Por Walter Sorrentino, em seu blog:
Estão em curso duas grandes batalhas, ambas muito desafiadoras e difíceis para a jornada democrática e progressista no Brasil.
Uma é aquela relativa ao julgamento de Dilma Rousseff no Senado, em duas semanas. Por mais que se considere invencível, a denúncia de uma ruptura institucional golpista é importante como marco de resistência das forças democráticas para o que vem a seguir, pelo que se deve manter a mobilização até o último round.
A outra batalha já foi iniciada e se prolongará. É a que opõe dois projetos antípodas, duas agendas políticas, sociais, econômicas e de inserção internacional do Brasil. O golpe abre curso para uma restauração conservadora aguda nessa agenda e o país está polarizado.
De um lado, esgotou-se um ciclo na vida do país, especificamente o pacto da Carta aos Brasileiros que levou Lula à presidência em 2003. O campo político vitorioso em quatro eleições presidenciais consecutivas cumpriu com êxito uma vigorosa etapa de transformações, às quais não se alcançou dar outra qualidade, com reformas estruturais.
O advento da crise capitalista mundial, em sua presente etapa atingindo em cheio os países em desenvolvimento, estancaram as condições de o país fazer a inteira defesa de seu interesse nacional e perseverar nas conquistas sociais. O Brasil conhece uma das maiores regressões econômicas e sociais da sua história: decréscimo do PIB em cerca de 9-10% em dois anos de crise, grave impacto no desemprego, na renda média do trabalho e na vida do povo.
Aos êxitos se somaram também muitos erros de condução. Combinados aos efeitos sociais da crise econômica, estreitou-se notavelmente a base de sustentação política e social ao governo Dilma, o que permitiu constituir-se que fosse submetido a um cerco político. Nessas condições, possibilitou-se o golpe sem que a maioria da sociedade se insurgisse. Sem compreender essa dinâmica e esses erros, a esquerda brasileira tardará a se reconfigurar e retomar protagonismo no rumo do projeto nacional, democrático e popular.
De outro lado, as elites se puseram em ofensiva para reinstaurar um ciclo francamente conservador. O consórcio político-empresarial-midiático e jurídico construiu persistentemente essa estratégia nos anos do governo Dilma, manipulando alterações de sentido conservador ocorridas na sociedade brasileira. As forças políticas centristas se inclinaram decidida e vastamente nessa direção, pondo-se sob o manto de uma agenda antinacional e antipopular, em bases democráticas fraudadas. Atuam hoje com o fervor dos convertidos com a agenda ultraliberal.
Não se entenderá tal ofensiva sem relacioná-la à restauração conservadora galopante no mundo. À carência de saídas progressistas para a já citada crise capitalista mundial, corresponde uma contraofensiva imperialista, em especial no subcontinente sul-americano encabeçada pelos EUA, de notável resultados, não apenas no Brasil.
Enfim, retornou o projeto ultraliberal acelerado, que implica em pôr fim ao pacto da Constituição de 1988 por meio da dilapidação do Estado brasileiro nas funções definidas constitucionalmente, com um choque fiscal estrutural que provocará restrições orçamentárias permanentes face a demandas crescentes de serviços públicos, desnacionalizações, desestatizações e desregulamentação nos direitos do trabalho (os três trágicos “Ds” do neoliberalismo, ao qual inevitavelmente se soma o quarto: desemprego). Nada disso foi legitimado pelas urnas, donde se pode esperar mais e crescentes ofensivas antidemocráticas.
O governo interino atua como síndico do condomínio das poderosas forças empresariais, midiáticas e políticas que assaltaram o poder. Sua força maior está no estamento político conservador, repudiado pela sociedade e alvo notório da Lava Jato, da qual tenta se desvencilhar com arranjos de cúpula. O governo goza de uma lua de mel irresponsável que o blinda na área da economia, mesmo que tenha adotado medidas que só agravam o déficit fiscal e dificultam a própria retomada da economia – “paga-se a conta” do impeachment.
Com Temer ou sem ele na presidência, sem reverter o golpe, será período de conchavos pelo alto e às costas da sociedade, escalada autoritária, criminalização das oposições e dos movimentos sociais, cassação de registros de funcionamento partidário, promoção da intolerância e atentados aos direitos civis e poderosas regressões no mundo do trabalho e da aposentadoria. Mas o governo está marcado por poderosas contradições e disputas, que não projetam o fim da crise política e nem apresentam perspectivas para o país.
