Por Katia Guimarães, no blog Socialista Morena:
Temer ganhou e o pedido de investigação foi arquivado, mas o “teste” no plenário indica que o governo poderá não aprovar a “reforma” da Previdência. Essa é a análise não só da oposição, mas de parte da base aliada na Congresso Nacional sobre o resultado da votação da denúncia contra o presidente –isso porque a diferença entre os votos favoráveis e contra foi de menos de 40 votos. Os deputados aprovaram por 263 a 227 o relatório que recomendou a rejeição da denúncia de corrupção passiva da Procuradoria-Geral da República contra o presidente. Nem mesmo o descaramento na compra de votos garantiu uma larga vitória.
O clima de meia vitória foi bem retratado, logo após o resultado final, por um deputado da base governista que comentou: “nos safamos, mas não sei onde vamos parar”. O problema é que o número alcançado pelo Palácio do Planalto não é suficiente para aprovar a “reforma” previdenciária, que precisa de 308 votos favoráveis. Apesar de outras agendas neoliberais, como o perdão das dívidas dos ruralistas e o programa de demissão voluntária dos servidores públicos, terem grandes chances de passar, a aprovação de uma emenda constitucional, como é o caso da Previdência, mede o poder do governo sobre o Legislativo.
Temer tem pela frente duas coisas com o que se preocupar: por um lado, outras denúncias são esperadas –duas envolvendo a delação do dono da JBS, Joesley Batista, por organização criminosa e obstrução à justiça. E, para completar, no mesmo dia em que tirou a corda do pescoço, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a inclusão do presidente no rol de investigados de um inquérito já instaurado contra o PMDB na Câmara no caso da Operação Lava-Jato –os ministros da Casa Civil, Eliseu Padilha, e da Secretaria-Geral, Moreira Franco, também estão sendo arrolados no mesmo processo.
Se a quarta-feira foi tensa para o governo, a perspectiva de um cenário com novas denúncias para derrubar pode ser devastador para um presidente já combalido e impopular, diz a oposição. Deputados oposicionistas acreditam que uma segunda votação tem poucas chances de prosperar, principalmente se comover as ruas. Só o povo salva! Outro ponto que causa tão ou mais dor de cabeça ao Palácio do Planalto é o racha na base aliada –houve dissidências de todo o lado, mas o PSDB ganha destaque, não só porque garantiam 47 deputados para o governo como tem quatro ministros na Esplanada dos Ministérios, cargos cobiçados pelos aliados nanicos, que foram bem mais fiéis.
Os tucanos são daquele jeito que a gente conhece, ficaram em cima do muro –cada metade da bancada votou para um lado. Não que os 50% que queriam o afastamento de Temer estejam preocupados com o país, ao contrário. Eles estão por trás de todas as medidas neoliberais tomadas até agora e se, em uma análise futura, o PSDB enxergar que o presidente pode ser uma pedra no caminho nos seus planos, poderá rifá-lo de vez, com o apoio da Globo. Ou exigir cada vez mais cargos e poder dentro do governo.
Logo que saiu a delação de Joesley, um dos mais experientes deputados da Casa, Miro Teixeira (PSB-RJ), que está no 11º mandato, afirmou: “se o PSDB desembarcar do governo, Temer cai”. Por meio dos jornalistas, o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), alertou o governo: ou se acerta com os tucanos, ou as reformas correm risco. Maia, potencial sucessor de Temer, também se queixou de “truculência” dos assessores do presidente, o que indica uma dissonância e possível traição à vista. “Não posso negar que atos de alguns assessores do presidente foram truculentos. Nunca pensei que fossem jogar tão baixo comigo”, queixou-se o presidente da Casa à Globo, atual inimiga de Temer.
