Por Eric Nepomuceno, no sítio Carta Maior:
Entre janeiro e julho venderam-se no Brasil pouco mais de dois milhões de veículos. É uma nova marca histórica e significa um crescimento de quase 9% em relação ao mesmo período de 2010. As empresas aéreas locais, por sua vez, experimentaram um aumento de 19% em suas vendas e jamais tantos brasileiros viajaram ao exterior, gastando como nunca. O Brasil é o país líder na expansão do setor aéreo em todo o mundo.
São brasileiros os estrangeiros que mais compram imóveis em Miami e arredores. E, para completar o cenário de bonança extrema, São Paulo é a décima cidade mais cara do planeta, e o Rio ocupa o décimo segundo posto no mesmo ranking. Vive-se mais barato em Berna, Copenhague ou Londres, e muitíssimo mais barato em paris, Milão ou Nova York. O custo de vida em Brasília supera o de Roma, Viena ou Estocolmo.
Em nenhum outro país se expande tanto e com tanta velocidade o número de internautas, e nos últimos quatro anos a telefonia móvel (o Brasil é o quinto mercado do setor no mundo) duplicou de tamanho. Existem mais telefones celulares que habitantes no país. Os preços dos imóveis nas duas maiores cidades fazem com que seja mais barato um escritório em Wall Street ou um apartamento em Manhattan que no Rio ou em São Paulo. Agências de publicidade dedicam seus melhores esforços para criar campanhas dirigidas especialmente aos quase 32 milhões de brasileiros que, nos últimos seis anos, ingressaram, velozes e ávidos, na classe média.
As reservas em dólares superam os 345 bilhões e o país está entre os cinco destinos preferenciais de investimentos estrangeiros no mundo.
Por detrás dessa aparente exibição de força e pujança há uma razão que preocupa cada vez mais o governo e desperta críticas contundentes de diversos e respeitados economistas: a supervalorização do real. O dólar vale hoje menos do que há doze anos. Nos últimos meses o governo brasileiro adotou uma série de medidas para impedir que a moeda norteamericana siga derretendo frente ao real, mas sem obter maiores resultados. Membros da equipe econômica asseguram que, se não fosse por essas medidas aparentemente ineficazes, o câmbio estaria muito próximo da paridade com o real (a cotação atual anda na casa de 1,55 real por dólar).
O resultado visível da valorização do real está, entre outras coisas, nos crescentes contingentes de brasileiros fazendo turismo no exterior, na expansão da importação de automóveis, nos investimentos imobiliários em Miami e na comparação do custo de vida no Rio e em São Paulo com outras metrópoles onde seguramente a qualidade de vida é bastante superior e a um preço mais baixo.
Mas existe também o rosto menos visível e mais preocupante, que aparece de maneira incessante para industriais, empresários, economistas e, claro, para o governo. As exportações de manufaturados e de produtos industriais despencaram nos últimos anos. Dos automóveis produzidos no Brasil há cinco anos, cerca de 30% eram exportados. Hoje, esse número caiu para 12%. Enquanto isso, os automóveis importados significavam 5% do mercado em 2005 e hoje representam 22%. Se não fosse os preços das commodities, em constante expansão, o Brasil teria graves problemas em sua balança comercial. O país é o vigésimo exportador mundial e não consegue subir no ranking graças a sua moeda, que é uma das que mais se valorizaram frente ao dólar nos últimos anos, especialmente em 2011.
Os malefícios gerados por dois fatores específicos – o excessivo ingresso de moeda norteamericana no país, que valoriza o real, mais as taxas de juro mais elevadas do mundo, ferramenta favorita do governo para controlar a inflação – causam desastres no parque industrial brasileiro. Todo o resto, ou seja, as aparências de um período de extrema prosperidade, se desfaz frente à crise enfrentada pela indústria, que, em alguns segmentos, se aproxima de um nível de gravidade preocupante.
Um número considerável de empresas contraíram empréstimos significativos em dólares, aproveitando-se das baixas taxas de juro do mercado externo e da forte valorização do real. Muitas tomaram empréstimos em dólares, ingressaram com a moeda no Brasil e aplicaram o resultado em títulos locais, que remuneram com taxas muito mais altas do que aquelas que são pagas no exterior. Por mais que o governo tenha lançado advertências sobre os riscos desse tipo de operação, uma súbita valorização do dólar provocaria estragos consistentes nessas empresas e bancos. Neste cenário – a crise vivida na Europa provocando uma elevação da moeda norteamericana – é outro fantasma que assombra a equipe econômica brasileira.
* Artigo publicado no jornal argentino Pagina/12. Tradução de Katarina Peixoto.