Dessa forma, há uma encruzilhada, uma fase transitória sem hegemonia estável e, portanto, sem estabilidade política. O caminho de novas eleições presidenciais antecipadas é o único que pode modificar as condições presentes, mobilizando outras forças sociais que alterem a correlação atual. É a perspectiva que pode mobilizar a maioria da população, para que ela tome nas mãos, mediante o voto, as saídas para a crise política. Sem isso, a nova oposição estaria abstraindo o presente e se iludindo com o futuro. Mas têm havido várias dificuldades para unir em torno dessa bandeira, até agora, toda a resistência ao golpe.
É nesse contexto que atuarão as forças democráticas, progressistas e da esquerda política e social, numa situação política amplamente desfavorável, mas com um ativo de mobilização dos movimentos sociais e progressistas de razoável força e unidade.
A oposição à agenda do governo golpista é o centro tático que permanecerá. Envolve a luta política e social permanente, união de forças amplas, com núcleo na esquerda política e social, que pode levar o povo a se conflagrar contra tal agenda. De todo modo, envolverá tambémmovimentos políticos para somar forças, dividir os adversários, explorar suas contradições, preservar condições democráticas e institucionalizadas para a vida política e, mais que tudo, dar perspectivas realistas à sociedade de outro caminho para a superação da crise.
Mais que isso, envolverá reformulações táticas mais de fundo, para outra fase de acumulação de forças, para o balanço crítico e autocrítico da experiência percorrida e para outra geração de medidas programáticas para retomar os caminhos da afirmação nacional, desenvolvimento soberano, democracia e promoção de direitos sociais do povo. De vários modos, maior grau de unidade das forças de esquerda e progressistas estarão no centro dessa pauta.
De vários modos, também, as eleições vindouras já serão palco dessa tática, porquanto não está isenta de disputa política das narrativas sobre o golpe, também porque já é a busca de acumulação de forças da esquerda e projeção de caminhos para a sua maior unidade. Para dizer o básico: não obstante serem eleições municipais, a vitória dessas forças em São Paulo e Rio de Janeiro, com Fernando Haddad e Jandira Feghali respectivamente, mudará profundamente o signo das perspectivas vindouras.
Estão em curso duas grandes batalhas, ambas muito desafiadoras e difíceis para a jornada democrática e progressista no Brasil.
Uma é aquela relativa ao julgamento de Dilma Rousseff no Senado, em duas semanas. Por mais que se considere invencível, a denúncia de uma ruptura institucional golpista é importante como marco de resistência das forças democráticas para o que vem a seguir, pelo que se deve manter a mobilização até o último round.
A outra batalha já foi iniciada e se prolongará. É a que opõe dois projetos antípodas, duas agendas políticas, sociais, econômicas e de inserção internacional do Brasil. O golpe abre curso para uma restauração conservadora aguda nessa agenda e o país está polarizado.
De um lado, esgotou-se um ciclo na vida do país, especificamente o pacto da Carta aos Brasileiros que levou Lula à presidência em 2003. O campo político vitorioso em quatro eleições presidenciais consecutivas cumpriu com êxito uma vigorosa etapa de transformações, às quais não se alcançou dar outra qualidade, com reformas estruturais.
O advento da crise capitalista mundial, em sua presente etapa atingindo em cheio os países em desenvolvimento, estancaram as condições de o país fazer a inteira defesa de seu interesse nacional e perseverar nas conquistas sociais. O Brasil conhece uma das maiores regressões econômicas e sociais da sua história: decréscimo do PIB em cerca de 9-10% em dois anos de crise, grave impacto no desemprego, na renda média do trabalho e na vida do povo.
Aos êxitos se somaram também muitos erros de condução. Combinados aos efeitos sociais da crise econômica, estreitou-se notavelmente a base de sustentação política e social ao governo Dilma, o que permitiu constituir-se que fosse submetido a um cerco político. Nessas condições, possibilitou-se o golpe sem que a maioria da sociedade se insurgisse. Sem compreender essa dinâmica e esses erros, a esquerda brasileira tardará a se reconfigurar e retomar protagonismo no rumo do projeto nacional, democrático e popular.
