Reproduzo excelente artigo de Mark Weisbrot, co-diretor do Centro para Pesquisa Política e Econômica e colunista do jornal britânico Guardian, publicado na Folha:
O que José Serra está tentando fazer? Em sua campanha pela Presidência do Brasil, ele acusou a Bolívia de cumplicidade no tráfico de drogas e criticou Lula por tentar mediar a disputa entre Washington e o Irã, e por recusar (em companhia da maioria dos demais países sul-americanos) reconhecimento ao governo de Honduras, “eleito” sob uma ditadura.
Por algum tempo ele optou por não aderir à campanha internacional de Washington contra a Venezuela, mas agora Serra e seu candidato a vice, Indio da Costa, também adentraram aquele pútrido pântano, alegando que a Venezuela “abriga” as Farc (Forças Armadas Revolucionárias Colombianas), o principal grupo guerrilheiro que combate o governo da Colômbia.
Que conste: a despeito de uma década de alegações, Washington ainda não conseguiu apresentar publicamente um traço de prova de que o governo de Chávez de fato apoie as Farc.
A única “prova” de que existe em domínio público vem de laptops e outros equipamentos de computação supostamente capturados pelas Forças Armadas colombianas em sua incursão ao território do Equador em março de 2008.
Blogueiros de direita como Reinaldo Azevedo repetem o mito de mídia de que a Interpol teria confirmado a autenticidade desses arquivos supostamente capturados, mas um relatório da Interpol nega enfaticamente essa possibilidade. Tudo que temos é a palavra das Forças Armadas colombianas -organização que sabidamente assassinou centenas de adolescentes inocentes e os vestiu como guerrilheiros.
Será que Serra realmente deseja que o Brasil compre brigas com todos os seus vizinhos a fim de se colocar desafiadoramente do lado errado da história? E isso apenas para se tornar o maior aliado direitista de Washington? Sim, caso Serra não tenha percebido, os Estados Unidos, sob o governo Obama como sob o governo Bush, só têm governos de direita como aliados no hemisfério: Canadá, Panamá, Colômbia, Chile, México. Existe um motivo para isso: a política norte-americana com relação à América Latina não mudou sob Obama.
Mesmo de um ponto de vista puramente maquiavélico - deixando de lado qualquer ideia de fazer da região ou do mundo um lugar melhor -, a estratégia “Serra Palin” faz pouco sentido. O Brasil tinha boas relações com Bush e pode ter boas relações com Obama sem incorrer nessa espécie desonrosa de servidão.
O Brasil não é El Salvador, país cujo governo vive sob chantagem por ameaças de enviar de volta ao seu território os milhares de emigrantes salvadorenhos que vivem nos Estados Unidos. E nem El Salvador tomou a estrada que Serra está percorrendo.
Não é apenas na Venezuela e na Bolívia que os Estados Unidos investem dezenas de milhões de dólares para adquirir influência política. Em 2005, como reportou este jornal, os Estados Unidos bancaram um esforço para mudar a lei brasileira de maneira a reforçar a oposição ao Partido dos Trabalhadores.
Washington tem grande interesse no resultado da eleição deste ano porque procura reverter as mudanças que tornaram a América Latina, no passado o “quintal” dos Estados Unidos, mais independente que nunca em sua história. José Serra está fazendo com que esse interesse cresça a cada dia.
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sábado, 7 de agosto de 2010
A necessidade de uma bancada de esquerda
Reproduzo artigo de Maria Cristina Fernandes, publicado no jornal no Valor Econômico:
Ao deixar o Planalto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva desalojará do poder o movimento sindical. É muito pequena a chance de o sindicalismo manter com o eleito, seja qual for, a interlocução e o peso alcançados neste governo. Nas duas candidaturas de oposição o afastamento é explicitado pelas alianças partidárias e programáticas que os sustentam. Na campanha petista o estranhamento vai desde os desacertos em torno do programa de governo do partido à ausência de qualquer interlocutor do movimento entre seus estrategistas.
Ao longo de sua carreira no serviço público, Dilma Rousseff, apesar de egressa do trabalhismo, nunca se aproximou do movimento sindical. Como ministra da Casa Civil, foram encontros majoritariamente empresariais que pautaram sua agenda apesar da tentativa das centrais de marcar presença. Como candidata, trata com desenvoltura da abertura de capital de estatais como a Infraero e os Correios, tema que, nas campanhas presidenciais de Lula, os sindicatos fizeram de cavalo de batalha contra tucanos inertes à estratégia da mistificação.
Esse afastamento é uma sinalização de que, no próximo governo, a retomada de propostas como a desoneração da folha ou a reforma da Previdência encontrará menos resistências internas, ainda que seja cedo para supor que a divisão de cadeiras no Congresso lhe seja favorável.
Ao se iniciar, este governo tinha ambas as propostas entre suas prioridades. Chegou a propor, sem sucesso, o fim da multa de 40% do FGTS, mas conseguiu aprovar mudanças tão ou mais significativas que as do governo anterior na Previdência, como a cobrança dos inativos, a instituição do redutor do benefício e a elevação da idade mínima.
A pauta foi suspensa com o mensalão, cujo enfrentamento levou o governo a convocar as centrais sindicais para a comissão de frente. Só seria retomada em 2007 com a apresentação pelo Executivo do projeto que institui a previdência complementar para o funcionalismo.
Pela proposta, todo servidor que ingresse no setor público depois da aprovação da lei teria direito a um teto previdenciário equivalente ao da iniciativa privada (hoje R$ 3,4 mil). Quem quisesse ganhar mais que contribua com um fundo de pensão. O projeto parte do pressuposto de que o Estado não deve ser onerado pelas aposentadorias mais altas.
Em mesa de debates durante o 10º encontro da Associação Brasileira de Ciência Política que acontece esta semana no Recife a professora da USP Marta Arretche mostrou como as desigualdades no mercado de trabalho são a principal agenda social que este governo deixou inacabada.
Ao longo do governo Lula programas sociais como o Bolsa Família permitiram acesso milhões a conta bancária e a um mínimo de consumo. O crescimento da economia elevou o nível de emprego a patamares históricos. Mas na população em idade de trabalhar não são poucas as diferenças no acesso à cidadania.
Um fosso separa o trabalhador informal de um celetista com férias e repouso semanal remunerado, vale transporte, seguro desemprego e contribuição previdenciária do empregador e de um estatutário que tem estabilidade, licença, direito à greve paga pelo erário e aposentadoria acima do teto do INSS.
Marta Arretche reconheceu que a legislação é insuficiente para explicar disparidades aprofundadas ao longo de ciclos econômicos que sempre contaram com grandes exércitos de reserva de mão-de-obra. Da mesma forma, o pleno emprego na Europa tem que considerar as levas de imigrantes que deixaram o continente nos últimos séculos e as baixas ocorridas com a Segunda Guerra Mundial. Mas em lugar algum do mundo a redução das desigualdades foi alcançada sem mudanças legais.
Listou os três governos europeus mais bem sucedidos na promoção de reformas que diminuíram essas desigualdades nos anos 1990 e em todos identificou em comum uma coalizão parlamentar de esquerda. Na França de Lionel Jospin a coalizão reuniu socialistas, comunistas e verdes, na Itália de Dini a reforma aprovada pela aliança de esquerda foi a mesma que havia derrubado o primeiro governo Berlusconi e, na Holanda, a entrada do partido trabalhista no governo foi condicionada ao apoio às mudanças.
Marta credita a paralisia das reformas em parte às incertezas em relação à viabilidade eleitoral da bancada do PT na disputa pós-mensalão. Na eleição de 2006 as pesquisas indicavam que o grau de identificação com a legenda tinha sofrido um baque, mas isso não impediu que o partido fizesse uma bancada maior.
As mudanças ocorridas na bancada do PT em 2006 – a redução de parlamentares da região centro-sul ligados a bandeiras sindicais e o aumento na proporção de cadeiras do Norte e Nordeste conquistadas pela associação com programas sociais e emendas parlamentares – devem se intensificar na eleição de outubro.
O novo perfil da bancada do PT pode indicar uma maior permeabilidade às propostas de redução das desigualdades no mercado de trabalho. Além da previdência complementar dos servidores há uma infinidade de projetos que foram contidos no Congresso, como a criação das fundações estatais, a limitação do gasto com pessoal e a regulamentação do direito de greve.
Entre os sindicalistas, a aposta é outra. Como não haveria no mercado eleitoral proposta que afugente o de capitais, restaria ao partido radicalizar ao lado das bandeiras do movimento. De acordo com essa tese, isso não teria sido possível no governo Lula pelo compromisso com a Carta aos Brasileiros. O PT não poderia afugentar os mercados que o presidente, a muito custo, havia acalmado. Desta vez, não há fios desencapados na sucessão, o que liberaria o PT a agir em favor das teses que o movimento acredita serem de esquerda.
Se a tese parece razoável num cenário de vitória tucana, as chances de que vingue num eventual governo Dilma estão diretamente associadas à crença de que Lula continue bancando o movimento mesmo longe do Planalto. A pergunta que fica é por que Lula, se estivesse interessado na permanência da hegemonia sindical, teria escolhido uma candidata que não soma meia dúzia de horas de assembleia.
Sindicalistas e empresários passaram a travar uma batalha pela prioridade das reformas trabalhista e sindical. O mensalão jogou Lula no colo de sua base social e as centrais acabaram descolando seu reconhecimento legal. O crescimento acelerado da economia e a fartura do crédito aquietaram o patronato.
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Ao deixar o Planalto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva desalojará do poder o movimento sindical. É muito pequena a chance de o sindicalismo manter com o eleito, seja qual for, a interlocução e o peso alcançados neste governo. Nas duas candidaturas de oposição o afastamento é explicitado pelas alianças partidárias e programáticas que os sustentam. Na campanha petista o estranhamento vai desde os desacertos em torno do programa de governo do partido à ausência de qualquer interlocutor do movimento entre seus estrategistas.
Ao longo de sua carreira no serviço público, Dilma Rousseff, apesar de egressa do trabalhismo, nunca se aproximou do movimento sindical. Como ministra da Casa Civil, foram encontros majoritariamente empresariais que pautaram sua agenda apesar da tentativa das centrais de marcar presença. Como candidata, trata com desenvoltura da abertura de capital de estatais como a Infraero e os Correios, tema que, nas campanhas presidenciais de Lula, os sindicatos fizeram de cavalo de batalha contra tucanos inertes à estratégia da mistificação.
