Por Maurício Caleiro, no blog Cinema & Outras Artes:
À medida que se aproxima a Copa de 2014, a histeria ansiosa que marca as expectativas quanto à suposta incapacidade do Brasil de preparar o evento vai atingindo índices superlativos. Por toda a parte lê-se que fracassaremos, que não temos capacidade de produzir um evento de tal porte, que os turistas ficarão presos no trânsito, sem conseguir chegar aos estádios - os quais, por sua vez, não ficarão prontos a tempo.
Tal reação mescla a expressão de uma insegurança atávica, típica de um país de modernização relativamente recente, com o velho hábito brasileiro de degradar a si e à nação. Ante a iminência de atrairmos os olhares do mundo, nós, brasileiros, não obstante o ótimo momento do país no cenário internacional, damos vazão à nossa insegurança e, parafraseando Nelson Rodrigues, derramamos a baba espessa e canina de nosso complexo de vira-latas.
Mas não se devem apenas à psicologia social brasileira a descrença e o tom alarmante que têm marcado as expectativas quanto à segunda Copa do Mundo a realizar-se em território nacional, depois de um hiato de 64 anos. O pessimismo que marca tal ansiedade vem sendo diariamente inflamado por uma mídia corporativa que, por conta de seus interesses político-econômicos, anseia por poder pespegar no governo de Dilma Rousseff o ônus por um eventual fracasso brasileiro – com o deleite adicional de, como esta semana já ensaiou fazer, poder atribuir ao ex-presidente Lula a irresponsabilidade de ter trazido um evento tão importante para um país tão incompetente.
Nesse vale-tudo de uma mídia que, com raríssimas exceções, tem atuado de forma partidária e com tal desenvoltura que não se pode qualificar como jornalismo a atividade que pratica, grassa a manipulação barata da opinião pública, sobretudo por jornalistas esportivos que fizeram carreira posando de catão e valando-se de um denuncismo moralista. À abordagem da preparação para a Copa é fornecida, quase sempre, o ângulo mais pessimista e desfavorável: o cronograma das obras é acompanhado a cada minuto, o que inevitavelmente gera a ansiedade do fracasso; alardeia-se uma corrupção generalizada antes mesmo de apurar qualquer evidência; os bastidores da negociação entre governo e Fifa ganham uma cobertura maniqueísta e de uma dramaticidade digna de um filme de Almodóvar; e a simples decisão sobre vender ou não cerveja nos estádios transforma-se numa questão de soberania nacional (como se a plutocracia midiática por esta zelasse...).
Que compartilhem tais maus augúrios midiáticos muitos entusiastas do conservadorismo e aquela parcela de brasileiros que morre de vergonha do país em que vive é algo que se lamenta, mas compreende-se; já o fato de que tantos autoproclamados esquerdistas embarquem ingenuamente nessa canoa, reproduzindo como papagaios os presságios da imprensa e ajudando a campanha negativista da oposição, é algo a se deplorar profundamente.
Por conta desse discurso negativista que ora se espalha e parece dominante, a impressão que se tem é que organizar uma Copa do Mundo equivale a uma tarefa hercúlea e inexequível. Infelizmente, não é bem assim: para hospedar o mundial em solo pátrio, o Brasil não terá de construir um circuito de pirâmides maiores que as do Egito, construir um trem-bala ligando Recife a Cuiabá, nem transplantar as águas do rio Amazonas para Porto Alegre.
A Copa do Mundo, por incrível que possa parecer, não passa de um torneio de futebol. E curto: dura exatamente um mês, em que são jogados 64 partidas. Demanda alguns estádios, hotéis para hospedar times e turistas, melhorias no sistema viário das cidades-sede e no sistema aeroportuário, telecomunicações tinindo. Basta um exame sereno e racional da questão, sem complexo de inferioridade ou ódios politicamente motivados, para constatar que o Brasil tem todas as condições para realizar os empreendimentos necessários a suprimir tais demandas – e o fará, à sua maneira, em seu ritmo, mas efetivamente.
