quinta-feira, 13 de maio de 2010
O renascimento do Barão de Itararé
Nesta sexta-feira, dia 14, às 19 horas, no auditório do Sindicato dos Engenheiros de São Paulo, será lançado o Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé. O coquetel de fundação será precedido por um debate sobre “A mídia e as eleições de 2010”, com os jornalistas Paulo Henrique Amorim (Conversa Afiada), Maria Inês Nassif (Valor Econômico) e Leandro Fortes (CartaCapital). Reproduzo abaixo o manifesto de lançamento da entidade:
A mídia hegemônica vive um paradoxo. Por um lado, ela nunca foi tão poderosa no mundo e no Brasil, atingindo níveis de concentração sem precedentes na história. Além do poder econômico, ela exerce um brutal poder ideológico, que manipula informações e deturpa comportamentos. No atual estágio, ela confirma a velha tese do intelectual italiano Antonio Gramsci e transforma-se num autêntico “partido” dos conservadores.
Por outro lado, ela nunca esteve tão vulnerável e sofreu tantos questionamentos da sociedade. No mundo todo, cresce a resistência às manipulações da mídia. Alguns governantes enfrentam, com formas e ritmos diferentes, esse poder que atenta contra a democracia e o Estado de Direito. Os avanços tecnológicos também criam brechas para a sua democratização. Novas mídias surgem no mundo inteiro, baqueando a audiência dos veículos tradicionais.
No caso do Brasil, a mídia controlada por meia-dúzia de famílias também esbanja poder, mas dá sinais de fragilidade. Ela não consegue mais fazer os “corações e mentes” dos brasileiros e perde audiência. A luta pela democratização do setor ganhou novo fôlego na fase recente. A realização da 1ª Conferência Nacional de Comunicação foi um marco neste processo. Surgem vários fóruns que encaram esta luta como estratégica e novas mídias ganham musculatura, com a multiplicação de veículos alternativos, como blogs, rádios e TVs comunitárias.
Este quadro, com os seus paradoxos, é que coloca a necessidade da criação de uma entidade que, em parceria com muitas outras já existentes, contribua na luta pela democratização dos meios de comunicação e pelo fortalecimento da mídia alternativa. Ela deverá ajudar na construção de uma militância social, permanente e aguerrida, nesta frente estratégica da batalha de idéias. É com esta perspectiva que nasce o Centro de Estudos da Mídia Alternativa e que se presta homenagem ao Barão de Itararé, um incansável lutador da imprensa progressista e pela ética jornalística.
Um dos criadores da imprensa alternativa
“Barão de Itararé’, pseudônimo irreverente do jornalista gaúcho Apparício Torelli (1895-1971), é considerado um dos criadores do jornalismo alternativo no país e o pai do humorismo brasileiro. Com os jornais A Manha e Almanhaque, ele ironizou as elites, criticou a exploração e enfrentou os governos autoritários. Preso várias vezes, ele nunca perdeu o seu humor. Itararé é o nome da batalha que não houve entre a oligarquia e as forças vitoriosas na revolução de 1930.
Frasista genial, ele cunhou incontáveis pérolas. Cansado de apanhar da polícia secreta do Estado Novo, colocou na porta do seu escritório uma placa com a hoje famosa frase “entre sem bater”. Político sagaz, ele percebeu a guinada progressista de Getúlio Vargas e respondeu aos críticos udenistas: “Não é triste mudar de idéias; triste é não ter idéias para mudar”. Militante do Partido Comunista do Brasil (PCB), Apparício foi eleito vereador pelo Rio de Janeiro em 1946 com o lema “mais leite, mais água e menos água no leite” – denunciando fraudes da indústria leiteira.