Esse afastamento é uma sinalização de que, no próximo governo, a retomada de propostas como a desoneração da folha ou a reforma da Previdência encontrará menos resistências internas, ainda que seja cedo para supor que a divisão de cadeiras no Congresso lhe seja favorável.
Ao se iniciar, este governo tinha ambas as propostas entre suas prioridades. Chegou a propor, sem sucesso, o fim da multa de 40% do FGTS, mas conseguiu aprovar mudanças tão ou mais significativas que as do governo anterior na Previdência, como a cobrança dos inativos, a instituição do redutor do benefício e a elevação da idade mínima.
A pauta foi suspensa com o mensalão, cujo enfrentamento levou o governo a convocar as centrais sindicais para a comissão de frente. Só seria retomada em 2007 com a apresentação pelo Executivo do projeto que institui a previdência complementar para o funcionalismo.
Pela proposta, todo servidor que ingresse no setor público depois da aprovação da lei teria direito a um teto previdenciário equivalente ao da iniciativa privada (hoje R$ 3,4 mil). Quem quisesse ganhar mais que contribua com um fundo de pensão. O projeto parte do pressuposto de que o Estado não deve ser onerado pelas aposentadorias mais altas.
Em mesa de debates durante o 10º encontro da Associação Brasileira de Ciência Política que acontece esta semana no Recife a professora da USP Marta Arretche mostrou como as desigualdades no mercado de trabalho são a principal agenda social que este governo deixou inacabada.
Ao longo do governo Lula programas sociais como o Bolsa Família permitiram acesso milhões a conta bancária e a um mínimo de consumo. O crescimento da economia elevou o nível de emprego a patamares históricos. Mas na população em idade de trabalhar não são poucas as diferenças no acesso à cidadania.
Um fosso separa o trabalhador informal de um celetista com férias e repouso semanal remunerado, vale transporte, seguro desemprego e contribuição previdenciária do empregador e de um estatutário que tem estabilidade, licença, direito à greve paga pelo erário e aposentadoria acima do teto do INSS.
Marta Arretche reconheceu que a legislação é insuficiente para explicar disparidades aprofundadas ao longo de ciclos econômicos que sempre contaram com grandes exércitos de reserva de mão-de-obra. Da mesma forma, o pleno emprego na Europa tem que considerar as levas de imigrantes que deixaram o continente nos últimos séculos e as baixas ocorridas com a Segunda Guerra Mundial. Mas em lugar algum do mundo a redução das desigualdades foi alcançada sem mudanças legais.
Listou os três governos europeus mais bem sucedidos na promoção de reformas que diminuíram essas desigualdades nos anos 1990 e em todos identificou em comum uma coalizão parlamentar de esquerda. Na França de Lionel Jospin a coalizão reuniu socialistas, comunistas e verdes, na Itália de Dini a reforma aprovada pela aliança de esquerda foi a mesma que havia derrubado o primeiro governo Berlusconi e, na Holanda, a entrada do partido trabalhista no governo foi condicionada ao apoio às mudanças.
Marta credita a paralisia das reformas em parte às incertezas em relação à viabilidade eleitoral da bancada do PT na disputa pós-mensalão. Na eleição de 2006 as pesquisas indicavam que o grau de identificação com a legenda tinha sofrido um baque, mas isso não impediu que o partido fizesse uma bancada maior.
As mudanças ocorridas na bancada do PT em 2006 – a redução de parlamentares da região centro-sul ligados a bandeiras sindicais e o aumento na proporção de cadeiras do Norte e Nordeste conquistadas pela associação com programas sociais e emendas parlamentares – devem se intensificar na eleição de outubro.
O novo perfil da bancada do PT pode indicar uma maior permeabilidade às propostas de redução das desigualdades no mercado de trabalho. Além da previdência complementar dos servidores há uma infinidade de projetos que foram contidos no Congresso, como a criação das fundações estatais, a limitação do gasto com pessoal e a regulamentação do direito de greve.
Entre os sindicalistas, a aposta é outra. Como não haveria no mercado eleitoral proposta que afugente o de capitais, restaria ao partido radicalizar ao lado das bandeiras do movimento. De acordo com essa tese, isso não teria sido possível no governo Lula pelo compromisso com a Carta aos Brasileiros. O PT não poderia afugentar os mercados que o presidente, a muito custo, havia acalmado. Desta vez, não há fios desencapados na sucessão, o que liberaria o PT a agir em favor das teses que o movimento acredita serem de esquerda.
Se a tese parece razoável num cenário de vitória tucana, as chances de que vingue num eventual governo Dilma estão diretamente associadas à crença de que Lula continue bancando o movimento mesmo longe do Planalto. A pergunta que fica é por que Lula, se estivesse interessado na permanência da hegemonia sindical, teria escolhido uma candidata que não soma meia dúzia de horas de assembleia.
Sindicalistas e empresários passaram a travar uma batalha pela prioridade das reformas trabalhista e sindical. O mensalão jogou Lula no colo de sua base social e as centrais acabaram descolando seu reconhecimento legal. O crescimento acelerado da economia e a fartura do crédito aquietaram o patronato.
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O PT e a "blindagem" da mídia aos tucanos
Reproduzo matéria de Anselmo Massad, publicada na Rede Brasil Atual:
Ativistas e lideranças do PT de São Paulo defenderam, em encontro na noite de quinta-feira (5) no centro da capital, ações para acabar com o que chamaram de blindagem da mídia aos governos do PSDB. Para eles, os meios de comunicação do estado são os principais responsáveis pela continuidade tucana no Palácio dos Bandeirantes.
O encontro buscava detalhar propostas de políticas de comunicação para um eventual governo de Aloízio Mercadante, candidato da legenda em São Paulo. Para Aparecido Luiz da Silva, o Cidão, secretário de Comunicação do PT-SP, um dos caminhos seria adotar um modelo de distribuição de anúncios do setor público semelhante ao empregado na gestão federal. "Precisaríamos dividir o bloco publicitário com os veículos menores, do interior e democratizar a comunicação, para não passar quatro anos de raiva com a mídia falando mal da gente", sugeriu.
Para Paulo Salvador, diretor da Editora Atitude, que produz a Rede Brasil Atual, a Revista do Brasil, a Rádio e os jornais Brasil Atual, é preciso superar um patamar de ingenuidade. "A ideia de que uma boa assessoria de imprensa resolve já se mostrou equivocada, porque a mídia é destrutiva em relação às construções sociais. Não podemos acreditar que vamos mudar o país e o estado com essa mídia que não tem apreço sequer à verdade e aos fatos", criticou.
"É necessária uma tomada de consciência de que a comunicação é estratégica", insistiu. Salvador usou a articulação de 60 sindicatos em torno dos projetos de comunicação a que representa como um exemplo dessa prioridade.
"Após oito anos de governo Lula, deveríamos estar democratizando a comunicação", criticou Joaquim Palhares, diretor da agência Carta Maior. "Na América Latina, o que se vê (em termos de democracia nos meios de comunicação) é ainda pior, o que nos coloca em uma posição de fragilidade da soberania dos povos", avalia. Ele considera que sem avançar na pluralidade da mídia, "perde-se tudo em cinco anos de governo de direita", por não terem sido estabelecidas raízes das transformações junto à população.
Palhares mostrou que todos os veículos da mídia conservadora, os maiores grupos, dependem de verba publicitária do setor público. Por isso, ele defendeu que, em uma eventual gestão de Mercadante, 20% dos recursos publicitários do estado sejam destinados a criar um fundo para projetos de comunicação escolhidos por meio de editais públicos.
Essas e outras propostas colhidas no encontro, realizado instantes antes do início do primeiro debate entre os presidenciávies, poderão ser incorporadas ao programa de governo petista em São Paulo.
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Ativistas e lideranças do PT de São Paulo defenderam, em encontro na noite de quinta-feira (5) no centro da capital, ações para acabar com o que chamaram de blindagem da mídia aos governos do PSDB. Para eles, os meios de comunicação do estado são os principais responsáveis pela continuidade tucana no Palácio dos Bandeirantes.
O encontro buscava detalhar propostas de políticas de comunicação para um eventual governo de Aloízio Mercadante, candidato da legenda em São Paulo. Para Aparecido Luiz da Silva, o Cidão, secretário de Comunicação do PT-SP, um dos caminhos seria adotar um modelo de distribuição de anúncios do setor público semelhante ao empregado na gestão federal. "Precisaríamos dividir o bloco publicitário com os veículos menores, do interior e democratizar a comunicação, para não passar quatro anos de raiva com a mídia falando mal da gente", sugeriu.
Para Paulo Salvador, diretor da Editora Atitude, que produz a Rede Brasil Atual, a Revista do Brasil, a Rádio e os jornais Brasil Atual, é preciso superar um patamar de ingenuidade. "A ideia de que uma boa assessoria de imprensa resolve já se mostrou equivocada, porque a mídia é destrutiva em relação às construções sociais. Não podemos acreditar que vamos mudar o país e o estado com essa mídia que não tem apreço sequer à verdade e aos fatos", criticou.
"É necessária uma tomada de consciência de que a comunicação é estratégica", insistiu. Salvador usou a articulação de 60 sindicatos em torno dos projetos de comunicação a que representa como um exemplo dessa prioridade.
"Após oito anos de governo Lula, deveríamos estar democratizando a comunicação", criticou Joaquim Palhares, diretor da agência Carta Maior. "Na América Latina, o que se vê (em termos de democracia nos meios de comunicação) é ainda pior, o que nos coloca em uma posição de fragilidade da soberania dos povos", avalia. Ele considera que sem avançar na pluralidade da mídia, "perde-se tudo em cinco anos de governo de direita", por não terem sido estabelecidas raízes das transformações junto à população.
Palhares mostrou que todos os veículos da mídia conservadora, os maiores grupos, dependem de verba publicitária do setor público. Por isso, ele defendeu que, em uma eventual gestão de Mercadante, 20% dos recursos publicitários do estado sejam destinados a criar um fundo para projetos de comunicação escolhidos por meio de editais públicos.
