Por Miguel do Rosário, no blog Cafezinho:
Os analistas da mídia, convertidos hoje em meros estafetas a serviços do golpe, terão trabalho extra com a vitória de Michel Temer, por isso devem estar bastante mal humorados.
Não serão eles, de qualquer forma, que poderão escrever sobre algumas consequências óbvias da votação de ontem, na qual o governo obteve uma vitória esmagadora, que não pode ser medida pelo placar de 263 votos a 227 votos em favor do governo.
Como a oposição precisava de 342 votos para autorizar a investigação e cassar o presidente, todos os deputados da direita com eleitorado de “opinião”, como são boa parte dos tucanos, além dos Bolsonaro, votaram “não”, ou seja, em favor da continuidade das investigações.
Mas foram votos notoriamente oportunistas, eleitoreiros, visto que todos os movimentos da cúpula do PSDB foram no sentido de ampliar (e não diminuir) o apoio do partido ao governo Temer.
Os Bolsonaro, por sua vez, ou pelo menos o patriarca, Jair, estão de mudança para o PEN, que é a legenda mais fiel a Temer no congresso. O PEN orientou o voto em favor do governo Temer (ou seja, no “sim”), e todos seus deputados seguiram fielmente a diretriz.
Não se pode esquecer isso, portanto, ao analisar o tamanho da vitória de Temer: ela foi maior do que o placar. Com isso, o caminho para aprovar mais reformas antissociais, sem aprovação popular, sem debate com a sociedade, está aberto.
Para entender os efeitos da votação de ontem, por outro lado, é preciso lembrar que inúmeros institutos de pesquisa detectaram que uma maioria esmagadora de brasileiros, quase a totalidade, desejava um resultado diferente, ou seja, que fosse autorizada a investigação.
Todas essas pessoas amanheceram com o gosto amargo da derrota na boca. O que acontece quando, numa democracia, a maioria perde?
Supõe-se que, ao rancor que as pessoas sentem em relação ao governo, venha se somar a frustração, a sensação de impotência, o desânimo.
Mas não se pode, jamais, subestimar a vontade e o espírito popular. Esses sentimentos são naturais e constituem uma defesa coletiva psicológica natural. Eles se transformam, rapidamente, em outra coisa, que ainda não sabemos, mas que será, provavelmente, qualquer coisa que seja oponha a Michel Temer. Será difícil para o PSDB e Bolsonaro convencerem a população de que não estão com Temer, se eles aparecem ao lado do governo na comemoração das “reformas” propostas e aprovadas.
Bolsonaro poderá tentar se descolar das reformas? Se for inteligente, sim, mas aí será atacado pela mídia. Por enquanto, a mídia deixa Bolsonaro, expulso do exército por terrorismo, livre, leve e solto, por entender que ele tem potencial de tirar votos de Lula, já que é óbvio que o deputado carioca já passou da fase em que tinha apoio apenas de setores autoritários e ignorantes da classe média, para começar a crescer também junto ao eleitorado mais pobre, cada vez mais assustado e confuso com o avanço das operações judiciais sobre tudo e sobre todos.
Quão diferente foi a votação de ontem, em Brasília movida por verbas e articulações obscuras, da eleição da Assembleia Constituinte na Venezuela? Esta última movimentou toda a população: a oposição não foi votar, mas isso foi uma participação política; e os favoráveis à Constituinte enfrentaram os riscos e os medos para elegerem seus candidatos. Lá, houve participação política e aprendizado. E aqui? A população assistiu atônita, impotente, os deputados apresentarem seus votos em favor de Temer com argumentos incrivelmente contraditórios.
O golpe – e a esta altura, não há dúvidas de que há uma articulação muito estruturada que une Lava Jato, Michel Temer e mídia – tentou evitar ao máximo a exposição dos deputados que votaram em favor de Temer. A votação foi realizada num dia semana, em horário de trabalho, não num domingo, como foi o impeachment de Dilma, e cuja repercussão negativa serviu de lição ao golpe, que não irá repetir o erro. Aos deputados foram dados apenas alguns segundos para se pronunciarem. Seguiu-se a lição maquiavélica, de que o poder, quando pretende fazer mal ao povo, deve ser rápido e brutal. Aliás, todas as ações do governo Temer tem seguido essa máxima: em poucos meses, o desmonte de tudo.