Seu mandato foi combativo e irreverente. Segundo o então senador Luiz Carlos Prestes, “o Barão não só fez a Câmara rir, como as lavadeiras e os trabalhadores. As favelas suspendiam as novelas para ouvir as sessões que eram transmitidas pela rádio”. Ele teve o mandato cassado juntamente com a anulação do registro do PCB, em 1947, e declarou solenemente: “Eu saio da vida pública para entrar na privada”. O seu jornal, A Manha, foi novamente empastelado e, com dificuldades financeiras, escreveu: “Devo tanto que, se eu chamar alguém de ‘meu bem’, o banco toma”.
Diante da crise que resultou no suicídio de Getúlio Vargas, em 1954, ele afirmou: “Há qualquer coisa no ar, além dos aviões de carreira”. Barão de Itararé foi um crítico dos jornais golpistas de Assis Chateaubriand e Carlos Lacerda e um entusiasta da imprensa alternativo. Após o golpe de 1964, ele passou por várias privações, mas manteve a sua máxima: “Nunca desista de seu sonho. Se acabou numa padaria, procure em outra”. Faleceu em 27 de novembro de 1971.
Os objetivos do “Barão do Itararé”
O Centro de Estudos da Mídia Alternativa “Barão de Itararé” irá se somar a outras entidades e movimentos sociais que lutam pela democratização da comunicação, visando conquistar maior pluralidade e diversidade informativa e cultural no país. Entre outros objetivos, ele concentrará as suas atividades em cinco eixos centrais:
1- Contribuir na ampliação da militância na luta pela democratização da comunicação. Na fase recente, em especial no processo da 1ª Confecom, muitas entidades, movimentos e ativistas se engajaram neste frente estratégica da batalha de idéias. O objetivo é dar maior organicidade e dinamismo a este movimento, lutando pela aplicação das resoluções da conferência, para tornar periódico este fórum democrático de consulta à sociedade e para avançar na regulamentação do setor e na adoção de políticas públicas visando a democratização dos meios de comunicação;
2- Fortalecer os fóruns existentes e incentivar novos espaços de atuação. O Brasil conta hoje com inúmeras entidades e movimentos que priorizam esta frente – desde o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), o mais antigo, até o Fórum de Mídia Livre, criado em 2008. No processo da Confecom, também foram formadas comissões estaduais pró-conferência, que ampliaram a participação da sociedade neste movimento. Há ainda novos espaços, como o dos blogueiros e o dos empresários progressistas do setor (Altercom). O “Barão de Itararé” atuará em parceria com estas entidades, visando fortalecer a atuação e organização unitárias.
3- Reforçar as mídias alternativas, comunitárias e públicas. A luta pela democratização do setor se dá, também, com o fortalecimento dos veículos não comerciais. Atualmente, existem cerca de 3.800 rádios comunitárias e 83 TVs comunitárias. O sistema público também ganhou alento com a criação da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), que revigora as emissoras de rádio e televisão educativas e culturais nos estados. Já com o crescimento da internet, surgiram centenas de sítios e blogs progressistas. O “Barão de Itararé” manterá relação estreita e solidária com estes veículos, visando seu florescimento e fortalecimento.
4- Investir na formação dos novos comunicadores. A comunicação alternativa conta hoje com milhares de ativistas, seja na luta pela democratização do setor, na construção dos instrumentos alternativos e nas próprias redações da mídia privada. A formação destes comunicadores é uma das prioridades do “Barão de Itararé”, que investirá na juventude, ainda nas faculdades, e nos ativistas sociais que constroem as rádios e televisões comunitárias, a imprensa sindical e juvenil, os blogs e sítios progressistas. O objetivo é promover o intercâmbio de experiências e reforçar a formação crítica destes comunicadores.
5- Aprofundar os estudos sobre o papel da mídia na atualidade. Há um acelerado processo de mutação na mídia internacional e brasileira. Por um lado, ele reforça a concentração deste setor, resultando em maior poder de manipulação. Por outro, ele abre brechas para criação de espaços alternativos. O “Barão de Itararé” pretende, em parceria com a academia e outros institutos de pesquisa, promover estudos sobre esta nova realidade da comunicação.
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