De outro lado, as elites se puseram em ofensiva para reinstaurar um ciclo francamente conservador. O consórcio político-empresarial-midiático e jurídico construiu persistentemente essa estratégia nos anos do governo Dilma, manipulando alterações de sentido conservador ocorridas na sociedade brasileira. As forças políticas centristas se inclinaram decidida e vastamente nessa direção, pondo-se sob o manto de uma agenda antinacional e antipopular, em bases democráticas fraudadas. Atuam hoje com o fervor dos convertidos com a agenda ultraliberal.
Não se entenderá tal ofensiva sem relacioná-la à restauração conservadora galopante no mundo. À carência de saídas progressistas para a já citada crise capitalista mundial, corresponde uma contraofensiva imperialista, em especial no subcontinente sul-americano encabeçada pelos EUA, de notável resultados, não apenas no Brasil.
Enfim, retornou o projeto ultraliberal acelerado, que implica em pôr fim ao pacto da Constituição de 1988 por meio da dilapidação do Estado brasileiro nas funções definidas constitucionalmente, com um choque fiscal estrutural que provocará restrições orçamentárias permanentes face a demandas crescentes de serviços públicos, desnacionalizações, desestatizações e desregulamentação nos direitos do trabalho (os três trágicos “Ds” do neoliberalismo, ao qual inevitavelmente se soma o quarto: desemprego). Nada disso foi legitimado pelas urnas, donde se pode esperar mais e crescentes ofensivas antidemocráticas.
O governo interino atua como síndico do condomínio das poderosas forças empresariais, midiáticas e políticas que assaltaram o poder. Sua força maior está no estamento político conservador, repudiado pela sociedade e alvo notório da Lava Jato, da qual tenta se desvencilhar com arranjos de cúpula. O governo goza de uma lua de mel irresponsável que o blinda na área da economia, mesmo que tenha adotado medidas que só agravam o déficit fiscal e dificultam a própria retomada da economia – “paga-se a conta” do impeachment.
Com Temer ou sem ele na presidência, sem reverter o golpe, será período de conchavos pelo alto e às costas da sociedade, escalada autoritária, criminalização das oposições e dos movimentos sociais, cassação de registros de funcionamento partidário, promoção da intolerância e atentados aos direitos civis e poderosas regressões no mundo do trabalho e da aposentadoria. Mas o governo está marcado por poderosas contradições e disputas, que não projetam o fim da crise política e nem apresentam perspectivas para o país.
Dessa forma, há uma encruzilhada, uma fase transitória sem hegemonia estável e, portanto, sem estabilidade política. O caminho de novas eleições presidenciais antecipadas é o único que pode modificar as condições presentes, mobilizando outras forças sociais que alterem a correlação atual. É a perspectiva que pode mobilizar a maioria da população, para que ela tome nas mãos, mediante o voto, as saídas para a crise política. Sem isso, a nova oposição estaria abstraindo o presente e se iludindo com o futuro. Mas têm havido várias dificuldades para unir em torno dessa bandeira, até agora, toda a resistência ao golpe.
É nesse contexto que atuarão as forças democráticas, progressistas e da esquerda política e social, numa situação política amplamente desfavorável, mas com um ativo de mobilização dos movimentos sociais e progressistas de razoável força e unidade.
A oposição à agenda do governo golpista é o centro tático que permanecerá. Envolve a luta política e social permanente, união de forças amplas, com núcleo na esquerda política e social, que pode levar o povo a se conflagrar contra tal agenda. De todo modo, envolverá tambémmovimentos políticos para somar forças, dividir os adversários, explorar suas contradições, preservar condições democráticas e institucionalizadas para a vida política e, mais que tudo, dar perspectivas realistas à sociedade de outro caminho para a superação da crise.
Mais que isso, envolverá reformulações táticas mais de fundo, para outra fase de acumulação de forças, para o balanço crítico e autocrítico da experiência percorrida e para outra geração de medidas programáticas para retomar os caminhos da afirmação nacional, desenvolvimento soberano, democracia e promoção de direitos sociais do povo. De vários modos, maior grau de unidade das forças de esquerda e progressistas estarão no centro dessa pauta.
De vários modos, também, as eleições vindouras já serão palco dessa tática, porquanto não está isenta de disputa política das narrativas sobre o golpe, também porque já é a busca de acumulação de forças da esquerda e projeção de caminhos para a sua maior unidade. Para dizer o básico: não obstante serem eleições municipais, a vitória dessas forças em São Paulo e Rio de Janeiro, com Fernando Haddad e Jandira Feghali respectivamente, mudará profundamente o signo das perspectivas vindouras.
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