Um dos artífices das nefastas terceirização e “reforma” trabalhista, o deputado carioca costuma receber empresários e investidores em seu gabinete e não tem nenhum pudor em defender o capital. “Não adianta a gente se enganar que para ter 308 votos sem reorganizar a base a gente não vai conseguir, vou trabalhar e acho que o governo vai fazer o mesmo, para que a gente possa recompor com todos os partidos da base, porque uma Reforma da Previdência precisa do apoio firme por parte do Poder Executivo e como sou um defensor da Reforma da Previdência porque entendo que ela acaba com privilégios na defesa do cidadão comum”, disse Maia, esquecendo dos enormes privilégios do Legislativo, Judiciário e do Ministério Público.
O recado atravessou a Praça dos Três Poderes rapidamente e um triunfal porém não sorridente Michel Temer surgiu no Planalto após a vitória para falar sobre a votação. Era preciso disfarçar que estava contrariado com os votos aquém do esperado e agradecer seus aliados publicamente. Para agradar o mercado financeiro, um totem endeusado pela elite dominante, o presidente afirmou que vai dar continuidade à votação das reformas e prometeu colocar as contas do governo em dia, sem mencionar que o governo tem uma conta a pagar e o rombo pode aumentar com uma iminente mudança do déficit fiscal.
Por fim, o presidente pregou a união pelo país, apelando para um discurso piegas: “Quero construir com cada brasileiro um país melhor, pacificado, justo, sem ódio ou rancor. Nosso destino inexorável é ser uma grande nação. É preciso acabar com os muros que nos separam e nos tornam menores. É hora de atravessarmos juntos a ponte que nos conduzirá ao grande futuro que o Brasil merece”.
O momento parece propício para a oposição, que batalhou durante todo o dia pela aprovação da denúncia e agiu de forma coesa –para quem tem menos de 100 votos na Casa, o número conquistado (227) revela que pode ser possível mobilizar a sociedade pela queda de Temer. Alguns dos sinais foram dados pelos deputados Sérgio Reis (PRB-SP) e Tiririca (PR-SP), que votaram a favor do golpe contra a presidenta Dilma e mudaram de posição, votando pela denúncia contra Temer. O cantor revelou a seus colegas ter recebido inúmeros e-mails pedindo que ele votasse a favor da investigação e divulgou uma nota explicando sua posição.
Cartazes, com o mapa da votação e a cara dos deputados, serão espalhados por todo o país e nas redes sociais para expor os golpistas e apoiadores do presidente. A partir de amanhã, a promessa da oposição é fustigar o governo e aliados, instigando o eleitor a cobrar dos deputados em suas bases eleitorais o porquê do voto em Temer, um presidente reprovado por 95% da população. O fosso entre Congresso e o povo brasileiro é cada vez maior e o eleitor vai cobrar caro nas eleições de 2018. Na análise da oposição, mudou a realidade institucional e a maioria confortável que o governo tinha no Congresso, e espera-se tempos ainda mais turbulentos.
* Pague a autora: Gostou da matéria? Contribua com a autora. Todas as doações para este post irão para a repórter Katia Guimarães. Se você preferir, pode depositar direto na conta dela: Katia Guimarães, Caixa Econômica Federal, agência 4760, conta 21602-1, CPF 602.735.771-15. Obrigada por colaborar com uma nova forma de fazer jornalismo no Brasil, sustentada pelos leitores.
Temer ganhou e o pedido de investigação foi arquivado, mas o “teste” no plenário indica que o governo poderá não aprovar a “reforma” da Previdência. Essa é a análise não só da oposição, mas de parte da base aliada na Congresso Nacional sobre o resultado da votação da denúncia contra o presidente –isso porque a diferença entre os votos favoráveis e contra foi de menos de 40 votos. Os deputados aprovaram por 263 a 227 o relatório que recomendou a rejeição da denúncia de corrupção passiva da Procuradoria-Geral da República contra o presidente. Nem mesmo o descaramento na compra de votos garantiu uma larga vitória.