As pessoas reclamaram, com razão, da apatia das ruas, dos movimentos sociais, dos sindicatos, dos partidos de esquerda, mas é preciso ponderar que estes setores vem protestando há meses. Este ano, foram dezenas de protestos, alguns bem grandes, incluindo duas greves gerais. Nada tem conseguido interromper a marcha do golpe, porque ele tem o judiciário, a Lava Jato e a mídia a seu lado. Não há uma ação do golpe, incluindo a votação de ontem, que não fosse acompanhada, de perto, pela Lava Jato. No dia da votação da cassação de Temer, Sergio Moro aceita outra denúncia contra Lula. No dia seguinte, em que e a vitória do governo poderia trincar a narrativa, outra etapa da operação é deflagrada.
Os deputados mais histericamente fieis a Temer, como o caricato Wladimir Costa (Solidariedade-PA), usavam o nome de Lula, ou tentavam surfar no antipetismo, como senha para jogar uma cortina de fumaça sobre a votação. Costa segurava um boneco do “pixuleco”, representando Lula em trajes de presidiário, o qual não parava de agir, durante toda a votação, seguindo de gritos contra Lula e o PT.
Com a votação de ontem, o governo ficou ainda mais refém dos setores mais retrógrados, conservadores e direitistas do parlamento.
A grande mídia, porém, é a principal culpada. No mesmo dia da votação, um editorial do Globo, embora fingisse apoiar, no título, a continuidade das investigações, cita Lula quatro vezes, o PT mais quatro vezes, e o “petrolão”, duas vezes, e elogia desbragadamente a “equipe econômica” e as reformas de Michel Temer. Ou seja, Wladimir Costa, em verdade, apenas traduziu para a linguagem do baixo parlamento o recado da Globo aos setores pretensamente (e só pretensamente!) mais esclarecidos das elites, sempre atentos às diretrizes emanadas pela direção central do golpe, que é a própria Globo.
O dilema da Globo é que ela, por mais que simule movimentos opostos, com uma tática diversionista que, infelizmente, ainda engana muitos incautos, está cada vez mais próxima de Michel Temer. E Michel Temer se torna, mais e mais, símbolo do golpe.
Os analistas da mídia, convertidos hoje em meros estafetas a serviços do golpe, terão trabalho extra com a vitória de Michel Temer, por isso devem estar bastante mal humorados.
Não serão eles, de qualquer forma, que poderão escrever sobre algumas consequências óbvias da votação de ontem, na qual o governo obteve uma vitória esmagadora, que não pode ser medida pelo placar de 263 votos a 227 votos em favor do governo.
Como a oposição precisava de 342 votos para autorizar a investigação e cassar o presidente, todos os deputados da direita com eleitorado de “opinião”, como são boa parte dos tucanos, além dos Bolsonaro, votaram “não”, ou seja, em favor da continuidade das investigações.
Mas foram votos notoriamente oportunistas, eleitoreiros, visto que todos os movimentos da cúpula do PSDB foram no sentido de ampliar (e não diminuir) o apoio do partido ao governo Temer.
Os Bolsonaro, por sua vez, ou pelo menos o patriarca, Jair, estão de mudança para o PEN, que é a legenda mais fiel a Temer no congresso. O PEN orientou o voto em favor do governo Temer (ou seja, no “sim”), e todos seus deputados seguiram fielmente a diretriz.
Não se pode esquecer isso, portanto, ao analisar o tamanho da vitória de Temer: ela foi maior do que o placar. Com isso, o caminho para aprovar mais reformas antissociais, sem aprovação popular, sem debate com a sociedade, está aberto.
Para entender os efeitos da votação de ontem, por outro lado, é preciso lembrar que inúmeros institutos de pesquisa detectaram que uma maioria esmagadora de brasileiros, quase a totalidade, desejava um resultado diferente, ou seja, que fosse autorizada a investigação.
Todas essas pessoas amanheceram com o gosto amargo da derrota na boca. O que acontece quando, numa democracia, a maioria perde?
Supõe-se que, ao rancor que as pessoas sentem em relação ao governo, venha se somar a frustração, a sensação de impotência, o desânimo.
