Por Luiz Gonzaga Belluzzo, no blog Nocaute:
Na quarta-feira, 15 de abril, o New York Times apresentou sua perplexidade com as iniciativas do Federal Reserve e do Tesouro americano que ajambraram um pacote trilionário para manter a economia de Tio Sam à tona.
O jornal conta que “os Estados Unidos responderam aos estragos econômicos causados pelo Coronavírus com o maior pacote de ajuda de sua história: US$ 2 trilhões.
Ele essencialmente substitui alguns meses de atividade econômica americana por uma enxurrada de dinheiro do governo – cada centavo dele emprestado ao próprio governo.”
E, logo, lança uma pergunta: “De onde vem todo esse dinheiro?
Resposta: “A maioria do nada.”
O velho e sempre novidadeiro capitalismo mostra a fisiologia de suas entranhas quando a coisa fica preta.
Nesse momento de ruptura dos circuitos mercantis, as visões, teorias e prosopopeias que circulam com a etiqueta de ciência são desmascaradas pelas forças do movimento real das coisas.
E as coisas estão a demonstrar que o mercado desmoronou e pede socorro aos bancos centrais e aos tesouros nacionais.
A turma da bufunfa – assim meu amigo Paulo Nogueira Batista Jr. chama os agentes dos mercados financeiros, a turma da Faria Lima – não sabe o que fazer diante da violência da pandemia econômica. Estão de costas para a parede.
Os circuitos de crédito e de avaliação dos ativos negociados e precificados nos ditos mercados secundários estão travados.
Caso valesse alguns centavos nesse momento, a chamada curva de juros estaria encolhidinha atrás da touceira, temerosa da perseguição do monstro deflacionário e exigindo uma compensação absurda como prêmio de risco.
Mas não é isso o que acontece. A demanda de títulos público é muito elástica
Chama o Estado porque o mercado sumiu.
A riqueza financeira privada capota e abre espaço para a expansão da dos títulos do governo.
Para tratar das perplexidades suscitadas pela súbita e inopinada irrupção dos Estado na reconstituição dos mercados, vou recorrer às sabedoria do maior crítico do capitalismo, ao mesmo tempo, seu grade admirador.
O leitor certamente sabe a quem me refiro. Um certo Karl Marx.
Em um dos capítulos de sua obra magna “O Capital”, Karl trata do surgimento do sistema monetário-financeiro ajustado aos requerimentos do Regime do Capital.
Ele vai cuidar da gênese dos sistemas monetários-financeiros modernos, os sistemas que ajudaram a impulsionar o nascimento da indústria depois da consolidação da propriedade privada moderna e da formação dos trabalhadores livres da servidão.
A citação é um tanto longa, mas necessária:
“A dívida pública torna-se uma das alavancas mais poderosas da acumulação primitiva. Como acontece com o toque da varinha de um encantador, emite o dinheiro estéril com seu poder da criação e transforma [esse dinheiro] em capital, sem a necessidade de se expor aos problemas e riscos inseparáveis de seu emprego na indústria ou mesmo na usura. Os credores estatais realmente não dão nada, pois a quantia emprestada é transformada em títulos públicos, facilmente negociáveis, que passam a funcionar em suas mãos, assim como o dinheiro vivo faria.
Mas, além da classe de rentistas preguiçosos, a riqueza criada do nada pelos [bancos], intermediários entre o governo e a nação, além dos agricultores, comerciantes, fabricantes privados, a quem boa parte dos empréstimos públicos prestam serviço, como um maná caído do céu – a dívida nacional deu origem a empresas por ações, a transações com ativos negociáveis de todos os tipos, em uma palavra ao jogo de bolsa de valores e dos bancos modernos.
Assim, para avaliar o acúmulo da dívida nacional não há medida mais infalível do que o aumento sucessivo do número de bancos, cujo desenvolvimento completo data da fundação do Banco da Inglaterra em 1694.
O Banco da Inglaterra começou com o empréstimo de seu dinheiro ao Governo em 8%; ao mesmo tempo, foi habilitado pelo Parlamento a cunhar dinheiro a partir do mesmo capital, emprestando-o novamente ao público sob a forma de cédulas.
Foi permitido usar essas notas para pagar contas, fazer empréstimos para o giro das mercadorias e para a compra dos metais preciosos.
Não demorou muito para que esse dinheiro de crédito, feito pelo próprio banco, se tornasse a moeda em que o Banco da Inglaterra fazia seus empréstimos ao Estado, e pagava, por conta do Estado, os juros da dívida pública.
Gradualmente, tornou-se o receptáculo do acervo metálico do país, e o centro de gravidade de todo o crédito comercial.
Esse foi o efeito produzido em seus contemporâneos pelo súbito surgimento desta ninhada de bancários, financiadores, rentistas, corretores, operadores das bolsas de valores, & c., tudo comprovado pelos escritos da época.”
A exaustiva citação revela o papel da dívida pública na composição da riqueza privada nos primórdios do capitalismo.
