, gravada e levada ao ar pela TV Brasil Internacional, no início de suas transmissões.

Com esta iniciativa o Brasil se equipara a países como a Inglaterra (BBC), Espanha (TVE), França (France Television), Portugal (RTP), Japão (NHK), Alemanha (Deutsche Welle), Venezuela (Telesur) e outros que têm canais internacionais transmitindo continuamente, em língua nacional.

Os Estados Unidos, por óbvio, são culturalmente dominantes no Ocidente e a programação das emissoras de televisão comercial já mantêm índices elevados de conteúdo de origem norte-americana.

O que significa o canal internacional da TV Brasil?

Discursando na solenidade, a diretora-presidente da EBC Teresa Cruvinel afirmou que "tal como os canais internacionais das TVs públicas de outros países, a TV Brasil Internacional será um canal da nacionalidade brasileira, um instrumento de divulgação de país, do povo brasileiro, da cultura, da riqueza e da diversidade do Brasil".

Na verdade, o canal internacional da TV Brasil responde à necessidade – que vem sendo sentida também por outros países (emergentes?) – de terem seu próprio meio de expressão internacional, fora da unidirecionalidade dos fluxos de informação e entretenimento Norte-Sul, largamente dominante. Reafirma também a possibilidade de uma comunicação internacional alternativa à mídia privada comercial, prisioneira da lógica do mercado, homogênea cultural e ideologicamente.

É mais do que necessário mostrar o que somos e o que temos, e também aprender mais sobre os nossos vizinhos e parceiros que nunca ou raramente são mostrados na mídia comercial privada.

Acima de tudo, um canal internacional brasileiro, é o reconhecimento de que nossa política externa tem que disputar palmo a palmo o seu espaço, não só com os outros Estados nacionais, mas também com as grandes corporações multinacionais, inclusive – ou, sobretudo – com as grandes corporações de mídia – brasileiras e/ou globais – que além de serem poderosos conglomerados industriais, são responsáveis diretas pela construção, nos níveis local e internacional, de pensamento resistente às mudanças e, quase sempre, alinhado à política externa dos países hegemônicos.

Resta a esperança de que a EBC se consolide, nos termos do artigo 223 da Constituição, como empresa pública – nem estatal, nem privada comercial – e siga seu caminho de constituir-se numa alternativa complementar de qualidade para seus telespectadores. Não apenas no Brasil.

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A nova Folha: jornal do futuro?

Reproduzo artigo do escritor Washington Araújo, publicado no Observatório da Imprensa:

A intenção é sempre boa. Ninguém leva adiante reforma em jornal sem estar bem intencionado. Muitas vezes parte da constatação de que a fonte secou e, acima de qualquer outra prioridade, o ribeirão precisa ressuscitar. De imediato surgem logo duas correntes. Uma defende que o jornal precisa acompanhar os novos tempos, os avanços da tecnologia, o advento de novas formas de comunicação; outra defende que a história do jornal deve ser preservada, suas conquistas, lutas em tempos de maior ou menos respeito à liberdade de expressão. Entre as duas, ganha uma terceira, aquela que diz que podemos mudar para continuar sendo o que sempre fomos.

É quando a faxina assume ares de reforma. Posicionam-se os móveis da casa de outra maneira, manda-se forrar aquele velho conjunto de estofados, troca-se a luminária da direita e descobre-se que não é mais importante ter o setor de chapelaria porque as pessoas que visitam o jornal dificilmente usarão chapéus. Fecha-se a seção chapelaria e ordena-se o sumiço de seu peculiar mobiliário, aqueles vários ganchos (espetos para uns) sem qualquer outra utilidade.

Como em toda faxina, descobre-se na ativa objetos inúteis, mas com evidente valor afetivo. Estes precisam ser mantidos. Mas em outro lugar, não assim tão à vista. Faxina não exige desprendimento de quem a executa e sim gosto pela limpeza e senso de organização. Reforma exige boa dose de coragem para decretar expirado o prazo de validade de certas coisas e ousadia na escolha de outras.

Para repor as energias

Há poucos dias, tratei neste Observatório da reforma fartamente propalada pelo jornal Folha de S.Paulo. Emiti considerações sobre o que o próprio jornal estava divulgando em seu habitual afã de ser visto como dono do futuro. A Folha demonstra muito maior interesse em anunciar a reforma do que em realizá-la. É como se estivesse subjugada pelo marketing fácil, esse que faz da propaganda autorreferente um fim em si mesmo. Se não houvesse uma operação de guerra para publicizar a reforma, será que seus leitores notariam alguma diferença entre o jornal antes e o jornal depois, como fazem anúncios de remédios para emagrecer?

Nada de errado nisso. Mas tem algo que me incomoda. Essa história de que agora, com a reforma, o jornal passa a ser do futuro. O viés da arrogância e da pretensão enfim encontrou meio de se manifestar em toda sua estúpida inteireza. Quem disse que podemos tomar posse do futuro se mal damos conta do presente e nem sabemos como lidar com o passado? Futuro não é matéria do presente. Futuro, com cara de futuro, conteúdo de futuro e jeito de futuro é o que está sempre por vir, à espreita, emitindo sinais que nem sempre se confirmam, nem sempre se unem à matéria da realidade.

Futuro é também como criança trabalhosa, aquela que não fica quieta, que parece ter o tal bicho carpinteiro e cuja missão na vida é desarrumar nosso pensamento e nossa vontade. E, qual criança trabalhosa, dessas que dão trabalho extenuante, imenso, sem paradas nem claudicações, sem pit-stop para repor as energias, o futuro adora escapulir como areia vazando dos dedos. Ao alcance da mão e distante dos olhos e ao alcance dos olhos, mas distante das mãos. Então, não me venham me vender o presente como se futuro fosse. Enquanto meus três neurônios estiverem aptos ao trabalho, saberei distinguir passado, presente e futuro.

Meios de discernimento

Ora, essa! Ainda mais jornal avançando, se esparramando futuro afora. Fosse descoberta no campo da biologia molecular ainda passava, sim, estaríamos na ante-sala do futuro. Fosse especialista em nanotecnologia, com sua mania de reducionismo exacerbado, ainda poderia sucumbir ao canto do futuro hoje. Mas… jornal? Justamente o que perde a validade em duas dúzias de horas, que diz a que veio em não mais que 1.440 minutos, e começa a expirar no momento mesmo em que começou a inspirar, coisa que chega no máximo a 86.400 segundos? Para ser jornal do futuro teria que abandonar de vez as âncoras do presente, se libertar das circunstâncias, ousar no limite, fazer a viagem para dentro em busca de mundos novos e com certeza “nunca dantes navegados”. Agora, como o paciente leitor deve ter percebido, o assunto me pegou de jeito. E sigo adiante. O que seria, então, um jornal do futuro?

Seria o jornal apreciado pelo leitor do futuro. Nesta breve frase imagino existir um mundo de reflexões latentes, matéria viva germinando. Como seria o leitor do futuro? Para começar, teria que ter olhos posicionados na ponta dos dedos. E não apenas no rosto. Teria que manejar novos códigos de comunicação e manter atualizados filtros aptos a separar cultura e conhecimento úteis de seus similares inúteis. Não poderia ser o leitor de hoje: sempre com o pé atrás, em atitude de crescente desconfiança, achando que está sendo engrupido, manipulado descaradamente pelos cartéis da grande imprensa.

O leitor do futuro teria meios de discernimento eficientes para detectar as reais intenções do editorialista, do articulista, do analista econômico, do resenhador de livros, discos e filmes. E teria também um chip no olho esquerdo. Sempre que estivesse lendo uma matéria plantada, a defesa de algum interesse escuso, as letras do texto ficariam irremediavelmente desfocadas e a imagem, como por encanto, desapareceria dando lugar a outra.

País de triste passado

O leitor do futuro teria expertise em uma porção de coisas. Por exemplo, em não deixar as entrelinhas esmagadas pelas linhas. E, ainda no desjejum matinal, tomaria dois comprimidos que trariam de forma condensada a informação que mais lhe apetece: se amasse música clássica seria rapidamente informado dos principais lançamentos na área, ouviria pequenos trechos, saberia do processo criativo da obra em formação e lhe seriam identificadas, de par em par, críticas favoráveis e desfavoráveis por quem entendo do riscado; se fosse aficionado de política internacional, logo estaria inteirado das contagens regressivas em andamento, quais guerras estavam no nascedouro e quais estivessem em andamento mesmo que uma das partes ainda não estivesse consciente disso; se fosse apaixonado pelo texto dotado da clara claridade de Clarice Lispector, logo estaria equipado para viver dia com tudo a que tivesse direito, com sensibilidade tal que poderia pegar em asas de borboleta sem machucar.

O leitor do futuro acessaria notícias por seu sentido mais apurado: se fosse a audição, tudo chegaria por esse meio, se fosse a visão, o som e a imagem estariam sempre entrelaçados produzindo a informação na medida. O leitor do futuro não seria o leitor do futuro e sim o destinatário da informação, o beneficiário final da notícia. Ler seria o de menos, até porque as notícias não chegam apenas pela antiquada forma da leitura. Novamente, acho que puxei demais o novelo e agora vejo fios espalhados por todos os lados.

Acelerei muito o pensamento e sou obrigado agora a dar um cavalo-de-pau. Puxo, então, o freio de mão da razão. Preciso retornar ao tema desse texto: a Folha de S.Paulo que se apresentou domingo (23/5/2010) como sendo o jornal do futuro. Menos de uma semana depois do grandiloqüente anúncio, feito para nublar qualquer conquista sobre a ignorância que invade nosso código genético, leio com desalento sua manchete de sexta-feira (28/5): “Hillary vê risco para o mundo no acordo Brasil/Irã”.

Será que, no futuro alardeado pelo jornal, é esperado que seus leitores captem o futuro com um misto de medo e impotência? O jornal do futuro preza em demasia o teor de cataclismo, de desgraça grande que parece carregar a visão de Hillary Clinton sobre o Brasil. Pobres de nós, brasileiros, não bastasse Hillary e esta sua visão estampada com ênfase aterrorizadora, ainda temos o jornal do futuro para repercuti-la. No caso específico entendo que esta primeira página da Folha nos remete a um país de triste passado, aquele que gripava ante o espirro ocasional da potência do Norte. Nos restos das entrelinhas sufocadas ainda consigo ler algo como: “Tremei brasileiros: Hillary nos escala para a bola da vez, depois do Irã”. Recuso-me, desde logo, a participar do futuro antecipado pelo jornal.

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O papel da Telebrás na banda larga

Reproduzo trechos da entrevista de Rogério Santanna, novo presidente da Telebrás, publicada no jornal Correio Braziliense:

Por que o Plano Nacional de Banda Larga é tão criticado, sobretudo pelo setor privado?