Essas e outras propostas colhidas no encontro, realizado instantes antes do início do primeiro debate entre os presidenciávies, poderão ser incorporadas ao programa de governo petista em São Paulo.
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Blogosfera: A turma da Kombi faz a hora
Reproduzo artigo de Lula Miranda, publicado no sítio Carta Maior:
O texto que segue versa sobre o poder da internet [mais precisamente da chamada “blogosfera”] na modificação do paradigma da comunicação e da mídia no país, e, como conseqüência ou instância última, na transformação da sociedade. É um “corte”. Apesar de longo [peço-lhe desculpas de antemão por ser demasiado prolixo] esse artigo é um pequeno-grande capítulo dessa história. O título, para aqueles que ainda não perceberam, alude a certa frase de um certo ex-presidente da Suprema Corte do país, e também àquela antiga canção de protesto “Para não dizer que não falei de flores” mais conhecida como “Caminhando e Cantando”. A alusão a essa canção, por sua vez, pretende remeter àqueles tempos em que alguns jovens “idealistas” sonhavam mudar o Brasil. A tal “turma da Kombi” seria, na visão dos “reacionários”, o povo da blogosfera que, agora, “faz a hora, não espera acontecer”.
A comunicação no Brasil está mudando. Graças à internet. O Brasil está mudando. Graças ao bafejar dos ventos mudancistas soprados por uns tais “militantes da utopia”, por aqueles que desejam e combatem, desde sempre, seja enfrentando a sordidez da real política seja navegando/militando na blogosfera, por uma democracia plena e, mais ainda, desejosos que este país seja, de fato, um país de/para todos os brasileiros.
[Contextualizando: a atmosfera que se respirava na época ou a “ambiência”. Vivia-se a retomada da anima esquerdista, incorporava-se o espírito das reuniões do Fórum Social Mundial que nos ensinava que “um outro mundo era possível”. Se um outro mundo era possível, então uma nova comunicação também era possível e, mais que isso, necessária. Diversas reuniões e conferências sobre comunicação “pipocavam” por todo o país]
Os blogs, no começo utilizados por alguns como uma espécie de singelo diário eletrônico ou virtual, evoluiu, amadureceu bastante [mas ainda não o suficiente] e se transformou, nos dias que correm, em vital instrumento de comunicação e combate aos humores do “mercadismo” e à grande mídia oligopolista, que, sabemos, era pretensa detentora do monopólio da verdade. Ou seja: a versão deles dos fatos [e da história] era a que prevalecia, posto que apenas veiculava-se essa versão “única”, apenas essa única maneira de ver o mundo tinha espaço. Hoje, não mais. Graças ao poder da participação do cidadão. Graças à força da cidadania.
“Cidadania.com” era, a propósito, o nome de um desses blogs precursores. Pilotado por um comerciante, um cidadão comum que, inconformado com as manipulações e inverdades publicadas diuturnamente pelos grandes jornais, resolvera ir à luta e “botar a boca no trombone”. Esse homem comum foi, decerto, a princípio, utilizado/manietado como um “inocente útil” pelos colunistas e editores desses “jornalões”. Mas, quando passou obstinadamente a buscar “a verdade”, tal qual um Quixote redivivo, foi logo descartado e rotulado de “louco” por esses mesmos colunistas e editores que antes lhe davam guarida e paparicavam. O espírito ali já se revelava outro: o homem comum, o leitor, buscava participar da tessitura da realidade, da notícia. Quem sabe faz a hora. O homem ordinário desejava ser extraordinário.
Eduardo Guimarães [este é o nome desse personagem], talvez após constatar que a solução para aquele problema que lhe incomodava deveras [e a muitos como ele] não passava somente pelo estratagema, digamos, bem intencionado, mas talvez ingênuo, de melhorar o jornalismo praticado pelos grandes veículos/grupos de comunicação utilizando-se tão-somente de esporádicas manifestações nos espaços dedicados aos leitores, teve então a idéia de criar um movimento agrupando aqueles que, como ele, se sentiam sem vez e voz, incomodados com o “duplipensar” e a “novilíngua” daquela imprensa que, desde sempre – agora, enfim, ele comprovara – esteve a serviço dos chamados “donos do poder”. Guimarães [e muitos com ele] naquele instante apreendeu a lição. Nascia então o MSM – Movimento dos Sem Mídia.
E foi exatamente esse mesmo MSM que, a despeito das suas fragilidades e insuficiências, dentre as várias ações que realizou, empreendeu uma que marcou, de modo indelével, definitivo a história dessas eleições de 2010. O movimento, agora uma ONG, entrou com uma representação na Procuradoria Geral Eleitoral (PGE) ajuizando a abertura de um processo em que solicita auditoria, fiscalização e acompanhamento das pesquisas realizadas por todos os institutos, pois havia fortes indícios de manipulação nessas sondagens [as principais suspeitas recaíam sobre DataFolha e Ibope]. O inquérito foi aberto e o processo instaurado (Nº 4559.2010-33). A Polícia Federal está investigando. Daí em diante, as empresas de pesquisas, e também o PIG, colocaram as barbas de molho. Não dava mais para mexer nos dados, dar uns 10 ou 12 pontos de vantagem ao candidato da oposição de direita e dizer-lhe: “Vai que a gente garante!”. Esse “empurrãozinho” fraudulento o conduziria direto ao abismo.
Porém, nessa breve história que lhes conto aqui existem outros, vários protagonistas e precursores. E é essa exatamente a principal característica da “blogosfera”: o chamado “protagonismo cidadão”. Leitores e articulistas-militantes se envolvem numa quase-perfeita sintonia. As notícias e opiniões são comentadas e, muitas vezes, contestadas em tempo real. Os comentários postados são, algumas das vezes, mais ricos e esclarecedores que os próprios artigos ou “posts” originais. Os leitores são agentes ativos do debate nacional, não mais passivos.
Para assomo de alguns “puristas”, alguns jornalistas egressos da grande mídia também se engajaram nessa intrincada, árdua e aparentemente inglória tarefa de construir e trilhar os caminhos de uma nova comunicação. Antes, você deve se lembrar, esse mister, esse ofício era atribuído à chamada imprensa alternativa. Surgem, porém, nomes de “celebridades” proscritas da grande mídia como “o impagável” Paulo Henrique Amorim e “o mineiríssimo” Luis Nassif, bem como nomes mais ou menos célebres como Luiz Carlos Azenha e Rodrigo Vianna, dentre outros.
Nassif tatuou a ferro e fogo seu nome nessa história quando publicou em seu blog o “Dossiê Veja”, onde revela os bastidores sombrios e pútridos desse semanário e da grande imprensa em geral – em decorrência disso responde hoje a inúmeros processos com custos (ou seriam custas?) de difícil mensuração. Atravessou para o lado de cá e queimou as caravelas que poderiam conduzir-lhe de volta. Nassif comeu o pão que o diabo amassou. Hoje pilota uma das mais instigantes e competentes experiências em jornalismo colaborativo na blogosfera.
Paulo Henrique Amorim, com seu jeito bonachão e galhofeiro de “bom carioca” foi intrépido e arriscou: deu vez e voz ao valente e “ínclito” delegado Protógenes Queiroz em sua luta contra o “banqueiro bandido” [nas palavras deste último]. Bateu de frente com gigantes das telecomunicações e foi “saído” do portal IG. É dele a “tirada”: “O supremo presidente do Supremo, Gilmar Dantas – como diria o Noblat”. Paulo Henrique também responde a inúmeros processos na Justiça. É inegável a importante contribuição que esses “traidores” da grande imprensa, por assim dizer [com o auxílio da ferina ironia do destino], deram à causa desses aqui chamados “militantes da utopia” ou, como querem alguns, dessa “turma que não enche uma Kombi”.
A estes se somam, como disse, outros, vários, diversos personagens anônimos [já nem tão anônimos assim] e protagonistas nesse “levante” dos “utopistas”. Ouso citar alguns só para cometer o pecado de me esquecer de muitos.
São importantes personagens dessa nova comunicação veículos como Carta Maior, Caros Amigos [faço aqui uma referência e reverência ao saudoso Sergio de Souza], Revista Carta Capital, ConversaAfiada, Nassif OnLine, Vi o Mundo, Escrevinhador, Blog da Cidadania, Vermelho.org.br [e o blog do Miro], Revista Fórum [revista, site e blog capitaneado por Renato Rovai], Revista do Brasil [alô, alô, Paulo Donizette!], RS Urgente, Abunda Canalha, Amigos do Presidente Lula [alô, alô, Helena Stephanowitz!], Óleo do Diabo, Cloaca News, Tijolaço [blog do jovem e valente deputado Brizola Neto - como o nome “entrega”, neto do saudoso e valoroso Leonel Brizola].
Não tenho aqui a pretensão de contar toda essa grande história em toda sua magnitude e dimensão; de enumerar/citar todos os seus mais importantes feitos, fatos e personagens – pois são muitos os seus aguerridos combatentes. Tampouco tenho a pretensão de mostrar a melhor visão ou enfoque desse rico movimento, essa onda que hoje se levanta diante de nossas retinas já tão fatigadas cristalizando o tal “quem sabe faz a hora acontecer”.
Trata-se apenas, como disse, de um “corte”, um “primeiro capítulo” de uma obra em construção. Mais um olhar, mais uma palavra semeada que, característica inerente a essa nova comunicação libertária, soma-se à sua visão e palavra, prezado leitor-cidadão, e se espalha. Enredo que se enreda rede adentro, mundo afora, por intermédio da internet e da blogosfera.
Não mais a serviço de um único tutor ou “dono”, seja esse “dono” uma empresa, um “coroné”, um partido ou uma determinada oligarquia. Sempre a serviço da “causa”. Qual seja: uma comunicação revolucionária, democrática e um Brasil para todos.