Mostra a importância do ativo-passivo emitido pelos governos na transição entre os patrimônios imobilizados na terra e a riqueza móvel e líquida.
Assim, o Banco da Inglaterra mediou as trepidações e expropriações da acumulação primitiva e criou o espaço monetário indispensável para o surgimento da economia da industria e da liberdade de empreender.
O Estado é o senhor da moeda, e os bancos, sob a supervisão e o controle do Banco Central são incumbidos da criação monetária mediante operações de crédito, o que permite a antecipação de expectativas futuras de produção e emprego, em virtude da tomada de risco pelos devedores, amparada na capacidade de alavancagem da atividade bancária.
Assim é, porque em sua dimensão monetária, o capitalismo revela o indissociável contubérnio entre o Universal e o Particular, entre o Estado e o Mercado, entre a Comunidade e o indivíduo.
O dinheiro não pode ser criado e entrar em circulação sem a benção do Estado e a unção das relações de propriedade, as relações débito-crédito.
A criação monetária executada pelos bancos sob a supervisão do Estado reforça as relações de propriedade: o banco credor empresta exercendo a função de agente privado do valor universal.
O devedor exercita seus direitos usufruindo o valor universal como proprietário privado.
Se não pagar a dívida, o agente privado do valor universal pode expropriar o devedor de sua propriedade.
Na pandemia econômica, os nexos monetários foram rompidos e os proprietários privados, aí incluídos os proprietários da força de trabalho, foram expropriados, afastados de suas atividades.
A propriedade jurídica sucumbe ao colapso econômico e a restauração das relações proprietárias só pode ser garantida pela ação discricionária do Estado – Banco Central e Tesouro Nacional.
Os mi-mi-mis liberalóides dos Paulo Guedes & Companhia, sempre preocupados com o que virá depois, podem destruir o futuro com suas vacilações do presente.
Retorno às páginas do New York Times:
“A dependência do Departamento do Tesouro em sua relação com o Fed, para a compra de seus títulos — e financiar grandes déficits — é uma mudança importante no pensamento convencional de políticos e formuladores de políticas, disse Paul McCulley, que se aposentou da Pimco em 2015 e agora leciona na Universidade de Georgetown. O que essa crise trouxe à tona é que este não é mais um debate acadêmico”, disse ele.
McCulley disse que a velocidade com que a crise avançou – e as circunstâncias únicas de um bloqueio quase nacional da produção e do consumo – significa que os líderes políticos não tinham escolha a não ser expandir os déficits. E, segundo ele, aqueles que geralmente questionam como os déficits serão pagos ficaram mudos.
“Como vamos pagar por isso?” McCulley disse.
“Nós imprimimos o maldito dinheiro.” Bingo!!!
O jornal conta que “os Estados Unidos responderam aos estragos econômicos causados pelo Coronavírus com o maior pacote de ajuda de sua história: US$ 2 trilhões.
Ele essencialmente substitui alguns meses de atividade econômica americana por uma enxurrada de dinheiro do governo – cada centavo dele emprestado ao próprio governo.”
E, logo, lança uma pergunta: “De onde vem todo esse dinheiro?
Resposta: “A maioria do nada.”
O velho e sempre novidadeiro capitalismo mostra a fisiologia de suas entranhas quando a coisa fica preta.
Nesse momento de ruptura dos circuitos mercantis, as visões, teorias e prosopopeias que circulam com a etiqueta de ciência são desmascaradas pelas forças do movimento real das coisas.
E as coisas estão a demonstrar que o mercado desmoronou e pede socorro aos bancos centrais e aos tesouros nacionais.
A turma da bufunfa – assim meu amigo Paulo Nogueira Batista Jr. chama os agentes dos mercados financeiros, a turma da Faria Lima – não sabe o que fazer diante da violência da pandemia econômica. Estão de costas para a parede.
Os circuitos de crédito e de avaliação dos ativos negociados e precificados nos ditos mercados secundários estão travados.
Caso valesse alguns centavos nesse momento, a chamada curva de juros estaria encolhidinha atrás da touceira, temerosa da perseguição do monstro deflacionário e exigindo uma compensação absurda como prêmio de risco.
Mas não é isso o que acontece. A demanda de títulos público é muito elástica
Chama o Estado porque o mercado sumiu.
A riqueza financeira privada capota e abre espaço para a expansão da dos títulos do governo.
Para tratar das perplexidades suscitadas pela súbita e inopinada irrupção dos Estado na reconstituição dos mercados, vou recorrer às sabedoria do maior crítico do capitalismo, ao mesmo tempo, seu grade admirador.
O leitor certamente sabe a quem me refiro. Um certo Karl Marx.
Em um dos capítulos de sua obra magna “O Capital”, Karl trata do surgimento do sistema monetário-financeiro ajustado aos requerimentos do Regime do Capital.
Ele vai cuidar da gênese dos sistemas monetários-financeiros modernos, os sistemas que ajudaram a impulsionar o nascimento da indústria depois da consolidação da propriedade privada moderna e da formação dos trabalhadores livres da servidão.
