Por Sebastião Soares
Um governo criminoso que investe com fúria incomum sobre trabalhadores e trabalhadoras e o povo mais pobre, comete mais uma atrocidade com a edição da Medida Provisória 927/20. O foco da MP é a autorização para empregadores suspenderem contratos de trabalho por quatro meses ou enquanto durar o Estado de Calamidade, imposto pelo Decreto 06/20.
Trata-se, na verdade, de total desmonte de aspectos fundamentais do que ainda resta da legislação trabalhista. Acaba com a representação sindical em várias questões e transfere para o contrato individual, entre patrão e empregado, a suspensão de direitos trabalhistas e sindicais.
Vários aspectos da MP 917 podem ser destacados, a saber: exclusão dos sindicatos, prevalecendo os acordos individuais sobre as normas coletivas, sem que o empregado tenha qualquer assistência. O contrato de trabalho pode ser mudado para teletrabalho, inclusive para aprendizes e estagiários, com equipamentos próprios ou fornecidos pelo empregador em regime de comodato.
Autoriza, também, a antecipação de férias individuais; a concessão de férias coletivas; o aproveitamento e a antecipação de feriados; o banco de horas; a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho; o direcionamento do trabalhador para qualificação e o diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS. Tudo isso mediante contrato individual.
Fica suspensa a obrigatoriedade de realização dos exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, exceto dos exames demissionais. O exame demissional poderá ser dispensado caso o exame médico ocupacional mais recente tenha sido realizado há menos de cento e oitenta dias.
Vale reafirmar, as suspensões determinadas na MP 927 não dependerão de acordo ou convenção coletiva, poderão ser acordadas individualmente com o empregador ou o grupo de empregadores, e serão registradas em carteira de trabalho física ou eletrônica. Outro absurdo é que, nesse período, os Auditores Fiscais do Trabalho só atuarão de maneira orientadora, sem multar, exceto na falta de registro de empregado, isto se houver denúncia; ou em situações de grave e iminente risco de acidente de trabalho fatal, apurado por meio de procedimento fiscal de análise de acidente; e trabalho em condições análogas às de escravo ou trabalho infantil.
Ao conceder amplos poderes à negociação individual, a MP cria uma condição de flagrante injustiça, pois não se pode chamar de “acordo” em uma relação de trabalho hipossuficiente. Nas condições em que o acordo individual se efetiva, o trabalhador só entra com o pescoço, já que a corda está nas mãos do empregador.
As maldades são ainda piores quando a MP 927 afasta a possibilidade de enquadrar a contaminação pelos vírus, no ambiente laboral, como acidente de trabalho; permite aos patrões decidir sobre a ultratividade das convenções ou acordos coletivos de trabalho; prorroga a jornada de trabalho na saúde para além de 12 horas; não garante qualquer possibilidade estabilidade no emprego para os trabalhadores e trabalhadoras que firmarem o acordo individual; não permite layoff sem acesso ao seguro-desemprego e tem previsão de uma bolsa de qualificação, a critério do patrão, cujo valor é indefinido, podendo, até mesmo, não ter nenhuma remuneração.
A lei da selva nas relações de trabalho foi estabelecida. Os trabalhadores e trabalhadoras ficam à mercê dos seus empregadores que podem tudo. A rigor, revoga-se a legislação protetiva dos direitos das classes trabalhadoras, e recua o País ao começo do século passado, afastando a necessária presença da proteção sindical.
Instala-se a barbárie de maneira oportunista para favorecer o governo e as empresas, em detrimento da vida e da saúde de milhões de trabalhadores. É uma medida antagônica ao que faz a maioria dos governos de países similares ao Brasil, que, em vez de jogar trabalhadores e trabalhadoras na miséria, criaram mecanismos de auxílio e de proteção enquanto durar a crise.
Portanto, uma Medida Provisória lamentável e grotesca, que só merece o repúdio, não só do movimento sindical, mas de todos as pessoas com um mínimo de senso de justiça e de humanidade. Não há outras letras para caracterizá-la: é um crime bárbaro contra as classes trabalhadoras brasileiras e contra o País.
* Sebastião Soares é diretor da CSPB e da Nova Central Sindical dos Trabalhadores.