Ouso, portanto, informar aos barões da mídia e aos demais corvos de plantão que a mandinga não vai funcionar e a Copa de 2014 será um sucesso. Algumas obras serão entregues com atraso? Certamente. O trânsito ficará um caos? Muito provavelmente. Alguns voos atrasarão? Não tenho dúvidas (e a mídia fará de tudo para maximizar os eventuais problemas do torneio e por estes caracterizá-lo). Mas os turistas e profissionais que vierem para o evento vão se amarrar muito, e não só, como de costume, com as belezas naturais, as praias, o friendly and warm people, a sensualidade latente, a diversidade musical, a caipirinha, a feijoada, mas com o grau de urbanidade e modernidade do ex-país periférico. Será um mês de festa também para os brasileiros, tanto para a maioria que vai curtir o evento em casa quanto para os que irão ao estádio – e, de maneira peculiar, para os comerciantes e prestadores de serviços que lucrarão com o mundial.
Se há algo para se preocupar em relação à Copa, aí sim, é com a seleção comandada por Mano Menezes. Não que faltem craques, mas, até o momento, não se tem esquema tático e padrão de jogo. Mas isso é outro departamento.
À medida que se aproxima a Copa de 2014, a histeria ansiosa que marca as expectativas quanto à suposta incapacidade do Brasil de preparar o evento vai atingindo índices superlativos. Por toda a parte lê-se que fracassaremos, que não temos capacidade de produzir um evento de tal porte, que os turistas ficarão presos no trânsito, sem conseguir chegar aos estádios - os quais, por sua vez, não ficarão prontos a tempo.
Tal reação mescla a expressão de uma insegurança atávica, típica de um país de modernização relativamente recente, com o velho hábito brasileiro de degradar a si e à nação. Ante a iminência de atrairmos os olhares do mundo, nós, brasileiros, não obstante o ótimo momento do país no cenário internacional, damos vazão à nossa insegurança e, parafraseando Nelson Rodrigues, derramamos a baba espessa e canina de nosso complexo de vira-latas.
Mas não se devem apenas à psicologia social brasileira a descrença e o tom alarmante que têm marcado as expectativas quanto à segunda Copa do Mundo a realizar-se em território nacional, depois de um hiato de 64 anos. O pessimismo que marca tal ansiedade vem sendo diariamente inflamado por uma mídia corporativa que, por conta de seus interesses político-econômicos, anseia por poder pespegar no governo de Dilma Rousseff o ônus por um eventual fracasso brasileiro – com o deleite adicional de, como esta semana já ensaiou fazer, poder atribuir ao ex-presidente Lula a irresponsabilidade de ter trazido um evento tão importante para um país tão incompetente.
Nesse vale-tudo de uma mídia que, com raríssimas exceções, tem atuado de forma partidária e com tal desenvoltura que não se pode qualificar como jornalismo a atividade que pratica, grassa a manipulação barata da opinião pública, sobretudo por jornalistas esportivos que fizeram carreira posando de catão e valando-se de um denuncismo moralista. À abordagem da preparação para a Copa é fornecida, quase sempre, o ângulo mais pessimista e desfavorável: o cronograma das obras é acompanhado a cada minuto, o que inevitavelmente gera a ansiedade do fracasso; alardeia-se uma corrupção generalizada antes mesmo de apurar qualquer evidência; os bastidores da negociação entre governo e Fifa ganham uma cobertura maniqueísta e de uma dramaticidade digna de um filme de Almodóvar; e a simples decisão sobre vender ou não cerveja nos estádios transforma-se numa questão de soberania nacional (como se a plutocracia midiática por esta zelasse...).
Que compartilhem tais maus augúrios midiáticos muitos entusiastas do conservadorismo e aquela parcela de brasileiros que morre de vergonha do país em que vive é algo que se lamenta, mas compreende-se; já o fato de que tantos autoproclamados esquerdistas embarquem ingenuamente nessa canoa, reproduzindo como papagaios os presságios da imprensa e ajudando a campanha negativista da oposição, é algo a se deplorar profundamente.