A citação é um tanto longa, mas necessária:
“A dívida pública torna-se uma das alavancas mais poderosas da acumulação primitiva. Como acontece com o toque da varinha de um encantador, emite o dinheiro estéril com seu poder da criação e transforma [esse dinheiro] em capital, sem a necessidade de se expor aos problemas e riscos inseparáveis de seu emprego na indústria ou mesmo na usura. Os credores estatais realmente não dão nada, pois a quantia emprestada é transformada em títulos públicos, facilmente negociáveis, que passam a funcionar em suas mãos, assim como o dinheiro vivo faria.
Mas, além da classe de rentistas preguiçosos, a riqueza criada do nada pelos [bancos], intermediários entre o governo e a nação, além dos agricultores, comerciantes, fabricantes privados, a quem boa parte dos empréstimos públicos prestam serviço, como um maná caído do céu – a dívida nacional deu origem a empresas por ações, a transações com ativos negociáveis de todos os tipos, em uma palavra ao jogo de bolsa de valores e dos bancos modernos.
Assim, para avaliar o acúmulo da dívida nacional não há medida mais infalível do que o aumento sucessivo do número de bancos, cujo desenvolvimento completo data da fundação do Banco da Inglaterra em 1694.
O Banco da Inglaterra começou com o empréstimo de seu dinheiro ao Governo em 8%; ao mesmo tempo, foi habilitado pelo Parlamento a cunhar dinheiro a partir do mesmo capital, emprestando-o novamente ao público sob a forma de cédulas.
Foi permitido usar essas notas para pagar contas, fazer empréstimos para o giro das mercadorias e para a compra dos metais preciosos.
Não demorou muito para que esse dinheiro de crédito, feito pelo próprio banco, se tornasse a moeda em que o Banco da Inglaterra fazia seus empréstimos ao Estado, e pagava, por conta do Estado, os juros da dívida pública.
Gradualmente, tornou-se o receptáculo do acervo metálico do país, e o centro de gravidade de todo o crédito comercial.
Esse foi o efeito produzido em seus contemporâneos pelo súbito surgimento desta ninhada de bancários, financiadores, rentistas, corretores, operadores das bolsas de valores, & c., tudo comprovado pelos escritos da época.”
A exaustiva citação revela o papel da dívida pública na composição da riqueza privada nos primórdios do capitalismo.
Mostra a importância do ativo-passivo emitido pelos governos na transição entre os patrimônios imobilizados na terra e a riqueza móvel e líquida.
Assim, o Banco da Inglaterra mediou as trepidações e expropriações da acumulação primitiva e criou o espaço monetário indispensável para o surgimento da economia da industria e da liberdade de empreender.
O Estado é o senhor da moeda, e os bancos, sob a supervisão e o controle do Banco Central são incumbidos da criação monetária mediante operações de crédito, o que permite a antecipação de expectativas futuras de produção e emprego, em virtude da tomada de risco pelos devedores, amparada na capacidade de alavancagem da atividade bancária.
Assim é, porque em sua dimensão monetária, o capitalismo revela o indissociável contubérnio entre o Universal e o Particular, entre o Estado e o Mercado, entre a Comunidade e o indivíduo.
O dinheiro não pode ser criado e entrar em circulação sem a benção do Estado e a unção das relações de propriedade, as relações débito-crédito.
A criação monetária executada pelos bancos sob a supervisão do Estado reforça as relações de propriedade: o banco credor empresta exercendo a função de agente privado do valor universal.
O devedor exercita seus direitos usufruindo o valor universal como proprietário privado.
Se não pagar a dívida, o agente privado do valor universal pode expropriar o devedor de sua propriedade.
Na pandemia econômica, os nexos monetários foram rompidos e os proprietários privados, aí incluídos os proprietários da força de trabalho, foram expropriados, afastados de suas atividades.
A propriedade jurídica sucumbe ao colapso econômico e a restauração das relações proprietárias só pode ser garantida pela ação discricionária do Estado – Banco Central e Tesouro Nacional.
Os mi-mi-mis liberalóides dos Paulo Guedes & Companhia, sempre preocupados com o que virá depois, podem destruir o futuro com suas vacilações do presente.
Retorno às páginas do New York Times:
“A dependência do Departamento do Tesouro em sua relação com o Fed, para a compra de seus títulos — e financiar grandes déficits — é uma mudança importante no pensamento convencional de políticos e formuladores de políticas, disse Paul McCulley, que se aposentou da Pimco em 2015 e agora leciona na Universidade de Georgetown. O que essa crise trouxe à tona é que este não é mais um debate acadêmico”, disse ele.
McCulley disse que a velocidade com que a crise avançou – e as circunstâncias únicas de um bloqueio quase nacional da produção e do consumo – significa que os líderes políticos não tinham escolha a não ser expandir os déficits. E, segundo ele, aqueles que geralmente questionam como os déficits serão pagos ficaram mudos.
“Como vamos pagar por isso?” McCulley disse.
“Nós imprimimos o maldito dinheiro.” Bingo!!!
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