Por Altamiro Borges
A deputada Luciana Genro, candidata da insólita aliança PSOL-PV à prefeitura de Porto Alegre, é famosa pela agressividade de seus discursos e pela intolerância diante dos adversários políticos. Nesta campanha eleitoral, ela tem adotado um discurso moralista, típico da velha UDN, na qual a fraseologia esquerdista deu lugar à pregação da ética. Essa imagem, porém, deve sofrer alguns abalos com a notícia de que a executiva municipal do PSOL, reunida em 14 de agosto, aceitou a oferta de doação de R$ 100 mil do complexo industrial de Jorge Gerdau, o barão da siderurgia.
O PSTU, ressentido com a implosão da “frente de esquerda” em várias partes do país e feroz crítico do “reformismo” do ex-partido aliado, foi o primeiro a denunciar a doação. O seu portal informa que este “fato muito grave está gerando uma crise política na campanha de Luciana Genro”. Outras correntes internas do PSOL estariam exigindo a revogação da decisão da direção municipal, que é hegemonizada pelo Movimento Esquerda Socialista (MES), tendência a qual pertence a candidata. Para o PSTU, com seu idílico purismo, a doação confirmaria o caráter burguês e a degeneração desta candidatura, que “segue trajetória semelhante ao do PT”.
“A burguesia não joga dinheiro fora”
“A Gerdau sempre investe muito no financiamento das campanhas eleitorais. Em 2006, foi uma das maiores doadoras e fez uma bancada de 27 deputados federais, segundo levantamento do jornal Valor Econômico... Essa empresa não faz nada de novo. É a mesma postura dos bancos, das grandes empresas de construção civil, das multinacionais automobilísticas. Eles financiam as campanhas do PT, PSDB, DEM, PMDB e conseguem influenciar o programa das candidaturas e depois os mandatos... É inevitável a relação entre dependência financeira e dependência política. A burguesia não joga dinheiro fora. Pouco a pouco, para manter as ‘contribuições’, o programa vai sendo ‘moderado’ e são ‘evitadas’ decisões que se choquem com os financiadores”, teoriza.
Para o PSTU, a doação de R$ 100 mil do Grupo Gerdau refletiria a acelerada “moderação” do PSOL. Ele cita a declaração do tesoureiro da campanha da deputada, Etevaldo Teixeira, segundo a qual o partido já teria procurado outros empresários. “Somos um partido novo e não tínhamos tradição de captação junto às empresas”, confessou. Como prova da “moderação”, o ex-partido aliado lembra que Luciana Genro tem dado prioridade à questão da segurança pública, propondo policiamento ostensivo, e que “trouxe um dos assessores de segurança de prefeituras do PT e da burguesia e também o ex-policial que inspirou o capitão Nascimento do filme Tropa de Elite”.
Avesso a qualquer política de aliança, o PSTU também recorda que o PSOL se aliou ao PV, “um partido da base de apoio do governo Lula, que na maior parte do país está coligado com a direita tradicional ou com o PT. No Rio de Janeiro, o PV de Fernando Gabeira está coligado ao PSDB e, em São Paulo, está apoiando Gilberto Kassab. O PV gaúcho não é diferente do resto do país. Nas últimas eleições, esteve coligado ao PP de Paulo Maluf e participou do governo do atual prefeito José Fogaça (PMDB). Agora vemos que o não à frente de esquerda PSTU/PSOL/PCB foi apenas o primeiro passo de outros que viriam”, sentencia o desiludido PSTU.
Democracia interna do PSOL pisoteada
As críticas aos rumos da campanha, porém, não partem apenas de forças que também disputam a prefeitura de Porto Alegre. Elas surgem do próprio interior deste partido, o que revela que a crise realmente é grave. Nota assinada por cinco tendências internas acaba de ser divulgada rejeitando a “a decisão do PSOL de Porto Alegre, tomada pela maioria do diretório municipal, de aceitar a polpuda oferta financeira do Grupo Gerdau... Como militantes do movimento sindical, estudantil e popular do campo e da cidade, assim como militantes que, em sua maioria, ajudaram a fundar o PSOL, manifestamos veemente repúdio a esta decisão, tomada à revelia da base partidária”.