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O texto que segue versa sobre o poder da internet [mais precisamente da chamada “blogosfera”] na modificação do paradigma da comunicação e da mídia no país, e, como conseqüência ou instância última, na transformação da sociedade. É um “corte”. Apesar de longo [peço-lhe desculpas de antemão por ser demasiado prolixo] esse artigo é um pequeno-grande capítulo dessa história. O título, para aqueles que ainda não perceberam, alude a certa frase de um certo ex-presidente da Suprema Corte do país, e também àquela antiga canção de protesto “Para não dizer que não falei de flores” mais conhecida como “Caminhando e Cantando”. A alusão a essa canção, por sua vez, pretende remeter àqueles tempos em que alguns jovens “idealistas” sonhavam mudar o Brasil. A tal “turma da Kombi” seria, na visão dos “reacionários”, o povo da blogosfera que, agora, “faz a hora, não espera acontecer”.
A comunicação no Brasil está mudando. Graças à internet. O Brasil está mudando. Graças ao bafejar dos ventos mudancistas soprados por uns tais “militantes da utopia”, por aqueles que desejam e combatem, desde sempre, seja enfrentando a sordidez da real política seja navegando/militando na blogosfera, por uma democracia plena e, mais ainda, desejosos que este país seja, de fato, um país de/para todos os brasileiros.
[Contextualizando: a atmosfera que se respirava na época ou a “ambiência”. Vivia-se a retomada da anima esquerdista, incorporava-se o espírito das reuniões do Fórum Social Mundial que nos ensinava que “um outro mundo era possível”. Se um outro mundo era possível, então uma nova comunicação também era possível e, mais que isso, necessária. Diversas reuniões e conferências sobre comunicação “pipocavam” por todo o país]
Os blogs, no começo utilizados por alguns como uma espécie de singelo diário eletrônico ou virtual, evoluiu, amadureceu bastante [mas ainda não o suficiente] e se transformou, nos dias que correm, em vital instrumento de comunicação e combate aos humores do “mercadismo” e à grande mídia oligopolista, que, sabemos, era pretensa detentora do monopólio da verdade. Ou seja: a versão deles dos fatos [e da história] era a que prevalecia, posto que apenas veiculava-se essa versão “única”, apenas essa única maneira de ver o mundo tinha espaço. Hoje, não mais. Graças ao poder da participação do cidadão. Graças à força da cidadania.
“Cidadania.com” era, a propósito, o nome de um desses blogs precursores. Pilotado por um comerciante, um cidadão comum que, inconformado com as manipulações e inverdades publicadas diuturnamente pelos grandes jornais, resolvera ir à luta e “botar a boca no trombone”. Esse homem comum foi, decerto, a princípio, utilizado/manietado como um “inocente útil” pelos colunistas e editores desses “jornalões”. Mas, quando passou obstinadamente a buscar “a verdade”, tal qual um Quixote redivivo, foi logo descartado e rotulado de “louco” por esses mesmos colunistas e editores que antes lhe davam guarida e paparicavam. O espírito ali já se revelava outro: o homem comum, o leitor, buscava participar da tessitura da realidade, da notícia. Quem sabe faz a hora. O homem ordinário desejava ser extraordinário.
Eduardo Guimarães [este é o nome desse personagem], talvez após constatar que a solução para aquele problema que lhe incomodava deveras [e a muitos como ele] não passava somente pelo estratagema, digamos, bem intencionado, mas talvez ingênuo, de melhorar o jornalismo praticado pelos grandes veículos/grupos de comunicação utilizando-se tão-somente de esporádicas manifestações nos espaços dedicados aos leitores, teve então a idéia de criar um movimento agrupando aqueles que, como ele, se sentiam sem vez e voz, incomodados com o “duplipensar” e a “novilíngua” daquela imprensa que, desde sempre – agora, enfim, ele comprovara – esteve a serviço dos chamados “donos do poder”. Guimarães [e muitos com ele] naquele instante apreendeu a lição. Nascia então o MSM – Movimento dos Sem Mídia.
E foi exatamente esse mesmo MSM que, a despeito das suas fragilidades e insuficiências, dentre as várias ações que realizou, empreendeu uma que marcou, de modo indelével, definitivo a história dessas eleições de 2010. O movimento, agora uma ONG, entrou com uma representação na Procuradoria Geral Eleitoral (PGE) ajuizando a abertura de um processo em que solicita auditoria, fiscalização e acompanhamento das pesquisas realizadas por todos os institutos, pois havia fortes indícios de manipulação nessas sondagens [as principais suspeitas recaíam sobre DataFolha e Ibope]. O inquérito foi aberto e o processo instaurado (Nº 4559.2010-33). A Polícia Federal está investigando. Daí em diante, as empresas de pesquisas, e também o PIG, colocaram as barbas de molho. Não dava mais para mexer nos dados, dar uns 10 ou 12 pontos de vantagem ao candidato da oposição de direita e dizer-lhe: “Vai que a gente garante!”. Esse “empurrãozinho” fraudulento o conduziria direto ao abismo.
Porém, nessa breve história que lhes conto aqui existem outros, vários protagonistas e precursores. E é essa exatamente a principal característica da “blogosfera”: o chamado “protagonismo cidadão”. Leitores e articulistas-militantes se envolvem numa quase-perfeita sintonia. As notícias e opiniões são comentadas e, muitas vezes, contestadas em tempo real. Os comentários postados são, algumas das vezes, mais ricos e esclarecedores que os próprios artigos ou “posts” originais. Os leitores são agentes ativos do debate nacional, não mais passivos.
Para assomo de alguns “puristas”, alguns jornalistas egressos da grande mídia também se engajaram nessa intrincada, árdua e aparentemente inglória tarefa de construir e trilhar os caminhos de uma nova comunicação. Antes, você deve se lembrar, esse mister, esse ofício era atribuído à chamada imprensa alternativa. Surgem, porém, nomes de “celebridades” proscritas da grande mídia como “o impagável” Paulo Henrique Amorim e “o mineiríssimo” Luis Nassif, bem como nomes mais ou menos célebres como Luiz Carlos Azenha e Rodrigo Vianna, dentre outros.
Nassif tatuou a ferro e fogo seu nome nessa história quando publicou em seu blog o “Dossiê Veja”, onde revela os bastidores sombrios e pútridos desse semanário e da grande imprensa em geral – em decorrência disso responde hoje a inúmeros processos com custos (ou seriam custas?) de difícil mensuração. Atravessou para o lado de cá e queimou as caravelas que poderiam conduzir-lhe de volta. Nassif comeu o pão que o diabo amassou. Hoje pilota uma das mais instigantes e competentes experiências em jornalismo colaborativo na blogosfera.
Paulo Henrique Amorim, com seu jeito bonachão e galhofeiro de “bom carioca” foi intrépido e arriscou: deu vez e voz ao valente e “ínclito” delegado Protógenes Queiroz em sua luta contra o “banqueiro bandido” [nas palavras deste último]. Bateu de frente com gigantes das telecomunicações e foi “saído” do portal IG. É dele a “tirada”: “O supremo presidente do Supremo, Gilmar Dantas – como diria o Noblat”. Paulo Henrique também responde a inúmeros processos na Justiça. É inegável a importante contribuição que esses “traidores” da grande imprensa, por assim dizer [com o auxílio da ferina ironia do destino], deram à causa desses aqui chamados “militantes da utopia” ou, como querem alguns, dessa “turma que não enche uma Kombi”.
A estes se somam, como disse, outros, vários, diversos personagens anônimos [já nem tão anônimos assim] e protagonistas nesse “levante” dos “utopistas”. Ouso citar alguns só para cometer o pecado de me esquecer de muitos.
São importantes personagens dessa nova comunicação veículos como Carta Maior, Caros Amigos [faço aqui uma referência e reverência ao saudoso Sergio de Souza], Revista Carta Capital, ConversaAfiada, Nassif OnLine, Vi o Mundo, Escrevinhador, Blog da Cidadania, Vermelho.org.br [e o blog do Miro], Revista Fórum [revista, site e blog capitaneado por Renato Rovai], Revista do Brasil [alô, alô, Paulo Donizette!], RS Urgente, Abunda Canalha, Amigos do Presidente Lula [alô, alô, Helena Stephanowitz!], Óleo do Diabo, Cloaca News, Tijolaço [blog do jovem e valente deputado Brizola Neto - como o nome “entrega”, neto do saudoso e valoroso Leonel Brizola].
Não tenho aqui a pretensão de contar toda essa grande história em toda sua magnitude e dimensão; de enumerar/citar todos os seus mais importantes feitos, fatos e personagens – pois são muitos os seus aguerridos combatentes. Tampouco tenho a pretensão de mostrar a melhor visão ou enfoque desse rico movimento, essa onda que hoje se levanta diante de nossas retinas já tão fatigadas cristalizando o tal “quem sabe faz a hora acontecer”.
Trata-se apenas, como disse, de um “corte”, um “primeiro capítulo” de uma obra em construção. Mais um olhar, mais uma palavra semeada que, característica inerente a essa nova comunicação libertária, soma-se à sua visão e palavra, prezado leitor-cidadão, e se espalha. Enredo que se enreda rede adentro, mundo afora, por intermédio da internet e da blogosfera.
Não mais a serviço de um único tutor ou “dono”, seja esse “dono” uma empresa, um “coroné”, um partido ou uma determinada oligarquia. Sempre a serviço da “causa”. Qual seja: uma comunicação revolucionária, democrática e um Brasil para todos.
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“A mídia é concentrada e de direita”
Reproduzo entrevista concedida ao jornalista Osvaldo Bertolino, publicada no sítio da Fundação Maurício Grabois:
Nesta entrevista ao Grabois.org, o jornalista, secretário de Mídia do PCdoB e presidente do Centro de Estudos de Mídia Alternativa Barão de Itararé Altamiro Borges comenta o papel da mídia na formação do Brasil. Para ele, há duas tendências na mídia que não se revertem a não ser com rupturas. Uma é concentração e a outra a maior capacidade de manipulação. “Cada vez mais ela é concentrada e cada vez com posições mais à direita”, diz. Segundo Altamiro Borges, a mídia alternativa tem o papel de fazer a disputa com setores formadores de opinião. Mas não ganha eleição. “O que ganha a eleição são as mudanças no Brasil”, afirma.
O que é o Centro de Estudos de Mídia Alternativa Barão de Itararé. O que é?
