Por Manuela D'Avila e Fabricio Solagna, no site Vermelho:
Nesta segunda-feira (11) começa o Fórum da Internet no Brasil em Porto Alegre, evento que reúne pessoas do país inteiro para discutir os desafios técnicos e políticos da rede. Em meio a tantos episódios de ódio e preconceito disseminados nas redes sociais, a garantia de um ambiente de respeito aos direitos humanos e a diversidade é um tema urgente a ser tratado.
A rede possibilita ferramentas inovadoras para o engajamento sobre direitos civis, mas infelizmente também tem o mesmo poder para disseminar mensagens ofensivas, discriminatórias e que incitam a intolerância.
Segundo pesquisa realizada na Inglaterra pela Dith the Label, mais de 70% dos jovens já foram alvo de ciberbulling, ou seja, agressões ou ofensas na rede. Já entre usuários do Facebook, mais da metade relatam que já vivenciaram esse tipo de agressão. É um termômetro do tamanho do problema que precisamos enfrentar, sem transformar a rede num espaço policialesco, nem tampouco num lugar de impunidade.
Aqui no Brasil vimos casos bastante exemplares nos últimos meses, como o ataque em massa ao perfil da atriz Taís Araújo com conteúdos racistas, o vazamento de imagens do estupro coletivo ocorrido no Rio de Janeiro ou ainda o caso ocorrido em Encantado, no Rio Grande do Sul, em que fotos e vídeos de meninas menores de idade circularam em grupos de WhatsApp.
A rede foi o instrumento do crime e também a plataforma de manifestação e apoio às vitimas. Se os casos não tivessem ganhado notoriedade talvez ficassem obscurecidos e dificilmente os algozes seriam investigados.
Foi nesse contexto que neste ano surgiram diversas propostas para alteração do Marco Civil da Internet com o objetivo de permitir o acesso aos dados cadastrais dos usuários da rede sem ordem judicial. Esta estratégia já foi amplamente discutida durante os sete anos de tramitação da lei que hoje é reconhecida mundialmente e recomendada pela ONU. Neste ponto acreditamos que remendos não vão estancar os crimes que ocorrem todos os dias na rede. A lei já define os direitos e responsabilidades dos diversos atores na rede. Em vez de remédio pode funcionar como veneno, trazendo insegurança, desequilíbrio jurídico e abuso de poder.
A questão é dar um passo adiante, permitindo que a Internet continue aberta, democrática mas com respeito aos direitos humanos.
Para investigar os cibercrimes, em vários Estados foram criadas delegacias especializadas em investigação de cibercrimes justamente para que os crimes ocorridos na Internet possam ser tratados por equipes especializadas. No Rio Grande do Sul, por exemplo, existe a Delegacia de Repressão aos Crimes Cibernéticos (DRCI). Isso tem se mostrado realmente eficiente para casos de crimes sexuais e contra o patrimônio.
No entanto, há uma lacuna quando se trata de crimes contra os direitos humanos. A não ser que você seja uma personalidade ou uma pessoa famosa, denunciar um crime de ódio, preconceito ou ameaça na rede pode ser mais difícil do que se imagina. Para que as pessoas comuns possam ter a mesma atenção é mais que necessária uma delegacia especializada em direitos humanos na Internet, que possa tratar dos crimes deste tipo na rede, sem atalhar os caminhos necessários para uma investigação criminal e sem tratar isso como um crime menor.
Não é preciso dar mais poder ao delegado como propõem algumas propostas de lei, apenas ter uma estrutura que acolha e responda a este tipo de problema, a exemplo do que ocorre com a delegacia da mulher. A delegacia nem precisa ser física, ela pode ser online e permitir um acesso facilitado.
Ou seja, a solução não é culpabilizar a rede, criando legislações cada vez mais punitivas e que acabem por ferir outros direitos. Para que os crimes sejam denunciados, investigados e os culpados punidos é preciso existir um espaço que tenha condições de receber este tipo de denúncia. Isso não implica necessariamente em mais gasto, mas em melhor planejamento para combater os crimes que acontecem na rede e afetam a vida concreta das pessoas. Assim poderemos garantir uma Internet com mais diversidade e com mais respeito, podendo exercer o principal direito humano que a rede proporciona, o direito de liberdade de expressão.