Segundo a nota, assinada por dirigentes das tendências Socialismo Revolucionário, Alternativa Socialista, Reage, Coletivo Liberdade Socialista e Alternativa Revolucionária Socialista, “esta decisão não fere apenas o estatuto do partido e as resoluções da 2ª Conferencia Eleitoral do PSOL, sendo, portanto, de patente ilegalidade interna, mas atinge e de forma profunda todo o acúmulo político sobre o qual o partido foi fundado e terá repercussões gravíssimas. Trata-se de mais um passo atrás, um retrocesso evidente em relação ao projeto original do PSOL”.
Para estas seitas, a decisão representa “um giro à direita na política, que implica necessariamente que se pise na democracia interna”. Elas garantem que comprarão uma briga pública para evitar a total “degeneração” do partido. “O argumento de que um questionamento enfático por parte da militância contra esta decisão prejudicaria a campanha do PSOL não pode ser admitido. Prejuízo incalculável, isso sim, virá se a decisão for mantida. Essa discussão não se refere apenas a Porto Alegre. Militantes e candidatos do PSOL em todo o país terão que arcar com o peso dela”.
Hipocrisias na campanha eleitoral
Realmente, a inusitada decisão da executiva gaúcha deverá arranhar a aura de pureza do partido. Em São Paulo, por exemplo, o candidato do PSOL à prefeitura da capital, o respeitado deputado Ivan Valente, realçou no seu site um texto intitulado “Onde começa a corrupção nas prefeituras”. Ele é peremptório: “No momento da disputa eleitoral, empresas e grandes corporações fazem doações milionárias a diferentes candidaturas. Depois, o administrador eleito vê-se obrigado a ‘pagar a conta’... Por isso, nessas eleições, Ivan Valente lançou o desafio aos candidatos à prefeitura de São Paulo: não aceitar os recursos de empresas privadas”. E agora?
A própria candidata Luciana Genro, que se jacta da postura radical de sua corrente, também deve explicações as suas bases sobre a moderação do seu discurso atual. Como deputada estadual, ela espinafrou o Grupo Gerdau. Em novembro de 1998, por exemplo, atacou a isenção fiscal dada pelo governo estadual à poderosa siderúrgica, sediada na capital. “A Gerdau vai ganhar dinheiro dos cofres públicos e não apenas vai deixar de pagar o ICMS. Tudo isto ocorrerá num estado que está endividado, cuja arrecadação está caindo e que não cumpre a lei salarial”. E agora?
Diante da acirrada disputa eleitoral na emblemática Porto Alegre, em que a postulante do PSOL despencou nas pesquisas após curta fase de euforia, o seu partido procura formas para viabilizar a sua eleição. A questão dos recursos financeiros passa a ser nevrálgica para a campanha sair do isolamento e para garantir maior visibilidade. Mas as regras do jogo numa eleição burguesa são implacáveis. A política de alianças e o financiamento da campanha, entre outros requisitos, são equações complexas. Não toleram nem a fraseologia pseudo-revolucionária nem hipocrisias.
A deputada Luciana Genro, candidata da insólita aliança PSOL-PV à prefeitura de Porto Alegre, é famosa pela agressividade de seus discursos e pela intolerância diante dos adversários políticos. Nesta campanha eleitoral, ela tem adotado um discurso moralista, típico da velha UDN, na qual a fraseologia esquerdista deu lugar à pregação da ética. Essa imagem, porém, deve sofrer alguns abalos com a notícia de que a executiva municipal do PSOL, reunida em 14 de agosto, aceitou a oferta de doação de R$ 100 mil do complexo industrial de Jorge Gerdau, o barão da siderurgia.