A ideia é fruto dos dois últimos anos, 2008 e 2009, em que o debate sobre democratização da comunicação ganhou certo impulso, principalmente no ano passado com a convocação da Conferência Nacional de Comunicação (Confecom). Essa era uma reivindicação antiga dos movimentos sociais. No interior do governo havia quem era contra. Havia forte pressão das empresas de comunicação para não se realizar a Conferência. Mas ela saiu. Foi convocada em janeiro, depois de anunciada no Fórum Social Mundial de Belém (FSM) em Belém, Pará, pelo presidente Lula anunciou. Para surpresa de muita gente, saiu. Isso fez com que o debate sobre comunicação ganhasse outra dimensão no Brasil.
O Barão de Itararé é fruto desse movimento. Aglutinou muita gente, trouxe à tona muitos que inclusive estão na chamada grande imprensa e que tem uma posição crítica. Muitas entidades do movimento social se inseriram nessa batalha. O Centro não nasceu do nada. Nasceu dessa luta pela democratização da comunicação, casada evidentemente com sua antítese — que é o desmascaramento da mídia hegemônica. Conforme vai caindo a ficha do que representa essa mídia, a luta pela democratização da comunicação cresce.
A ideia do Barão de Itararé, primeiro, é essa homenagem a um grande jornalista brasileiro, Aparício Fernando Brinkerhoff Torelly, um gaúcho que fez toda a sua história no Rio de Janeiro. Foi inclusive foi vereador do Partido Comunista do Brasil, o PCB, no Rio de Janeiro. Era um jornalista muito crítico. Ele foi o jornalista que fez a primeira imprensa alternativa no Brasil — tirando a imprensa sindical, anarquista e comunista. A primeira imprensa alternativa não partidária e nem sindical no Brasil, como o jornal A Manha, o Almanhaque.
Outra característica dele foi a irreverência, a ironia. O Barão é considerado o pai do humorismo no Brasil. Por isso, resolvemos fazer uma homenagem a essa figura, cujas idéias casam com o período que estamos vivendo. Esse movimento de sites, blogs é muito irreverente. A ideia do Barão é agregar essas pessoas, os vários movimentos sociais, agregar as entidades que lutam pela democratização da comunicação, as várias publicações, sites, revistas, jornais que têm um papel contra-hegemônico. E agregar pessoas que têm tido um papel importante na denúncia dessa mídia golpista. Pessoas como Paulo Henrique Amorim, Luis Nassif, Leandro Fortes, Maria Inês Nassif, Luis Carlos Azenha, Rodrigo Viana etc.
São pessoas que têm tido uma contribuição muito grande para estimular o senso crítico, um jornalismo mais crítico. O Barão procura agregar tudo isso. Para quê? Basicamente para quatro coisas: contribuir para o fortalecimento da luta pela democratização da comunicação; contribuir para o fortalecimento das mídias alternativas já existentes ou por existir - como blogs, sites, rádios comunitárias, TVs comunitárias, TVs públicas etc. -; e ajudar na formação dessa galera. Aprendo com ela, pois não há teoria pronta para isso. No intercâmbio vamos construir uma formação, desde o jornalista que está na faculdade — que está sendo formado para ser William Bonner e Fátima Bernardes da vida, mas que poderia ter um senso crítico maior — até a pessoa que está fazendo radiodifusão comunitária, jornal sindical, jornal de bairro.
A idéia é ajudar na pesquisa, no estudo, tentar entender mais o que ocorre com a mídia não apenas no sentido do reativo. Essa mídia que está aí é a nossa crítica, mas estudar principalmente o que está pintando de novo, porque há muita coisa nova. Alguns autores até chamam de nova mídia. Então, tentar entender o que está acontecendo e potencializar isso.
Você diria que o Barão é resultado dessa ressaca da mídia dominante, depois daquela investida feroz, golpista contra o governo Lula?
Para mim, ele é resultado de duas coisas. Do desmascaramento e da ressaca dessa mídia que está aí, com sua overdose de manipulação e golpismo, de preconceito, de pensamento único. E é resultado não apenas da constatação, não apenas da ressaca, mas da reação a essa overdose. É resultado da crítica e do movimento. Da crítica a essa mídia que está aí e do movimento que vem sendo feito principalmente nesse último período por democratização da comunicação no Brasil. A meu ver, são essas duas coisas.
Você acha que a mídia, depois dessa invertida na tentativa frustrada de golpe contra o governo Lula, tem força nestas eleições?
A meu ver, tem. Para mim, a mídia perdeu força. Hoje ela é mais vulnerável. Mais vulnerável basicamente por três razões. Primeiro pela própria mudança tecnológica. O velho Marx tinha razão, porque quando as forças produtivas se mexem outras coisas se movem. O fato de haver alterações profundas na base tecnológica da comunicação, como a internet, fragilizou essa mídia. Vê-se uma queda de tiragem de jornais. Isso não apenas no Brasil.
No Brasil chama a atenção o fato de a Folha de S.Paulo, que na década de 1980 tinha uma tiragem de 1.000.000 /1.100 milhão exemplares aos domingos, hoje ter 300 mil. É um negócio impressionante. O mesmo se dá com o Estadão, com O Globo, com o Correio Brasiliense. Porque houve uma migração dessa mídia impressa para a mídia virtual, para a internet. Isso ocorre não só a mídia impressa. Mesmo a televisão está perdendo audiência. Esse é um fenômeno que se verifica nos Estados Unidos, na Europa, e começa a se verificar no Brasil. As pessoas estão saindo da TV, que é uma coisa unidirecional: o sujeito está lá, sentado no sofá, e ouve todas as abobrinhas ditas. A pessoa é passiva. Já a internet que é mais interativa. A pessoa pode escrever, colocar o filme dela, a foto.
Acho que na crise dessa mídia tradicional tem como primeira razão a questão tecnológica. A segunda é a crise de credibilidade – que Emir Sader chama de crise moral –, porque essa mídia vem se desgastando no Brasil e no mundo. Veja nos EUA, onde se destacou a capacidade de manipulação da mídia na preparação da invasão do Iraque. Tudo o que se disse sobre armas químicas e bacteriológicas era papo furado, era mentira do Bush que a mídia amplificou. O único jornal que reconheceu isso foi o The New York Times — embora timidamente.
Fico imaginando na Venezuela, onde houve um golpe que foi orquestrado pela mídia. O próprio Chávez chama de golpe midiático. Aquele povo não acredita muito na mídia, não chora de amores pela RCTV, que teve a outorga cancelada recentemente. E nem pela Globovisión, com seu dono metido em corrupção. Outro exemplo é a Bolívia, onde quase 90% das notícias na campanha eleitoral, na vitória de Morales, foram contra ele. Ou no Brasil. Há uma crise de credibilidade.
Acho que um terceiro fator é o crescimento de uma consciência crítica, que se materializa até em mudanças legislativas. Têm ocorrido mudanças importantes na Venezuela, no Uruguai, na Argentina, na Nicarágua, em El Salvador, Equador, na Bolívia etc. Portanto, começa a ter não só perda de credibilidade, mas começa a se pensar em alternativas. Políticas públicas, regulamentação. Por isso, acho que essa mídia está em crise. Mas não acho que essa crise tire o poder da mídia. Ela ainda tem ainda muita capacidade de interferir na sociedade.
Há a tese de que acabou-se aquela história da pedra na lagoa que bate e se expande. As redes estariam superando esse efeito. Mas não superam a TV Globo. A TV Globo tem um poder monstruoso. Pegue pela Copa. Nas ruas o povo repete a argumentação da Globo. O Dunga – e olha que eu não gosto do Dunga, acho um técnico retranqueiro – é o vilão e a Globo, coitadinha, a vítima. A televisão ainda tem um papel fenomenal. Os jornais têm um papel fenomenal. A revista Veja, com 1 milhão de exemplares para a classe média, faz a cabeça. Acho que a mídia está mais vulnerável, mas não significa que ela perdeu o seu papel.
Existe uma pesquisa do Vox Populi que mostra que, em 2006, se não fosse o papel da Globo a eleição teria sido decidida no primeiro turno. Aquela onda que a Globo fez nos dois últimos dias, com os tais dos aloprados com pacotes de dinheiro, fez com que 6% do eleitorado se movessem. Foi o que garantiu o segundo turno. Por isso, acho que ela ainda tem muito poder. Às vezes o pessoal brinca que a mídia está na UTI. Nada, a mídia para ir para a UTI ainda vai demorar um bocado.
Você vê um componente ideológico nesses movimentos, baseado no fato de que o sistema norte-americano vai mais para a direita e desperta seu contraponto?
Gramsci, uma figura interessante, ao estudar mais essas chamadas sociedades complexas do Ocidente, como ficou a terminologia, estudou a questão da luta ideológica, o papel da hegemonia. E Gramsci, já nas décadas de 1920 e 1930, disse que quando as instituições da burguesia entram em crise a imprensa – não era a mídia – ocupa o papel do partido da classe dominante, ocupa o papel do partido do capital. Hoje, as instituições burguesas estão com dificuldades de administrar esse mundo cada vez mais sob a hegemonia do capital financeiro, cada vez mais desregulado. Há uma crise dessas instituições e a imprensa passa a ocupar o papel mais proeminente na sociedade.
Não quer dizer que ela não ocupasse isso no passado. Ela já ocupava. Se pegarmos a história do Brasil, o papel da imprensa foi decisivo. Veja o papel do Estadão na época de Canudos. Peguemos fatos mais recentes, de 60 anos para cá – no governo Getúlio Vargas, por exmplo, no governo do Juscelino Kubitschek. Ou o fato dramático que foi o golpe de 1964. Quem ajudou a preparar o golpe de 1964 foi a imprensa. Inclusive, certos chavões ditos hoje são mesmos daquela época. Eles não têm nem criatividade para mudá-los. A história de república sindical que a revista Época recentemente usou tem as mesmas terminologias.
Há um estudo impressionante de um pesquisador da Fundação Getúlio Vargas sobre o papel que a imprensa teve na Constituinte. Como ela foi moldando a Constituinte. Lembremos o papel que a imprensa teve na campanha das diretas, na eleição de Collor. Acho que cada vez mais ela vai por uma confluência, porque adquiriu maior poder econômico. O o setor de comunicação e de telecomunicação é um dos setores que mais cresce na economia mundial. Isso decorre da fragilidade, da crise vivida pelo capital. A mpidia passa a ocupar o papel de partido do capital de forma mais proeminente. E o partido do capital, na situação do mundo atual, tem uma marca reacionária muito forte.