Um governo criminoso que investe com fúria incomum sobre trabalhadores e trabalhadoras e o povo mais pobre, comete mais uma atrocidade com a edição da Medida Provisória 927/20. O foco da MP é a autorização para empregadores suspenderem contratos de trabalho por quatro meses ou enquanto durar o Estado de Calamidade, imposto pelo Decreto 06/20.
Trata-se, na verdade, de total desmonte de aspectos fundamentais do que ainda resta da legislação trabalhista. Acaba com a representação sindical em várias questões e transfere para o contrato individual, entre patrão e empregado, a suspensão de direitos trabalhistas e sindicais.
Vários aspectos da MP 917 podem ser destacados, a saber: exclusão dos sindicatos, prevalecendo os acordos individuais sobre as normas coletivas, sem que o empregado tenha qualquer assistência. O contrato de trabalho pode ser mudado para teletrabalho, inclusive para aprendizes e estagiários, com equipamentos próprios ou fornecidos pelo empregador em regime de comodato.
Autoriza, também, a antecipação de férias individuais; a concessão de férias coletivas; o aproveitamento e a antecipação de feriados; o banco de horas; a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho; o direcionamento do trabalhador para qualificação e o diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS. Tudo isso mediante contrato individual.
Fica suspensa a obrigatoriedade de realização dos exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, exceto dos exames demissionais. O exame demissional poderá ser dispensado caso o exame médico ocupacional mais recente tenha sido realizado há menos de cento e oitenta dias.
Vale reafirmar, as suspensões determinadas na MP 927 não dependerão de acordo ou convenção coletiva, poderão ser acordadas individualmente com o empregador ou o grupo de empregadores, e serão registradas em carteira de trabalho física ou eletrônica. Outro absurdo é que, nesse período, os Auditores Fiscais do Trabalho só atuarão de maneira orientadora, sem multar, exceto na falta de registro de empregado, isto se houver denúncia; ou em situações de grave e iminente risco de acidente de trabalho fatal, apurado por meio de procedimento fiscal de análise de acidente; e trabalho em condições análogas às de escravo ou trabalho infantil.
Ao conceder amplos poderes à negociação individual, a MP cria uma condição de flagrante injustiça, pois não se pode chamar de “acordo” em uma relação de trabalho hipossuficiente. Nas condições em que o acordo individual se efetiva, o trabalhador só entra com o pescoço, já que a corda está nas mãos do empregador.
As maldades são ainda piores quando a MP 927 afasta a possibilidade de enquadrar a contaminação pelos vírus, no ambiente laboral, como acidente de trabalho; permite aos patrões decidir sobre a ultratividade das convenções ou acordos coletivos de trabalho; prorroga a jornada de trabalho na saúde para além de 12 horas; não garante qualquer possibilidade estabilidade no emprego para os trabalhadores e trabalhadoras que firmarem o acordo individual; não permite layoff sem acesso ao seguro-desemprego e tem previsão de uma bolsa de qualificação, a critério do patrão, cujo valor é indefinido, podendo, até mesmo, não ter nenhuma remuneração.
A lei da selva nas relações de trabalho foi estabelecida. Os trabalhadores e trabalhadoras ficam à mercê dos seus empregadores que podem tudo. A rigor, revoga-se a legislação protetiva dos direitos das classes trabalhadoras, e recua o País ao começo do século passado, afastando a necessária presença da proteção sindical.
Instala-se a barbárie de maneira oportunista para favorecer o governo e as empresas, em detrimento da vida e da saúde de milhões de trabalhadores. É uma medida antagônica ao que faz a maioria dos governos de países similares ao Brasil, que, em vez de jogar trabalhadores e trabalhadoras na miséria, criaram mecanismos de auxílio e de proteção enquanto durar a crise.
Portanto, uma Medida Provisória lamentável e grotesca, que só merece o repúdio, não só do movimento sindical, mas de todos as pessoas com um mínimo de senso de justiça e de humanidade. Não há outras letras para caracterizá-la: é um crime bárbaro contra as classes trabalhadoras brasileiras e contra o País.
* Sebastião Soares é diretor da CSPB e da Nova Central Sindical dos Trabalhadores.
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