Por conta desse discurso negativista que ora se espalha e parece dominante, a impressão que se tem é que organizar uma Copa do Mundo equivale a uma tarefa hercúlea e inexequível. Infelizmente, não é bem assim: para hospedar o mundial em solo pátrio, o Brasil não terá de construir um circuito de pirâmides maiores que as do Egito, construir um trem-bala ligando Recife a Cuiabá, nem transplantar as águas do rio Amazonas para Porto Alegre.
A Copa do Mundo, por incrível que possa parecer, não passa de um torneio de futebol. E curto: dura exatamente um mês, em que são jogados 64 partidas. Demanda alguns estádios, hotéis para hospedar times e turistas, melhorias no sistema viário das cidades-sede e no sistema aeroportuário, telecomunicações tinindo. Basta um exame sereno e racional da questão, sem complexo de inferioridade ou ódios politicamente motivados, para constatar que o Brasil tem todas as condições para realizar os empreendimentos necessários a suprimir tais demandas – e o fará, à sua maneira, em seu ritmo, mas efetivamente.
Ouso, portanto, informar aos barões da mídia e aos demais corvos de plantão que a mandinga não vai funcionar e a Copa de 2014 será um sucesso. Algumas obras serão entregues com atraso? Certamente. O trânsito ficará um caos? Muito provavelmente. Alguns voos atrasarão? Não tenho dúvidas (e a mídia fará de tudo para maximizar os eventuais problemas do torneio e por estes caracterizá-lo). Mas os turistas e profissionais que vierem para o evento vão se amarrar muito, e não só, como de costume, com as belezas naturais, as praias, o friendly and warm people, a sensualidade latente, a diversidade musical, a caipirinha, a feijoada, mas com o grau de urbanidade e modernidade do ex-país periférico. Será um mês de festa também para os brasileiros, tanto para a maioria que vai curtir o evento em casa quanto para os que irão ao estádio – e, de maneira peculiar, para os comerciantes e prestadores de serviços que lucrarão com o mundial.
Se há algo para se preocupar em relação à Copa, aí sim, é com a seleção comandada por Mano Menezes. Não que faltem craques, mas, até o momento, não se tem esquema tático e padrão de jogo. Mas isso é outro departamento.
8 comentários:
Esqueceu de mencionar os SUPERFATURAMENTOS de OBRAS! Mas o BRASILLLLL é RICO...
A Rádio Bandeirantes e a Rádio Estadão-ESPN deveriam ter a coerência de abdicar das transmissões de qualquer assunto sobre a Copa 2014, inclusive do evento propriamente dito, os jogos, pois que vantagem tem para qualquer emissora transmitir uma droga - como eles bradam -de evento?
Aqui no RJ, graças a Eduardo Paes e Sergio Cabral, já estamos presos no trânsito.
Mesmo que a copa seja um sucesso, é bom lembrarmos de duas coisinhas:
- primeiro, será que a população brasileira vai finalmente conseguir perceber que o futebol é APENAS UMA FORMA DE DIVERSÃO e que esse papo de que "é importante" a "seleção" jogar bem e ganhar é algo absolutamente supérfluo e um tanto infantil?
- segundo: será que vão se lembrar dos brasileiros que não curtem futebol, completamente esquecidos durante um mês em todo ano de copa?
A questão maior não é o trãnsito ou até mesmo os superfaturamentos de obras. O problema é esses estádios elefantes brancos em Manaus e Cuiabá e o fato de estarem gastando dinheiro público nisso. Quem vê as críticas parece estar confundindo as coisas. Quem critica não está contra o Brasil, apenas acha errado jogar milhões em estádios que ficarão as moscas depois da Copa.
Esqueceu de algo muito importante meu caro Miro... quantos conseguirão assistir em casa os jogos? será transmitido democraticamente para todos ou somente assistirá quem tiver TV a Cabo??
Não há dúvida de que interessa,e muito,à oposição que o Brasil não consiga realizar a Copa a contento,pois se isso realmente acontecer é a chance que tem de voltar ao poder em 2014.
Mas denunciar o uso de dinheiro público na construção de estádios que,provavelmente,virarão grandes elefantes brancos não é de maneira nenhuma ser contra o Brasil.Ao contrário,se está querendo preservar o dinheiro dos contribuintes brasileiros da velha mania de se utilizar dinheiro público para beneficiar entes privados.