O capital vai contra a humanidade. Esse sistema é contra a humanidade. Portanto, para se expressar a hegemonia desse sistema é preciso ter uma atitude cada vez mais reacionária. Há duas tendências na mídia que não se revertem a não ser com rupturas. Uma é concentração e a outra a maior capacidade de manipulação. São duas tendências: concentração e direitização. Cada vez mais ela é concentrada e cada vez com posições mais à direita. Lógico, com contradições. Não dá para ter uma visão também fechada, totalmente blocada.
No Brasil já temos uma concentração histórica. Você falou do golpe de 1964. No pós-golpe de 1964 começou a montagem desses grupos poderosos...
Já havia concentração antes. Porque temos problemas na legislação brasileira e na tradição brasileira. Na Europa, por exemplo, principalmente no pós-Segunda Guerra Mundial, enfrentou-se o papel que a imprensa teve no surgimento do nazi-fascismo. Estudou-se uma forma de democratizar a comunicação, de quebrar aqueles monopólios que foram incentivadores ou cúmplices do nazi-fascismo. Surgiu então a rede pública, como a BBC de Londres, que vem da resistência ao nazi-fascismo. Surgem também TVs públicas na França, na Itália. Mesmo nos EUA há uma rede pública com certa força.
No Brasil, nunca tivemos uma rede pública. Getúlio tenta montar uma, por meio da Rádio Nacional, mas não prosperou. Esse é um problema da mídia brasileira, só há o setor privado. Agora é que estão começando os primeiros passos da montagem de uma rede pública com a da Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Então.
Um segundo problema é que nunca houve regulamentação desse setor no Brasil. Há regulamentação nessa área de mídia em várias partes do mundo. Nos EUA, por exemplo, o órgão regulamentador é forte — existem mais de 100 cassações e outorgas de TV e rádio por desrespeito à lei, à Constituição. No Brasil, sem nenhuma regulamentação o início da concentração começou cedo. O caso mais famoso é o de Assis Chateaubriand com os Diários Associados. Foi um baita império midiático. Com vários jornais, depois rádios. A biografia dele escrita pelo Fernando Morais é muito interessante. Ele era um chantagista, um mercenário da mídia.
A Globo, esse império, foi construída com o apoio da ditadura militar. Esse império só existiu por causa da ditadura militar, que permitou acordos lesivos, acordos contrários à legislação. O nascimento da TV Globo em aliança com uma empresa estadunidense, a Time Life, era proibido mas foi permitido. A Globo cresceu à sombra do regime militar. Aí é que ela se transforma num grande império. Hoje é isso, há sete famílias que dominam a mídia brasileira. É um negócio impressionante. São sete famílias.
Como essas famílias se realcionavam com o Estado? Temos exemplos mais recentes, como o caso das famosas concessões do ex-ministro das Comunicações, Antônio Carlos Magalhães (ACM).
A isso o professor Vinicius Lima chama de coronelismo eletrônico. Há o coronelismo do campo brasileiro e o coronelismo eletrônico. Tudo numa relação de promiscuidade, patrimonialismo com Estado, concessões, apoios. Então, vão sendo constituídos esses grandes grupos por meio de negociatas políticas. E essas grandes empresas passaram a ter um papel no Estado brasileiro. Basta pegar os ministros de Comunicação e, então, pode-se ver quem são. São pessoas vinculadas a essa área, que conta com muito poder. E aí funciona esse mecanismo de coronelismo, de troca de favores, de patriomonialismo.
É uma relação de promiscuidade muito grande. E desrespeitosa inclusive em relação à Constituição e às leis. Porque a legislação brasileira é taxativa: detentor de cargo público não pode ter meios de comunicação. Muito simples, coloca-se um fantasma, coloca-se um parente, mas continua tendo. Não era o ACM o dono da TV Bahia, mas a mulher dele. A mesma coisa com relação ao Sarney. Não é ele, mas o filho dele. E por aí vai. Vai sendo montado todo um esquema de promiscuidade pública e privada, de patrimonialismo mesmo. O que dá uma grande força a esses grupos.
O Luis Nassif usou o termo gangsterismo ao se referir a Otávio Frias, da Folha. Depois dessa ofensiva golpista alguns veículos até recuaram porque se desmoralizaram, mas a Folha e a Veja se mantêm na ofensiva. Você vê aí também gangsterismo?
Acho que são grupos com oscilações em determinados períodos históricos. Por exemplo, a Folha apoiou o golpe, apoiou o setor linha dura da ditadura na época do velho Frias. Não só apoiou escrevendo, chamando de terroristas, justificando assassinatos, como ajudou na logística –, cedeu carros de transporte de jornal para o serviço de repressão.
Quando ela percebe que o regime militar estava se fragilizando e não servia mais, teve uma oscilação ao desemmpenhar papel importantíssimo na luta pelas Diretas. Não dá para desconhecer isso. Lembra daquela capa histórica da campanha das Diretas na Catedral da Sé? A Folha quase foi um jornal da campanha das Diretas. A burguesia é muito hábil, tem flexibilidade. Às vezes a esquerda tem dificuldade de se flexibilizar, a direita se flexibiliza.
A Veja já foi o contrário. Ela nasce como uma revista de oposição. Com Mino Carta e outras figuras como Raimundo Pereira e Pedro de Oliveira. A Veja nasceu como uma revista de resistência. Depois vai se amoldando. Mas acho que ela nunca perdem o seu referencial de classe. Eles têm referencial de classe. Às vezes nós não temos muito. Eles têm. Eles não se iludem. Eles têm um projeto.
Acho que no caso do governo Lula, essa turma tem muito referencial de classe. Percebe o seguinte: no governo Lula, mesmo não enfrentando os problemas estruturais do país, eles batem sem dó. A Veja não perde o referencial de classe. Ela percebe que isso é um processo que pode, em perspectiva, colocar em perigo os seus projetos de classe. O Nassif fala isso porque ele sentiu na carne. Ele fala: com o governo Lula esse setor muda, assume a posição de gangster mesmo. Aí não tem mais conversa, é uma posição de classe. O governo Lula é um perigo.
Estão com mais medo ainda da Dilma. Eles têm mais medo dela porque falam, com faz o Jabbour, que Lula pelo menos é um conciliador que conseguiu afastar os “bolcheviques” e “jacobinos”. Já a Dilma talvez não consiga. Então, esse setor tem muito medo disso. É um problema de classe. Assume uma posição de gangster mesmo. Não tem conversa e vai para metralhar. Acho que a Folha e o Estadão têm demonstrado isso.
A meu ver, outros são mais hábeis, mas também na hora do vamos ver eles se juntam. A Globo sabe pressionar, obter determinadas benesses e dar uma recuadinha para depois pressionar novamente. O episódio da Petrobras é ótimo nesse sentido. A Globo obrigou os partidos de direita a entrar na CPI. Os tucanos e os demos não tinham muito interesse em entrar na briga contra a Petrobras. Quem pautou a direita para entrar na CPI foi a mídia.
Quando essa mesma mídia conseguiu o que queria — basta ver o número de anúncios como aumentou —, a mídia tirou o time de campo. Tanto é que o Rodrigo Maia (presidente do DEM) reclamou: “Nos deixaram pendurados”. É deixou mesmo. A mídia tem uma componente pragmática, mercenária, muito forte. Isso ela aprendeu com Chateaubriand. Aí não é gangsterismo, é algo de jogador de carteado.
A TV Globo parecia que tinha adotado um comportamento mais neutro em 2004, 2005, até 2006. Na hora de dar o bote, quem forçou o segundo turno foi a rede Globo. Não foi a Veja ou a Folha. Então, acho que essa turma não perde a oportunidade. A Maria Inês Nassif, do jornal Valor Econômico, diz isso na dissertação de mestrado dela: o governo Lula forçou um posicionamento mais explícito dessa mídia. Alguns, de forma gangsterista outros de forma mais habilidosa. Mas, a meu ver, no conjunto é um projeto de classe.
Como você vê a ação desse conjunto na campanha eleitoral?
Acho que a mídia alternativa não ganha eleição. Não foi a internet que ganhou as eleições em 2006. E não será a internet, pelo lado progressista, que vai ganhar as eleições de 2010. O que ganha a eleição são as mudanças no Brasil. O que ganha, mais do que a internet, é o Bolsa Família, o Luz para Todos, é o país crescendo, o salário-mínimo valorizado, o emprego.
Não foi a internet, nem blogs e sites progressistas que evitaram a manipulação da mídia e que garantiram a reeleição de Lula em 2006. Acho que aí seria muita presunção de nossa parte. Até porque a internet atinge uma parte pequena da população. Atinge 22%, 23%. A mídia alternativa, a meu ver, tem o papel de fazer a disputa com setores formadores de opinião. Ela tem o papel de municiar o debate de ideias. Ela consegue às vezes reverter determinadas coisas. Veja um episódio recente que, em minha opinião, foi extremamente educativo, sintomático: aquela história do clipping de 45 anos da TV Globo. Aquilo foi impressionante.
Ela fez um clipping e, por mera coincidência, era a cara do PSDB. Era o slogan de campanha do PSDB: O Brasil pode mais. Com a cor azul do PSDB e, por acaso, 45 anos, o número da legenda do PSDB. Houve um bombardeio na internet, rapidamente eles sondaram o TSE, perceberam que ia dar processo e recuaram. Se não houvesse aquela gritaria na internet, possivelmente a campanha durasse um pouco mais. A tendência é de que cada vez mais cresça esse papel. Porque a mídia se democratiza à medida que a sociedade se democratiza.
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Nesta entrevista ao Grabois.org, o jornalista, secretário de Mídia do PCdoB e presidente do Centro de Estudos de Mídia Alternativa Barão de Itararé Altamiro Borges comenta o papel da mídia na formação do Brasil. Para ele, há duas tendências na mídia que não se revertem a não ser com rupturas. Uma é concentração e a outra a maior capacidade de manipulação. “Cada vez mais ela é concentrada e cada vez com posições mais à direita”, diz. Segundo Altamiro Borges, a mídia alternativa tem o papel de fazer a disputa com setores formadores de opinião. Mas não ganha eleição. “O que ganha a eleição são as mudanças no Brasil”, afirma.