O clima de meia vitória foi bem retratado, logo após o resultado final, por um deputado da base governista que comentou: “nos safamos, mas não sei onde vamos parar”. O problema é que o número alcançado pelo Palácio do Planalto não é suficiente para aprovar a “reforma” previdenciária, que precisa de 308 votos favoráveis. Apesar de outras agendas neoliberais, como o perdão das dívidas dos ruralistas e o programa de demissão voluntária dos servidores públicos, terem grandes chances de passar, a aprovação de uma emenda constitucional, como é o caso da Previdência, mede o poder do governo sobre o Legislativo.
Temer tem pela frente duas coisas com o que se preocupar: por um lado, outras denúncias são esperadas –duas envolvendo a delação do dono da JBS, Joesley Batista, por organização criminosa e obstrução à justiça. E, para completar, no mesmo dia em que tirou a corda do pescoço, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a inclusão do presidente no rol de investigados de um inquérito já instaurado contra o PMDB na Câmara no caso da Operação Lava-Jato –os ministros da Casa Civil, Eliseu Padilha, e da Secretaria-Geral, Moreira Franco, também estão sendo arrolados no mesmo processo.
Se a quarta-feira foi tensa para o governo, a perspectiva de um cenário com novas denúncias para derrubar pode ser devastador para um presidente já combalido e impopular, diz a oposição. Deputados oposicionistas acreditam que uma segunda votação tem poucas chances de prosperar, principalmente se comover as ruas. Só o povo salva! Outro ponto que causa tão ou mais dor de cabeça ao Palácio do Planalto é o racha na base aliada –houve dissidências de todo o lado, mas o PSDB ganha destaque, não só porque garantiam 47 deputados para o governo como tem quatro ministros na Esplanada dos Ministérios, cargos cobiçados pelos aliados nanicos, que foram bem mais fiéis.
Os tucanos são daquele jeito que a gente conhece, ficaram em cima do muro –cada metade da bancada votou para um lado. Não que os 50% que queriam o afastamento de Temer estejam preocupados com o país, ao contrário. Eles estão por trás de todas as medidas neoliberais tomadas até agora e se, em uma análise futura, o PSDB enxergar que o presidente pode ser uma pedra no caminho nos seus planos, poderá rifá-lo de vez, com o apoio da Globo. Ou exigir cada vez mais cargos e poder dentro do governo.
Logo que saiu a delação de Joesley, um dos mais experientes deputados da Casa, Miro Teixeira (PSB-RJ), que está no 11º mandato, afirmou: “se o PSDB desembarcar do governo, Temer cai”. Por meio dos jornalistas, o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), alertou o governo: ou se acerta com os tucanos, ou as reformas correm risco. Maia, potencial sucessor de Temer, também se queixou de “truculência” dos assessores do presidente, o que indica uma dissonância e possível traição à vista. “Não posso negar que atos de alguns assessores do presidente foram truculentos. Nunca pensei que fossem jogar tão baixo comigo”, queixou-se o presidente da Casa à Globo, atual inimiga de Temer.
Um dos artífices das nefastas terceirização e “reforma” trabalhista, o deputado carioca costuma receber empresários e investidores em seu gabinete e não tem nenhum pudor em defender o capital. “Não adianta a gente se enganar que para ter 308 votos sem reorganizar a base a gente não vai conseguir, vou trabalhar e acho que o governo vai fazer o mesmo, para que a gente possa recompor com todos os partidos da base, porque uma Reforma da Previdência precisa do apoio firme por parte do Poder Executivo e como sou um defensor da Reforma da Previdência porque entendo que ela acaba com privilégios na defesa do cidadão comum”, disse Maia, esquecendo dos enormes privilégios do Legislativo, Judiciário e do Ministério Público.
O recado atravessou a Praça dos Três Poderes rapidamente e um triunfal porém não sorridente Michel Temer surgiu no Planalto após a vitória para falar sobre a votação. Era preciso disfarçar que estava contrariado com os votos aquém do esperado e agradecer seus aliados publicamente. Para agradar o mercado financeiro, um totem endeusado pela elite dominante, o presidente afirmou que vai dar continuidade à votação das reformas e prometeu colocar as contas do governo em dia, sem mencionar que o governo tem uma conta a pagar e o rombo pode aumentar com uma iminente mudança do déficit fiscal.