O PSTU, ressentido com a implosão da “frente de esquerda” em várias partes do país e feroz crítico do “reformismo” do ex-partido aliado, foi o primeiro a denunciar a doação. O seu portal informa que este “fato muito grave está gerando uma crise política na campanha de Luciana Genro”. Outras correntes internas do PSOL estariam exigindo a revogação da decisão da direção municipal, que é hegemonizada pelo Movimento Esquerda Socialista (MES), tendência a qual pertence a candidata. Para o PSTU, com seu idílico purismo, a doação confirmaria o caráter burguês e a degeneração desta candidatura, que “segue trajetória semelhante ao do PT”.
“A burguesia não joga dinheiro fora”
“A Gerdau sempre investe muito no financiamento das campanhas eleitorais. Em 2006, foi uma das maiores doadoras e fez uma bancada de 27 deputados federais, segundo levantamento do jornal Valor Econômico... Essa empresa não faz nada de novo. É a mesma postura dos bancos, das grandes empresas de construção civil, das multinacionais automobilísticas. Eles financiam as campanhas do PT, PSDB, DEM, PMDB e conseguem influenciar o programa das candidaturas e depois os mandatos... É inevitável a relação entre dependência financeira e dependência política. A burguesia não joga dinheiro fora. Pouco a pouco, para manter as ‘contribuições’, o programa vai sendo ‘moderado’ e são ‘evitadas’ decisões que se choquem com os financiadores”, teoriza.
Para o PSTU, a doação de R$ 100 mil do Grupo Gerdau refletiria a acelerada “moderação” do PSOL. Ele cita a declaração do tesoureiro da campanha da deputada, Etevaldo Teixeira, segundo a qual o partido já teria procurado outros empresários. “Somos um partido novo e não tínhamos tradição de captação junto às empresas”, confessou. Como prova da “moderação”, o ex-partido aliado lembra que Luciana Genro tem dado prioridade à questão da segurança pública, propondo policiamento ostensivo, e que “trouxe um dos assessores de segurança de prefeituras do PT e da burguesia e também o ex-policial que inspirou o capitão Nascimento do filme Tropa de Elite”.
Avesso a qualquer política de aliança, o PSTU também recorda que o PSOL se aliou ao PV, “um partido da base de apoio do governo Lula, que na maior parte do país está coligado com a direita tradicional ou com o PT. No Rio de Janeiro, o PV de Fernando Gabeira está coligado ao PSDB e, em São Paulo, está apoiando Gilberto Kassab. O PV gaúcho não é diferente do resto do país. Nas últimas eleições, esteve coligado ao PP de Paulo Maluf e participou do governo do atual prefeito José Fogaça (PMDB). Agora vemos que o não à frente de esquerda PSTU/PSOL/PCB foi apenas o primeiro passo de outros que viriam”, sentencia o desiludido PSTU.
Democracia interna do PSOL pisoteada
As críticas aos rumos da campanha, porém, não partem apenas de forças que também disputam a prefeitura de Porto Alegre. Elas surgem do próprio interior deste partido, o que revela que a crise realmente é grave. Nota assinada por cinco tendências internas acaba de ser divulgada rejeitando a “a decisão do PSOL de Porto Alegre, tomada pela maioria do diretório municipal, de aceitar a polpuda oferta financeira do Grupo Gerdau... Como militantes do movimento sindical, estudantil e popular do campo e da cidade, assim como militantes que, em sua maioria, ajudaram a fundar o PSOL, manifestamos veemente repúdio a esta decisão, tomada à revelia da base partidária”.
Segundo a nota, assinada por dirigentes das tendências Socialismo Revolucionário, Alternativa Socialista, Reage, Coletivo Liberdade Socialista e Alternativa Revolucionária Socialista, “esta decisão não fere apenas o estatuto do partido e as resoluções da 2ª Conferencia Eleitoral do PSOL, sendo, portanto, de patente ilegalidade interna, mas atinge e de forma profunda todo o acúmulo político sobre o qual o partido foi fundado e terá repercussões gravíssimas. Trata-se de mais um passo atrás, um retrocesso evidente em relação ao projeto original do PSOL”.