O que é o Centro de Estudos de Mídia Alternativa Barão de Itararé. O que é?
A ideia é fruto dos dois últimos anos, 2008 e 2009, em que o debate sobre democratização da comunicação ganhou certo impulso, principalmente no ano passado com a convocação da Conferência Nacional de Comunicação (Confecom). Essa era uma reivindicação antiga dos movimentos sociais. No interior do governo havia quem era contra. Havia forte pressão das empresas de comunicação para não se realizar a Conferência. Mas ela saiu. Foi convocada em janeiro, depois de anunciada no Fórum Social Mundial de Belém (FSM) em Belém, Pará, pelo presidente Lula anunciou. Para surpresa de muita gente, saiu. Isso fez com que o debate sobre comunicação ganhasse outra dimensão no Brasil.
O Barão de Itararé é fruto desse movimento. Aglutinou muita gente, trouxe à tona muitos que inclusive estão na chamada grande imprensa e que tem uma posição crítica. Muitas entidades do movimento social se inseriram nessa batalha. O Centro não nasceu do nada. Nasceu dessa luta pela democratização da comunicação, casada evidentemente com sua antítese — que é o desmascaramento da mídia hegemônica. Conforme vai caindo a ficha do que representa essa mídia, a luta pela democratização da comunicação cresce.
A ideia do Barão de Itararé, primeiro, é essa homenagem a um grande jornalista brasileiro, Aparício Fernando Brinkerhoff Torelly, um gaúcho que fez toda a sua história no Rio de Janeiro. Foi inclusive foi vereador do Partido Comunista do Brasil, o PCB, no Rio de Janeiro. Era um jornalista muito crítico. Ele foi o jornalista que fez a primeira imprensa alternativa no Brasil — tirando a imprensa sindical, anarquista e comunista. A primeira imprensa alternativa não partidária e nem sindical no Brasil, como o jornal A Manha, o Almanhaque.
Outra característica dele foi a irreverência, a ironia. O Barão é considerado o pai do humorismo no Brasil. Por isso, resolvemos fazer uma homenagem a essa figura, cujas idéias casam com o período que estamos vivendo. Esse movimento de sites, blogs é muito irreverente. A ideia do Barão é agregar essas pessoas, os vários movimentos sociais, agregar as entidades que lutam pela democratização da comunicação, as várias publicações, sites, revistas, jornais que têm um papel contra-hegemônico. E agregar pessoas que têm tido um papel importante na denúncia dessa mídia golpista. Pessoas como Paulo Henrique Amorim, Luis Nassif, Leandro Fortes, Maria Inês Nassif, Luis Carlos Azenha, Rodrigo Viana etc.
São pessoas que têm tido uma contribuição muito grande para estimular o senso crítico, um jornalismo mais crítico. O Barão procura agregar tudo isso. Para quê? Basicamente para quatro coisas: contribuir para o fortalecimento da luta pela democratização da comunicação; contribuir para o fortalecimento das mídias alternativas já existentes ou por existir - como blogs, sites, rádios comunitárias, TVs comunitárias, TVs públicas etc. -; e ajudar na formação dessa galera. Aprendo com ela, pois não há teoria pronta para isso. No intercâmbio vamos construir uma formação, desde o jornalista que está na faculdade — que está sendo formado para ser William Bonner e Fátima Bernardes da vida, mas que poderia ter um senso crítico maior — até a pessoa que está fazendo radiodifusão comunitária, jornal sindical, jornal de bairro.
A idéia é ajudar na pesquisa, no estudo, tentar entender mais o que ocorre com a mídia não apenas no sentido do reativo. Essa mídia que está aí é a nossa crítica, mas estudar principalmente o que está pintando de novo, porque há muita coisa nova. Alguns autores até chamam de nova mídia. Então, tentar entender o que está acontecendo e potencializar isso.
Você diria que o Barão é resultado dessa ressaca da mídia dominante, depois daquela investida feroz, golpista contra o governo Lula?
Para mim, ele é resultado de duas coisas. Do desmascaramento e da ressaca dessa mídia que está aí, com sua overdose de manipulação e golpismo, de preconceito, de pensamento único. E é resultado não apenas da constatação, não apenas da ressaca, mas da reação a essa overdose. É resultado da crítica e do movimento. Da crítica a essa mídia que está aí e do movimento que vem sendo feito principalmente nesse último período por democratização da comunicação no Brasil. A meu ver, são essas duas coisas.
Você acha que a mídia, depois dessa invertida na tentativa frustrada de golpe contra o governo Lula, tem força nestas eleições?
A meu ver, tem. Para mim, a mídia perdeu força. Hoje ela é mais vulnerável. Mais vulnerável basicamente por três razões. Primeiro pela própria mudança tecnológica. O velho Marx tinha razão, porque quando as forças produtivas se mexem outras coisas se movem. O fato de haver alterações profundas na base tecnológica da comunicação, como a internet, fragilizou essa mídia. Vê-se uma queda de tiragem de jornais. Isso não apenas no Brasil.
No Brasil chama a atenção o fato de a Folha de S.Paulo, que na década de 1980 tinha uma tiragem de 1.000.000 /1.100 milhão exemplares aos domingos, hoje ter 300 mil. É um negócio impressionante. O mesmo se dá com o Estadão, com O Globo, com o Correio Brasiliense. Porque houve uma migração dessa mídia impressa para a mídia virtual, para a internet. Isso ocorre não só a mídia impressa. Mesmo a televisão está perdendo audiência. Esse é um fenômeno que se verifica nos Estados Unidos, na Europa, e começa a se verificar no Brasil. As pessoas estão saindo da TV, que é uma coisa unidirecional: o sujeito está lá, sentado no sofá, e ouve todas as abobrinhas ditas. A pessoa é passiva. Já a internet que é mais interativa. A pessoa pode escrever, colocar o filme dela, a foto.
Acho que na crise dessa mídia tradicional tem como primeira razão a questão tecnológica. A segunda é a crise de credibilidade – que Emir Sader chama de crise moral –, porque essa mídia vem se desgastando no Brasil e no mundo. Veja nos EUA, onde se destacou a capacidade de manipulação da mídia na preparação da invasão do Iraque. Tudo o que se disse sobre armas químicas e bacteriológicas era papo furado, era mentira do Bush que a mídia amplificou. O único jornal que reconheceu isso foi o The New York Times — embora timidamente.
Fico imaginando na Venezuela, onde houve um golpe que foi orquestrado pela mídia. O próprio Chávez chama de golpe midiático. Aquele povo não acredita muito na mídia, não chora de amores pela RCTV, que teve a outorga cancelada recentemente. E nem pela Globovisión, com seu dono metido em corrupção. Outro exemplo é a Bolívia, onde quase 90% das notícias na campanha eleitoral, na vitória de Morales, foram contra ele. Ou no Brasil. Há uma crise de credibilidade.
Acho que um terceiro fator é o crescimento de uma consciência crítica, que se materializa até em mudanças legislativas. Têm ocorrido mudanças importantes na Venezuela, no Uruguai, na Argentina, na Nicarágua, em El Salvador, Equador, na Bolívia etc. Portanto, começa a ter não só perda de credibilidade, mas começa a se pensar em alternativas. Políticas públicas, regulamentação. Por isso, acho que essa mídia está em crise. Mas não acho que essa crise tire o poder da mídia. Ela ainda tem ainda muita capacidade de interferir na sociedade.
Há a tese de que acabou-se aquela história da pedra na lagoa que bate e se expande. As redes estariam superando esse efeito. Mas não superam a TV Globo. A TV Globo tem um poder monstruoso. Pegue pela Copa. Nas ruas o povo repete a argumentação da Globo. O Dunga – e olha que eu não gosto do Dunga, acho um técnico retranqueiro – é o vilão e a Globo, coitadinha, a vítima. A televisão ainda tem um papel fenomenal. Os jornais têm um papel fenomenal. A revista Veja, com 1 milhão de exemplares para a classe média, faz a cabeça. Acho que a mídia está mais vulnerável, mas não significa que ela perdeu o seu papel.
Existe uma pesquisa do Vox Populi que mostra que, em 2006, se não fosse o papel da Globo a eleição teria sido decidida no primeiro turno. Aquela onda que a Globo fez nos dois últimos dias, com os tais dos aloprados com pacotes de dinheiro, fez com que 6% do eleitorado se movessem. Foi o que garantiu o segundo turno. Por isso, acho que ela ainda tem muito poder. Às vezes o pessoal brinca que a mídia está na UTI. Nada, a mídia para ir para a UTI ainda vai demorar um bocado.
Você vê um componente ideológico nesses movimentos, baseado no fato de que o sistema norte-americano vai mais para a direita e desperta seu contraponto?
Gramsci, uma figura interessante, ao estudar mais essas chamadas sociedades complexas do Ocidente, como ficou a terminologia, estudou a questão da luta ideológica, o papel da hegemonia. E Gramsci, já nas décadas de 1920 e 1930, disse que quando as instituições da burguesia entram em crise a imprensa – não era a mídia – ocupa o papel do partido da classe dominante, ocupa o papel do partido do capital. Hoje, as instituições burguesas estão com dificuldades de administrar esse mundo cada vez mais sob a hegemonia do capital financeiro, cada vez mais desregulado. Há uma crise dessas instituições e a imprensa passa a ocupar o papel mais proeminente na sociedade.
Não quer dizer que ela não ocupasse isso no passado. Ela já ocupava. Se pegarmos a história do Brasil, o papel da imprensa foi decisivo. Veja o papel do Estadão na época de Canudos. Peguemos fatos mais recentes, de 60 anos para cá – no governo Getúlio Vargas, por exmplo, no governo do Juscelino Kubitschek. Ou o fato dramático que foi o golpe de 1964. Quem ajudou a preparar o golpe de 1964 foi a imprensa. Inclusive, certos chavões ditos hoje são mesmos daquela época. Eles não têm nem criatividade para mudá-los. A história de república sindical que a revista Época recentemente usou tem as mesmas terminologias.