Por fim, o presidente pregou a união pelo país, apelando para um discurso piegas: “Quero construir com cada brasileiro um país melhor, pacificado, justo, sem ódio ou rancor. Nosso destino inexorável é ser uma grande nação. É preciso acabar com os muros que nos separam e nos tornam menores. É hora de atravessarmos juntos a ponte que nos conduzirá ao grande futuro que o Brasil merece”.
O momento parece propício para a oposição, que batalhou durante todo o dia pela aprovação da denúncia e agiu de forma coesa –para quem tem menos de 100 votos na Casa, o número conquistado (227) revela que pode ser possível mobilizar a sociedade pela queda de Temer. Alguns dos sinais foram dados pelos deputados Sérgio Reis (PRB-SP) e Tiririca (PR-SP), que votaram a favor do golpe contra a presidenta Dilma e mudaram de posição, votando pela denúncia contra Temer. O cantor revelou a seus colegas ter recebido inúmeros e-mails pedindo que ele votasse a favor da investigação e divulgou uma nota explicando sua posição.
Cartazes, com o mapa da votação e a cara dos deputados, serão espalhados por todo o país e nas redes sociais para expor os golpistas e apoiadores do presidente. A partir de amanhã, a promessa da oposição é fustigar o governo e aliados, instigando o eleitor a cobrar dos deputados em suas bases eleitorais o porquê do voto em Temer, um presidente reprovado por 95% da população. O fosso entre Congresso e o povo brasileiro é cada vez maior e o eleitor vai cobrar caro nas eleições de 2018. Na análise da oposição, mudou a realidade institucional e a maioria confortável que o governo tinha no Congresso, e espera-se tempos ainda mais turbulentos.
* Pague a autora: Gostou da matéria? Contribua com a autora. Todas as doações para este post irão para a repórter Katia Guimarães. Se você preferir, pode depositar direto na conta dela: Katia Guimarães, Caixa Econômica Federal, agência 4760, conta 21602-1, CPF 602.735.771-15. Obrigada por colaborar com uma nova forma de fazer jornalismo no Brasil, sustentada pelos leitores.
1 comentários:
Tenho pouco tempo e não tenho um computador pessoal ou um smartphone para me relacionar. Leio e digito sempre com pressa. Porém, não poderia deixar de, mais uma vez, contestar a "aritmética" adotada por alguns analistas, que creem que a votação do relatório que refutou a abertura de inquérito contra Temer nos permite afirmar que ele terá dificuldades para aprovar a Reforma da Previdência. Se essa Reforma for rejeitada, não o será com o mesmo perfil da votação do dia 2 de agosto, e tampouco porque Temer perdeu base de sustentação dentro do Congresso (embora essa perda de base de sustentação política de Temer seja verdadeira. Será rejeitada porque os defensores desta contrarreforma espúria perderam a disputa política na sociedade. A contrarreforma da Previdência é apoiada amplamente (mais até que o próprio Centrão, a quem Temer se vincula) pelo PSDB de São Paulo, que não votou a favor de Temer no dia 2 de agosto. É apoiada pela Globo (mais até que o próprio Temer) que pressionou pesadamente os deputados para votarem contra Temer na última quarta-feira. Em uma eventual votação da contrarreforma espúria, a Globo esquecerá, por um momento, a sua empreitada para derrubar Temer, e pressionará os deputados pela aprovação, os deputados do PSDB paulista, neoliberais muito mais orgânicos do que os deputados do PSDB que votaram a favor de Temer, tenderão a conceder seus votos à contrarreforma neoliberal, e assim por diante. Portanto, a meu ver, o cálculo é bem mais complexo do que a transposição mecanicista dos números da votação do dia 2 de agosto para a votação eventual da contrarreforma. Sem pressão contundente dos trabalhadores e do povo contra essas contrarreformas, elas serão aprovadas.
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