Os fabricantes de equipamentos no Brasil consideram o plano uma ótima oportunidade de ver essa indústria revitalizada. O Brasil tinha mais de 60 empresas nessa área e hoje há pouco mais que 13, que sobreviveram porque têm boa tecnologia. Quem não gostou foram os que estavam em uma situação de monopólio na maior parte das cidades onde atuam. É estranho que se chame de mercado aquilo que é monopólio. Segundo a própria Net, só há concorrência em 184 cidades.

Evidentemente, estão reagindo à entrada onde os pequenos provedores vão poder concorrer. Dizer que as regras mudaram não é correto. As regras que o ex-ministro (das Comunicações) Sérgio Motta estabeleceu na época das privatizações, que eram de estimular a competição, pouco a pouco foram esquecidas e nós voltamos para um ambiente de concentração e de controle por uma única empresa em mais de 2 mil municípios. Em 3 mil, não há nada.

Então, houve falhas no processo de privatização?

Eu sempre gosto muito de usar uma frase de um escritor gaúcho que respeito muito, que é o Luiz Fernando Veríssimo. Ele disse: "Nada envelhece tão depressa quanto os futuros de antigamente". Os futuros de 10 anos atrás já envelheceram. Aquilo que nós pensávamos que ia ser o futuro das telecomunicações não se realizou. Ninguém sonhou que a internet ia ter essa dimensão que tem, que a telefonia celular ia ocupar esse espaço. São duas inovações que ninguém previu. Isso afeta muito o negócio e as operadoras estão envolvidas nesse processo. Elas têm que repensar. Nós temos que sair da posição de 60, onde nós estamos (no acesso à banda larga), para ter uma posição de 10º, de 5º, que é o nosso lugar na economia. Temos a telefonia mais cara do mundo.

Mesmo sem o imposto?

Sim. De 70 economias emergentes, temos a mais cara, disparado: US$ 28 de conta média. Na Índia, custa US$ 5. Na China, não chega a esse preço. Nossa situação não é boa. Isso inibe o desenvolvimento.

Estudos mostram que, a cada 10% de aumento de penetração do acesso à internet, há 1,4% de aumento do PIB. Se nós queremos ser um país com inserção na sociedade do conhecimento, temos de mudar radicalmente a forma com que lidamos com a banda larga. Se ela for uma commoditty barata, as empresas brasileiras estarão na ponta da inovação.

Os empreendedores brasileiros são muito criativos e, certamente, se nós instituirmos um ambiente que promova a concorrência, os custos do país vão baixar. Até do governo, que poderá prestar uma série de serviços que permitirão levar conhecimento para o interior do Brasil e aplicações como telemedicina, a nota fiscal eletrônica. Temos oportunidades na área de serviços, na área de novas aplicações, hardware. Não é possível ser ingênuo a ponto de dizer que o país não possa ter uma infraestrutura própria, com competência, no seu próprio país.

Então a banda larga é questão de segurança para o país?

Sim. Senão, o submarino nuclear que vai patrulhar as costas brasileiras não vai conseguir falar com um avião do último modelo que estamos comprando. Não sabemos qual vai ser a empresa vencedora, mas, com certeza, terá tecnologia de ponta. E como que esses caras falam? Falam por um satélite comercial, por exemplo?

O senhor está se referindo ao pré-sal?

Sim. No reforço da Marinha brasileira, em função das riquezas nos campos de pré-sal, os submarinos vão precisar conversar com a Aeronáutica. Como é que eles vão se falar? Por satélites comerciais ou eles vão usar redes que nós controlamos? Não dá para ser ingênuo ao ponto de o país não ter autonomia.

Hoje, então, há risco de vazamento de informação sigilosa porque o governo não tem rede própria de telecomunicações?

Isso já aconteceu. Não é um fato novo. Na época da Brasil Telecom, vários e-mails de ministros foram interceptados pela empresa operadora interessada na questão. No governo Fernando Henrique, na contratação do Sivam-Sipam (programas de monitoramento da Amazônia), comunicações dos militares foram interceptadas por fornecedores interessados e acabaram interferindo em um acordo que ia ser feito com a França. Não é possível que a gente não tenha uma estrutura. É uma questão de segurança de Estado. Como é que vamos trabalhar com informação reservada, combatendo tráfego de drogas, com uma rede frágil, que pode ser escutada a qualquer momento?

A crítica mais recente à reativação da Telebrás é um possível conflito de interesse pelo uso de informações privilegiadas por funcionários da estatal que estão cedidos para a Anatel. Existe esse risco?

Deveríamos fazer uma discussão mais ampla sobre o tempo em que os conselheiros das agências ficam em quarentena quando saem. No caso da privatização, houve vários conflitos. O Fernando Xavier terminou de privatizar a Embratel, tirou umas férias prolongadas e foi ser presidente da Telefonica no Brasil. Não se fez um escândalo sobre isso ser uso de informação privilegiada, nem de conflito de interesse. O próprio Antonio Carlos Valente, atual presidente da empresa, saiu do conselho da Anatel, fez um estágio no Peru, ficou quatro meses de férias e foi trabalhar para a Telefonica, uma empresa regulada por ele como conselheiro. E ninguém achou que tinha conflito de interesse. O que é estranho é que agora, quando se trata de funcionários mais baixos que retornam à sua empresa de origem, haja esse conflito.

Em outros países, as regras são mais rígidas para esse tipo de situação?

Nos Estados Unidos, a quarentena de um conselheiro é de cinco anos para falar do assunto. Do 5º ano ao 10º, ele pode dar aula, mas não trabalhar numa empresa. Aqui, são quatro meses. Isso são férias prolongadas. O problema não é a saída do pequeninho, mas sim a do Xavier e a do Valente para trabalhar na Telefonica. É ridículo.

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PNDH-3: mídia contra os direitos humanos

Reproduzo artigo de Bia Barbosa e Carolina Ribeiro, publicado no Observatório do Direito à Comunicação:

O Brasil é um dos poucos países do mundo que tem uma terceira edição de um Programa Nacional de Direitos Humanos apresentada pelo governo federal. Por si só, isso já demonstra uma preocupação do Estado brasileiro com a situação desses direitos em território nacional. Mais positivo ainda é se este programa é atualizado periodicamente em diferentes espaços de diálogo e interlocução com a sociedade civil. No caso da terceira edição do PNDH, estamos falando de um processo que envolveu mais de 14 mil pessoas em todo o país. Um processo que deve ser saudado para que, imediatamente, se possa cobrar deste mesmo governo um compromisso com o mesmo.

Infelizmente, as recentes alterações sofridas pelo PNDH-3, via decreto presidencial, revelam a outra triste face desta moeda. O Decreto 7.177, de 12 de maio de 2010, alterou sete e revogou duas ações do Programa Nacional. Ficou explícito que, apesar de despontar como promissora potência mundial, o Brasil ainda se curva a setores autoritários com grande tradição na arte de manter o país, simbólica e estatisticamente, no "terceiro mundo".

Desde a publicação do Decreto 7.037/2009, que institucionalizou o PNDH-3, bispos católicos, militares, latifundiários e donos da mídia bombardeiam a sociedade com suas opiniões sobre as diretrizes que buscam a redução dos conflitos no campo, o respeito ao Estado laico e aos direitos da mulher, à memória e à verdade e a democratização das comunicações. Agem como uma tropa, colocando os meios de comunicação na linha de frente da artilharia daquilo que consideraram uma “obsessão totalitária”, como observou um dos articulistas da revista Veja.

A constatação óbvia – e triste – que este governo não foi capaz de enfrentar setores que tornam o Brasil um país profundamente desigual e arcaico é tão grave quanto o desrespeito aos processos democráticos e participativos promovidos pelo próprio governo. O Programa foi construído por meio de Conferências Municipais, Estaduais e Nacional de Direitos Humanos, convocadas pelo Executivo. O resultado dessas conferências, abertas à toda sociedade, é um indicativo aos gestores públicos e legisladores sobre as mudanças que devem acontecer na área.

Foi a partir da 13a Conferência Nacional de Direitos Humanos que nasceu o PNDH-3. Ao alterar seu texto, o governo desrespeita frontalmente essa construção e abre precedente para que outras Conferências e Programas sejam alterados à revelia de todos aqueles que, com debate público e espírito democrático, definiram objetivos, diretrizes e ações para as políticas públicas no Brasil.

Mas o que poderia ter levado o governo a estabelecer tamanho recuo e desrespeitar o processo da 13a Conferência de Direitos Humanos?

Conferências na mira da mídia

A crítica ao PNDH-3 e a seu processo originário não veio isolada na artilharia dos grandes meios de comunicação. Na edição do dia 17 de janeiro de 2010, o jornal O Estado de S.Paulo publicou dez matérias e artigos que trataram das Conferências e do Programa Nacional de Direitos Humanos. Só sobre as Conferências foram quatro no caderno Nacional. Na primeira matéria, com o título “ Um debate que cabe em qualquer evento”, os repórteres Felipe Recondo e Marcelo de Moraes sentenciam:

“No governo Lula, as Conferências nacionais têm sido realizadas constantemente e produzido propostas polêmicas, mas inócuas. Na prática, servem para que o presidente Lula dê voz ao público interno do PT e dos movimentos sociais, que levantam bandeiras controvertidas, mas acabam não tendo consequências”.

A matéria seguinte traz na manchete um ataque feroz: “Conferência de Cultura arma novo ataque à mídia”. Dois parágrafos para o Ministério se defender. Mas a entrevista de página inteira coroa a série: o cientista político Leôncio Martins Rodrigues, no bojo de sua autoridade de intelectual, é acionado para finalizar o massacre:

“Usado para fundamentar as conferências nacionais promovidas pelo governo, o conceito de democracia direta ainda custa a ganhar a adesão de alguns estudiosos, a exemplo do cientista político Leôncio Martins Rodrigues. Para ele, a proposta não apenas é "impossível de ser realizada", como representa mais uma fórmula para que uma minoria organizada mobilize a maioria. Foi por trás da tese de contato direto de um líder com a população, argumenta, que nasceram ideologias como o fascismo”.

Não há outra explicação que não a pura e simples manipulação ideológica do leitor para comparar as Conferências com práticas fascistas. Em artigos de opinião de outros três cadernos, a edição daquele domingo seguiu desferindo golpes no ministro da Secretaria de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, e no governo federal.

O exemplo usado foi o de uma edição de janeiro de 2010 de O Estado de S. Paulo, mas poderia ser de uma edição do Jornal Nacional, do jornal O Globo, Correio Brasiliense ou da Folha de S. Paulo, dos últimos seis meses. Não faria diferença. A artilharia contra o PNDH-3 e os processos participativos foi arquitetada pela Associação Nacional dos Jornais (ANJ) e pela Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), que representam, junto com a Associação Nacional de Editoras de Revistas (Aner), toda a patota de empresários de mídia que se organizou para fuzilar o PNDH-3.

