Charge: Zé Dassilva |
Uma eleição subverte todas as matemáticas. Por isso é divertido ler que Eduardo Leite vai entrar na corrida presidencial, como possível surpresa da terceira via pelo PSD, para subtrair eleitores de João Doria, Ciro Gomes e Sergio Moro e assim chegar ao segundo turno.
Não há tantos eleitores para essa subtração. Tirar votos desses três, para afastar Bolsonaro do páreo e enfrentar Lula, seria brigar por pedaços de uma fatia de no máximo 20%. Que é a soma mais otimista das preferências pelos três nas pesquisas.
Se conseguisse tomar tudo o que Doria, Ciro e Moro têm até agora, mas tudo mesmo, Leite não chegaria perto de Bolsonaro, que oscila entre os 25% e os 30%.
Eduardo Leite só teria uma chance de prosperar e sonhar em tirar Bolsonaro do segundo turno. Precisaria brigar para buscar de volta partes dos votos da classe média que se jogou no colo de Bolsonaro como a gambiarra salvadora de 2018.
Uma classe média desamparada pela fragilização do PSDB, que João Doria jogou não conseguiu atrair com sua vacina e que agora está dispersa, mas está também, e muito, com Lula.
Leite vai ter que tirar nacos desses três e outros pedaços das preferências por Lula para almejar alguma coisa.
Consagrou-se que não há como querer tirar, em número relevante, eleitores de Bolsonaro, o candidato que tem a maior fidelização de uma base quase intocada.
Conseguir essa façanha de tirar votos de Ciro, Doria, Moro e Lula, sem mexer no lastro de Bolsonaro, é muito para quem aparecia nas pesquisas, antes das prévias do PSDB, com apenas 4%.
Eduardo Leite tem o desafio de ser o que Ciro, Doria e Moro não foram até agora e, pelo jeito, nunca serão. E ainda poderemos ter Simone Tebet nessa faixa.
O futuro ex-tucano apresenta-se com muitos problemas a resolver. Foi bolsonarista assumido em 2018, mesmo que às vezes tentasse dissimular.
E anunciou que, se perdesse nas prévias, trabalharia por Doria. Ficou marcado como bolsonarista oportunista e agora pode ter mais a marca de mau perdedor que divide o que resta dos tucanos.
Leite é o sobrinho fofo do mercado e dos empresários, por sua obsessão privatizante. Mas é também desnatado demais para passar ao eleitorado de centro e de direita a certeza de que seria a alternativa a Bolsonaro.
O impasse pode ser assim resumido. O eleitorado de centro e da direita moderada é maioria nessa faixa conservadora e deseja mesmo outra coisa que não seja Bolsonaro.
Mas esse eleitorado com escrúpulos é vacilante, não tem convicções desde a morte do tucanismo. Já o eleitorado que sustenta Bolsonaro, que se identifica com tudo que o sujeito diz e faz, é fiel e não arreda pé.
A ‘racionalidade’ desse eleitorado fiel constrói na cabeça do bolsonarismo o cenário que irá repetir em 2022 o que aconteceu em 2018. Que Bolsonaro vai para o segundo turno, desta vez menos agressivo, e que depois é só comemorar.
Por isso Leite, no quadro atual, não tem futuro. Porque Bolsonaro ainda ilude um quarto da população com a ideia de que voltará a ser a enjambração anti-Lula e anti-PT.
Se Leite conseguisse reverter essa situação e, num milagre, ir para o segundo turno contra Lula, aí poderíamos ter outro cenário.
Mas antes ele precisa vencer Bolsonaro, enfrentando a matemática e também as milícias da extrema direita. Leite é jovem e pode estar mesmo se apresentando como projeto de longo prazo.
Se não der certo, volta daqui a quatro anos. Lula, Mitterrand e tantos outros tentaram pelo menos três vezes. O importante é estar na vitrine nacional.
Até porque o pior risco seria concorrer à reeleição no Estado e ser derrotado, como foram todos os governadores gaúchos que tentaram um segundo mandato.
Seria demais para o ego de quem diz, desde o tempo de vereador em Pelotas, que nasceu para ser presidente da República. Leite vem aí para convencer os desencantados de que é a terceira via desde criancinha.
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