Entre janeiro e julho venderam-se no Brasil pouco mais de dois milhões de veículos. É uma nova marca histórica e significa um crescimento de quase 9% em relação ao mesmo período de 2010. As empresas aéreas locais, por sua vez, experimentaram um aumento de 19% em suas vendas e jamais tantos brasileiros viajaram ao exterior, gastando como nunca. O Brasil é o país líder na expansão do setor aéreo em todo o mundo.
São brasileiros os estrangeiros que mais compram imóveis em Miami e arredores. E, para completar o cenário de bonança extrema, São Paulo é a décima cidade mais cara do planeta, e o Rio ocupa o décimo segundo posto no mesmo ranking. Vive-se mais barato em Berna, Copenhague ou Londres, e muitíssimo mais barato em paris, Milão ou Nova York. O custo de vida em Brasília supera o de Roma, Viena ou Estocolmo.
Em nenhum outro país se expande tanto e com tanta velocidade o número de internautas, e nos últimos quatro anos a telefonia móvel (o Brasil é o quinto mercado do setor no mundo) duplicou de tamanho. Existem mais telefones celulares que habitantes no país. Os preços dos imóveis nas duas maiores cidades fazem com que seja mais barato um escritório em Wall Street ou um apartamento em Manhattan que no Rio ou em São Paulo. Agências de publicidade dedicam seus melhores esforços para criar campanhas dirigidas especialmente aos quase 32 milhões de brasileiros que, nos últimos seis anos, ingressaram, velozes e ávidos, na classe média.
As reservas em dólares superam os 345 bilhões e o país está entre os cinco destinos preferenciais de investimentos estrangeiros no mundo.
Por detrás dessa aparente exibição de força e pujança há uma razão que preocupa cada vez mais o governo e desperta críticas contundentes de diversos e respeitados economistas: a supervalorização do real. O dólar vale hoje menos do que há doze anos. Nos últimos meses o governo brasileiro adotou uma série de medidas para impedir que a moeda norteamericana siga derretendo frente ao real, mas sem obter maiores resultados. Membros da equipe econômica asseguram que, se não fosse por essas medidas aparentemente ineficazes, o câmbio estaria muito próximo da paridade com o real (a cotação atual anda na casa de 1,55 real por dólar).
O resultado visível da valorização do real está, entre outras coisas, nos crescentes contingentes de brasileiros fazendo turismo no exterior, na expansão da importação de automóveis, nos investimentos imobiliários em Miami e na comparação do custo de vida no Rio e em São Paulo com outras metrópoles onde seguramente a qualidade de vida é bastante superior e a um preço mais baixo.
Mas existe também o rosto menos visível e mais preocupante, que aparece de maneira incessante para industriais, empresários, economistas e, claro, para o governo. As exportações de manufaturados e de produtos industriais despencaram nos últimos anos. Dos automóveis produzidos no Brasil há cinco anos, cerca de 30% eram exportados. Hoje, esse número caiu para 12%. Enquanto isso, os automóveis importados significavam 5% do mercado em 2005 e hoje representam 22%. Se não fosse os preços das commodities, em constante expansão, o Brasil teria graves problemas em sua balança comercial. O país é o vigésimo exportador mundial e não consegue subir no ranking graças a sua moeda, que é uma das que mais se valorizaram frente ao dólar nos últimos anos, especialmente em 2011.
Os malefícios gerados por dois fatores específicos – o excessivo ingresso de moeda norteamericana no país, que valoriza o real, mais as taxas de juro mais elevadas do mundo, ferramenta favorita do governo para controlar a inflação – causam desastres no parque industrial brasileiro. Todo o resto, ou seja, as aparências de um período de extrema prosperidade, se desfaz frente à crise enfrentada pela indústria, que, em alguns segmentos, se aproxima de um nível de gravidade preocupante.
Um número considerável de empresas contraíram empréstimos significativos em dólares, aproveitando-se das baixas taxas de juro do mercado externo e da forte valorização do real. Muitas tomaram empréstimos em dólares, ingressaram com a moeda no Brasil e aplicaram o resultado em títulos locais, que remuneram com taxas muito mais altas do que aquelas que são pagas no exterior. Por mais que o governo tenha lançado advertências sobre os riscos desse tipo de operação, uma súbita valorização do dólar provocaria estragos consistentes nessas empresas e bancos. Neste cenário – a crise vivida na Europa provocando uma elevação da moeda norteamericana – é outro fantasma que assombra a equipe econômica brasileira.
* Artigo publicado no jornal argentino Pagina/12. Tradução de Katarina Peixoto.
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