O aparato bélico também foi apontado para a Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), espaço que essas mesmas entidades abandonaram sem explicação convincente. Acusaram os participantes de ser contra a liberdade de expressão e de desejar a volta da censura. Espaço para o contraditório em seus veículos? Nenhum. Quem censura quem, afinal?

Falando em censura, ela não apareceu apenas nas justificativas acusatórias da Confecom, mas foi também pano de fundo de uma propaganda produzida pelo Conselho de Autorregulamentação Publicitária (CONAR) e seu braço acadêmico, a Escola Superior de Marketing e Propaganda. A peça, inserida propositadamente em meio ao bombardeio de notícias sobre o PNDH-3, envolve o telespectador numa animação sombria de animação científica com a seguinte narrativa:

"Ele era conhecido como o Último Suspiro, o laboratório mais seguro do mundo, a última fronteira para o mal. Ali, foram eliminadas as maiores aberrações existentes na face da terra, vírus, seres das profundezas oceânicas, bactérias. Experiências secretas foram feitas ali e, em uma cela especial, ainda habita a criatura mais terrível, o mostro da censura, que agora repousa fora de combate. A temperatura da sua cela é cuidadosamente controlada, o frio tem que ser constante, assim ele já mais despertará de novo. Nada pode distrair a tarefa da sentinela! Não deixe o mostro da censura acordar!”

Toca a sirene

Em pouco tempo, o governo atendeu ao terrorismo midiático da peça publicitária e cedeu à metralhadora giratória do jornalismo praticado por essas empresas, modificando pontos significativos relacionados à mídia no texto do PNDH-3. Levantou a bandeira branca e, numa canetada, reescreveu sozinho o que foi construído por milhares de mãos em todo o Brasil, e que estava compilado na Diretriz 22: “Garantia do direito à comunicação democrática e ao acesso à informação para a consolidação de uma cultura em Direitos Humanos ”.

Foi alterada a ação programática “a) Propor a criação de marco legal regulamentando o art. 221 da Constituição, estabelecendo o respeito aos Direitos Humanos nos serviços de radiodifusão (rádio e televisão) concedidos, permitidos ou autorizados, como condição para sua outorga e renovação, prevendo penalidades administrativas como advertência, multa, suspensão da programação e cassação, de acordo com a gravidade das violações praticadas”.

Na Constituição Federal, o artigo 221 diz que “a produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios: preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas; promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação; regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei; e respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família”.

Desde 1963, no entanto, o Decreto 57.795 estabelece, por exemplo, um mínimo de 5% da grade de programação diária para o jornalismo, de 5 horas de programação educativa por semana e também o limite de 25% da grade diária com veiculação de publicidade. O decreto também prevê multas, suspensões e cassações, caso haja descumprimento das normas estabelecidas. Ou seja, estabelece alguns parâmetros que, posteriormente, foram recepcionados pela Constituição, criando cotas, limites e sanções para os radiodifusores.

O que a redação original do PNDH-3 previa era a inclusão dos direitos humanos como um desses parâmetros, para evitar que práticas racistas, machistas, homofóbicas e outras de mesma natureza acontecessem na programação das concessionárias de rádio e TV.

A grande mídia chiou e, com a nova redação, a ação programática ficou bem mais genérica, sem avanços: "a) Propor a criação de marco legal, nos termos do art. 221 da Constituição, estabelecendo o respeito aos Direitos Humanos nos serviços de radiodifusão (rádio e televisão) concedidos, permitidos ou autorizados".

Cabe perguntar, então, se os meios de comunicação são favoráveis a conteúdos que violem direitos humanos, já que foram contrários a que esse fosse um critério para outorga e renovação das concessões. Ou se acreditam que estabelecer os direitos humanos como critério para ocupar um espaço que é público é censura, pois foi isso que bradaram aos quatro ventos em seus veículos.

O segundo pecado do PNDH-3, na visão dos donos da mídia, foi a ação “d) Elaborar critérios de acompanhamento editorial a fim de criar um ranking nacional de veículos de comunicação comprometidos com os princípios de Direitos Humanos, assim como os que cometem violações”.

Essa ação, que foi apagada da nova versão do Programa, simplesmente já é executada desde 2002. A campanha “Quem financia a baixaria é contra a cidadania”, coordenada por entidades da sociedade civil em parceria com a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, recebe denúncias dos telespectadores e, a partir delas, faz um ranking para classificar os programas que incentivam o preconceito, a estereotipização e a discriminação. Depois buscam sensibilizar anunciantes para que deixem de financiar esse tipo de conteúdo. Logo, é difícil compreender porque os empresários da grande mídia, mais uma vez, tacharam de censura esta forma de coibir violações de direitos humanos na mídia.

Pela liberdade de expressão

Na verdade, ao contrário do que dizem Abert, ANJ e Aner, o cerceamento à liberdade de imprensa ou de expressão está longe de ser o problema de conferências e programas nacionais delas resultantes. O grande problema desses instrumentos de participação popular é que eles colocam o dedo na ferida das estruturas fundantes da desigualdade histórica em nosso país. Neste caso, um dos mais notórios problemas da democracia brasileira: os monopólios e oligopólios de mídia.

Para se ter uma ideia, as cinco principais redes de TV controlam 65% das emissoras (284 emissoras), são responsáveis por 82,5% da audiência nacional, e controlam 99,1% das verbas publicitárias. A Globo, sozinha, tem 44,3% da audiência e 73,5% das verbas publicitárias. Isso tudo apesar da explícita vedação ao monopólio dos meios de comunicação presente em nossa Carta Magna.

O monstro da censura, portanto, que esses empresários não querem acordar, é na verdade o monstro da democracia nos meios de comunicação. Democracia que só pode ser exercida plenamente quando houver mecanismos que garantam a circulação da pluralidade de ideias e da diversidade característica da sociedade brasileira na esfera pública midiática. Afinal, somente num espaço onde todos e todas tenham voz, os direitos humanos poderão ser conhecidos, reconhecidos, protegidos, defendidos, reivindicados e efetivados.

É isso o que defendem o PNDH-3 em sua Diretriz 22 e todas as organizações, movimentos populares e defensores de direitos humanos organizados em torno da Campanha Nacional pela Integralidade e Implementação do PNDH-3. Esta é uma luta de todos e todas nós.

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Pela redução abrupta da jornada de trabalho

Reproduzo entrevista de José Dari Krein, concedida ao boletim online do Instituto Humanitas Unisinos-IHU:

Em entrevista à IHU On-Line, realizada por telefone, José Dari Krein analisou a luta em prol da redução da jornada de trabalho e defendeu que o tempo no trabalho deve ser diminuído de forma abrupta “porque, com uma redução progressiva, as empresas vão fazer um processo de adaptação e, dificilmente, vão aumentar o número de contratações”.

Ele também avaliou a posição do governo frente a essa problemática e tratou de questões como a utilização do tempo livre pelo trabalhador e as doenças geradas pela intensificação do trabalho. “Estamos assistindo, atualmente, um processo de intensificação de plano de metas, de cobranças excessivas sobre o trabalhador, da exigência por ampliação das qualificações profissionais, ou seja, há uma pressão que gera doenças do trabalho próprias do século XXI”, apontou.

Graduado em filosofia pela PUC-PR, José Dari Krein tem mestrado e doutorado em Economia Social e do Trabalho pela Universidade Estadual de Campinas, onde atualmente é professor no Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho.

Para o senhor, a que se deve a resistência dos empresários em aceitar a redução da jornada de trabalho semanal de 44 para 40 horas semanais? São razões econômicas ou ideológicas?

São as duas coisas. O capital sempre busca reduzir o custo da força de trabalho ao mínimo possível, além de manter o controle sobre as condições de uso, contratação e remuneração do trabalho. O empresariado, hoje, tem o poder de legitimar a forma como ele mesmo utiliza o trabalho, e sabe que a redução da jornada de trabalho tem seu lado positivo, que é o aumento da produtividade, mas é contra porque quer utilizar o trabalhador com o maior tempo e menos custo possível.

Do ponto de vista histórico, tivemos um pequeno período em que se conseguiu o “relativo emprego”. Isso se deu, primeiro, pela introdução de novas atividades para atender às necessidades da sociedade, principalmente nas áreas da saúde e da educação, que são os setores que mais empregam. Ou seja, criou-se uma ocupação em relação a atividades que fazem sentido ao bem-estar da sociedade. Outra forma foi a redução da jornada de trabalho que é importante, principalmente, hoje, para a criação de emprego, mas também é uma medida indispensável para criar um ambiente de trabalho mais saudável.

Estamos assistindo, atualmente, um processo de intensificação de plano de metas, de cobranças excessivas sobre o trabalhador, da exigência por ampliação das qualificações profissionais, ou seja, há um processo de pressão que gera doenças do trabalho próprias do século XXI. Essas doenças estão inseridas num contexto em que crescem a insegurança e a incerteza das pessoas no trabalho. E mais, soma-se a isso uma situação onde as pessoas são submetidas a uma superexploração do trabalho. Portanto, a redução da jornada é também uma questão de saúde pública.

As centrais sindicais estariam negociando um escalonamento na redução. Primeiro viria um acordo para reduzir de 44 para 42 e depois para 40 horas semanais. Isso já é um avanço?

Qualquer redução do tempo de trabalho é um avanço. Mas o melhor seria se a redução fosse feita de maneira abrupta, porque, com uma redução progressiva, as empresas vão fazer um processo de adaptação e, dificilmente, vão aumentar o número de contratações. Reduzir o tempo de trabalho é sempre algo bem-vindo porque, em função da terceira revolução industrial, tivemos ganhos de produtividade extremamente elevados, mas que não foram redistribuídos para a sociedade. Por isso, defendo que a redução deveria ser feita de forma abrupta.

Qual é a média da jornada de trabalho semanal em outros países?

Na Europa, houve uma redução de jornada de trabalho do final do século XIX até a década de 1970 do século XX. Depois dos anos 1970, sob a hegemonia do neoliberalismo, houve uma a introdução de novas formas de gestão do trabalho que fez com que as pessoas ficassem mais tempo à disposição das empresas. Hoje, em alguns países, a jornada de trabalho formal é até maior, mas a real é negociada. Tivemos um movimento no período recente em que houve um retardamento na entrada das pessoas no mercado de trabalho, mas, por outro lado, houve mudanças na previdência social, elevando a idade mínima para a pessoa ter acesso à aposentadoria.

Assim, aconteceu um movimento que foi importante para a estruturação da sociedade, que foi retardar a entrada do jovem no mercado de trabalho, pois não tem necessidade alguma de se começar a trabalhar aos 16 anos. Mas ainda é preciso avançar de uma forma sistemática, no sentido de reduzir o tempo de trabalho na vida inteira, junto com a redução do trabalho semanal.