Para estas seitas, a decisão representa “um giro à direita na política, que implica necessariamente que se pise na democracia interna”. Elas garantem que comprarão uma briga pública para evitar a total “degeneração” do partido. “O argumento de que um questionamento enfático por parte da militância contra esta decisão prejudicaria a campanha do PSOL não pode ser admitido. Prejuízo incalculável, isso sim, virá se a decisão for mantida. Essa discussão não se refere apenas a Porto Alegre. Militantes e candidatos do PSOL em todo o país terão que arcar com o peso dela”.
Hipocrisias na campanha eleitoral
Realmente, a inusitada decisão da executiva gaúcha deverá arranhar a aura de pureza do partido. Em São Paulo, por exemplo, o candidato do PSOL à prefeitura da capital, o respeitado deputado Ivan Valente, realçou no seu site um texto intitulado “Onde começa a corrupção nas prefeituras”. Ele é peremptório: “No momento da disputa eleitoral, empresas e grandes corporações fazem doações milionárias a diferentes candidaturas. Depois, o administrador eleito vê-se obrigado a ‘pagar a conta’... Por isso, nessas eleições, Ivan Valente lançou o desafio aos candidatos à prefeitura de São Paulo: não aceitar os recursos de empresas privadas”. E agora?
A própria candidata Luciana Genro, que se jacta da postura radical de sua corrente, também deve explicações as suas bases sobre a moderação do seu discurso atual. Como deputada estadual, ela espinafrou o Grupo Gerdau. Em novembro de 1998, por exemplo, atacou a isenção fiscal dada pelo governo estadual à poderosa siderúrgica, sediada na capital. “A Gerdau vai ganhar dinheiro dos cofres públicos e não apenas vai deixar de pagar o ICMS. Tudo isto ocorrerá num estado que está endividado, cuja arrecadação está caindo e que não cumpre a lei salarial”. E agora?
Diante da acirrada disputa eleitoral na emblemática Porto Alegre, em que a postulante do PSOL despencou nas pesquisas após curta fase de euforia, o seu partido procura formas para viabilizar a sua eleição. A questão dos recursos financeiros passa a ser nevrálgica para a campanha sair do isolamento e para garantir maior visibilidade. Mas as regras do jogo numa eleição burguesa são implacáveis. A política de alianças e o financiamento da campanha, entre outros requisitos, são equações complexas. Não toleram nem a fraseologia pseudo-revolucionária nem hipocrisias.
4 comentários:
É incrível perceber que mesmo tendo disponível desde 1920 o excelente livro de Lênin - "Esquerdismo, doença infantil do Comunismo" - muitas pessoas, até bem intencionadas, ainda incorrem no mesmo erro.
Será que um dia vão se libertar?
Altamiro, é uma vergonha o que acontece em termos de financiamento de campanhas. É preciso uma Reforma radical no sistema político brasileiro, não podemos aceitar a continuação da interferência do Capital Burguês. A busca pelo "poder" nivelou por baixo a maioria dos partidos políticos no Brasil. Lamnentável.
Nem precisamos recorrer a Lênin. Basta entender, de uma vez por todas, que Luciana e sua corrente, quando colocados à prova, nunca traíram os interesses dos trabalhadores. Ou já esqueceram do contexto no qual se deu a expulsão da deputada pelo PT. Naquele momento, para manter a luta, ela renunciou a máquina eleitoral do partido, enquanto muitos que agora repudiam a doação fizeram um movimento que eu chamava de "fiquismo", justamente para priorizar os mandatos em detrimento da disputa real.
Lênin, ao que se sabe, também buscava dinheiro junto à burguesia, coisa que não comprometeu-lhe...
Miro,
parabéns pelo blog.
Não é fácil manter a coerência entre discurso e prática... e isso vale para todos nós!!
Abraços e tudo de bom,
____________________
Antonio Ozaí da Silva
blog http://antonio-ozai.blogspot.com
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