Há um estudo impressionante de um pesquisador da Fundação Getúlio Vargas sobre o papel que a imprensa teve na Constituinte. Como ela foi moldando a Constituinte. Lembremos o papel que a imprensa teve na campanha das diretas, na eleição de Collor. Acho que cada vez mais ela vai por uma confluência, porque adquiriu maior poder econômico. O o setor de comunicação e de telecomunicação é um dos setores que mais cresce na economia mundial. Isso decorre da fragilidade, da crise vivida pelo capital. A mpidia passa a ocupar o papel de partido do capital de forma mais proeminente. E o partido do capital, na situação do mundo atual, tem uma marca reacionária muito forte.
O capital vai contra a humanidade. Esse sistema é contra a humanidade. Portanto, para se expressar a hegemonia desse sistema é preciso ter uma atitude cada vez mais reacionária. Há duas tendências na mídia que não se revertem a não ser com rupturas. Uma é concentração e a outra a maior capacidade de manipulação. São duas tendências: concentração e direitização. Cada vez mais ela é concentrada e cada vez com posições mais à direita. Lógico, com contradições. Não dá para ter uma visão também fechada, totalmente blocada.
No Brasil já temos uma concentração histórica. Você falou do golpe de 1964. No pós-golpe de 1964 começou a montagem desses grupos poderosos...
Já havia concentração antes. Porque temos problemas na legislação brasileira e na tradição brasileira. Na Europa, por exemplo, principalmente no pós-Segunda Guerra Mundial, enfrentou-se o papel que a imprensa teve no surgimento do nazi-fascismo. Estudou-se uma forma de democratizar a comunicação, de quebrar aqueles monopólios que foram incentivadores ou cúmplices do nazi-fascismo. Surgiu então a rede pública, como a BBC de Londres, que vem da resistência ao nazi-fascismo. Surgem também TVs públicas na França, na Itália. Mesmo nos EUA há uma rede pública com certa força.
No Brasil, nunca tivemos uma rede pública. Getúlio tenta montar uma, por meio da Rádio Nacional, mas não prosperou. Esse é um problema da mídia brasileira, só há o setor privado. Agora é que estão começando os primeiros passos da montagem de uma rede pública com a da Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Então.
Um segundo problema é que nunca houve regulamentação desse setor no Brasil. Há regulamentação nessa área de mídia em várias partes do mundo. Nos EUA, por exemplo, o órgão regulamentador é forte — existem mais de 100 cassações e outorgas de TV e rádio por desrespeito à lei, à Constituição. No Brasil, sem nenhuma regulamentação o início da concentração começou cedo. O caso mais famoso é o de Assis Chateaubriand com os Diários Associados. Foi um baita império midiático. Com vários jornais, depois rádios. A biografia dele escrita pelo Fernando Morais é muito interessante. Ele era um chantagista, um mercenário da mídia.
A Globo, esse império, foi construída com o apoio da ditadura militar. Esse império só existiu por causa da ditadura militar, que permitou acordos lesivos, acordos contrários à legislação. O nascimento da TV Globo em aliança com uma empresa estadunidense, a Time Life, era proibido mas foi permitido. A Globo cresceu à sombra do regime militar. Aí é que ela se transforma num grande império. Hoje é isso, há sete famílias que dominam a mídia brasileira. É um negócio impressionante. São sete famílias.
Como essas famílias se realcionavam com o Estado? Temos exemplos mais recentes, como o caso das famosas concessões do ex-ministro das Comunicações, Antônio Carlos Magalhães (ACM).
A isso o professor Vinicius Lima chama de coronelismo eletrônico. Há o coronelismo do campo brasileiro e o coronelismo eletrônico. Tudo numa relação de promiscuidade, patrimonialismo com Estado, concessões, apoios. Então, vão sendo constituídos esses grandes grupos por meio de negociatas políticas. E essas grandes empresas passaram a ter um papel no Estado brasileiro. Basta pegar os ministros de Comunicação e, então, pode-se ver quem são. São pessoas vinculadas a essa área, que conta com muito poder. E aí funciona esse mecanismo de coronelismo, de troca de favores, de patriomonialismo.
É uma relação de promiscuidade muito grande. E desrespeitosa inclusive em relação à Constituição e às leis. Porque a legislação brasileira é taxativa: detentor de cargo público não pode ter meios de comunicação. Muito simples, coloca-se um fantasma, coloca-se um parente, mas continua tendo. Não era o ACM o dono da TV Bahia, mas a mulher dele. A mesma coisa com relação ao Sarney. Não é ele, mas o filho dele. E por aí vai. Vai sendo montado todo um esquema de promiscuidade pública e privada, de patrimonialismo mesmo. O que dá uma grande força a esses grupos.
O Luis Nassif usou o termo gangsterismo ao se referir a Otávio Frias, da Folha. Depois dessa ofensiva golpista alguns veículos até recuaram porque se desmoralizaram, mas a Folha e a Veja se mantêm na ofensiva. Você vê aí também gangsterismo?
Acho que são grupos com oscilações em determinados períodos históricos. Por exemplo, a Folha apoiou o golpe, apoiou o setor linha dura da ditadura na época do velho Frias. Não só apoiou escrevendo, chamando de terroristas, justificando assassinatos, como ajudou na logística –, cedeu carros de transporte de jornal para o serviço de repressão.
Quando ela percebe que o regime militar estava se fragilizando e não servia mais, teve uma oscilação ao desemmpenhar papel importantíssimo na luta pelas Diretas. Não dá para desconhecer isso. Lembra daquela capa histórica da campanha das Diretas na Catedral da Sé? A Folha quase foi um jornal da campanha das Diretas. A burguesia é muito hábil, tem flexibilidade. Às vezes a esquerda tem dificuldade de se flexibilizar, a direita se flexibiliza.
A Veja já foi o contrário. Ela nasce como uma revista de oposição. Com Mino Carta e outras figuras como Raimundo Pereira e Pedro de Oliveira. A Veja nasceu como uma revista de resistência. Depois vai se amoldando. Mas acho que ela nunca perdem o seu referencial de classe. Eles têm referencial de classe. Às vezes nós não temos muito. Eles têm. Eles não se iludem. Eles têm um projeto.
Acho que no caso do governo Lula, essa turma tem muito referencial de classe. Percebe o seguinte: no governo Lula, mesmo não enfrentando os problemas estruturais do país, eles batem sem dó. A Veja não perde o referencial de classe. Ela percebe que isso é um processo que pode, em perspectiva, colocar em perigo os seus projetos de classe. O Nassif fala isso porque ele sentiu na carne. Ele fala: com o governo Lula esse setor muda, assume a posição de gangster mesmo. Aí não tem mais conversa, é uma posição de classe. O governo Lula é um perigo.
Estão com mais medo ainda da Dilma. Eles têm mais medo dela porque falam, com faz o Jabbour, que Lula pelo menos é um conciliador que conseguiu afastar os “bolcheviques” e “jacobinos”. Já a Dilma talvez não consiga. Então, esse setor tem muito medo disso. É um problema de classe. Assume uma posição de gangster mesmo. Não tem conversa e vai para metralhar. Acho que a Folha e o Estadão têm demonstrado isso.
A meu ver, outros são mais hábeis, mas também na hora do vamos ver eles se juntam. A Globo sabe pressionar, obter determinadas benesses e dar uma recuadinha para depois pressionar novamente. O episódio da Petrobras é ótimo nesse sentido. A Globo obrigou os partidos de direita a entrar na CPI. Os tucanos e os demos não tinham muito interesse em entrar na briga contra a Petrobras. Quem pautou a direita para entrar na CPI foi a mídia.
Quando essa mesma mídia conseguiu o que queria — basta ver o número de anúncios como aumentou —, a mídia tirou o time de campo. Tanto é que o Rodrigo Maia (presidente do DEM) reclamou: “Nos deixaram pendurados”. É deixou mesmo. A mídia tem uma componente pragmática, mercenária, muito forte. Isso ela aprendeu com Chateaubriand. Aí não é gangsterismo, é algo de jogador de carteado.
A TV Globo parecia que tinha adotado um comportamento mais neutro em 2004, 2005, até 2006. Na hora de dar o bote, quem forçou o segundo turno foi a rede Globo. Não foi a Veja ou a Folha. Então, acho que essa turma não perde a oportunidade. A Maria Inês Nassif, do jornal Valor Econômico, diz isso na dissertação de mestrado dela: o governo Lula forçou um posicionamento mais explícito dessa mídia. Alguns, de forma gangsterista outros de forma mais habilidosa. Mas, a meu ver, no conjunto é um projeto de classe.
Como você vê a ação desse conjunto na campanha eleitoral?
Acho que a mídia alternativa não ganha eleição. Não foi a internet que ganhou as eleições em 2006. E não será a internet, pelo lado progressista, que vai ganhar as eleições de 2010. O que ganha a eleição são as mudanças no Brasil. O que ganha, mais do que a internet, é o Bolsa Família, o Luz para Todos, é o país crescendo, o salário-mínimo valorizado, o emprego.
Não foi a internet, nem blogs e sites progressistas que evitaram a manipulação da mídia e que garantiram a reeleição de Lula em 2006. Acho que aí seria muita presunção de nossa parte. Até porque a internet atinge uma parte pequena da população. Atinge 22%, 23%. A mídia alternativa, a meu ver, tem o papel de fazer a disputa com setores formadores de opinião. Ela tem o papel de municiar o debate de ideias. Ela consegue às vezes reverter determinadas coisas. Veja um episódio recente que, em minha opinião, foi extremamente educativo, sintomático: aquela história do clipping de 45 anos da TV Globo. Aquilo foi impressionante.
Ela fez um clipping e, por mera coincidência, era a cara do PSDB. Era o slogan de campanha do PSDB: O Brasil pode mais. Com a cor azul do PSDB e, por acaso, 45 anos, o número da legenda do PSDB. Houve um bombardeio na internet, rapidamente eles sondaram o TSE, perceberam que ia dar processo e recuaram. Se não houvesse aquela gritaria na internet, possivelmente a campanha durasse um pouco mais. A tendência é de que cada vez mais cresça esse papel. Porque a mídia se democratiza à medida que a sociedade se democratiza.
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