Alguns países já avançaram, pois, além da redução semanal, fizeram também a redução anual, que inclui a questão das férias. Assim, é possível ter um sistema mais civilizado, ampliando o tempo de descanso no ano, reduzindo a jornada semanal e incluindo mecanismos onde o tempo de trabalho na vida seja menor.

E como o senhor vê a posição do governo Lula nesse embate?

O governo foi extremamente tímido no que diz respeito à viabilização da proposta da redução da jornada de trabalho. Em 2002, o governo Lula só tinha duas propostas: A criação do Fórum Nacional do Trabalho, que não redundou na reforma sindical o que era esperado, e a redução de jornada para 40 horas semanais. Estamos no final do segundo mandato, e essas questões ainda estão pendentes. E o governo vai continuar assim se o movimento sindical não mostrar capacidade de articulação e mobilização em defesa da redução da jornada de trabalho. É fundamental inclusive fazer com que a sociedade se envolva nessa questão.

O governo também foi tímido quando foi colocada em discussão a Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). E, agora, durante o período eleitoral, quando ocorrem as aproximações com o setor empresarial, essa timidez se acentua ainda mais.

Desde a pré-crise, a jornada de trabalho tem se ampliado, chegando até a 60 horas semanais. Como o senhor vê a questão do valor da hora extra?

No Brasil, existe um abuso da utilização da hora extra. Apesar de haver muitos mecanismos de flexibilização, os números de horas extras são absurdos. Isso mostra que, de um lado, houve uma retomada da atividade econômica, e os setores mais qualificados começaram a pressionar os trabalhadores para que eles aceitassem fazer hora extra. Em 2005, uma pesquisa do Dieese mostrou que a maioria dos trabalhadores só faz hora extra porque se sente pressionado pela empresa, e parte deles aceita esse jogo porque é uma forma de complementar os salários que são muito baixos. Um dos problemas é que muitos trabalhadores preferem trabalhar mais e ganhar mais e participar de forma mais intensa desse mercado de consumo, porque é isso que dá uma certa identidade e perspectiva de inserção na sociedade.

Se essas horas fossem transformadas em vagas, como isso mudaria a realidade do setor industrial?

A diminuição da hora extra, num ambiente em pleno crescimento, teria um efeito direto na criação de novos postos de trabalho. Embora a hora extra tenha um custo relevante, ainda assim o setor industrial prefere que se faça a hora extra do que se contrate outro trabalhador. Por isso, ela deve ser proibida.

Como o senhor vê a utilização do tempo livre pelo trabalhador brasileiro? Ela está associada ao rendimento ou independe disso?

Nós não temos estudos mais sistemáticos sobre como o trabalhador utiliza o tempo livre. Acho que numa sociedade como a nossa, em que a educação não adquiriu a importância que deveria, é fundamental fazer um processo de reeducao para que as pessoas deem valor para outras dimensões da vida que não sejam as mesmas do mercado, como o lazer, a cultura e a integração.

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sábado, 5 de junho de 2010

Telespectador e leitor não são estúpidos

Reproduzo artigo do professor Venício A. de Lima, publicado no sítio Carta Maior:

Robert Fisk, premiado jornalista inglês, correspondente no Oriente Médio do “The Independent”, em discurso no V Fórum Anual da emissora árabe de televisão Al Jazeera (publicado originalmente no site “Vi o Mundo” e também nesta Carta Maior) recoloca uma questão fundamental: como jornalistas incorporam acriticamente o que ele chama de “palavras do poder”, isto é, palavras e expressões deliberadamente criadas nos laboratórios do poder hegemônico para falsear a realidade que aparentam significar.

O tema, por óbvio, não é novo. No clássico “1984”, de George Orwell, a edição que estava sendo preparada do Dicionário da Novilíngua daria à língua a sua forma final não pela invenção de novas palavras, mas, sobretudo, pela destruição de palavras existentes.

Estudos sobre a difusão mundial da idéia de globalização no final do século XX, por exemplo, apontaram para a "violência simbólica" praticada pela introdução de palavras/expressões como flexibilização, governabilidade, nova economia, fragmentação, tolerância zero paralelamente à desqualificação sistemática de conceitos como capitalismo, classe social, dominação, exploração, desigualdade, dentre outros.

O famoso consultor do Partido Republicano e ex-assessor do presidente Bush, Frank I. Luntz, explicou publicamente, em 2003, a eficiência da substituição de palavras/expressões nas campanhas eleitorais e na sustentação da imagem positiva de governos, nos Estados Unidos: "aquecimento global" vira "mudança climática"; um "programa de desmatamento" vira "florestas sustentáveis"; "privatizar" vira "personalizar"; "invasão” vira "guerra contra o terrorismo" – e assim por diante.

Fisk e as palavras do poder

O que o assustador discurso de Fisk constata é como a relação de jornalistas com o poder mundial hegemônico está contaminada pela adoção acrítica de um vocabulário que serve de importante instrumento na construção de uma falsa visão do que ocorre hoje no mundo. Diz ele:

“No contexto Ocidental, a relação entre poder e mídia diz respeito a palavras — é sobre o uso de palavras. É sobre semântica. É sobre o emprego de frases e suas origens. E é sobre o mau uso da História e sobre nossa ignorância da História. Mais e mais, hoje em dia, nós jornalistas nos tornamos prisioneiros da linguagem do poder.”

Os exemplos que apresenta estão, sobretudo, relacionados com a política externa e as ações americana e inglesa no Oriente Médio e incluem expressões como processo de paz, a paz dos bravos, pico de violência, narrativas que competem ou a substituição, sem mais, de ocupação por disputa; de muro por barreira de segurança, de colonização por acampamentos ou postos.

Um estudo sobre a cobertura que a grande mídia nativa tem oferecido da política externa brasileira, sobretudo, das recentes tentativas, ao lado do governo turco, de mediar um acordo com o Irã sobre o enriquecimento de urânio para fins pacíficos, certamente revelaria um processo equivalente de adoção acrítica da narrativa do poder mundial hegemônico. Ou não seria isso exatamente o que faz, por exemplo, o jornal O Globo quando chama a atual política externa de "suicídio diplomático”?

Abreviando seu próprio fim

Fisk em seu discurso, todavia, traz uma reflexão fundamental. Diz ele: “O lado mais perigoso de nosso (jornalistas) uso da semântica de guerra, nosso uso das palavras do poder — embora não seja uma guerra, já que nós nos rendemos — é que isso nos isola de nossos telespectadores e leitores. Eles não são estúpidos. Eles entendem as palavras e, em muitos casos — temo — melhor que nós. Eles sabem que estamos afogando nosso vocabulário na linguagem dos generais e presidentes, das assim-chamadas elites, na arrogância dos experts do Brookings Institute, ou daqueles da Rand Corporation ou o que eu chamo de ‘tink thanks’.”

Talvez seja essa mais uma das razões a explicar a crise continuada da velha mídia, não só entre nós, mas no mundo: nossos telespectadores e leitores não são estúpidos.

A partidarização como estratégia de sobrevivência e a adoção acrítica da narrativa do poder estão acelerando a desconstrução de modelos superados de jornalismo e, inclusive, de modelos de negócios. Insistir neste caminho significa, para a grande mídia, abreviar seu próprio fim.

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A farsa do suposto dossiê anti-Serra

Reproduzo reportagem de Leandro Fortes, publicada na revista CartaCapital:

No modorrento feriado de Corpus Christi, os leitores dos jornais foram inundados com informações sobre uma trama que envolveria a fabricação de dossiês contra o candidato tucano à Presidência, José Serra, produzidos por gente ligada ao comitê da adversária Dilma Rousseff. O time de espiões teria sido montado pelo jornalista Luiz Lanzetta, dono da agência Lanza, responsável pela contratação de funcionários para a área de comunicação da campanha petista.

O primeiro desses documentos seria um relatório sobre as ligações de Verônica Serra, filha do candidato do PSDB, com Verônica Dantas, irmã do banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity. Uma história tão antiga quanto os dinossauros e já relatada inúmeras vezes na última década, inclusive porCartaCapital.

A notícia sobre o suposto dossiê, que ninguém sabe dizer se existe de fato, veio a público em uma reportagem confusa da revista Veja e ganhou lentamente as páginas dos jornais durante a semana até ser brindada com uma forte reação do PSDB e de Serra.

Na quarta-feira 2, o pré-candidato tucano acusou Dilma Rousseff de estar por trás da “baixaria” e cobrou explicações. A petista disse que a acusação era uma “falsidade” e o presidente do partido, José Eduardo Dutra, informou que a cúpula da legenda havia decidido interpelar Serra na Justiça por conta das declarações.

Os boatos sobre a fábrica de dossiês parecem ser fruto de uma disputa interna entre dois grupos petistas interessados em comandar a estrutura de comunicação da campanha de Dilma Rousseff, um ligado a Lanzetta, outro ao deputado estadual Rui Falcão. A origem dessa confusão era, porém, desconhecida do público, até agora.

CartaCapital teve acesso a parte do tal “dossiê” que gerou toda essa especulação. Trata-se, na verdade, de um livro ainda não publicado com 14 capítulos intitulado Os Porões da Privataria, do jornalista Amaury Ribeiro Jr.

O livro descreve com minúcias o que seria a participação de Serra e aliados tucanos nos bastidores das privatizações durante os dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso. É um arrazoado cujo conteúdo seria particularmente constrangedor para o pré-candidato e outros tantos tucanos poderosos dos anos FHC.

Entre os investigados por Ribeiro Jr. estão também três parentes de Serra: a filha Verônica, o genro Alexandre Bourgeois e o primo Gregório Marin Preciado. Está sendo produzido há cerca de dois anos e nada tem a ver com a suposta intenção petista de fabricar acusações contra o adversário.

Arapongas contra Aécio

É essa a origem das informações sobre a existência do tal “dossiê” contra a filha de Serra. E a razão de os tucanos terem lançado um ataque preventivo às informações que constam do livro. De fato, Ribeiro Jr. dedicou-se a apurar os negócios de Verônica. Repórter experiente com passagens em várias redações da imprensa brasileira, Ribeiro Jr. iniciou as apurações a pedido do seu último empregador, o Grupo Diários Associados, que congrega, entre outros, os jornais Correio Braziliense e O Estado de Minas.

O livro narra, por exemplo, supostos benefícios obtidos por Marin Preciado em instituições financeiras públicas, entre elas o Banco do Brasil, na época em que outro ex-tesoureiro de Serra, Ricardo Sérgio de Oliveira, trabalhava lá. Para quem não se lembra, Oliveira ficou famoso após a divulgação de sua famosa frase “no limite da irresponsabilidade” no conjunto dos grampos do BNDES.