Gabriel Braga
"Mas os turistas e profissionais que vierem para o evento vão se amarrar muito, e não só, como de costume, com as belezas naturais, as praias, o friendly and warm people, a sensualidade latente, a diversidade musical, a caipirinha, a feijoada, mas com o grau de urbanidade e modernidade do ex-país periférico. Será um mês de festa também para os brasileiros, tanto para a maioria que vai curtir o evento em casa quanto para os que irão ao estádio – e, de maneira peculiar, para os comerciantes e prestadores de serviços que lucrarão com o mundial."
Ex-país periférico? O que mudou, agora que não somos mais um país periférico? O que mudou de quando éramos para os dias de hoje, em que somos a sexta economia? O que caracteriza um país periférico?
Desculpe-me, mas enquanto esses bilhões serão investidos na realização de um evento ao qual só terá acesso a minoria abastada da sociedade, milhões de pessoas morrerão nas filas de hospitais superlotados, devido a ausência destes mesmos bilhões, que não serão investidos na saúde.
Acho um pouco contraditório defender a copa em detrimento da população pobre, a qual estaria bem mais servida se, em vês de assistir a uma partida entre Inglaterra e França pela TV ( por que não terão, devido ao preço dos ingressos, condições de irem aos estádios), pudesse marcar consultas nos hospitais sem ter que acordar às quatro da manhã, porque se assim não fizerem, não pegarão um lugar numa fila quilométrica. Estariam mais bem servidos os brasileiros se pudessem ter mais acesso às universidades, a uma educação de qualidade...
Creio que o Brasil precisa escolher melhor suas prioridades. A Inglaterra, por exemplo, realizará as olimpíadas; mas observem o padrão de vida do cidadão inglês. Não tem como comparar. Olhem o tamanho da nossa população e o número de pobres e miseráveis que há nela. Eles, os ingleses, podem se dar ao luxo de um evento desse porte. Mas nós, diante de toda a realidade do país, podemos? E a educação? E a segurança pública?Além da saúde citada acima, não seriam estes bens mais aproveitáveis à nação do que um evento que durará um mês, que será de acesso a poucos, gastará bilhões do dinheiro público ( não digam que não gastará, que gastará sim) e que, ao término, deixará benefícios( ao menos espero que assim seja) apenas às cidades envolvidas na realização do mesmo? Em que se baseia a afirmativa tão cantada pela mídia de que a copa é do Brasil, do povo, que só fará bem à nação? Quem mora em Macapá, por exemplo, e não tem dinheiro para viajar a uma das cidades-sedes, verá a “copa no Brasil” do mesmo modo que viu a copa na Alemanha e na África do sul: pela televisão. Alguém que assisti a um jogo da seleção brasileira por esse aparelho, percebe alguma diferença relevante quando o jogo se dá no maracanã ou quando se dá no Monumental?
No entanto, se esses bilhões fossem investidos em áreas que deles realmente precisam, como as citadas acima, talvez esse “alguém de Macapá”, que veria apenas mais um jogo pela televisão, pudesse desfrutar de um hospital decente, de um sistema educacional decente. O Problema não é se o país tem ou não capacidade de realizar a copa, pois é latente que tem, e sim se esta merece realmente todo o esforço e o dinheiro a ela direcionados. E isso não é complexo de vira-lata, é simplesmente um questionamento a cerca de prioridades.
É isso! Quanto ao excerto retirado de seu texto, que constitui o primeiro parágrafo deste, acho-o impregnado de estereótipos e à moda do complexo de vira-lata mencionado, diferenciando-se deste apenas pela oposição, mas seguindo a mesma regra de raciocínio. Parece aquela velha mania de que temos que achar que tudo estará bem, desde que os turistas estejam bem e gostando. E mais: parece mais de acordo com o discurso que ouviremos na Globo, daqui a dois anos, do que com o que costumeiramente lemos em seu blog.
Se o interpretei mal, desculpo-me desde já.
Um abraço! Votos de sucesso!
De alguém, independentemente de ideologias políticas—sejam elas direitistas ou esquerdistas—, a favor do povo.
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