* Manuela D'Ávila é deputada estadual pelo PCdoB do Rio Grande do Sul e Fabricio Solagna é doutorando em Sociologia pela UFRGS e membro do núcleo do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barao de Itarare do RS.
A rede possibilita ferramentas inovadoras para o engajamento sobre direitos civis, mas infelizmente também tem o mesmo poder para disseminar mensagens ofensivas, discriminatórias e que incitam a intolerância.
Segundo pesquisa realizada na Inglaterra pela Dith the Label, mais de 70% dos jovens já foram alvo de ciberbulling, ou seja, agressões ou ofensas na rede. Já entre usuários do Facebook, mais da metade relatam que já vivenciaram esse tipo de agressão. É um termômetro do tamanho do problema que precisamos enfrentar, sem transformar a rede num espaço policialesco, nem tampouco num lugar de impunidade.
Aqui no Brasil vimos casos bastante exemplares nos últimos meses, como o ataque em massa ao perfil da atriz Taís Araújo com conteúdos racistas, o vazamento de imagens do estupro coletivo ocorrido no Rio de Janeiro ou ainda o caso ocorrido em Encantado, no Rio Grande do Sul, em que fotos e vídeos de meninas menores de idade circularam em grupos de WhatsApp.
A rede foi o instrumento do crime e também a plataforma de manifestação e apoio às vitimas. Se os casos não tivessem ganhado notoriedade talvez ficassem obscurecidos e dificilmente os algozes seriam investigados.
Foi nesse contexto que neste ano surgiram diversas propostas para alteração do Marco Civil da Internet com o objetivo de permitir o acesso aos dados cadastrais dos usuários da rede sem ordem judicial. Esta estratégia já foi amplamente discutida durante os sete anos de tramitação da lei que hoje é reconhecida mundialmente e recomendada pela ONU. Neste ponto acreditamos que remendos não vão estancar os crimes que ocorrem todos os dias na rede. A lei já define os direitos e responsabilidades dos diversos atores na rede. Em vez de remédio pode funcionar como veneno, trazendo insegurança, desequilíbrio jurídico e abuso de poder.
A questão é dar um passo adiante, permitindo que a Internet continue aberta, democrática mas com respeito aos direitos humanos.
Para investigar os cibercrimes, em vários Estados foram criadas delegacias especializadas em investigação de cibercrimes justamente para que os crimes ocorridos na Internet possam ser tratados por equipes especializadas. No Rio Grande do Sul, por exemplo, existe a Delegacia de Repressão aos Crimes Cibernéticos (DRCI). Isso tem se mostrado realmente eficiente para casos de crimes sexuais e contra o patrimônio.
No entanto, há uma lacuna quando se trata de crimes contra os direitos humanos. A não ser que você seja uma personalidade ou uma pessoa famosa, denunciar um crime de ódio, preconceito ou ameaça na rede pode ser mais difícil do que se imagina. Para que as pessoas comuns possam ter a mesma atenção é mais que necessária uma delegacia especializada em direitos humanos na Internet, que possa tratar dos crimes deste tipo na rede, sem atalhar os caminhos necessários para uma investigação criminal e sem tratar isso como um crime menor.
Não é preciso dar mais poder ao delegado como propõem algumas propostas de lei, apenas ter uma estrutura que acolha e responda a este tipo de problema, a exemplo do que ocorre com a delegacia da mulher. A delegacia nem precisa ser física, ela pode ser online e permitir um acesso facilitado.
Ou seja, a solução não é culpabilizar a rede, criando legislações cada vez mais punitivas e que acabem por ferir outros direitos. Para que os crimes sejam denunciados, investigados e os culpados punidos é preciso existir um espaço que tenha condições de receber este tipo de denúncia. Isso não implica necessariamente em mais gasto, mas em melhor planejamento para combater os crimes que acontecem na rede e afetam a vida concreta das pessoas. Assim poderemos garantir uma Internet com mais diversidade e com mais respeito, podendo exercer o principal direito humano que a rede proporciona, o direito de liberdade de expressão.
* Manuela D'Ávila é deputada estadual pelo PCdoB do Rio Grande do Sul e Fabricio Solagna é doutorando em Sociologia pela UFRGS e membro do núcleo do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barao de Itarare do RS.
* Publicado originalmente no site Vermelho.
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