Em uma entrevista que será usada como peça de divulgação do livro e à qualCartaCapital teve acesso, Ribeiro Jr. afirma que a investigação que desaguou no livro começou há dois anos. À época, explica, havia uma movimentação, atribuída ao deputado Marcelo Itagiba (PSDB-RJ), visceralmente ligado a Serra, para usar arapongas e investigar a vida do governador tucano Aécio Neves, de Minas Gerais. Justamente quando Aécio disputava a indicação como candidato à Presidência pelos tucanos.

“O interesse suposto seria o de flagrar o adversário de Serra em situações escabrosas ou escândalos para tirá-lo do páreo”, diz o jornalista. “Entrei em campo, pelo outro lado, para averiguar o lado mais sombrio das privatizações, propinas, lavagem de dinheiro e sumiço de dinheiro público.”

A ligação feita entre o nome de Ribeiro Jr. e o anunciado esquema de espionagem do comitê de Dilma deveu-se a um encontro entre ele e Lanzetta, em Brasília, no qual se especulou sobre sua contratação para a equipe de comunicação da campanha petista. Vencedor de três prêmios Esso e quatro prêmios Vladimir Herzog, entre muitos outros, Ribeiro Jr., 47 anos, é conhecido por desencavar boas histórias. Herdeiro de uma pizzaria e uma fazenda em Campo Grande (MS) e ocupado com a finalização do livro, o jornalista recusou o convite.

Na entrevista de divulgação do livro, Ribeiro Jr. afirma que a obra estabelece a ligação de diversos tucanos com as privatizações e desnuda inúmeras ações com empresas offshore para fazer entrar no Brasil dinheiro oriundo de paraísos fiscais. “São operações complicadas e necessitam ser explicadas com cuidado para os brasileiros perceberem o quanto foram lesados e em quanto mais poderão ser.”

A aproximação entre Ribeiro Jr. e Lanzetta, contudo, teria sido suficiente para que grupos interessados em ganhar espaço na campanha petista desencadeassem uma onda de boatos sobre a formação de um time de contraespionagem para produzir dossiês contra os tucanos. Diante do precedente dos “aloprados” do PT, a mídia embarcou com entusiasmo na versão depois assumida com tanto vigor pelos próceres tucanos. É mais um não fato da campanha.

Dilma rechaça dossiê

O mesmo fenômeno envolveu o ex-delegado federal Onésimo de Souza, especialista em contraespionagem que chegou a oferecer serviços ao PT de vigilância e rastreamento de escutas telefônicas. Como cobrou caro demais, acabou descartado, mas foi apontado como futuro integrante da tal equipe de arapongas de Dilma Rousseff.

Por ordem da pré-candidata, qualquer assunto relativo a dossiê e afins está proibido no comitê de campanha instalado numa casa do Lago Sul de Brasília. Dilma se diz “estarrecida” com as acusações veiculadas, primeiro, na revista Veja e, em seguida, por diversos outros veículos — sempre com foco na suposta espionagem, nunca no conteúdo do suposto dossiê.

Aos auxiliares, a petista mandou avisar que não aceitará, “em hipótese alguma”, a confecção de dossiês durante a campanha e demitirá sumariamente quem se envolver com tal expediente.

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Uma nova Última Hora, já!

Reproduzo artigo do professor Laurindo Lalo Leal Filho, publicado no sítio Carta Maior:

Dá tristeza parar em frente à uma banca de revistas no Brasil. Diante de tanto papel impresso e de balas, doces e isqueiros, pouco há para escolher. Quando se trata de jornal, então, a pobreza é franciscana. Em São Paulo são dois títulos, com conteúdos quase iguais. No Rio, um e meio.

Num ano eleitoral como este a escassez de diversidade nas bancas chega a ser um atentado ao processo democrático. Muitos poderão dizer que os jornais, além de poucos, têm tiragens tão insignificantes que a influência no eleitorado beira o zero. É verdade, em parte. Somadas as vendas em banca e as assinaturas dos três jornalões, o total não chega a um milhão de exemplares diários. Num país com quase 200 milhões de habitantes, o número de vendas é mesmo irrisório.

No entanto, os jornais apesar de pouco lidos, acabam servindo de munição para os veículos eletrônicos (rádio, TV e internet). No rádio, os chamados “comunicadores populares” decodificam com seus critérios pessoais as notícias impressas para milhões de pessoas diariamente. Na TV pautam o jornalismo, as entrevistas e até os programas de auditório. E na internet servem para tudo, desde o abastecimento dos portais noticiosos até as infâmias e calúnias que capeiam pela rede. Reside ai a importância dos jornais, na potencialização do seu conteúdo realizada por outros veículos.

Invejo argentinos, franceses e ingleses. Não passam pela mesma privação informativa. Alem de disporem de jornais de melhor qualidade que os nossos, têm sempre à mão uma alternativa de leitura mais progressista. Refiro-me ao Página 12, na Argentina; ao Guardian, na Inglaterra e ao Le Monde e o Libération, na França. Que falta fazem por aqui jornais como esses.

Mas nem sempre foi assim. Antes do golpe de 64 podia-se ver nas bancas de algumas cidades brasileiras jornais alinhados com diferentes correntes político-partidárias, claro que majoritariamente conservadoras. Com algumas honrosas exceções como a Última Hora dirigida por Samuel Wainer.

É bem verdade que a opção Última Hora só surgiu graça ao impulso dado pelo governo Vargas. Wainer em sua autobiografia (Minha Razão de Viver, Editora Planeta, 2006) lembra a gênese do jornal. Eleito em 1950, Getúlio Vargas reuniu-se com o novo ministério no dia 2 de fevereiro. Ao final do encontro comentou com o jornalista: “Tu reparaste que hoje não veio ninguém cobrir a reunião?” Concordando, Samuel acrescentou: “O senhor só vai aparecer nos jornais quando houver algo negativo a noticiar. Essa é uma tática normal de oposição, e a mais devastadora”. O presidente, segundo o relato, “andava de um lado para o outro. De repente parou e me disse (...): Por que tu não fazes um jornal?”.

Estava dada a senha para a construção de um jornal comprometido com as mudanças esperadas do novo governo e manifestadas pelo povo, nas urnas. Enquanto durou, a Última Hora representou o que de melhor era possível se fazer no jornalismo da época, dando grandes furos, realizando reportagens históricas e congregando em suas páginas os mais competentes colunistas nas mais diversas áreas, da política ao esporte, passando pela economia e a cultura. Sem esconder sua posição nacionalista de esquerda, segundo o próprio Wainer.

Hoje não temos nada disso. E com o poder da televisão as coisas pioraram. Uma nova Última Hora torna-se então imprescindível, alem do fortalecimento constante da TV pública. Não é cabível que um governo popular tenha que se dirigir à sociedade somente através do filtro das empresas comerciais de jornalismo, com todas as distorções que conhecemos. Aqui ao lado, na Bolívia, o presidente Evo Morales já percebeu isso e criou o jornal Câmbio, líder de tiragem em poucos meses de existência.

São jornais que permitem também dar voz aos que hoje não têm voz, além dos governos. Infelizmente não há como setores politicamente fortes, vinculados às camadas populares, mas economicamente frágeis, estabelecerem algum tipo de concorrência com as grandes empresas de comunicação.

A saída é a presença do Estado, ainda que de maneira apenas indutiva, estimulando novos meios de comunicação. A asfixia do debate público não é sentida apenas por aqui. Até na Alemanha, um pensador como Jurgen Habermmas, cultor da ideia do espaço público como arena do debate democrático, diz, por exemplo, que “quando se trata do gás, eletricidade ou água, o Estado tem a obrigação de prover as necessidades energéticas da população. Por que não seria igualmente obrigado a prover essa outra espécie de ‘energia’, sem a qual o próprio Estado democrático poderia acabar avariado?”. Por que não?

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Frei Betto e os "oráculos da verdade"

Reproduzo artigo de Frei Betto, publicado no jornal Correio Braziliense:

O filósofo alemão Emmanuel Kant não anda muito em moda. Sobretudo por ter adotado em suas obras uma linguagem hermética. Porém, num de seus brilhantes textos (O que é o Iluminismo?) sublinha um fenômeno que, na cultura televisual que hoje impera, se torna cada vez mais generalizado: as pessoas renunciam a pensar por si mesmas. Preferem se colocar sob proteção dos oráculos da verdade: a revista semanal, o telejornal, o patrão, o chefe, o pároco ou o pastor.

Esses, os guardiões da verdade que, bondosamente, velam para não nos permitir incorrer em equívocos. Graças a seus alertas sabemos que as mortes de terroristas nas prisões made in USA de Bagdá e Guantánamo são apenas acidentes de percurso comparadas à morte de um preso comum, disfarçado de político, num hospital de Cuba, em decorrência de prolongada greve de fome.

São eles que nos tornam palatáveis os bombardeios dos EUA no Iraque e no Afeganistão, dizimando aldeias com crianças e mulheres, e nos fazem encarar com horror a pretensão de o Irã fazer uso pacífico da energia nuclear, enquanto seu vizinho, Israel, ostenta a bomba atômica.

São eles que nos induzem a repudiar o MST em sua luta por reforma agrária, enquanto o latifúndio, em nome do agronegócio, invade a Amazônia, desmata a floresta e utiliza mão de obra escrava.

É isso que, na opinião de Kant, faz do público Hausvieh, gado doméstico, arrebanhamento, de modo que todos aceitem, resignadamente, permanecer confinados no curral, cientes do risco de caminhar sozinho.

Kant aponta uma lista de oráculos da verdade: o mau governante, o militar, o professor, o sacerdote etc. Todos clamam: Não pensem! Obedeçam! Paguem! Creiam! O filósofo francês Dany-Robert Dufour sugere incluir o publicitário que, hoje, ordena ao rebanho de consumidores: Não pensem! Gastem!

Tocqueville, autor de Da democracia na América (1840), opina em seu famoso livro que o tipo de despotismo que as nações democráticas deveriam temer é exatamente sua redução a um rebanho de animais tímidos e industriosos, livres da preocupação de pensar.

O velho Marx, que anda em moda por ter previsto as crises cíclicas do capitalismo, assinalou que elas decorreriam da superprodução, o que de fato ocorreu em 1929. Mas não foi o que vimos em 2008, cujos reflexos perduram. A crise atual não derivou da maximização da exploração do trabalhador, e sim da maximização da exploração dos consumidores. Consumo, logo existo, eis o princípio da lógica pós-moderna.

Para transformar o mundo num grande mercado, as técnicas do marketing contaram com a valiosa contribuição de Edward Bernays, duplo sobrinho estadunidense de Freud. Anna, irmã do criador da psicanálise e mãe de Bernays, era casada com o irmão de Martha, mulher de Freud. Os livros deste foram publicados pelo sobrinho nos EUA. Já em 1923, em Crystallizing Public Opinion, Bernays argumenta que governos e anunciantes são capazes de arregimentar a mente (do público) como os militares o fazem com o corpo.