Mas não se pode, jamais, subestimar a vontade e o espírito popular. Esses sentimentos são naturais e constituem uma defesa coletiva psicológica natural. Eles se transformam, rapidamente, em outra coisa, que ainda não sabemos, mas que será, provavelmente, qualquer coisa que seja oponha a Michel Temer. Será difícil para o PSDB e Bolsonaro convencerem a população de que não estão com Temer, se eles aparecem ao lado do governo na comemoração das “reformas” propostas e aprovadas.
Bolsonaro poderá tentar se descolar das reformas? Se for inteligente, sim, mas aí será atacado pela mídia. Por enquanto, a mídia deixa Bolsonaro, expulso do exército por terrorismo, livre, leve e solto, por entender que ele tem potencial de tirar votos de Lula, já que é óbvio que o deputado carioca já passou da fase em que tinha apoio apenas de setores autoritários e ignorantes da classe média, para começar a crescer também junto ao eleitorado mais pobre, cada vez mais assustado e confuso com o avanço das operações judiciais sobre tudo e sobre todos.
Quão diferente foi a votação de ontem, em Brasília movida por verbas e articulações obscuras, da eleição da Assembleia Constituinte na Venezuela? Esta última movimentou toda a população: a oposição não foi votar, mas isso foi uma participação política; e os favoráveis à Constituinte enfrentaram os riscos e os medos para elegerem seus candidatos. Lá, houve participação política e aprendizado. E aqui? A população assistiu atônita, impotente, os deputados apresentarem seus votos em favor de Temer com argumentos incrivelmente contraditórios.
O golpe – e a esta altura, não há dúvidas de que há uma articulação muito estruturada que une Lava Jato, Michel Temer e mídia – tentou evitar ao máximo a exposição dos deputados que votaram em favor de Temer. A votação foi realizada num dia semana, em horário de trabalho, não num domingo, como foi o impeachment de Dilma, e cuja repercussão negativa serviu de lição ao golpe, que não irá repetir o erro. Aos deputados foram dados apenas alguns segundos para se pronunciarem. Seguiu-se a lição maquiavélica, de que o poder, quando pretende fazer mal ao povo, deve ser rápido e brutal. Aliás, todas as ações do governo Temer tem seguido essa máxima: em poucos meses, o desmonte de tudo.
As pessoas reclamaram, com razão, da apatia das ruas, dos movimentos sociais, dos sindicatos, dos partidos de esquerda, mas é preciso ponderar que estes setores vem protestando há meses. Este ano, foram dezenas de protestos, alguns bem grandes, incluindo duas greves gerais. Nada tem conseguido interromper a marcha do golpe, porque ele tem o judiciário, a Lava Jato e a mídia a seu lado. Não há uma ação do golpe, incluindo a votação de ontem, que não fosse acompanhada, de perto, pela Lava Jato. No dia da votação da cassação de Temer, Sergio Moro aceita outra denúncia contra Lula. No dia seguinte, em que e a vitória do governo poderia trincar a narrativa, outra etapa da operação é deflagrada.
Os deputados mais histericamente fieis a Temer, como o caricato Wladimir Costa (Solidariedade-PA), usavam o nome de Lula, ou tentavam surfar no antipetismo, como senha para jogar uma cortina de fumaça sobre a votação. Costa segurava um boneco do “pixuleco”, representando Lula em trajes de presidiário, o qual não parava de agir, durante toda a votação, seguindo de gritos contra Lula e o PT.
Com a votação de ontem, o governo ficou ainda mais refém dos setores mais retrógrados, conservadores e direitistas do parlamento.
A grande mídia, porém, é a principal culpada. No mesmo dia da votação, um editorial do Globo, embora fingisse apoiar, no título, a continuidade das investigações, cita Lula quatro vezes, o PT mais quatro vezes, e o “petrolão”, duas vezes, e elogia desbragadamente a “equipe econômica” e as reformas de Michel Temer. Ou seja, Wladimir Costa, em verdade, apenas traduziu para a linguagem do baixo parlamento o recado da Globo aos setores pretensamente (e só pretensamente!) mais esclarecidos das elites, sempre atentos às diretrizes emanadas pela direção central do golpe, que é a própria Globo.
O dilema da Globo é que ela, por mais que simule movimentos opostos, com uma tática diversionista que, infelizmente, ainda engana muitos incautos, está cada vez mais próxima de Michel Temer. E Michel Temer se torna, mais e mais, símbolo do golpe.
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