Matteo Renzi. Foto: EPA |
Enquanto os brasileiros aguardam pela segunda votação da PEC 55 pelo Senado, a renúncia do primeiro-ministro italiano Matteo Renzi, desmoralizado por uma derrota política acachapante, é mais uma advertência sobre as inconveniências de programas de austeridade forçada, que não levam em conta as necessidades da maioria da população.
Explico. Em teoria, o referendo italiano nada tinha a ver com economia. A questão envolvia uma reforma política que diminuía as prerrogativas do Senado italiano. Na prática, foi a prolongada crise econômica italiana, atolada numa recessão que se prolonga por sete anos, sem índices de crescimento real há 13, alimentando um desemprego que bate nos 11%, que abriu o terreno para a derrota de Renzi, reforçando incertezas sobre o novo governo daquele país e sobre o futuro da União Europeia.
O desastre italiano é fruto direto de um processo que podemos chamar de economia Berlusconi, em homenagem ao antigo primeiro ministro que assumiu o poder após a Operação Mãos Limpas, quando o sistema político construído após a derrota do fascismo foi colocado no chão pela investigação que serviu de inspiração para a Lava Jato.
A história é fácil de compreender. Como ocorreu em muitos outros lugares, atingidos pelas exportações chinesas, na Itália a globalização também destruiu uma economia baseada em grande parte em pequenas e médias indústrias, arrastando consigo setores inteiros do bem-estar social de um país outrora conhecido pela qualidade dos serviços públicos. Num esforço para reanimar a economia, Matteo Renzi tentou criar programas de estímulo - sem sucesso.
Uma reportagem do New York Times (2/5/2016) explica a razão, de uma forma bem didática: "O governo italiano tentou aumentar gastos públicos para acelerar a economia. Contudo, os líderes da União Europeia, como a Alemanha, estabeleceram regras para limitar os déficits orçamentários."
Na prática, estamos falando de um programa de controle de gastos que, à semelhança da PEC 55, limitava a capacidade de endividamento do Estado - exatamente como a dupla Meirelles-Temer pretende implantar no Brasil. A diferença, no caso brasileiro, é que se trata de um programa fixo, com prazo de 20 anos, baseado uma emenda constitucional - o que representa uma versão radical de uma ideia já ruim.
Num outro dado que mostra o grau de degradação da economia italiana, que também possui lições de extrema atualidade para os brasileiros, verifica-se uma situação curiosa. Nos meses posteriores ao colapso dos derivativos, 2008-2009, tanto o Banco Central brasileiro, do qual Henrique Meirelles era presidente, como o Banco Central Europeu, dominado pelo monetarismo mais estreito, conseguiram aliar-se no mesmo erro. Decidiram elevar os juros numa hora em que o capitalismo desabava no plano universal. Nos dois bancos centrais dizia-se que a prioridade era controlar gastos para impedir altas inflacionárias.
Forçado por Lula, então na presidência da Republica, Meirelles acabou modificando sua política, o que permitiu ao Brasil recuperar o crescimento num prazo relativamente curto. O BCE também voltou atrás após uma mudança de diretoria e tentou reanimar as economias do Velho Mundo com juros negativos. Não adiantou - pois havia o limite de gastos imposto pelo governo de Angela Merkel, o mesmo que crucificou a Grécia, Espanha e Portugal.
Os empréstimos a juros negativos passaram a afetar "a lucratividade dos bancos" italianos, explica o NYT. Conforme o jornal, os bancos passaram a guardar "os dinheiro, retirando capital de uma economia já anêmica." Num país em recessão prolongada, a vida cotidiana e as projeções para o futuro se transformaram num pesadelo. Hoje, a Itália concentra 40% de todos os empréstimos inadimplentes do bloco do Euro. Conforme o FMI, o país acumula uma montanha de 360 bilhões de euros em empréstimos problemáticos, o que transforma o sistema bancário numa ameaça real a Europa.
A chave da questão, mais uma vez, encontra-se num ponto bem definido: "os bancos italianos não serão capazes de se restabelecer sem que haja crescimento, e a economia italiana não pode crescer sem bancos saudáveis."