Como gado, o consumidor busca sua segurança na identificação com o rebanho, capaz de homogeneizar seu comportamento, criando padrões universais de hábitos de consumo por meio de uma propaganda libidinal que nele imprime a sensação de ter o desejo correspondido pela mercadoria adquirida. E quanto mais cedo se inicia esse adestramento ao consumismo, tanto maior a maximização do lucro. O ideal é cada criança com um televisor no próprio quarto.

Para se atingir esse objetivo é preciso incrementar uma cultura do egoísmo como regra de vida. Não é por acaso que quase todas as peças publicitárias se baseiam na exacerbação de um dos sete pecados capitais. Todos eles, sem exceção, são tidos como virtudes nessa sociedade neoliberal corroída pelo afã consumista.

A inveja é estimulada no anúncio da família que possui um carro melhor que o do vizinho. A avareza é o mote das cadernetas de poupança. A cobiça inspira as peças publicitárias, do último modelo de telefone celular ao tênis de grife. O orgulho é sinal de sucesso dos executivos assegurado por planos de saúde eterna. A preguiça fica por conta das confortáveis sandálias que nos fazem relaxar ao sol.

A luxúria é marca registrada dos jovens esbeltos e das garotas esculturais que desfrutam vida saudável e feliz ao consumirem bebidas, cigarros, roupas e cosméticos. Enfim, a gula envenena a alimentação infantil na forma de chocolates, refrigerantes e biscoitos, induzindo a crer que sabores são prenúncios de amores.

Na sociedade neoliberal, a liberdade se restringe à variedade de escolhas consumistas; a democracia, em votar nos que dispõem de recursos milionários para bancar a campanha eleitoral; a virtude, em pensar primeiro em si mesmo e encarar o semelhante como concorrente. Essa, a verdade proclamada pelos oráculos do sistema.

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“Internet tornou-se um meio subversivo”

Reproduzo entrevista concedida ao jornalista José Meirelles Passos e publicada no jornal O Globo:

O acesso mais amplo das pessoas aos meios de comunicação, em especial a utilização da internet — como contraponto à mídia tradicional — é um dos aspectos abordados no III Fórum Mundial da Aliança de Civilizações, com especial atenção à chamada “alfabetização midiática” proposta pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura). “A internet tornou-se, em certo sentido, um meio muito subversivo, porque é muito difícil de controlar. E é preciso ensinar as pessoas a utilizá-lo de forma responsável”, disse, em entrevista, o dinamarquês Mogens Schmidt, vice-diretor-geral-adjunto para Comunicação da Unesco, ao revelar detalhes daquele programa.

O que vem a ser essa iniciativa da Unesco denominada como “alfabetização midiática”?

É uma maneira de dar às pessoas o poder de, elas mesmas, utilizarem a mídia, para se expressar e, assim, participar mais da sociedade. Mas, também, fazer isso de uma forma que possam refletir, criticamente, sobre o que a mídia tradicional traz para elas e, também, decodificar o que acontece nos meios de comunicação.

E como, na prática, essa iniciativa é aplicada? Quem é o alvo central dela?

Há três níveis de alcance. Um deles engloba crianças de 9 a 15 anos. Desenvolvemos um currículo e uma “caixa de ferramentas” para ajudar professores a treinar as crianças. Outro diz respeito aos próprios profissionais de imprensa, fazendo-os pensar mais seriamente sobre a sua responsabilidade. E o terceiro é formado por proprietários de meios de comunicação e de publishers, buscando fazer com que também repensem a sua atividade.

Isso, obviamente, tem a ver com o papel cada dia mais influente da internet, não?

Claro. Esse novo meio, a internet, tornou-se em certo sentido um meio muito subversivo, porque é muito difícil de controlar. E é preciso ensinar as pessoas a utilizá-lo de forma responsável. Elas, afinal, agora podem agir facilmente através da nova mídia social que está ao seu dispor em muitos países. E fazer isso juntas, virtualmente, além de fisicamente. Podem se unir através das fronteiras de uma forma bem mais fácil, do que há 40 anos, quando eu era jovem. Trata-se de um potencial completamente diferente para unir as pessoas, de forma que as suas vozes sejam ouvidas.

O objetivo da Unesco é o de incentivar a criação de novos meios, populares, que sirvam de contraponto à mídia tradicional?

O esquema funciona assim: você ensina as pessoas a desenvolverem meios de comunicação: criar um jornal, um website e, a partir disso, discutir tal iniciativa. Ou seja: colocando a mão na massa, elas passarão naturalmente a perguntar “por que fiz tal coisa?, por que disse ou escrevi tal coisa?, por que usei tal informação?, qual a lógica por trás de uma determinada escolha? Fiz a coisa certa ou não? Cedi a algum tipo de influência, de pressão? Por quê?”. Dessa forma, as pessoas passarão a saber julgar melhor a mídia. É, portanto, uma alfabetização midiática.

E quanto aos profissionais do ramo? Qual o objetivo dessa iniciativa da Unesco?

Estamos trabalhando com várias organizações de jornalistas profissionais, em todo o mundo, com relação a padrões profissionais, desenvolvendo manuais de redação, sistemas de transparência e responsabilidade. Tudo isso baseado em autorregulação. O objetivo é dialogar sobre o que, afinal, é bom jornalismo, quais são os bons padrões éticos profissionais. Precisamos refletir mais sobre o que estamos fazendo, como jornalistas.

O senhor crê que a categoria deixou de levar em conta tais cuidados?

Muitas vezes, sim. Tanto que a própria Federação Internacional de Jornalistas criou a Iniciativa do Jornalista Ético, como uma ferramenta que pode ajudar os profissionais a se defenderem das críticas que têm sido feitas à mídia ultimamente, como a acusação de que ela agora só se preocupa com entretenimento, que o jornalismo crítico desapareceu, que o jornalismo investigativo já não está fazendo mais o que devia.

O senhor mencionou, no início, que publishers e proprietários de meios também devem receber uma educação midiática, ou seria uma reeducação?

O que estamos a fazer é com que repórteres, editores e donos de jornais se sentem para refletir e tentar redefinir algumas virtudes do jornalismo clássico e ver como elas poderão ser devolvidas à mídia, inseridas na agenda da mídia. Os proprietários também têm que levar em conta essas questões, sob o risco de que seus meios percam a credibilidade.

Por falar nisso, como lidar justamente com a questão da confiança, da credibilidade, numa época em que qualquer pessoa tem acesso à internet e, através dela, pode propagar informações falsas ou tendenciosas?

Ah, esse é o problema. E é isso que reforça a iniciativa da Unesco. Ao “alfabetizar” pessoas em relação à mídia, damos a elas a capacidade de distinguir entre o que é uma história tendenciosa, parcial, e uma confiável. Elas aprendem a decodificar a mídia. Por outro lado, ao trabalharmos também com os próprios jornalistas, o foco mais forte está na ética, de forma a que eles façam o seu trabalho de uma forma decente.

Como o senhor vê a liberdade expressão e, especificamente, de imprensa hoje?

Ela cresceu muito, globalmente, embora ainda haja problemas. O Brasil está em situação muito boa, nesse sentido. E por isso, acho que tem o papel de influir para que toda a América do Sul o imite nessa área.

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A mídia e a má vontade com o presidente

Reproduzo artigo do escritor Washington Araújo, publicado no Observatório da Imprensa:

Não raras vezes sou instado a responder a esta questão: "Por que nossa grande mídia tem tanta má vontade com o presidente Lula?" É tema recorrente nas mensagens que recebo nas perguntas de estudantes de faculdades de jornalismo e em almoço com colegas de profissão.

Sou levado a crer que a questão martela a têmpora de nove em cada grupo de 10 pessoas dedicadas a estudar o "fazer jornalístico" no Brasil. Mas até a pergunta comporta diversas variações de intensidade e inflexão. Algumas destas: "Por que a grande imprensa está sempre contra Lula?" E mais: "O que Lula fez para que nossa principal emissora de TV aberta, nossos principais jornais e nossas revistas semanais de maior tiragem lhe fizessem marcação cerrada, expressassem tamanha oposição ao seu governo?" E chega a ser risível esta outra formulação: "Por que será mais fácil nevar em Teresina que a grande mídia mostrar alguma consideração para com Lula?"

Reforçar o preconceito

O certo é que a questão é uma só e desperta a paixão de quem se habilita a respondê-la. A resposta não comporta muro nem esperança de que o muro se mova. Temos aqueles que são rápidos no gatilho verbal e resumem tudo a mero preconceito de classe, preconceito cultural, preconceito social, preconceito lingüístico, preconceito – enfim. Os que concordam com esta tese entendem que não há outra justificativa razoável. Acreditam que os barões da grande imprensa prezam seus ritos, tanto os escritos quanto os verbais; ritos que lhes asseguram ser sua atividade profissional o próprio Quarto Poder e se vêm com poder de influenciar para o bem ou para o mal as políticas de governo. Proclamam seu poder em conquistar corações e mentes tanto para beatificar quanto demonizar autoridades do primeiro escalão. Entendem que faz parte da esfera pública em que atuam a decisão para tratar a cobertura do governo em três modos: "banho maria", fogo brando ou crestado em altas labaredas. E, por fim, são useiros e vezeiros na arte de criar dificuldades imediatas para vender facilidades midiáticas. Há ainda aqueles que respondem à pergunta sobre a má vontade da grande imprensa para com o presidente com outra pergunta: “Não foi este governo que diminuiu o protagonismo da grande mídia?”

Destacam, então, que não faz muito tempo, coisa de menos de um decênio, era comum no Brasil que o presidente da República, em pessoa, levasse aos barões da mídia suas idéias e até mesmo detalhes do planejamento de políticas públicas de vulto que pretendia levar à realidade. Tudo feito com anterioridade regulamentar, antes de ser do conhecimento de seu primeiro escalão e muito antes de o assunto ser objeto de debate no Congresso Nacional. Mas, como manter as tradições, os ritos e o arraigado teor simbólico das relações mídia-governo se o governo passou a ser visto pelos tradicionais interlocutores midiáticos como não se estando à altura dos desafios postos à sua frente?

Aqueles que nutrem este tipo de preconceito em relação ao presidente desconhecem ou não concordam com a percepção que a experiência substitui o diploma formal. São pessoas que chegam mesmo a expressar concordância e respeito para com o conhecimento dos povos originários do Brasil. Um xamã, uma rezadeira, um manipulador de ervas medicinais pode ter um conhecimento mágico que transcende as leis da medicina.

Infelizmente, o presidente da República não pode se beneficiar destas clareiras do pensamento. E não importa se é líder nato, carismático, se destrincha o código de comunicação com as raízes do Brasil. Nada disso importa já que não reforça o preconceito. Simples assim.

O sorriso da aquiescência

Temos também aqueles que justificam essa má vontade do baronato devido às ações do governo para diluir a força da meia dúzia de atores políticos – os que se entendem porta-vozes da "grande imprensa" – e criar espaço para nova gama de atores, os "grandes" das mídias regionais e locais. Aqui, é indispensável citar dados da Secretaria de Comunicação da Presidência da República (Secom): em 2003, o governo Lula publicou anúncios em 182 municípios, atingindo 499 veículos (incluindo rádio, jornal e TV). Em 2004, esse número subiu para 757 municípios e 2.165 veículos. Em 2006, com 1.358 municípios e 4.451 veículos. Devido a um orçamento menor em 2007, os anúncios veiculados pela Secom caíram para 913 municípios em 3.434 veículos. Em 2008, o governo divulgou peças publicitárias em 5.297 veículos, sendo 2.597 rádios e 297 TVs, número muito superior aos 499 meios de comunicação que recebiam recursos para fins de promoção em 2003. Nesse período, o número de municípios atingidos pelos anúncios do Executivo federal cresceu de 182 para 1.149.

São números estarrecedores para uns poucos e esclarecedores para a vasta maioria da população. Em qualquer atividade empresarial, o bem maior a ser protegido não fica no lado esquerdo do peito, e sim, no bolso. Para se ter uma visão de grandeza dos valores envolvidos, tenhamos em mente que para promover a imagem e as ações do governo nos quatro primeiros meses de 2010, já foram desembolsados R$ 240,7 milhões – 63% a mais do que no mesmo período de 2009. E mais: o orçamento total para a propaganda chega a R$ 700,4 milhões, 29,2% a mais do que no ano passado. Estão de fora dessa conta os valores gastos pelas estatais.

Números que falam por si, dando conta que o bolo (da publicidade oficial) começou, de fato, a ser fatiado de forma menos concentradora e mais transparente e os comensais, que em 2003 eram contados a poucas centenas, hoje já chegam aos milhares.

A gritaria é grande, a cara feia, amuada, toma lugar no rosto que antes mantinha monolítico sorriso de aquiescente aprovação e então novas bandeiras passam a ser agitadas aos ventos (e eventos) da ocasião. Porque uma coisa é democratizar o acesso aos veículos de comunicação e outra coisa é convidar mais gente para pegar sua fatia do bolo. Ainda assim, há que se franzir o cenho e partir para cima, não obstante os melhores pedaços do bolo se destinarem às mesmas bocas.

O que a mídia não viu

Explico. Em 2009, a quase totalidade dos milhões de reais investidos em publicidade pelo governo "autoritário e estatizante" de Lula foi destinada aos que integram o consórcio “grande imprensa”: 62% das verbas publicitárias do governo e das estatais foram para as emissoras de televisão, 12% para as rádios, 9% para os jornais, 8% para as revistas, 1,5% para a internet, 1,5% para outdoors e 6% para as outras mídias. Só a TV Globo ficou com quase 60% dos recursos da televisão. Os três principais jornais do país (Folha de S.Paulo, Estado de S. Paulo e O Globo) abocanharam o grosso dos recursos do setor.

Sempre existiu no Brasil uma mídia coberta com a capa da invisibilidade e outra mídia, conhecida como grande mídia, atenta representante das grandes redes de rádio e televisão, das maiores empresas publicadoras de jornais e revistas e dos grandes portais na internet. Esta mídia historicamente detinha 100% da interlocução com o governo. Mudou a forma como o mundo vê o Brasil. E mudou a forma como o Brasil se deixa ver pelo mundo. E foi para melhor. Hoje somos mais bem explicados pela imprensa internacional que pela nacional.

E não é só o Brasil que parece ter mudado de eixo. Time, Le Monde, El País, New York Times, Newsweek, Financial Times, Der Spiegel não passam 30 dias sem publicar extensa matéria laudatória (1) ao Brasil como potência do presente e do futuro imediato, (2) a Lula como maior líder político da atualidade ou dos últimos dez anos, (3) explicando a conjunção de fatores que faz o Brasil ser alvo da opinião pública mundial. E não precisa ser muito iluminado para entender que Le Monde, El País e Financial Times são alguns dos jornais deste mundo cujas opiniões contam. Goste-se ou não.

É irônico que o que não se faz em casa se faz fora de casa. Aqui, o governo Lula passaria em brancas nuvens ante o olhar embaçado de nossos grandes jornais e revistas e ante as lentes turvas de nosso telejornal de maior audiência, o Jornal Nacional. Historiadores no futuro terão trabalho para escrever o papel da grande imprensa brasileira no período 2003-2010. Pesquisar nos arquivos será frustrante porque o Brasil impresso mostrará ser visceralmente contraditado pelo Brasil real. Se uma vista d´olhos tiver como escopo a coleção de manchetes diárias dos grandes jornais e as capas das principais revistas semanais de informação, o pesquisador irá detectar que nunca existiu tão grande descompasso entre o que a mídia não viu (e noticiou) e o que a população viu (e vivenciou).

Uma história de vida

Se antes, nos anos 1990, a praxe era repercutir semanas a fio qualquer reverência prestada ao Brasil – e ao seu presidente – partindo de autoridade estrangeira – ou também por ser o Brasil tema de reportagem com viés positivo por seus congêneres midiáticos estrangeiros, hoje se tornou lugar comum deixar passar batido, fazer de conta que os aplausos são para o presidente de Trinidad e Tobago e a aprovação internacional ter como alvo a região onde antes ficava o Congo Belga e, sendo assim, nada mais previsível que passar ao largo, repercutir de forma melancólica e burocrática, em matérias claramente forçadas (o contrário de entusiasmadas). Repercussão feita apenas para cumprir tabela e tentar diminuir a distância abissal a separar nossa opinião pública (da população) da opinião publicada (dos donos dos grandes veículos de comunicação).

E a verdade começa a incomodar: desde 1889, ano em que foi a proclamada a República, até os dias que correm, nunca tivemos um presidente da República tão premiado, festejado, elogiado em fóruns internacionais como o atual presidente. Prêmios de organismos internacionais – como os do sistema Nações Unidas – parecem chegar em penca. O mesmo ocorre com aqueles que lhe são conferidos por entidades como o Fórum Econômico Mundial de Davos, o do governo espanhol, do Centro Woodrow Wilson etc. Mas, nada disso parece demover a grande imprensa de sua posição preconcebida, de fazer vista grossa para o fato que o presidente para chegar ao ponto em que se encontra – desfrutando de aprovação popular interna na oscilando entre 76% e 83% e contando amplo respaldo internacional, e não obstante colocar em jogo essa reputação em bolas divididas com o Irã – tem uma história de vida que, como bem assinalou recentemente editorial da revista americana Newsweek. Publicou a revista que "Lula percorreu um longo caminho do faminto Nordeste do Brasil para a sala da Assembleia-Geral das Nações Unidas, mas o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, conhece cada passo desse caminho".

Esforços pela paz mundial

Embora soe irônico quando colocado sob perspectiva histórica, não faz muitos anos que a imprensa entrava em êxtase ao noticiar que um presidente brasileiro seria agraciado com o título de doutor honoris causa concedido pela na Universidade de Coimbra. As fotos da solenidade acadêmica preencheriam páginas centrais, as manchetes trariam a marca do deliberado ufanismo como se estivessem noticiando ser um brasileiro o primeiro humano a pisar a superfície de Marte. O contraste é brutal e não dissimulado.

Quando o preconceito embota o juízo humano, a verdade se dilui com a celeridade do orvalho ante os primeiros raios do sol. É fato que nossa grande imprensa prefere se mirar mais no espelho da Universidade portuguesa que no espelho do mundo simbolizado por tão ilustres organismos multilaterais entesourados no sistema Nações Unidas, como a Unesco, o Unicef, a FAO, a ActionAid. A grande imprensa prefere investigar razões ocultas, e não lídimas, para a concessão dos prêmios. Trata-se de performance patética e atrapalhada pelos que detêm o poder real nos meios de comunicação. Porque, já nos ensinava Albert Einstein em meados dos anos 1940, é bem mais fácil rachar um átomo que quebrar um preconceito.

E, no entanto, é a mesma grande imprensa que faz força para entortar o que é direito. E há deliberado esforço nisso. A política externa de Lula é vista com olhos tomados por clara alucinação preconceituosa. Quando não, motivada por absoluta má-fé. Retiram-lhe os créditos por vocalizar os anseios dos países africanos e por ousar criar embaixadas em países em que o PIB é menor que o do estado do Piauí. A ação do Itamaraty só é legítima perante nossa grande imprensa se for destinada a manter o status quo: continuar sua função de habitual anonimato entre os países afluentes que integram o circuito Elizabeth Arden. O Ministério das Relações Exteriores do Brasil se torna acéfalo, inoperante e fracassado se passa a flertar com o chamado circuito Madre Teresa de Calcutá, convenhamos, circuito infinitamente menos sedutor. Mas por onde trafega 2/3 da humanidade. Cassam os créditos do Itamaraty por haver conseguido protagonismo único no G-20. É quando a grande imprensa forma fileiras (de primeira a quinta colunas) com potências ocidentais, sempre desejosas por novas guerras – forma perversa e rápida de reequilibrar suas finanças, já que armas precisam tanto de guerras quanto guerras precisam de armas. E em seu desejo de empanar o brilho de nossas conquistas no contencioso nuclear envolvendo o Irã e o Ocidente vigora o vale-tudo: opta-se por menosprezar as ações do Brasil conseguindo, em menos de 19 meses, gerar ambiente propício à diplomacia no terreno minado entre o Irã e o Ocidente, terreno que começou a ficar minado ainda naquele período glacial que remonta a 1979, Chama atenção que o Brasil – que tanto se orgulha de sua história de pacifismo –, tantas vezes mencionado em curso de formação para a carreira de diplomata do sisudo Instituto Rio Branco, apareça aos olhos de sua grande mídia como disposto a refugar tão bem sucedidos esforços pela paz mundial.

O passado não se pode mudar

Chega a ser impensável para nossa grande imprensa que o retirante nordestino, praticante contumaz de crimes gramaticais, vítima de adjuntos adnominais e refém de uma cultura cínica e centrada na posse do canudo universitário, possa ser acumular êxitos em tantas frentes: aplicar políticas públicas bem sucedidas a ponto de levar 23 milhões de brasileiros da classe pobre para a classe média em menos de meia década; anunciar (por golpe de sorte, penso) a descoberta de imensos campos petrolíferos na camada do pré-sal; fazer eco ao legado de Getúlio Vargas trazendo à existência legal nada menos que uma CLS, ou seja, uma Consolidação das Leis Sociais; liquidar a histórica dívida do Brasil com o Fundo Monetário Internacional, passando o país de devedor a credor; chamar de marola (e depois provar que tinha razão) a crise de 2008, considerada a pior crise econômica internacional depois da Grande Depressão de 1929, mostrando ao mundo um país com fundamentos econômicos sólidos e com suas contas inteiramente sob controle e, mais que isto, administráveis.