As semelhanças entre as economias não é completa. A maioria das vantagens comparativas fica no lado brasileiro, o que torna ainda mais absurdo que a opção pela PEC 55, que já levou a Itália para o fundo do poço. Só para começar a conversa. Enquanto o déficit público italiano chega a 133% do PIB, as reservas brasileiras, construídas pacientemente durante os anos Lula-Dilma, chegam a U$ 360 bilhões.
Um ponto pode ajudar a entender a situação porém. Os dois países tiveram seus sistemas políticos dizimados por operações judiciais contra a corrupção, a Mãos Limpas e a Lava Jato. Qualquer que seja a avaliação jurídica e ética que se possa fazer dessas operações, é inegável que elas tiveram um efeito econômico e político conhecido. De um lado, destruíram grande parte do setor produtivo dos dois países. Se no caso brasileiro nem precisamos detalhar o tamanho do estrago, na Itália ocorreu o colapso de grandes grupos nacionais, dos quais restaram poucos expoentes num conjunto que já foi orgulho da Europa.
Na vida política italiana, lideranças e partidos tradicionais foram dizimadas, dando lugar a políticos sem força e sem lastro para enfrentar as pressões do capital financeiro, que fazem girar os grandes mecanismos da globalização, principais interessados em programas de controle de gastos públicos cuja prioridade é reservas saldos imensos para a ciranda financeira. Na Itália, a nova situação deu origem a Silvio Berlusconi, empresário bilionário, e, agora, às conhecidas aves de rapina das democracia em escombros, que só mudam de nome e endereço de um país para o outro.
Os empréstimos a juros negativos passaram a afetar "a lucratividade dos bancos" italianos, explica o NYT. Conforme o jornal, os bancos passaram a guardar "os dinheiro, retirando capital de uma economia já anêmica." Num país em recessão prolongada, a vida cotidiana e as projeções para o futuro se transformaram num pesadelo. Hoje, a Itália concentra 40% de todos os empréstimos inadimplentes do bloco do Euro. Conforme o FMI, o país acumula uma montanha de 360 bilhões de euros em empréstimos problemáticos, o que transforma o sistema bancário numa ameaça real a Europa.
A chave da questão, mais uma vez, encontra-se num ponto bem definido: "os bancos italianos não serão capazes de se restabelecer sem que haja crescimento, e a economia italiana não pode crescer sem bancos saudáveis."
As semelhanças entre as economias não é completa. A maioria das vantagens comparativas fica no lado brasileiro, o que torna ainda mais absurdo que a opção pela PEC 55, que já levou a Itália para o fundo do poço. Só para começar a conversa. Enquanto o déficit público italiano chega a 133% do PIB, as reservas brasileiras, construídas pacientemente durante os anos Lula-Dilma, chegam a U$ 360 bilhões.
Um ponto pode ajudar a entender a situação porém. Os dois países tiveram seus sistemas políticos dizimados por operações judiciais contra a corrupção, a Mãos Limpas e a Lava Jato. Qualquer que seja a avaliação jurídica e ética que se possa fazer dessas operações, é inegável que elas tiveram um efeito econômico e político conhecido. De um lado, destruíram grande parte do setor produtivo dos dois países. Se no caso brasileiro nem precisamos detalhar o tamanho do estrago, na Itália ocorreu o colapso de grandes grupos nacionais, dos quais restaram poucos expoentes num conjunto que já foi orgulho da Europa.
Na vida política italiana, lideranças e partidos tradicionais foram dizimadas, dando lugar a políticos sem força e sem lastro para enfrentar as pressões do capital financeiro, que fazem girar os grandes mecanismos da globalização, principais interessados em programas de controle de gastos públicos cuja prioridade é reservas saldos imensos para a ciranda financeira. Na Itália, a nova situação deu origem a Silvio Berlusconi, empresário bilionário, e, agora, às conhecidas aves de rapina das democracia em escombros, que só mudam de nome e endereço de um país para o outro.
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