Se no primeiro mandato constava da publicidade governamental blasonar "o orgulho de ser brasileiro", no segundo já estávamos em outra fase, o de sentir este orgulho. É quando o Brasil é escolhido pela Fifa para sediar a Copa do Mundo de Futebol de 2014, e o Rio de Janeiro, desbancando Chicago, Madri, Tóquio e conquistando o direito de sediar os Jogos Olímpicos de 2016. Fica evidente que se o Brasil tivesse que ser escolhido para ser anfitrião dos dois mais importantes eventos esportivos do planeta contando unicamente com o apoio de sua grande imprensa, com certeza a Copa de 2014 aconteceria nos Estados Unidos e as Olimpíadas de 2016 seriam ou na Espanha ou no Japão. E quem duvidar dessa singela afirmação basta gastar um par de horas pesquisando nos arquivos virtuais das revistas Veja e Época e dos jornais O Globo, Folha de S.Paulo e Estado de S. Paulo. Pesquisar arquivos de nossas TVs de canal aberto exigirá mais tempo, mas o resultado será o mesmo: ainda bem que quem representa a chamada grande mídia brasileira - aquela que se reúne no Instituto Millenium - não é quem representa o Brasil em fóruns internacionais. Uma coisa que não se pode mudar é o passado. E precisamos entender que a história do presente, antes de ser objeto de historiadores, é registrada nas redações de nossos principais veículos de comunicação.

Guardiões do culto acadêmico

A situação chega a ser tão absurda e tão "comprovada" a tal má vontade de nossa grande imprensa para com o governo Lula que a edição do carioca O Globo de 18/3/2010 chegou a publicar a seguinte declaração de Maria Judith Brito, presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ) e executiva do grupo Folha de S.Paulo: "A liberdade de imprensa é um bem maior que não deve ser limitado. A esse direito geral, o contraponto é sempre a questão da responsabilidade dos meios de comunicação e, obviamente, esses meios de comunicação estão fazendo de fato a posição oposicionista deste país, já que a oposição está profundamente fragilizada. E esse papel de oposição, de investigação, sem dúvida nenhuma incomoda sobremaneira o governo."

Cabe ao leitor atento, ao internauta antenado e ao telespectador perspicaz perceber que muitas redações parecem trabalhar com as seguintes diretrizes: tratar de confiscar do presidente Lula todas as conquistas de seu governo; procurar dono para essas conquistas; ridicularizar seu discurso de apelo e compreensão fáceis; minimizar suas políticas públicas e, de quebra, enxovalhar sua política externa. Qualquer êxito que lhe seja imputado, antes de sua necessária divulgação, deve passar por rigoroso esquadrinhamento, cerrada investigação e busca incessante por motivações ocultas. A marca da maldade existe – precisa apenas ser encontrada. É nesse contexto que assume novo significado a famosa frase presidencial (revista piauí nº 28, janeiro/2009) dizendo que "o presidente Lula não lê jornal porque lhe dá azia". E, considerando que o dono da anunciada azia continua bafejado com índice recorde de aprovação popular... não seria razoável imaginar que seria apenas ele, o presidente, a sentir os efeitos indigestos da leitura dos jornais?

No momento em que todos – à exceção da grande mídia – demonstram incondicional aprovação ao governo Lula, é bom que os diversos atores venham à boca do palco despejar toda a verdade. Ao menos de vez em quando, dizer a verdade faz bem à mente e ao espírito. Ao dizer que ler jornais lhe causava azia, será que não estava por trás a mensagem de que ele preferia não se pautar pela agenda da grande mídia?

Não seria esta sua resposta simples, direta, fazendo o trajeto do coração ao fígado derivada dos muitos anos em que foi impiedosamente atacado, ridicularizado, menosprezado pelos guardiões do culto acadêmico?

Seres débeis e mesquinhos

Avancemos mais que pensar não enlouquece ninguém, isso já se comprovou. Os milhões de brasileiros que votaram nele em cinco eleições presidenciais (1989, 1994, 1998, 2002 e 2006) teriam assim procedido graças à sua trajetória intelectual? Ou, então, será que esses milhões que o acompanharam nas vezes em que não subiu a rampa do Planalto e nas duas em que adentraram com ele o Palácio não nutriam admiração por ser ele um operário que abraçou a vida política e a passou a viver para a política?

Teria o seu governo investido menos em educação superior do que qualquer outro governo republicano? E dentre seus antecessores na suprema magistratura (é assim que também se designa o presidente do Brasil), aqueles que possuíam vistosos títulos acadêmicos, reconhecimento intelectual conferido pela Sorbonne IV (Paris), carinho e franco apreço midiátivo, por acaso, fizeram governo melhor, saíram do governo para entrar (em vida) na História?

Como deve ser mensurado o mérito de um líder político? Por que critérios este deve ser avaliado: nos seus deslizes verbais ou nos seus resultados? Na sua atestada autosuficiência intelectual ou por sua prática política fundada no diálogo e na lídima negociação na esfera pública?

E, no vácuo criado pela interdição voluntária dos êxitos do governo, o que deve fazer a grande imprensa? Simples: embaralhar, criar confusão e impedir todo e qualquer debate sobre controle social da informação. Para tanto, nada mais previsível que se apresentem como defensores legítimos da liberdade de expressão, deixando ao governo a ação caluniosa de propor a volta da censura sempre que este se atreva a acenar com a regulamentação dos artigos 221 a 223, da Constituição Brasileira de 1988. Uma coisa é certa: não foram frutos de displicência nem distração dos representantes eleitos pelo povo brasileiro para participar Assembléia Nacional Constituinte. E do que tratam estes dispositivos constitucionais?

Tratam das restrições da liberdade de comunicar; da propriedade das empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e televisiva; da concessão e permissão para tais serviços; e, ainda mais, tem o já demonizado artigo 224 da Carta Magna. Este prevê a instituição do Conselho de Comunicação Social. Portanto, agir conforme reza a Constituição, passa a ser encarado crime de lesa-pátria.

Atento leitor: chegará o momento em que não será mais necessário clamar por um jornalismo plural, responsável, sério, veraz, equânime, vacinado contra os males do preconceito e da hipocrisia moral que ganha terreno em nossas relações sociais. E não haverá de se dispensar mais esforço para derrubá-lo porque este tipo de jornalismo está com dias contados e sua queda, de tão podre, mostrará ser inevitável.

O leitor pode bem se comprazer na deleitosa tarefa de entender o jornalismo como espelho-mundo, dotado de visão e fala. Ao crítico da mídia compete um encargo mais melancólico. Cumpre-lhe descobrir a inevitável mistura de erro e corrupção por ele contraído numa longa associação com os poderosos da terra, em meio a uma raça de seres débeis e mesquinhos.

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O Estado de Israel é a origem do ódio

Reproduzo excelente resposta de Breno Altman, publicada no sítio Opera Mundi:

Li essa manhã um indignado artigo escrito pelo jornalista Sérgio Malbergier, intitulado “Ódio a Israel ameaça palestinos”. O autor aborda o repúdio internacional contra o ataque israelense à frota humanitária que se dirigia a Faixa de Gaza. “Como judeu, descendente de avós que perderam pais e irmãos no Holocausto nazista, é de embrulhar o estômago ver a guerra mundial contra Israel”, afirma o colunista da Folha.com.

Temos pontos em comum. Também sou judeu. Meus avós, como os dele, igualmente perderam irmãos e parentes na Europa ocupada pelo nazismo. Mas considero inaceitável e indigno que o Holocausto sirva de álibi para que o Estado de Israel comporte-se com o povo palestino com a mesma arrogância e a mesma crueldade que vitimaram os judeus.

Onde Malbergier consegue ver “guerra mundial contra Israel”? Protestos e moções são comparáveis aos tiros que receberam os passageiros das embarcações pacifistas? A tímida resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas tem alguma equivalência com o terrorismo de Estado que se manifesta nas atitudes do governo israelense?

O problema talvez não seja de estômago embrulhado, mas de vista embaçada. Quem sabe o dr. Greg House possa diagnosticar a cegueira que acomete meu patrício. Afinal, como deveriam reagir os homens e mulheres de bem a mais esse ataque covarde? Batendo palmas? Aceitando as mentiras de Netanyahu?

Mas Malbergier não se contenta em justificar os crimes sionistas com o escudo do Holocausto. Recorre à surrada fórmula do antissemitismo: “Não é possível distinguir o Estado judeu dos judeus. Odiando-se um, odeia-se os outros.”

Arvora-se o autor a falar em nome de todos os judeus? Não em meu nome. Tampouco no de incontáveis judeus que deram suas vidas pelas boas causas da humanidade e jamais aceitariam ver sua biografia misturada à defesa de um Estado comprometido até a medula com a opressão de outro povo.

Se Israel está se convertendo em uma nação pária, que Malbergier procure a responsabilidade por essa situação entre os malfeitos do sionismo, pois foi essa corrente que construiu o Estado de Israel à sua imagem e semelhança.

Governo após governo, desde 1948, o Estado de Israel viola resoluções internacionais e dedica-se a expandir suas fronteiras muito além da partilha da Palestina aprovada pelas Nações Unidas em 1947.

O primeiro dos atentados terroristas, realizado em abril de 1948, foi o massacre da aldeia de Deir Yassin, nas proximidades de Jerusalém, quando mais de duzentos palestinos desarmados foram trucidados por forças sionistas paramilitares. Dali por diante essa foi a marca do comportamento de sucessivas administrações israelenses.

Ao ódio colonizador do Estado sionista, os palestinos responderam com o ódio dos desvalidos. Muitos de seus atos são injustificáveis e condenáveis, pois o terror contra a população civil é crime contra a humanidade. Mas o ovo da serpente, onde tudo começou, está na recusa de Israel em aceitar o direito à independência e à soberania do povo palestino.

A escalada da violência só irá terminar quando esse direito estiver assegurado. O Estado de Israel atravessou décadas na ilegalidade porque sempre contou com a salvaguarda da Casa Branca para seus atos de pirataria. Apenas se sentará com seriedade na mesa de negociações se essa proteção acabar.

O temor de muitos judeus que defendem o Estado de Israel é que, dessa vez, seu país de reverência tenha ido além da conta. Diante do risco, ainda pequeno, de que a era da impunidade chegue ao fim, apontam seu dedo acusatório e ameaçador contra as vítimas.

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